Meninas tiveram reações adversas após
tomar vacina em escola de SP. Especialistas descartam que problemas
tenham sido causados por vacina.
Vários telespectadores procuraram o Fantástico
pedindo uma reportagem esclarecedora sobre o assunto, como a Dona
Cristina. “Meu nome é Cristina dos Reis, eu moro em Niterói, no Rio de
Janeiro, e tenho uma filha de 18 anos que eu ia levar essa semana agora
para tomar a vacina contra o vírus HPV em uma clínica particular. Mas eu
tenho ouvido tantos relatos a respeito de reações adversas graves
provocadas pela vacina, que eu gostaria de saber mais sobre o assunto
aqui no Fantástico”, disse ela.
O Fantástico esclarece isso na reportagem a seguir:
Luana Raiane Barros da Silva, de 12 anos, e Mariana Vitória Freitas da
Costa, também de 12 anos, contaram como ficaram, há duas semanas, logo
depois de tomar a vacina contra o HPV.
“Cerca de 20 minutos, por aí, e aí eu comecei a passar mal”, lembra Luana.
Fantástico: E não conseguia caminhar, não conseguia andar nada?
Mariana: Não.
“Eu comecei a sentir formigar e aí do nada as pernas pararam. Se eu
ficasse em pé, nem adiantava, não dava, não dava”, diz Luana.
Passaram seis dias internadas. Receberam alta na quarta-feira. Elas não
foram as únicas a passar mal. Outra jovem foi internada no hospital com
os mesmos sintomas, e outras oito meninas também apresentaram problemas
mais leves, como falta de sensibilidade nas pernas, dor de cabeça e
tontura.
Elas estudam em uma escola em Bertioga, litoral de São Paulo. Foi lá que elas receberam a vacina.
“Um desespero, um monte de criança chorando, se tremendo, dizendo que
não estava sentindo as pernas”, conta Fabíola Freitas de Lima, mãe da
Mariana.
“Aí eu perguntei: ‘O que aconteceu?’ ‘Tomaram a vacina e começaram a cair’”, afirma Rosália Alves Barros, mãe de Luana.
Por que elas tiveram esses sintomas? Existe de fato uma relação com a vacina?
Desde março, o Brasil oferece essa imunização, de graça, em postos de
saúde e escolas para meninas de 11 a 13 anos. Mais de 4,4 milhões já
foram vacinadas.
Ao serem vacinadas, as jovens são protegidas contra os tipos mais
frequentes do HPV. O Papilomavírus Humano, o HPV, é um vírus sexualmente
transmissível que pode causar o câncer de colo de útero, o terceiro
tipo de tumor mais comum em mulheres e o quarto câncer que mais mata
brasileiras.
A vacina não usa o vírus enfraquecido, como é comum em outras, como
febre amarela e sarampo. A do HPV usa apenas um pedacinho do vírus, que
tem uma proteína chamada L1. Só essa proteína já é suficiente para
ativar o sistema de defesa do organismo contra o HPV.
A vacina é novidade no Brasil, mas já foi adotada há muito tempo em
outros países. Nos Estados Unidos, a vacina contra o HPV não é
obrigatória e não é de graça. A recomendação é que meninas e meninos
entre 11 e 12 anos sejam imunizados.
A reação mais observada é dor de cabeça. Há algumas investigações
abertas para apurar casos, como, por exemplo, o de um adolescente que
morreu dormindo seis meses depois de tomar a última dose. O Fantástico
conversou pela internet com o diretor do Centro de Controle e Prevenção
de Doenças dos Estados Unidos. “Algumas pessoas podem ter uma reação
alérgica a essa vacina, mas é algo que pode acontecer após tomar
qualquer vacina. Nós conduzimos vários estudos e eles nos mostraram que a
vacina contra o HPV é muito segura”, afirma Tom Shimabokuro.
No Japão, a vacina contra o HPV chegou em 2009. Porém, só em abril do
ano passado teve início uma campanha nacional de vacinação. O foco eram
meninas entre 12 e 16 anos.
Ao todo, 3,4 milhões de doses foram aplicadas, e 176 adolescentes que
receberam a vacina apresentaram reações mais sérias. Isso dá um problema
mais grave para cada 20 mil pessoas vacinadas. É pouco, mas já foi o
suficiente para o governo japonês suspender a campanha.
O neurologista Toshiaki Hirai acabou de fazer um estudo com sete
meninas japonesas que apresentaram sintomas: dor crônica, perda de força
e sensibilidade nas pernas, e também de memória. Ele conta que uma
delas não reconhece mais os pais. Exames de tomografia computadorizada
no cérebro das adolescentes revelaram menos circulação sanguínea na
parte de trás da cabeça.
É importante ressaltar que ainda não se sabe se existe uma relação
direta entre a aplicação da vacina e os problemas que surgiram.
Mesmo com a campanha suspensa, a vacina contra o HPV ainda está
disponível de graça nos principais hospitais e clínicas do Japão.
Na Grã-Bretanha, a vacina contra HPV é aplicada há seis anos. Meninas de 12 e 13 anos recebem as doses na escola.
Nos dois primeiros anos de vacinação, o governo britânico fez um estudo
para avaliar a segurança. Cinco mil meninas, 1% das que foram
vacinadas, relataram efeitos colaterais. Mas os médicos concluíram que
eram reações esperadas, e muitas vezes causadas por efeitos
psicológicos, por medo da vacina. Houve apenas um caso que chamou a
atenção do governo e teve muita repercussão: em 2009, uma menina morreu
horas depois de receber a vacina, mas uma investigação concluiu que o
motivo foi um tumor que ninguém sabia que ela tinha. Portanto, nenhuma
relação com a vacina.
No Brasil, os médicos também acreditam que as adolescentes de Bertioga,
que perderam os movimentos das pernas por alguns dias, tiveram uma
reação emocional, não física. “Tem a ver com essa preocupação, com o
medo de que essa injeção possa doer. A própria OMS já define esse termo:
‘reação de ansiedade após imunização’”, afirma a diretora de imunização
da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, Helena Sato.
Segundo os médicos, o problema é comum em adolescentes, principalmente
meninas. E, quando elas estão em grupo, uma acaba 'sentindo' os mesmos
sintomas da outra. “Isso já aconteceu na Austrália. Meninas que foram
vacinadas reportam sensações diferentes e há como se existisse um
estresse quase que coletivo relacionado à aplicação da vacina em algumas
meninas que apresentem os mesmos sintomas”, conta o presidente da
Sociedade Brasileira de Imunizações, Renato Kfouri.
No hospital, Luana e Mariana fizeram exames neurológicos, testes de
reflexo, sensibilidade, também uma tomografia. E a tomografia do crânio
está sem alterações.
O governo e os médicos garantem: a vacina é segura. “Nós estamos
falando de 0,03% do número de doses aplicadas versus número de reações
reportadas”, afirma Kfouri.
“Essa é uma vacina extremamente importante. Porque é uma vacina eficaz, que previne contra o câncer”, ressalta Sato.
Ester da Cruz Romão, de 13 anos, está bem certa da decisão: “Isso
previne de eu pegar doenças. Eu tomo mesmo porque isso é importante”,
diz a menina.