Pesquisa mostra que um em cada cinco profissionais de saúde já sofreu agressão física e mais de 70% já passaram por algum episódio de violência. Demora no atendimento é a principal razão para ataques contra médicos e enfermeiros
Esse foi o drama enfrentado pela enfermeira Maria Lúcia Bortolucci, em Santos (SP), e pela pediatra Lyse Soares, em Niterói (RJ). Durante um plantão no Pronto-Socorro da Zona Noroeste, em 10 de agosto, a enfermeira foi jogada no chão e espancada por duas mulheres enquanto tentava internar o pai de ambas. Ela precisará de uma cirurgia no maxilar. O caso foi parar na delegacia. Na madrugada de 2 de abril, Lyse foi agredida no Hospital Icaray, depois que um casal exigiu, sem sucesso, a internação do filho, que estava só em estado febril. A pediatra foi agarrada pelos cabelos e estapeada pelos pais. O caso ganhou repercussão e os agressores, um advogado e uma fisioterapeuta, perderam seus empregos.
Os homens também são vítimas. Em 3 de janeiro, no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto (SP), o obstetra Conrado Ragazini foi nocauteado sem aviso pelo marido de uma paciente. Ele sofreu fraturas nos ossos da face e ficou afastado por um mês. Dois dias antes, o obstetra havia feito o parto do filho do agressor. Como o bebê precisou ser encaminhado para uma UTI neonatal, o pai culpou o médico. Já o enfermeiro Wagner Batista passou a sofrer de síndrome de “burnout” após ser ameaçado de morte por um foragido da Justiça. O caso ocorreu em março, na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) São João Lavras, um das mais movimentadas de Guarulhos, Grande São Paulo, e terminou com sua demissão. Batista havia optado por manter um paciente alcoolizado no ambulatório, dando lugar para quem necessitasse de internação. Após seis horas, o paciente e seu filho tentaram esmurrá-lo e o ameaçaram. A polícia foi chamada e descobriu-se que o filho era procurado. Dias depois, pessoas estranhas passaram a ameaçá-lo na unidade. O enfermeiro começou a sofrer de ansiedade, cansaço crônico e pressão alta.
Sucateamento da saúde
A principal causa das agressões estaria no sucateamento do sistema de saúde pública, acredita o otorrinolaringologista Florisval Meinão, diretor da Associação Paulista de Medicina (APM). Para ele, não dá para culpar diretamente os pacientes, que estão em situação de grande vulnerabilidade. “Porém, há limites”, diz. A presidente do Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo (Coren-SP) Renata Pietro vai na mesma linha. “Descontam em quem está na linha de frente para ajudar”, diz. A solução seria aumentar a segurança nas unidades, para amenizar o problema a curto prazo, e aplicar mais recursos na Saúde, já que a maior causa de conflitos (33%) está na demora de atendimento.
Pior é quando o profissional é vítima de quem deveria protegê-lo. Durante um plantão noturno, em 29 de julho, na UPA Baeta Neves, em São Bernardo do Campo (ABC-SP), a cirurgiã gástrica Edwiges Dias da Rosa, de 61 anos, ganhou hematomas nos braços ao ser segura com força por policiais militares. Tudo começou quando um PM exigiu a cópia do prontuário de uma vítima de violência doméstica. A cirurgiã informou que isso só seria possível mediante um pedido formal de delegado, já que os dados são sigilosos – algo usual. PMs tentaram detê-la por desobediência e o atendimento de uma idosa com foi comprometido. “Nunca vi tanta truculência”, conta. O caso está na Corregedoria da PM. É mais uma amostra de que a medicina é uma profissão de alto risco.
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