Procedimento inovador, minimamente invasivo, trata a lesão tumoral e não agride o tecido hepático saudável
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Renato Bezerra - Especial para o Vida*
O câncer no fígado, geralmente oriundo de metástase por tumores do tipo colorretal (que acometem o intestino grosso), atingiu mais de 34 mil pessoas no Brasil em 2016. A boa notícia é um tratamento inovador, minimamente invasivo, contra a progressão da doença.
O procedimento, realizado pelo Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, tem como metodologia a Radioterapia Interna Seletiva (SIRT, sigla em inglês) se utilizando de microesferas radioativas que são aplicadas diretamente sobre o tumor no fígado, seja ele primário ou secundário de outro órgão, e na condição de inoperáveis. Carregadas com radiação beta, as microesferas contêm o elemento radioativo Y-90, que destroem as células cancerígenas.
Após injetadas, o raio de ação das microesferas no tumor varia de 2.5 a 10 milímetros, segundo detalha o médico radiologista Felipe Nasser, cirurgião intervencionista do Hospital paulista. "Isso faz com que eu consiga tratar só a lesão tumoral e não agrida o tecido hepático saudável. Pela quantidade de esferas que nós injetamos, elas se agrupam e conseguem fazer um raio de ação maior para que a gente consiga tratar toda a lesão", explica.
A maioria dos pacientes, como ressalta, são oriundos de outros tratamentos sem o resultado esperado. Para se tornar um candidato apto ao procedimento, no entanto, é preciso ter um prognóstico de vida superior a três meses, boa função medular e importante reserva pulmonar, uma vez que a circulação hepática se comunica com a circulação pulmonar.
"Temos que sempre calcular essa comunicação para quando injetarmos as esferas no fígado elas não migrem para outras regiões e nossa maior preocupação é o pulmão", explica Nasser. O volume do fígado, assim como seu grau de acometimento pela doença, também é levado em consideração para o procedimento, que mantém a indicação quando a metástase está em até 60% do órgão.
Resultados
Para resultados a nível global, 530 pacientes com câncer de intestino e metástases hepáticas não curáveis foram testados, tendo a metade utilizada o SIRT em combinação com a quimioterapia e metade somente a quimioterapia.
Como resultado, conforme o oncologista clínico do Hospital Israelita Albert Einstein, Dr. Rene Gans, a sobrevida do fígado, estando o órgão livre de progressão da doença, foi quase o dobro da atingida pelos pacientes que fizeram o tratamento tradicional. A chance de a doença regredir, acrescenta, fica em 6% com as microesferas e 1,9% com a quimioterapia.
Dr. Rene Gans destaca, no entanto, não se tratar de sobrevida global do paciente. Essa constatação, como frisa, será apresentada, em Chicago, no Congresso da Sociedade Americana de Oncologia, em julho.
A realização do procedimento é considerada de baixa complexidade, onde o paciente é internado, aplica as microesferas (acesso percutâneo) e recebe alta no dia seguinte. Como efeito colateral, é normal um cansaço por um período de até 15 dias. O Albert Einstein tem, até o momento, 44 pacientes tratados.
Desafio
A Radioterapia Intensiva Seletiva já é usada na Austrália, nos EUA e na União Europeia. No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou o método em 2014. O desafio, no entanto, é levar o tratamento para a maioria da população. Utilizando-se de alta tecnologia e não fazendo parte da lista de procedimentos da Agência Nacional de Saúde (ANS) até o momento, o método não é coberto pelas operadoras de planos de saúde, tampouco realizado pela rede pública hospitalar. Nesse caso, a única maneira de aderir ao tratamento é arcando com os custos, que podem chegar a R$ 180 mil.
"Tudo que for minimamente invasivo exige máxima tecnologia, o que é uma vantagem, mas um desafio em termos de custeio. Essa incorporação de tecnologia é muito difícil no Brasil e a oncologia talvez seja, hoje, a área em que a confluência de diversas técnicas e tecnologias seja a mais incrível", ressaltou o médico Rodrigo Gobbo, do Centro de Intervenção Guiada por Imagem do Albert Einstein.
Já a produção das microesferas no Brasil, se possível, será realidade vista somente a longo prazo, uma vez que o País não dispõe de tecnologia para isso, atualmente. A expectativa, segundo diz Rene Gans, é que havendo resultados positivos quanto a extensão da sobrevida dos pacientes, o processo de inclusão no rol da ANS seja acelerado.
Fique por dentro
Má alimentação é principal fator de risco
O câncer colorretal foi responsável pela morte de 15.415 pessoas no País em um ano, segundo dados do Datasus, com base no Sistema de Informações de Mortalidade (SIM) de 2013. Enquanto a tecnologia não se faz acessível a maior parte da população, a melhor forma de combate ao câncer ainda é a prevenção.
Ligada, principalmente, aos hábitos alimentares, a doença tem como principais fatores de risco o sobrepeso, o alto consumo de carne vermelha, alta ingestão de açúcar e álcool e o hábito de fumar. Além de evitar essas práticas, os médicos recomendam uma rotina de exercício físico.
Uma vez que o câncer chega ao fígado, a taxa de mortalidade é alta, atingindo aproximadamente 90%. "Para o paciente com doença metastática no fígado, a chance de estar vivo em cinco anos é de 11%, e a causa principal da morte é a falência do rim", explica Rene Gans, oncologista clínico do Hospital Israelita Albert Einstein.
O gastroenterologista e cirurgião do Hospital Israelita Albert Einstein Antonio Luiz Macedo chama atenção para a gordura no fígado, patologia potencialmente maligna, comum, mas que geralmente não é dada a devida importância pela população. "Daqui a cinco anos, a maior causa de câncer no fígado será a gordura no fígado, devido ao excesso de vinho, excesso de farinha branca, excesso de açúcar e excesso de carne vermelha", alerta o especialista.
*O jornalista viajou a SP a convite do Hospital Israelita Albert Einstein
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