“Serei uma paciente oncológica para o resta da minha vida”
Elena Greene,
enfermeira (Crédito: GABRIEL REIS)
Elena
Greene, enfermeira de 53 anos, recebeu aliviada a notícia de que a
Anvisa eliminou no Brasil a comercialização das próteses mamárias
Biocell, da marca Natrelle, produzida pela empresa Allergam. O anúncio
seguiu os passos da U.S. Food and Drug Administration (FDA), a agência
reguladora dos EUA. “Pelo menos novas mulheres não terão risco de passar
pelo que passei”, diz Elena. A enfermeira sentiu na pele as
consequências da falta de informação sobre os riscos de desenvolver
câncer em decorrência de uma prótese mamária. Em 2017, ela, que era
maratonista e tinha feito há sete anos um implante de silicone da marca
condenada, resolveu trocar a prótese porque o seio esquerdo estava
inchado e atrapalhava seu desempenho na corrida. Na época, Elena se
sentia cansada e possuía manchas na perna e no braço, mas não associava
esses sintomas ao inchaço da mama. Por coincidência, seu marido, que é
clínico geral, entrou na sala de cirurgia de troca das próteses e pediu
para o seroma, ou seja, o líquido que o corpo desenvolve em volta da
prótese, fosse analisado. Poucos dias depois, eles voltaram para apanhar
o resultado. “Quando o médico falou que eu tinha linfoma, o chão se
abriu. Em cinco segundos passei de uma paciente estética para uma
paciente oncológica”, diz ela.
O caso de Elena ilustra bem como esse problema pode estar sendo
subdiagnosticado no Brasil e no mundo. Se o seu marido não estivesse na
sala de operações, o seroma não teria sido analisado. Essa é justamente a
suspeita de especialistas que atuam na área. “Trocar a prótese faz
parte do tratamento. Os médicos podem estar tratando o linfoma sem saber
que ele existe”, diz Vanderson Rocha, professor de hematologia,
hemoterapia e terapia celular da USP. O FDA já registrou 573 relatos de
linfomas relacionados à prótese mamária e 33 mortes. Apesar do alto
número de letalidade, a comunidade médica ainda afirma que são casos
muito raros, já que a quantidade de implantes é grande – nos Estados
Unidos, por exemplo, apenas em 2017 foram 281 mil. “De um modo geral,
quem quer o implante aceita riscos que são de cem a mil vezes mais
frequentes que esse, como alergias e infecções. O linfoma não é mais
grave, a única diferença é a palavra câncer”, diz Bernardo Nogueira
Batista, cirurgião plástico do Hospital Sírio Libanês.
Especialistas afirmam que o número de
casos é impreciso. Muitas vezes as próteses são substituídas sem análise
do seroma, o que impossibilita o diagnóstico do linfoma
Pesquisas e marcas
As pacientes que desenvolveram a doença lamentam a falta de
informação. Muitas delas, quando diagnosticadas, foram às redes sociais
para alertar outras pessoas. Profissionais da área afirmaram à
reportagem, sob a condição de não serem identificados, que a falta de
pesquisas e a demora no reconhecimento do problema, inclusive por
conceituadas associações médicas, são fruto da força econômica da
indústria farmacêutica. Agora as mulheres esperam que o reconhecimento
das agências seja apenas o pontapé inicial para o desenvolvimento de
mais pesquisas e informações sobre o tema, inclusive a respeito de
problemas relacionados a outras marcas.
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