sexta-feira, 30 de agosto de 2019

Dia D da Diálise: um ótimo tratamento que esbarra em desafios nacionais

A diálise salva milhares de brasileiros com doenças renais. Ainda assim, uma especialista revela que ela é negligenciada nos setores público e privado

Sou médica e em 2020 completarei 30 anos trabalhando com diálise. Muitos me perguntam porque escolhi esse caminho. Respondo: me encantou trabalhar com um tratamento que permite que os pacientes vivam apesar da “ausência” de um órgão vital. A diálise substitui rins muito doentes, filtrando toxinas e equilibrando a concentração de sal e outros eletrólitos, ácidos e, especialmente, líquidos. Uma estratégia assim não existe para qualquer outro órgão essencial à vida.
Essa fantástica terapia pode ser utilizada por breves períodos (como na doença renal aguda) ou pelo resto da vida, para preservar pacientes sem perspectivas de recuperar a função dos rins (doença renal crônica) e que não podem, ainda não conseguiram ou mesmo não desejam receber um novo órgão transplantado. Sim, algumas pessoas estão tão bem em diálise que decidem não fazer essa cirurgia.
Que fique claro: o transplante renal é um excelente tratamento. Ele deve ser estimulado sempre, pois eleva a sobrevida e dá uma maior liberdade de “ir e vir”. No entanto, como na diálise, há necessidade de cuidados e uso regular de medicações.
Além disso, a população precisa ter ciência de que, se tudo correr bem, o rim transplantado usualmente funcionará por um longo período (cerca de dez anos). Mas não para sempre.

Diálise para o resto da vida?

A diálise crônica pode ser assustadora e realmente reduz a liberdade do paciente. Ela também exige uma grande capacidade de adaptação às novas rotinas (inclusive por parte da família), restrições e, principalmente, resiliência em relação a possíveis percalços.
Mas ser feliz, produtivo e realizar sonhos é possível com o tratamento de substituição de função renal. Ao longo dos anos, vi inúmeros pacientes ativos em suas profissões. Também acompanhei casamentos, retomadas de esportes prediletos, sonhos de viagens realizados, mães dando à luz, formaturas… E até observei pessoas que, por causa da diálise, tiveram tempo de reconstruir relações importantes no final de vida.

Para vermos desfechos tão positivos, no entanto, é necessária a assistência de profissionais altamente especializados, muita tecnologia e individualização do tratamento. A personalização precisa considerar não somente as características clínicas do paciente, mas também seus desejos e estilo de vida.
Nesse sentido, um dos princípios mais belos do Sistema Único de Saúde (SUS) deveria ser aplicado também na diálise crônica: a equidade. Ou seja, tratar o diferente de modo diferente, para que cada paciente se adapte à terapia e se reintegre à sociedade da melhor forma possível.
Só que no Brasil, o que temos visto é um trágico sucateamento do setor. O valor do procedimento de hemodiálise crônica é o mais baixo da América Latina. Não se consegue mais atrair profissionais diferenciados nem utilizar as melhores tecnologias.
Com isso, o impacto da diálise na melhoria da qualidade de vida é menor. O Brasil sequer conseguiu reduzir a mortalidade dos pacientes em diálise em meia década: cerca de 20% deles morrem ao ano no país e essas taxas não melhoraram nos últimos cinco anos.
As clínicas especializadas tentam manter a resiliência com um ótimo trabalho multidisciplinar. Elas contam obrigatoriamente com médicos, enfermeiros, nutricionistas, assistentes sociais e psicólogos em um ambiente altamente regulado e vigiado. Mas são ilhas em meio ao descaso e insensibilidade de todo um sistema.
A maioria das fontes financiadoras da terapia dialítica no Brasil na rede pública ou privada permite somente tratamentos restritos, padronizados e de baixo custo. Mais do que fracassar do ponto de vista dos objetivos para cada indivíduo, as fontes financiadoras erram ainda na análise de sustentabilidade do sistema de saúde. Um paciente renal crônico mais saudável e ativo tem um custo global menor e produz mais.
Há inúmeros exemplos dessas distorções. Vou pinçar um emblemático: os remédios que tratam a anemia e os distúrbios ósseos dos pacientes renais são liberados apenas por meio de excessiva documentação e que muitas vezes não atende a casos específicos. As prescrições dos médicos comumente são desrespeitadas.
Além disso, em muitos locais a medicação não é entregue ou não pode ser mantida nas clínicas, onde deveria ser aplicada, o que compromete a aderência e a eficácia. E essa não é uma realidade somente no SUS. A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) não obriga os convênios a oferecerem tais medicamentos para a doença renal crônica.
Outra mazela: o acesso vascular. Frequentemente, a confecção de fístulas arteriovenosas (FAV), uma técnica para realizar a diálise por meio de um acesso no braço, é tardia, principalmente por falta de diagnóstico precoce da doença renal grave. Então a maioria dos pacientes acaba necessitando de um cateter em uma veia no pescoço ou na virilha, o que implica em desconforto e risco de infecções e tromboses.
Para piorar, a medicação que desfaz trombos dentro dos cateteres não é garantida nas clínicas de diálise sequer por convênios privados. O doppler, exame que mapeia as melhores veias e artérias para a confecção da FAV, não é assegurado no SUS.
Resultado: sobe o número de internações em instituições públicas ou privadas por infecções complicadas de cateteres e falências crônicas ou agudas de acesso vascular. Isso onera o sistema e torna a jornada da diálise uma tragédia para pacientes e familiares.
Poderia citar inúmeros exemplos, mas quero terminar falando dos meus sonhos. Temos ótimos casos de equidade no sistema de saúde brasileiro, como o programa da aids. Sonho que os pacientes em diálise sejam atendidos da mesma forma. Que tenham suas limitações respeitadas, que possam ter reintegração social e um futuro que valha a pena viver. Que sejam tratados com consideração a todas as suas restrições e diferenças. E deixem de ser tratados com indiferença.
*Ana Beatriz Barra é nefrologista e gerente médica da Fresenius Medical Care

sexta-feira, 23 de agosto de 2019

Bactérias multirresistentes são identificadas fora do ambiente hospitalar

Pesquisadores brasileiros alertam para o perigo de esses micro-organismos nocivos estarem circulando na população em geral

Bactérias da espécie Klebsiella pneumoniae estão entre os micro-organismos que mais causam infecções hospitalares e também entre os que mais têm desenvolvido resistência a antibióticos. Pertence ao grupo, por exemplo, a KPC (Klebsiella pneumoniae carbapenemase), que ganhou a alcunha de superbactéria por produzir uma enzima capaz de inativar os fármacos mais potentes para o tratamento de infecções graves.
Um estudo recente apoiado pela Fapesp e publicado no Journal of Global Antimicrobial Resistance mostrou que patógenos multirresistentes – inclusive as produtoras de KPC – já não são um problema restrito ao ambiente hospitalar no Brasil. Ao analisar espécies de K. pneumoniae na urina de 48 pessoas diagnosticadas com infecção urinária na região de Ribeirão Preto, no interior de São Paulo, cientistas observaram que 29 amostras (60,4%) continham versões da bactéria não suscetíveis a três ou mais classes de antibióticos e, portanto, consideradas multirresistentes.
“Ficamos surpresos ao encontrar bactérias com tanta multirresistência e virulência em pessoas que não estavam hospitalizadas Algumas tinham perfil genético caraterístico de cepas causadoras de infecção hospitalar”, disse à Agência Fapesp André Pitondo da Silva, professor da Universidade de Ribeirão Preto (Unaerp) e coautor do artigo.
Pitondo-Silva coordena um projeto que tem como objetivo comparar o perfil molecular de espécimes de Klebsiella isolados em pacientes de hospitais das cinco regiões brasileiras (Londrina, Brasília, Teresina, Manaus e Ribeirão Preto) e de outros países dos cinco continentes (Nova Zelândia, Canadá, Holanda, África do Sul e Índia). As amostras da comunidade ribeirão-pretana foram obtidas por acaso, quando os pesquisadores coletavam bactérias isoladas em pacientes de um hospital local. O trabalho se iniciou quando Pitondo-Silva ainda era da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP), da Universidade de São Paulo (USP).
“Nesse hospital parceiro, há um laboratório de análises clínicas particular que atende moradores de diversos municípios do entorno, além de ser responsável pelos exames dos pacientes internados. Quando nos enviaram as amostras de K. pneumoniae, percebemos que nem todas tinham informações sobre a ala de internação. Ao questionarmos os funcionários, fomos informados que as amostras eram de pessoas que não estavam hospitalizadas. Surgiu, então, o interesse de estudar essas bactérias da comunidade e compará-las com as do ambiente hospitalar”, contou.
Como para os casos estudados não existiam prontuários médicos, não foi possível levantar o histórico de saúde desses indivíduos. “Nossa hipótese é que já tenham sido hospitalizados no passado e, durante a internação, foram colonizados por essas bactérias multirresistentes”, disse Pitondo-Silva.

Bactérias oportunistas

A K. pneumoniae pode integrar a microbiota de um indivíduo durante anos, sem causar problemas. Porém, quando há queda na imunidade – em decorrência de uma doença, de um tratamento ou do envelhecimento – o micro-organismo pode se manifestar de diversas formas. Exemplos: infecções pulmonares e urinárias, feridas (cirúrgicas ou escaras) e até mesmo sepse.
“No caso de pacientes com infecção urinária recorrente, o risco é o quadro evoluir para pielonefrite [doença inflamatória que afeta os rins], podendo causar comprometimento renal. Portanto, quando esses pacientes retornam ao hospital, disseminam no local os micro-organismos multirresistentes”, afirmou Pitondo-Silva.
A principal forma de contaminação é o contato com fluidos do paciente infectado, que ocorre por meio de sondas e cateteres, por exemplo. “Quando bactérias MDR são identificadas em hospitais, principalmente as produtoras de KPC, são adotados protocolos rigorosos para evitar a disseminação, podendo até mesmo limitar a visitação ao paciente”, disse Pitondo-Silva.
Conhecer as características moleculares das bactérias encontradas nos hospitais de diferentes regiões do Brasil e do mundo ajuda a entender como os genes de resistência e virulência estão se disseminando e como a espécie está evoluindo, informações essenciais para o controle de infecções e o tratamento correto.
“É muito importante investigar a quais antibióticos a bactéria é suscetível, porque administrar o medicamento errado chega a piorar o quadro clínico”, alertou Pitondo-Silva.
Este conteúdo foi produzido originalmente pela Agência Fapesp

quinta-feira, 22 de agosto de 2019

Por que precisamos pensar (de verdade) na nossa longevidade

Médica e colunista reflete sobre o que vem a ser a receita para viver mais e com prazer e saúde

Você já parou pra pensar que, quando nasceu, um idoso que tem hoje 75 anos tinha a expectativa de viver apenas até os 45? E que, daqui a umas três décadas, quem nascer no Brasil terá, em média, uma expectativa de vida de 86 anos pelo menos? Sim, cada vez estamos vivendo mais, e essa sempre foi uma busca da humanidade. Ainda na era antes de Cristo, o filósofo romano Cícero (106-43 a.C.) já dizia que ninguém era tão velho que não podia viver mais um ano.
Hoje em dia, então, já não podemos imaginar nossa vida terminando perto dos 50. Quantos sonhos não realizaríamos? Quantas oportunidades perderíamos? Hoje temos estudantes na faixa dos 60 anos. Temos gente empreendendo novas conquistas e sonhos durante essa fase chamada velhice.
Sabemos que muitos caminhos levam à longevidade, uma via hoje mais factível graças aos grandes investimentos na área da saúde, como expansão do saneamento básico, programas de prevenção e chegada de métodos de diagnóstico e tratamento sofisticados e precisos. Mas todo mundo tem de fazer sua parte, preocupando-se com os cuidados com o corpo, o engajamento social, a manutenção das habilidades cognitivas, o cultivo da fé, da espiritualidade e da resiliência e a busca por propósitos.
E o novo dilema que se aproxima é: mas até quanto envelheceremos? Passaremos fácil dos 130 anos? A resposta exata ainda não temos. Novas tecnologias trazem a esperança de uma vida longa e melhor, porém sabemos que precisamos “poupar” em termos de saúde para poder “gastar” quando formos mais velhos. Essa poupança, que deveria ser pensada desde a infância, contempla em sua receita uma boa alimentação, a prática de atividade física e outros hábitos que contribuem para um envelhecimento saudável e sustentável.
Aí está um desafio: como conscientizar mais e transpor para a rotina a necessidade de prevenção e educação em saúde. Não basta falarmos de terapia gênica, vacina contra colesterol, cirurgia robótica e bioengenharia. Precisamos nos engajar a cuidar da nossa saúde física e mental, sempre tendo em vista a reflexão de que mais importante do que envelhecer mais é envelhecer bem. Envelhecer com independência e qualidade de vida, pelo maior tempo possível.
Vamos nos espelhar em um exemplo real, as ilhas azuis, alguns lugares do mundo em que as doenças demoram a aparecer na população. Qual é o segredo desses povos? Bons hábitos aliados a uma vida social prazerosa. Parece que a receita está em nossas mãos. Nós decidimos como será. Venha, vamos juntos chegar bem!

terça-feira, 20 de agosto de 2019

Hipertensão: causas, sintomas, diagnóstico e como baixar a pressão

Aproveite o Dia Mundial da Hipertensão para saber tudo sobre a pressão alta, da prevenção ao tratamento. E veja como identificar!

A hipertensão arterial é o aumento anormal – e por longo período – da pressão que o sangue faz ao circular pelas artérias do corpo. Não à toa, a doença também é chamada de pressão alta.
Para chegar a cada parte do organismo, o sangue bombeado a partir do coração exerce uma força natural contra as paredes internas das artérias. Os vasos, por sua vez, oferecem certa resistência a essa passagem. E é essa disputa que determina a pressão arterial.
A pressão varia ao longo do dia. Numa pessoa deitada, ela fica mais baixa. Quando nos movimentamos, os valores sobem, porque o cérebro avisa que o corpo precisa de mais energia.
A pressão é apresentada em milímetros de mercúrio (mmHg). O indivíduo é considerado hipertenso quando sua pressão fica maior ou igual a 14 por 9 na maior parte do tempo. A partir desse limite, o risco de ocorrerem doenças cardiovasculares, renais e por aí vai é significativamente maior. Aliás, entidades americanas já até baixaram o sarrafo para 13 por 8.
Para fazer a medição, é utilizado um aparelho chamado esfigmomanômetro, posicionado em volta do braço, e um estetoscópio para ouvir os sons do peito. O primeiro número é registrado no momento em que o coração libera o sangue. Essa é a pressão sistólica, ou máxima – o recomendável é que não passe de 12 mmHg. O segundo valor é a pressão diastólica, ou mínima. O ideal é que fique em torno de 8 mmHg. É o famoso 12 por 8.
Quando a pressão fica descontrolada, o coração é o órgão mais afetado. Como a circulação está prejudicada pelo aperto nas artérias coronárias, ele não recebe sangue e oxigenação suficientes – um quadro que leva ao sofrimento do músculo cardíaco, podendo ocasionar o infarto.
O acidente vascular cerebral (AVC), o popular derrame, é outra consequência frequente da hipertensão. Com as constantes agressões da pressão, as artérias da cabeça não conseguem se dilatar e ficam suscetíveis a entupimentos. Os picos hipertensivos acabam servindo de estopim para um vaso ficar completamente obstruído ou então se romper.
Além do derrame, a pressão alta provoca uma série de pequenas obstruções e hemorragias no cérebro. Ao longo do tempo, esses episódios destroem os neurônios – o quadro é denominado demência vascular e leva à perda de memória.
Os rins também deixam de filtrar o sangue a contento quando a hipertensão se instala por muito tempo, e essa falha pode provocar insuficiência renal.
A pressão alta interfere ainda nos vasos que irrigam a retina, tecido no fundo do olho crucial para captação das imagens. É por isso que alguns hipertensos relatam sofrer de visão embaçada.

Sinais e sintomas

A hipertensão é uma doença silenciosa. Se os sintomas abaixo surgirem, provavelmente ela já estará em fase mais avançada. O ideal, portanto, é detectá-la com exames.
  • Dor de cabeça
  • Falta de ar
  • Visão borrada
  • Zumbido no ouvido
  • Tontura
  • Dores no peito

Fatores de risco

– Histórico familiar: filhos de pais hipertensos têm um risco 30% maior de ter pressão alta
– Idade: a partir dos 60 anos de idade, as artérias perdem a flexibilidade
– Etnia: a doença é mais prevalente na população negra e asiática
– Obesidade
– Poluição
– Estresse
– Sono irregular
– Menopausa: a queda dos hormônios femininos danifica as artérias
– Excesso de bebida alcoólica
– Tabagismo
– Alto consumo de sal
– Sedentarismo
– Diabetes
– Doenças renais
– Apneia do sono
– Hipertireoidismo

A prevenção

Um estilo de vida saudável influencia muito aqui. Dar um basta no sedentarismo, especialmente se valendo de atividades aeróbicas, como correr e nadar, induz a liberação óxido nítrico, substância vasodilatadora. Com as artérias relaxadas, a tendência é a pressão se manter mais baixa.
Verdade que, durante os treinos, é esperado que a pressão até suba um pouco – daí porque pacientes com hipertensão devem ter certos cuidados com os exercícios e buscar supervisão de um expert. Mas logo depois os números se estabilizam.
A alimentação é tão importante na prevenção da pressão alta que há uma dieta específica para esse fim. É a DASH, sigla em inglês para “dieta para combater a hipertensão”.
Ela foi criada em 1997 e se baseia em generosas doses de vegetais, frutas, legumes e grãos integrais no cardápio como forma de combater a elevação da pressão. São alimentos carregados de nutrientes como potássio, cálcio e magnésio – minerais que regulam a contração dos vasos sanguíneos e do coração.
O consumo de sódio, por outro lado, deve ser moderado. Ele é o principal componente do sal de cozinha, e exagerar na dose é um perigo. A recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) é ingerir no máximo 5 gramas de sal por dia. Isso equivale a uma colher de chá.
Só não se esqueça de considerar os alimentos que têm sódio em sua composição, como o pãozinho, os temperos prontos, embutidos e produtos processados. Hoje, estima-se que o brasileiro consuma mais ou menos o dobro de sódio do que deveria. Essa é uma das razões pelas quais 30% da população possui hipertensão.
Não fumar, não extrapolar na ingestão de bebidas alcoólicas e driblar a insônia são atitudes bem-vindas. É importante também arrumar uma brecha na agenda para incluir momentos de prazer capazes de aliviar o estresse do dia a dia, outro sabotador das artérias.

O diagnóstico

Como a hipertensão não costuma dar sinais, é fundamental medir a pressão pelo menos uma vez por ano. Nas consultas de rotina, seja com o clínico geral ou algum especialista, sempre informe se algum parente sofre desse mal, sobretudo se for for o pai ou a mãe.
Para confirmar se uma pessoa possui pressão alta, a medição tem que ser feita em três dias diferentes. Antes de cada uma, o paciente deve seguir orientações como evitar tomar café ou bebidas estimulantes, descansar bem e relaxar. Na hora do exame, não se deve conversar nem ficar se mexendo. Esses cuidados são importantes para que o resultado seja o mais confiável possível. Se ainda assim restar alguma dúvida, o especialista solicita um exame que vigia a pressão ao longo de 24 horas – é o holter.
O rigor na medição ajuda ainda a identificar uma condição antes de chamada de pré-hipertensão – e agora rebatizada de pressão elevada. Entra nessa classificação quem estiver com a pressão acima dos 12 por 8 e abaixo dos 14 por 9, quando já se define a hipertensão propriamente.
Essa faixa intermediária, além de já causar eventuais estragos, revela que o indivíduo tem o dobro de risco de se tornar hipertenso. Quanto mais cedo essa ameaça é detectada, maior a chance de evitar que a doença se instale de vez.
Em mulheres grávidas, a atenção é ainda maior. Isso para impedir o aparecimento da pré-eclâmpsia. Trata-se de uma complicação da gestação marcada pelo aumento da pressão arterial na gravidez.
Essa condição aumenta a possibilidade de parto prematuro e, se não for controlada, evolui para eclâmpsia – quadro em que a mulher tem convulsões, com risco para a sua vida e a do bebê.

O tratamento

Uma pequena parcela de hipertensos (pequena, porém considerável) consegue dominar a doença apenas com ajustes no cardápio, exercícios físicos e controle do estresse. Para tomar a decisão de não entrar imediatamente com medicamentos, o médico se baseia em bons resultados gerais de exames como glicemia e colesterol e se os rins estão funcionando direito.
A ausência de outros problemas cardiovasculares também é considerada. Pesa ainda o fato de a pessoa ser ou não fumante.
As avaliações são periódicas. Em geral, depois de seis meses ele vai medir a pressão novamente. Se os valores caíram, é possível continuar nesse caminho, mas lembrando que a doença não foi eliminada e que, portanto, é preciso manter os cuidados.
Se mesmo depois das mudanças no estilo de vida a pressão continua subindo ou estabiliza apenas em um patamar elevadíssimo, o especialista prescreve remédio para controlar a situação. Ele indica, entre as diferentes categorias de antihipertensivos, aquela que vai trazer os melhores resultados em cada caso.

Alguns são diuréticos, ou seja, eliminam o excesso de sódio pelo xixi. Outros atuam como vasodilatadores. Há ainda os que impedem a entrada de cálcio nas artérias, diminuindo a resistência para a passagem do sangue. E um dos medicamentos mais usados impede a produção de angiotensina, molécula que faz os vasos se contraírem e aumenta a pressão.
A partir do estágio da doença classificado como moderado, a conduta é adotar dois ou mais antihipertensivos para atuar em diversas frentes.
Há também casos de hipertensão resistente – quando a pressão não fica abaixo de 14 por 9 mesmo com o uso de três classes de remédio. Aí, o cardiologista pode lançar mão de inovações a exemplo de um aparelho que emite ondas de alta frequência na região dos rins. Como nos hipertensos o cérebro manda uma mensagem errada a esses órgãos para liberarem substâncias vasoconstritoras, o objetivo do método é cortar essa comunicação.
Para isso, um cateter é introduzido na virilha e guiado até as artérias renais. Nesse ponto, é disparada uma radiação capaz de queimar alguns nervos, fechando assim a conexão com o sistema nervoso. Sem o estímulo enviado aos rins, os vasos podem se dilatar e a pressão tende a melhorar.
A conduta, entretanto, depende de cada caso. Mas o certo é que um estilo de vida balanceado sempre vai ajudar, não importa a gravidade.

segunda-feira, 19 de agosto de 2019

Remédio para cólica menstrual tem efeito no tratamento de esquistossomose

Em pesquisas com camundongos, o anti-inflamatório foi mais eficiente do que a única droga disponível para o combate à verminose

Em experimentos feitos na Universidade Guarulhos, com apoio da Fapesp, um medicamento tipicamente usado contra a cólica menstrual reduziu em mais de 80% a carga parasitária em camundongos infectados com o verme Schistosoma mansoni, que causa a esquistossomose (popularmente chamada de barriga d’água). O índice ultrapassa o chamado padrão-ouro estipulado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para novos remédios.
Os resultados da pesquisa, publicada na revista EbioMedicine, do grupo The Lancet, sugerem que o ácido mefenâmico pode ser mais eficiente do que a única medicação existente para essa infecção, o praziquantel. Mas, para que o anti-inflamatório seja receitado contra a esquistossomose, será necessária a realização de testes em seres humanos com a verminose.
A descoberta deu-se a partir de um estudo de reposicionamento de fármacos conduzido no Núcleo de Pesquisa em Doenças Negligenciadas da Universidade Guarulhos. Foram analisados 73 anti-inflamatórios não esteroidais comercializados no Brasil e em outros países. De todos os testados, cinco se destacaram, sendo os resultados do ácido mefenâmico os mais promissores.
“Os testes in vitro demonstraram que o ácido mefenâmico afetou a motilidade e a viabilidade do parasita. Ainda não se sabe exatamente o mecanismo de ação do ácido mefenâmico nesse tipo de infecção, mas outros tratamentos das verminoses também não possuem mecanismos elucidados”, disse Josué de Moraes, professor da Universidade Guarulhos e autor do artigo. “Por isso, estudos de reposicionamento de fármaco são tão importantes para doenças negligenciadas, como a esquistossomose”, completou.
Essa enfermidade atinge mais de 240 milhões de pessoas em todo o mundo, de acordo com a OMS. Há 40 anos, um único fármaco tem sido usado no seu tratamento.
“Após tanto tempo sem nenhum tratamento alternativo e sendo o praziquantel receitado para humanos e para uso veterinário, é esperado que o parasita tenha adquirido resistência à droga”, afirmou Moraes.
O ácido mefenâmico se mostrou mais efetivo do que o praziquantel por agir também na fase larval do agente infeccioso.
“Atualmente, é preciso esperar que os vermes jovens no paciente se tornem adultos para que o fármaco tenha efeito. Isso significa que, se o tratamento não for repetido, o ciclo de vida do parasita não é interrompido e o indivíduo continua com a doença”, explicou o especialista. “Pessoas infectadas, em um contexto de saneamento inadequado, tendem a contribuir para a disseminação dos vermes no ambiente. É claro que o ideal seria um saneamento adequado, mas o ácido mefenâmico pode ser importante no aspecto preventivo também”, arrematou.

Estudos de reposicionamento de fármaco

Moraes destaca que essas pesquisas têm se tornado mais comuns, sobretudo para as chamadas doenças negligenciadas, aquelas que, embora afetem parcela significativa da população, carecem de estudos, vacinas e tratamentos mais avançados.
Esse é o caso da esquistossomose, cuja transmissão está ligada a locais sem saneamento básico adequado e pelo contato de água com caramujos infectados pelos vermes. Uma vez no corpo de alguém, o Schistosoma se aloja nas veias do mesentério e no fígado do paciente.
A doença, ainda sem vacina – existem estudos já avançados sendo realizados na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) –, é assintomática nas primeiras duas semanas, mas pode evoluir e causar problemas crônicos de saúde e morte.
“A descoberta e o desenvolvimento de um novo fármaco custam em média 1,5 bilhão de dólares, dinheiro que não existe para doenças negligenciadas. Não há interesse comercial. Por isso estamos buscando ação contra o parasita em drogas já existentes e comercializadas”, revelou Moraes. “Isso possibilita cortar uma série de etapas, uma vez que não é preciso fazer testes clínicos sobre toxicidade, interação medicamentosa e outros. Ainda é preciso fazer testes em humanos, mas não todos. O processo fica muito mais barato”, ponderou.
Este conteúdo foi publicado originalmente pela Agência Fapesp.

sexta-feira, 16 de agosto de 2019

Um jeito comum de fazer agachamento na academia pode danificar a coluna

Estudo goiano sugere que não projetar os joelhos para além da linha dos pés desgastaria a coluna vertebral. O problema é a alternativa a isso... Confira

Existe um conselho comum no mundo da educação física de que o joelho não deve ultrapassar a linha dos pés durante um agachamento, aquele exercício comum nas aulas de ginástica funcional que fortalece os músculos da parte inferior do corpo. Só que essa recomendação talvez prejudique a coluna vertebral, segundo um grupo de pesquisadores brasileiros.
A equipe, da Universidade Federal de Goiás (UFG), avaliou a movimentação das costas de 19 voluntários enquanto eles faziam um agachamento. Todos praticavam atividades físicas e já estavam familiarizados com esse exercício especificamente há pelo menos um ano.
As medições foram conduzidas com um software desenvolvido no laboratório. Esse programa usava imagens geradas por adesivos reflexivos grudados na pele dos participantes e construía com elas um desenho da coluna no computador.
“Verificamos que, quando o joelho não passa a linha dos pés, o indivíduo tende a inclinar as costas muito para trás e retificar a região lombar. Isso faz com que ela perca sua curvatura natural”, comenta Mário Hebling Campos, educador físico e professor da UFG que coordena pesquisas nesse departamento. “Quando se aplica carga na coluna, o ideal é que essa curvatura seja mantida para não espremer os discos intervertebrais”, destaca.

Se projetar o bicho pega, se retificar o bicho come

Todos temos uma curvatura natural nas costas quando estamos em pé. A parte inferior – a lombar – fica um pouco para dentro e a superior, na altura do tórax, ligeiramente para fora.
Ao realizar o agachamento com aquela restrição de movimento do joelho, a tendência é esticar especialmente a lombar, o que acaba pressionando os discos que evitam o atrito entre uma vértebra e outra.
“Suspeitamos que essa sobrecarga aumente o risco de danos nessas estruturas a longo prazo. Mas essa hipótese ainda precisa ser confirmada”, ressalta Campos.
Por outro lado, quando o joelho pôde ir mais para a frente, a pressão na coluna dos voluntários goianos foi menor. Só que, neste caso, é justamente o joelho que sofreria mais.
Os primeiros achados foram publicados no The Journal of Sports Medicine and Physical Fitness, um periódico científico italiano, em 2017. Outra descoberta do grupo, recentemente publicada, é a de que a barra guiada, ou Smith, parece preservar melhor a curvatura das costas do que a livre, empregada no estudo mais antigo.

O que fazer agora?

A história ainda precisa ser investigada mais a fundo para saber se a perda da curvatura momentânea oferece mesmo riscos para a coluna com o passar dos anos. “Como o exercício estimula o corpo a ficar mais resistente, pode ser que, no fim, essa sobrecarga na coluna não seja ruim”, comenta o professor.
Provavelmente, o melhor caminho é individualizar o treino de acordo com cada um, adotando cautelas adicionais em caso de limitações no joelho ou na coluna lombar.
“Mas para uma pessoa saudável, sem problemas nas costas ou nos joelhos, talvez seja bom colocar o joelho só um pouco pra frente dos pés e, assim, preservar melhor as duas estruturas”, sugere Hebling.
Por fim, vale ressaltar que quem possui problemas articulares ou na espinha dorsal deve consultar um médico. Em certos cenários, o agachamento chega a ser contraindicado.

quarta-feira, 14 de agosto de 2019

OMS alerta para o pior surto global de sarampo desde 2006

Número de infecções pelo vírus do sarampo quase triplica em 2019 ao redor do globo, segundo Organização Mundial da Saúde. Tudo pela falta de vacinação

Em um relatório divulgado no dia 12 de agosto, a Organização Mundial da Saúde (OMS) informou que 364 808 casos de sarampo foram notificados de janeiro a julho de 2019, em 181 países. O número é quase três vezes maior do que o do mesmo período de 2018 – na ocasião, foram 129 239 infecções.
E fica pior: a entidade alerta que a quantidade de casos de sarampo provavelmente é bem maior do que o reportado no relatório. Estima-se que menos de um a cada dez episódios da doença são notificados para a OMS. Um cenário mais grave só foi observado em 2006.
A África foi o continente com maior aumento de casos: 900% a mais! Os piores surtos no momento estão acontecendo em Angola, Camarões, Chade, Cazaquistão, Nigéria, Filipinas, Sudão e Tailândia.
Apenas o sudeste da Ásia e a região das Américas tiveram uma redução nos episódios de 2018 para 2019, da ordem de 15%. Ainda assim, o Brasil segue sofrendo com essa encrenca: 907 casos foram confirmados entre 5 de maio e 3 de agosto, segundo o Ministério da Saúde. Eles estão concentrados em São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia.
Infelizmente, a taxa de vacinação aqui está deixando a desejar. Em 2017, apenas 79% do público-alvo recebeu as duas doses. Para evitar surtos, a meta é chegar a 95%. Dados da OMS e da Unicef dão conta de que, em 2018, 69% das crianças ao redor do globo receberam a segunda dose.
Uma cobertura tão baixa pode abrir as portas inclusive para a rubéola, outra enfermidade prevenível com as vacinas tríplice e tetravirais. Alguns casos isolados dessa infecção já surgiram na América Latina.
Por causa dos surtos, até bebês de 6 meses a 1 ano estão sendo orientados a tomar a vacina contra o sarampo se forem para locais com casos notificados. Além disso, muitos adultos acham que estão imunizados quando, na realidade, não cumpriram o calendário de vacinação direito.

terça-feira, 13 de agosto de 2019

Vitamina B17 não trata câncer (nem é vitamina de verdade)

Corre pela internet o boato de que a tal vitamina B17 (ou amigdalina), presente em certos caroços, eliminaria tumores. Só que ela é um veneno

Espalhou-se pelo WhatsApp a notícia de que o câncer é, na verdade, uma deficiência de vitamina B17. Portanto, bastaria suplementá-la para se prevenir contra tumores ou até para curá-los. Só que, para começo de conversa, a B17 sequer é uma vitamina.
Explicamos. As vitaminas do complexo B são a B1, B2, B3, B5, B6, B7, B9 e B12. Apesar do apelido que ganhou, a B17 é um composto semissintético chamado amigdalina. Ele é extraído do caroço de algumas frutas, a exemplo do pêssego e do damasco. E não existem evidências de que seja benéfico para a saúde – pelo contrário.
Ao processar essa molécula, o organismo produz cianeto, que é tóxico. “Isso é gravíssimo, porque não estamos falando de uma substância inofensiva, mas de algo que ameaça a vida das pessoas”, alerta Maria Del Pilar Estevez Diz, coordenadora de oncologia clínica do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo, o Icesp.
Além disso, a origem do câncer passa longe da deficiência de amigdalina. Você pode entender como essa doença surge em linhas gerais clicando aqui.

De onde veio a “vitamina B17”

Ela foi isolada pela primeira vez em 1830 e patenteada nos anos 1950 com o nome comercial de Laetrile, um suplemento que teria propriedades anticâncer. “Mas logo notou-se que a substância era degradada no sistema digestivo até virar cianeto”, conta Maria Del Pilar.
Aliás, uma das versões da notícia falsa promete até uma versão injetável da suposta vitamina para driblar a formação do agente. “Mesmo se não houver essa toxicidade, o que não é comprovado, a teoria de que a amigdalina trataria o câncer em seres humanos não foi verificada em nenhum estudo clínico”, destaca a médica.
A bem da verdade, algumas pesquisas in vitro (feitas com células isoladas em laboratórios) até mostraram um certo potencial anticâncer. Mas a possibilidade de reações adversas graves é tamanha que fica difícil conduzir estudos com seres humanos.
E, sem esses experimentos, é impossível saber se a vitamina B17 funcionaria ou não. Infelizmente, a maioria das substâncias que exibem algum efeito positivo em testes laboratoriais ou com animais fracassa na hora que é aplicada em pesquisas maiores, com seres humanos.

Por que a amigdalina preocupa tanto

Sua ingestão pode provocar envenenamento agudo, com sintomas como sonolência, confusão mental, redução da frequência cardíaca, arritmias e insuficiência renal e hepática.
“Já em doses pequenas, o risco é de intoxicação crônica, que leva a problemas sérios ao longo do tempo. Perda de visão e doenças no sistema nervoso estão entre eles”, aponta Maria Del Pilar.
Uma revisão de 2015 do Instituto Cochrane, organização global focada na avaliação de evidências científicas, afirma que os benefícios do Laetrile não foram comprovados em ensaios clínicos e detectou reações adversas graves por seu uso. O perigo é maior quando a amigdalina é tomada como pílula e acompanhada de vitamina C, que potencializa a toxicidade do composto.
O Laetrile é banido em boa parte dos Estados Unidos e em toda a Europa pelo potencial dano à saúde. Ainda dá para encontrá-lo à venda na internet, inclusive em sites brasileiros, mas o Ministério da Saúde já desmentiu sua eficácia e alertou contra os perigos da amigdalina em janeiro de 2019.
Ou seja, se receber uma notícia do tipo, não compartilhe e denuncie o material. Quando o assunto é câncer, não existe milagre e todo cuidado é pouco.

segunda-feira, 12 de agosto de 2019

Uma doença ainda escondida

A falta de notificações oficiais do câncer de pulmão, o mais mortal no Brasil e no mundo, dificulta a adoção de políticas públicas

Crédito: knape
RISCOS O tabagismo é a maior causa do câncer de pulmão: 79,1% dos pacientes são fumantes ou ex-fumantes (Crédito: knape)
NOVA TÉCNICA O Instituto do Câncer do Estado de São Paulo se vale de ondas eletromagnéticas de alta frequência para tratar lesões: método menos invasivo (Crédito:WERTHER)
No Brasil, assim como no mundo, o câncer de pulmão é o tipo mais mortal. No ano passado, 92% dos 34.511 novos casos levaram a óbito, segundo o Globocan, projeto internacional que compila dados de cada país. Esse ano, o Instituto Nacional do Câncer (INCA) estima que essa doença dos órgãos respiratórios atingirá 31.000 novos casos. Mas, apesar da gravidade, a doença ainda é subnotificada no País. Somente 24,5% dos casos foram registrados nos dados mais recentes do Registro Hospitalar de Câncer (RHC), de 2016, segundo levantamento do Instituto Oncoguia. Das 28.220 incidências, apenas 6.915 acabaram notificadas. Para Luciana Holtz, presidente do Oncoguia, há muitos desafios ainda para se conseguir atingir dados confiáveis. Eles vão desde a falta de obrigatoriedade na notificação por parte das instituições até a demora na compilação das informações. A falta de conhecimento da realidade tem como consequência a morosidade nas decisões e a dificuldade em se adotar políticas públicas eficientes — por exemplo, a indicação de tomografias de baixa dose para pessoas de alto risco. No mundo, o câncer de pulmão é o mais frequente. No Brasil, a incidência é inferior ao de mama, próstata e colorretal, nessa ordem.
Além da subnotificação, os registros também não reportam com precisão os hábitos que podem ter contribuído para a doença. Somente metade deles (51,6%) tem dados sobre o tabagismo. É uma lacuna importante, já que o fumo é associado à maioria dos casos. Quando é conferida essa informação, a conexão é clara. 79,1% dos doentes são fumantes ou ex-fumantes, enquanto 20,9% nunca tiveram contato com tabaco.
Uma das razões para a alta taxa de mortalidade é o registro tardio. Em 86,2% dos casos apontados em 2016, a doença já estava em estágio avançado, o que compromete as chances de tratamento e cura. No entanto, os dados internacionais não desmentem o alto índice de letalidade no Brasil (92,3%). No mundo, dos 2 milhões de casos ocorridos em 2018, a mortalidade foi de 84,1%.
A melhor forma de combater a doença ainda é a prevenção: por exemplo, o combate ao tabagismo. “O Brasil está bem nisso. É um câncer evitável”, afirma Luciana. Ela aponta o risco de modismos como o uso de cigarros eletrônicos, que podem estimular o hábito nos jovens.
Em 86,2% dos casos apontados em 2006, a doença já estava em estágio avançado dificultando o tratamento
Uso de micro-ondas
Uma notícia positiva para o combate à doença – assim como na luta os tumores de fígado, rim e ossos – vem do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp). A instituição está desenvolvendo uma técnica que utiliza radiação eletromagnética de alta frequência (micro-ondas) para tratar lesões de forma menos invasiva e mais rápida. O método já demonstrou resultados semelhantes aos obtidos nas cirurgias, mas sem remoção de tecidos sadios. Ele é indicado para tumores de até 3 cm de diâmetro e não pode ser aplicado em regiões perto de brônquios grandes. É uma boa notícia para uma doença que ainda exige toda a atenção – pública e privada.

quinta-feira, 8 de agosto de 2019

Sarampo: bebês que viajarão para cidades com surto devem tomar a vacina

Crianças de 6 meses a 1 ano de vida também precisam receber a vacina contra o sarampo se forem para regiões com novos casos da doença

O Ministério da Saúde soltou um comunicado alertando que pais e responsáveis de todo o Brasil devem dar a vacina do sarampo para bebês de 6 meses a 1 ano de idade caso forem viajar para 42 cidades dos estados de São Paulo, Bahia ou Rio de Janeiro onde há surtos ativos da doença. A recomendação é que todas essas crianças sejam imunizadas ao menos 15 dias antes da data prevista da viagem.
Além de proteger contra o vírus, essa medida visa interromper a cadeia de transmissão do sarampo no país. Essa é uma prática já utilizada no passado durante momentos de surto.
Segundo o governo, essa injeção precoce não elimina a necessidade das duas doses posteriores que são recomendadas no Calendário Nacional de Vacinação. Ou seja, esses pais deverão levar os filhos para tomar a vacina aos 12 e aos 15 meses de idade.
Clique aqui para ver quais as cidades com surtos ativos. Caso você vá com um bebê para alguma delas, é necessário vaciná-lo. A maioria dos municípios está em São Paulo.
Este conteúdo foi produzido pela Agência Brasil.

quarta-feira, 7 de agosto de 2019

Impunidade como método

Livro sobre presidiários famosos da penitenciária de Tremembé revela que o ex-médico Roger Abdelmassih, condenado a 181 anos de reclusão, fraudou exames para ganhar a prisão domiciliar. Exige-se, agora, uma resposta rápida da Justiça

Crédito: Divulgação
ENGANAÇÃO Roger Abdelmassih internado em 2017 para tratar de uma infecção: prisão domiciliar pode estar em xeque (Crédito: Divulgação)
REVELAÇÃO Em acareação, Carlos Sussumu (dir.) admitiu ter fraudado diagnóstico: gangorra na pressão arterial (Crédito:Divulgação)
O nome de Roger Abdelmassih é conhecido como um dos mais grotescos da história brasileira. O ex-médico de estrondoso sucesso foi condenado a 181 anos de prisão por abusar sexualmente de dezenas de mulheres, todas pacientes em sua clínica de fertilização. Apesar dos relatos assustadores de estupros, enquanto elas permaneciam sob efeito de anestesia, ainda existem novas ocorrências em sua vasta ficha criminal. Um livro intitulado “Diário de Tremembé – o presídio dos famosos”, escrito por Acir Filló, ex-prefeito da cidade paulista de Ferraz de Vasconcelos e que está preso por corrupção na mesma prisão que Abdelmassih esteve, a de Tremembé, revela que o ex-médico forjou exames para atestar insuficiência cardíaca de nível quatro. Passando-se assim por falso doente grave, ele conquistou na Justiça a prisão domiciliar em junho de 2017 – na verdade, Abdelmassih se viu atrás das grades por menos de quatro anos, uma vez que, condenado em 2010, fugiu para o Paraguai e lá esteve até 2014. A impunidade parece gostar dele.
O depoimento que embasa esse capítulo do livro foi dado por outro médico: Carlos Sussumu, que, por estar cumprindo a sentença em regime semiaberto, trabalhava em Tremembé cuidando da saúde de outros presidiários. Sussumu fora condenado por associação criminosa e extorsão, e coube a ele a tarefa aparentemente inacreditável de ensinar uma nova malandragem ao exímio malandro Abdelmassih. No livro em questão, Sussumu admite ter assinado diagnósticos e relatórios que “não condizem com a realidade” sobre a condição clínica de seu “paciente”, fato que levou Abdelmassih para casa. Diz mais: “A doença do Roger é uma fraude, foi fabricada e é artificial. Ele não tem nenhum problema de saúde que uma simples medicação não resolva”. As declarações de Sussumu foram corroboradas em uma acareação entre ele e Filló, ordenada pela juíza Sueli Zeraik. A magistrada foi alertada do golpe pelo próprio autor do livro que, prevendo a grande repercussão da publicação, pediu à Justiça o direito de conceder entrevistas. Ela também realizou audiências com outros presos de Tremembé que foram mencionados na publicação como Alexandre Nardoni, Cristian Cravinhos e Lindemberg Alves.
Remédio indevido
Sussumu afirma não ter prescrito medicação alguma, mas reconhece que ensinou a Abdelmassih o truque de se valer de remédios cujo efeito colateral é manter a pressão arterial instável, desde que utilizado inadequadamente – caso do hipertensor Effortil (medicamento descontinuado pelo laboratório Boehringer em dezembro de 2015, por razões comerciais). Abdelmassih tomava excessivamente água com sal (a pressão subia) e depois o Effortil (subia mais ainda). O médico especialista em fazer dolosamente da pressão arterial uma gangorra avalia que, se Abdelmassih de fato sofresse com o problema cardíaco que alega, não estaria respirando por conta própria dois anos após o diagnóstico – por causa de sua idade avançada de 75 anos – e necessitaria do auxílio de aparelhos para sobreviver.
Para Sussumu, a sua hora chegou. A Justiça ordenou o seu retorno ao regime fechado de cumprimento de pena. Caso as enganações sejam comprovadas, o seu registro no Conselho Federal de Medicina certamente será cassado. Já para Abdelmassih, a estrela da impunidade segue a brilhar. Abriu-se um processo na Vara das Execuções Criminais para avaliar as irregularidades no seu requerimento de prisão domiciliar, mas, pelo fato de a última perícia médica (claro que não praticada pelo “mestre” Sussumu) apontá-lo com a saúde debilitada, o estuprador continua em casa. Ele é representado judicialmente pela esposa, Larissa Abdelmassih, que afirmou recentemente que o quadro clínico de seu marido está pior do que em 2017. E ele estaria à beira da morte. Quem viver, verá.
“A doença de Abdelmassih é uma fraude, foi fabricada e é artificial. Ele não tem nenhum problema de saúde que uma simples medicação não resolva” Carlos Sussumu, médico presidiário que atuava no presídio

terça-feira, 6 de agosto de 2019

Tratamento à base de livros

A literatura pode aliviar o estresse, melhorar a autoestima e afastar a depressão. Entenda essa história e conheça obras bem-vindas em algumas situações

No consultório ou em seus livros, o médico gaúcho Moacyr Scliar (1937-2011) tinha o hábito de prescrever a leitura a todos os seus pacientes e leitores. O autor de A Paixão Transformadora – Um Ensaio Sobre as Relações Entre Medicina e Literatura, entre tantos outros, chegou a escrever uma crônica bem-humorada sobre os efeitos terapêuticos de um bom livro. Em Ler Faz Bem à Saúde, ele diz que, “entre ir à farmácia e comprar alguma substância duvidosa para fortificar o cérebro, ou escolher um bom livro, recomendo a última opção”.
E explica o motivo: “é mais eficiente, mais barata, dá mais prazer e, a menos que a pilha de livro na mesa de cabeceira caia em cima do leitor, não tem efeitos colaterais”. Em sua estante de livros (ou seria armário de remédios?), Scliar guardava alguns títulos infalíveis. Se o paciente sofria de câncer, recomendava A Morte de Ivan Ilitch (1886), do russo Liev Tolstói (1828-1910). Se o diagnóstico era tuberculose, indicava A Montanha Mágica (1924), do alemão Thomas Mann (1875-1955). Mas, se o quadro era de saúde mental, nada melhor que O Alienista (1882), do brasileiro Machado de Assis (1839-1908).
A tese de Scliar – de que ler é um santo remédio para os males da alma – é compartilhada por psicólogos e biblioteconomistas. Cristiana Seixas é uma delas. Psicóloga, escreveu Vivências em Biblioterapia – Práticas do Cuidado Através da Literatura e, em 2016, coordenou o I Encontro Nacional de Biblioterapia – a segunda edição do evento está prevista para outubro, na Universidade Federal Fluminense. Adepta da biblioterapia desde 2010, Cristiana trabalha de duas formas: em sessões individuais ou em rodas de leitura, batizadas de “círculos de biblioterapia”. Em seu consultório, conta, há uma estante com títulos selecionados que ela chama de “farmacinha”.
Nas sessões iniciais, Cristiana costuma prescrever o poema Canção Excêntrica, de Cecília Meireles (1901-1964). Para quadros mais complexos, recomenda O Livro do Desassossego, do escritor português Fernando Pessoa (1888-1935), A Queda, do argelino Albert Camus (1913-1960) ou Notas do Subsolo, do russo Fiódor Dostoiévski (1821-1881).
“O foco da biblioterapia é sempre o paciente. O gênero, o livro e o autor, nesta perspectiva, estão a serviço do cuidado com o paciente e sua história. Não há nada pior do que a aplicação de soluções prontas, que impõem fórmula única diante da complexidade, sem espaço para as narrativas do outro”, argumenta. Certa vez, um determinado livro ajudou muito no processo de luto de uma paciente. Em outra ocasião, porém, não surtiu o menor efeito. “Cada um é um grande mistério”.
Um dos precursores da biblioterapia, quando o método ainda nem sonhava levar esse nome, foi o médico grego Sorano de Éfeso (98-138 d.C.). Por causa do efeito catártico do teatro, costumava mandar seus pacientes assistir às peças de Sófocles, Ésquilo e Eurípides.
No Reino Unido, a biblioterapia já é adotada pelo seu Serviço Nacional de Saúde desde junho de 2013. Intitulado de Books on Prescription (Prescrição de Livros, em livre tradução), o programa prevê a substituição de antidepressivos por livros em pacientes com quadro leve ou moderado. “Os resultados surpreenderam tanto que foram estendidos a outras áreas de atenção psicossocial, como asilos, orfanatos e presídios”, explica Cristiana.
Por aqui, a importância da biblioterapia no tratamento da depressão foi tema do trabalho de conclusão do curso de biblioteconomia de Isabela Lustosa. Formada pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), ela explica que, na biblioterapia, a leitura é usada como ponte para ajudar os pacientes a enfrentar seus medos, aliviar suas preocupações e a solucionar seus conflitos.
“O próprio ato de ler já é, em si, uma atividade relaxante que contribui para a redução do estresse. Ao rir ou chorar, o paciente assimila as emoções transmitidas pela leitura e libera as que estão reprimidas. Funciona como uma válvula de escape para os problemas do dia a dia”, explica.
No Brasil, uma das maiores autoridades no assunto é Clarice Fortkamp Caldin. Doutora em literatura pela Universidade Federal de Santa Catarina, ela é autora de Biblioterapia – Um Cuidado com o Ser. Clarice explica que a terapia através dos livros se dá de duas maneiras: a leitura solitária e a leitura solidária.
A solitária acontece quando lemos um livro por puro prazer, porque estamos tristes ou nos sentimos sozinhos. “Viver o ficcional é terapêutico porque conseguimos abandonar temporariamente o mundo problemático em que vivemos e adentramos um universo ficcional, onde tudo é possível. A biblioterapia liberta, alegra e consola”, analisa.
Já a solidária, completa, está quase sempre associada a uma instituição: creches, escolas, hospitais, condomínios e casas de repouso. O biblioterapeuta seleciona o material de acordo com o perfil do público-alvo e, em seguida, organiza o local onde será realizada a atividade. Quanto mais convidativo e agradável, melhor. Terminada a leitura, desenvolve atividades lúdicas relacionadas à história ou estimula o grupo a trocar impressões sobre a obra.
“O sentido de pertencimento a um grupo é benéfico e o texto literário se presta a ser o intermediário”, diz Clarice. Solitária ou solidária, a biblioterapia já demonstra efeitos como melhorar a autoestima, turbinar a memória, enfrentar a depressão… “É o único remédio sem efeitos colaterais indesejáveis”, garante Cecília, fazendo coro às palavras de Moacyr Scliar.

Um livro para cada situação

Na obra Farmácia Literária, as escritoras Ella Berthoud e Susan Elderkin não só discorrem sobre o poder terapêutico dos livros como trazem sugestões de leitura para momentos de estresse, tristeza ou angústia. Confira abaixo dez indicações, de acordo com o momento ou sentimento da vez.  
  1. Alcoolismo – O Iluminado, de Stephen King.
  2. Ansiedade – Retrato de Uma Senhora, de Henry James.
  3. Baixa autoestima – Rebecca, a Mulher Inesquecível, de Daphne Du Maurier.
  4. Bullying – Olho de Gato, de Margaret Atwood.
  5. Culpa – Crime e Castigo, de Fiodor Dostoiévski.
  6. Depressão – A Insustentável Leveza do Ser, de Milan Kundera.
  7. Esgotamento – Zorba, o Grego, de Nikos Kazantzakis.
  8. Insônia – Livro do Desassossego, de Fernando Pessoa.
  9. Pessimismo – Robinson Crusoé, de Daniel Defoe.
  10. Tristeza – Dois Irmãos, de Milton Hatoum.

segunda-feira, 5 de agosto de 2019

O silicone que dá câncer

eguindo os passos dos Estados Unidos, a Anvisa retirou do mercado próteses mamárias associadas a linfoma. A medida, tardia, foi comemorada pelas mulheres já diagnosticadas

Crédito:  GABRIEL REIS
“Serei uma paciente oncológica para o resta da minha vida” Elena Greene, enfermeira (Crédito: GABRIEL REIS)

Elena Greene, enfermeira de 53 anos, recebeu aliviada a notícia de que a Anvisa eliminou no Brasil a comercialização das próteses mamárias Biocell, da marca Natrelle, produzida pela empresa Allergam. O anúncio seguiu os passos da U.S. Food and Drug Administration (FDA), a agência reguladora dos EUA. “Pelo menos novas mulheres não terão risco de passar pelo que passei”, diz Elena. A enfermeira sentiu na pele as consequências da falta de informação sobre os riscos de desenvolver câncer em decorrência de uma prótese mamária. Em 2017, ela, que era maratonista e tinha feito há sete anos um implante de silicone da marca condenada, resolveu trocar a prótese porque o seio esquerdo estava inchado e atrapalhava seu desempenho na corrida. Na época, Elena se sentia cansada e possuía manchas na perna e no braço, mas não associava esses sintomas ao inchaço da mama. Por coincidência, seu marido, que é clínico geral, entrou na sala de cirurgia de troca das próteses e pediu para o seroma, ou seja, o líquido que o corpo desenvolve em volta da prótese, fosse analisado. Poucos dias depois, eles voltaram para apanhar o resultado. “Quando o médico falou que eu tinha linfoma, o chão se abriu. Em cinco segundos passei de uma paciente estética para uma paciente oncológica”, diz ela.
O caso de Elena ilustra bem como esse problema pode estar sendo subdiagnosticado no Brasil e no mundo. Se o seu marido não estivesse na sala de operações, o seroma não teria sido analisado. Essa é justamente a suspeita de especialistas que atuam na área. “Trocar a prótese faz parte do tratamento. Os médicos podem estar tratando o linfoma sem saber que ele existe”, diz Vanderson Rocha, professor de hematologia, hemoterapia e terapia celular da USP. O FDA já registrou 573 relatos de linfomas relacionados à prótese mamária e 33 mortes. Apesar do alto número de letalidade, a comunidade médica ainda afirma que são casos muito raros, já que a quantidade de implantes é grande – nos Estados Unidos, por exemplo, apenas em 2017 foram 281 mil. “De um modo geral, quem quer o implante aceita riscos que são de cem a mil vezes mais frequentes que esse, como alergias e infecções. O linfoma não é mais grave, a única diferença é a palavra câncer”, diz Bernardo Nogueira Batista, cirurgião plástico do Hospital Sírio Libanês.
Especialistas afirmam que o número de casos é impreciso. Muitas vezes as próteses são substituídas sem análise do seroma, o que impossibilita o diagnóstico do linfoma
Pesquisas e marcas
As pacientes que desenvolveram a doença lamentam a falta de informação. Muitas delas, quando diagnosticadas, foram às redes sociais para alertar outras pessoas. Profissionais da área afirmaram à reportagem, sob a condição de não serem identificados, que a falta de pesquisas e a demora no reconhecimento do problema, inclusive por conceituadas associações médicas, são fruto da força econômica da indústria farmacêutica. Agora as mulheres esperam que o reconhecimento das agências seja apenas o pontapé inicial para o desenvolvimento de mais pesquisas e informações sobre o tema, inclusive a respeito de problemas relacionados a outras marcas.

sexta-feira, 2 de agosto de 2019

Prescrição médica eletrônica: como isso pode melhorar minha saúde?

As receitas ilegíveis de alguns médicos são só um dos obstáculos da prescrição. Mas a tecnologia pode ajudar nesse sentido, segundo nosso colunista da vez

Carimbo, número do CRM, nome do médico e o perfeito entendimento dos medicamentos que iremos usar em nosso tratamento. Esse seria o cenário ideal quando recebemos uma receita médica. Mas a realidade é que, da prescrição ao fim do tratamento, passando pela compra dos remédios, frequentemente enfrentamos obstáculos que podem prejudicar a saúde. A boa notícia é que, hoje, já existem recursos de prescrição eletrônica capazes de ultrapassá-los!
Porém, antes de falar da solução, vamos abordar o problema. Quem nunca foi ao médico e saiu do consultório com uma receita ilegível? Muitas vezes, o próprio farmacêutico tem dificuldades de entender o que está escrito. Estima-se que 68% dos erros relacionados à medicação ocorrem pela incompreensão da grafia no receituário. Esse dado é da KLAS, empresa de pesquisas britânica voltada à área da saúde e tecnologia.
Além disso, outras estatísticas mostram que 39% dos erros médicos associados aos fármacos ocorrem no momento da prescrição. O problema pode ser tão grave quanto as preocupantes infecções hospitalares. Sim, é uma situação mais séria do que muitos pensam.
E quando já estamos com o medicamento em mãos, mas ainda temos dúvidas sobre como usá-lo? Entender quando, como e qual a dosagem deve ser ingerida é fundamental. Assim como saber se há algum risco de reação alérgica ou de interação medicamentosa com outro comprimido ou com bebidas alcoólicas.
Eu poderia dar muitos exemplos de erros perigosos relacionados à falta de compreensão da prescrição, que podem evoluir inclusive para a morte. Mas a questão é: como solucionar ou ao menos minimizar esse problema?

Tecnologia a favor do receituário

Segundo uma pesquisa interna da APM (Associação Paulista de Medicina), 82,65% dos médicos do estado de São Paulo já utilizam algum tipo de tecnologia para otimizar as consultas. E, do ponto de vista do paciente, basta olhar em nossa volta. Não vamos a lugar nenhum sem nosso celular.
Nesse cenário, a tal prescrição médica eletrônica se encaixa quase naturalmente. Aliás, ela já existe e é a forma mais segura para solucionar o problema das receitas, tanto para o paciente quanto para o médico.
Os benefícios são inúmeros e vão além da questão da ilegibilidade das receitas. Se fosse assim, bastaria digitar em um computador, e, em seguida, imprimir a receita. Mas e se danificarmos o papel ou perdermos a receita antes do fim do tratamento?
Existem hoje soluções, sem custos para os médicos e os pacientes, que agregam também maior inteligência ao processo. Elas oferecem aos profissionais milhares de informações de extrema importância no momento em que estão prescrevendo.
Por exemplo: ficam disponíveis para o profissional referências de medicamentos que se aplicam a cada caso clínico, composição, posologias e até o histórico das prescrições anteriores. Tudo isso ajuda a aumentar a segurança e reduzir enormemente o risco de erros.
Outro ponto legal é que, ao final da consulta, o médico pode enviar a você um link com uma versão digital da receita, via SMS. Ou seja, o conteúdo dessa prescrição pode ser acessado diretamente no celular, o que facilita a nossa vida, pois podemos pesquisar a farmácia mais próxima, comparar os preços nas drogarias online, comprar e receber o medicamento em casa…. Sem falar que, em caso de dúvidas, é possível obter informações sobre o remédio, o porquê está sendo ministrado, agendar exames nos laboratórios e enviar os resultados diretamente ao médico.
Tem também outro fator positivo: um levantamento do Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico, realizado com 2 126 pessoas em 129 cidades de todas as regiões do Brasil, mostrou que sete em cada dez desejam a receita eletrônica. Além disso, 75% dos entrevistados acreditam na necessidade de implantação dessa tecnologia para evitar erros de interpretação da grafia dos médicos.
Porém, a adoção da prescrição eletrônica ainda é incipiente em nosso país. No momento, ela está sendo regulamentada pelo Conselho Federal de Farmácia (CFF).
A maneira como a receita de medicamento é gerada pode impactar, tanto negativa como positivamente. E, com certeza, a prescrição médica eletrônica e as ferramentas tecnológicas podem acrescentar inteligência a esse processo e melhorar os cuidados com a nossa saúde.
*Graduado em marketing e psicologia, Ricardo Moraes é CEO da Memed, empresa pioneira na plataforma de prescrição médica digital no Brasil e que dispõe de uma solução gratuita para médicos