sexta-feira, 28 de junho de 2019

Alimentos “zero gordura trans” na verdade podem conter a substância

Uma brecha na lei permite que uma dose da gordura mais danosa seja adicionada nos industrializados sem um alerta claro ao consumidor. Como detectá-la?

O Idec (Instituto de Defesa do Consumidor) divulgou recentemente um alerta sobre a gordura trans, a mais associada a problemas cardiovasculares e de saúde em geral. Em parceria com a Universidade de São Paulo, a entidade avaliou milhares de alimentos industrializados e concluiu que uma parte considerável contém a substância mesmo quando alega ser “zero trans” na embalagem.
Ela foi encontrada em 18,7% dos 11 mil produtos estudados, mas só 7,4% do total identificou sua presença. Portanto, menos da metade dos itens que contam com essa molécula em sua composição a acusam explicitamente no rótulo.
Entre os que declararam ser isentos do ingrediente, 11% dos salgadinhos, 9% de produtos de panificação e 8,4% dos biscoitos na verdade carregavam ao menos um pouco de gordura trans. A investigação foi feita em 2017 e o artigo científico está em revisão no momento.
Cabe destacar que essa aparente discrepância é prevista na nossa regulamentação. De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), produtos com até 0,2 grama (g) de gordura trans por porção podem alegar ter 0g na tabela nutricional, aquela que informa a quantidade de cada macronutriente segundo a ingestão diária recomendada. Já os que possuem até 0,1g por porção podem dizer que são “zero” ou “não contém” o ingrediente.

A quantidade pode ser pequena, mas preocupa

A indústria alimentícia brasileira já reduziu nos últimos anos o teor de gordura trans utilizada em seus processos. Mesmo assim, ela continua sendo empregada. “Os fabricantes não estão errados, assim por dizer. Eles seguem a legislação vigente, só que as pessoas comem muito mais do que a porção indicada no rótulo”, destaca a nutricionista Regina Pereira, da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp).
Ou seja, parece pouco que haja 0,1g de gordura trans escondida em uma bolacha, mas o problema é que essa quantia está em uma única porção, não no pacote inteiro. No caso dos biscoitos recheados, por exemplo, uma porção via de regra equivale a três unidades.
Além disso, outros alimentos que mastigamos durante o dia podem conter essa inimiga da saúde. Aí, de pouco em pouco, acabamos nos enchendo dela.
“A gordura trans é muito barata e amplamente utilizada em barrinhas de cereal, balas, bolachas, sorvetes, salgadinhos, margarinas e até para fazer frituras vendidas a preços baixos na rua, como as coxinhas de um real”, destaca Regina. Nesse caso, é usada por ser estável e facilmente reaproveitada.
Como esse composto não é essencial ao organismo, não existe um nível recomendado de sua ingestão. Ou seja, quanto menos, melhor.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estipula que esse ingrediente não deve responder por mais de 1% das calorias totais de uma dieta. Se o indivíduo come 2 mil calorias ao dia, poderia ingerir até 2g de gordura trans ao dia.
“Para ter ideia, 25 gramas de biscoito de polvilho de algumas marcas já quase atingem essa quantidade” calcula Regina.

Como então detectar a gordura trans nos alimentos?

Não é tão simples, porque a tabela nutricional pode indicar 0g – e ela não está evidente mesmo na lista de ingredientes. O jeito é ler com atenção essa relação de itens utilizados no produto, ficando de olho em termos que denunciam sua presença. Quais?
“Qualquer coisa que leve a palavra hidrogenada, independentemente de ser óleo ou gordura, é trans”, ensina a Regina. Outras palavras podem indicar a presença dela (embora nem sempre isso seja verdade). São eles: margarina, creme vegetal e gordura vegetal.

O problema da gordura trans

Existe uma versão dela encontrada naturalmente em produtos de origem animal, como carnes e leites. Contudo, trata-se de uma dose pra lá de singela (e menos problemática). Quando os especialistas mencionam os danos provocados pela trans, eles se referem à versão hidrogenada, criada pela indústria. É esse tipo que estamos abordando nesta reportagem.
Seu consumo está associado ao aumento do colesterol ruim, o LDL, e à redução do HDL, o bom. “A gordura trans favorece a resistência à insulina, o hormônio que coloca o açúcar dentro das células, o que pode levar ao diabetes tipo 2”, ressalta Regina. “Ela ainda estimula a produção de agentes inflamatórios, que causam problemas cardiovasculares”, enumera.
Segundo a OMS, aproximadamente 540 mil mortes por ano no mundo são atribuídas ao consumo exagerado de gorduras trans industrialmente processadas.

Uma preocupação global

A Organização Mundial da Saúde tem como meta eliminar as gorduras trans da indústria alimentícia até 2023. Em maio de 2019, a entidade lançou um alerta sobre o assunto. Segundo a OMS, 110 países ainda não tomaram qualquer atitude para ao menos reduzir a concentração desse composto nas comidas processadas, o que deixa mais de 5 bilhões de pessoas expostas aos perigos de seu excesso.
Dinamarca, Estados Unidos, Chile e Tailândia estão entre as nações que já adotaram políticas que restringem ou banem de vez a trans das fábricas. Alguns desses locais já parecem sentir na prática a redução das mortes por doenças cardiovasculares.
No Brasil, a Anvisa discute atualmente formas de coibir o uso e pode em breve realizar uma audiência pública sobre o tema.

quarta-feira, 26 de junho de 2019

Conheça o Lego para crianças que não enxergam

Brinquedo ajuda no entendimento do braille, o sistema de escrita com pontos em relevo que permite a pessoas cegas ler pelo tato

A disponibilidade de audiolivros e aplicativos para deficientes visuais é cada vez maior. Por isso, o aprendizado do braille às vezes tem ficado em segundo plano. Só que isso dificulta o desenvolvimento da autonomia das crianças que não enxergam ou têm baixa visão.
Para virar esse jogo, o Grupo Lego, junto com a Fundação Dorina Nowill para Cegos e a Universidade Estadual Paulista, criou o projeto Lego Braille Bricks. São kits de 250 peças moldadas com o mesmo número de pontos em relevo de letras e números do alfabeto para deficientes visuais.
“Se não entenderem coisas simples como letras maiúsculas, separação de palavras e pontuação, essas crianças poderão ter dificuldades, mais tarde, de se inserir na universidade e no mercado de trabalho”, justifica Ika Fleury, membro do Conselho Curador da Fundação Dorina Nowill. Com o brinquedo, a meninada aprende se divertindo.

Outras formas de aprender Braille

O Lego não é a única forma de os pequenos desbravarem o alfabeto para cegos: jogos interativos que dependem do tato também podem ser usados na escola. Mas, segundo Ika Fleury, eles são apenas complementos.
A máquina de escrever com teclas em braille ou o reglete com punção (instrumento de madeira com ponta metálica que perfura o papel) compõem o sistema tradicional.

terça-feira, 25 de junho de 2019

Atividades aquáticas ajudam a prevenir quedas em pessoas mais velhas

Os treinos na piscina preparam o corpo em vários sentidos para evitar tombos e lesões após os 60 anos de idade

Há quatro anos, o professor de educação física espanhol Eduardo Guillamón iniciou uma série de estudos e iniciativas com o objetivo de evitar quedas entre as pessoas mais velhas. Sua maior inspiração foi a avó, que apresenta bastante dificuldade para caminhar, mesmo com o auxílio de um andador.
Um dos resultados desse trabalho foi a publicação de um artigo, assinado em conjunto com especialistas da Universidade Católica de Múrcia, na Espanha, e da Universidade de Bournemouth, na Inglaterra, que avaliou a eficácia de exercícios aquáticos nas faixas etárias mais avançadas.
“Modalidades como natação e hidroginástica melhoram diversas aptidões que conferem proteção contra esses acidentes, como flexibilidade, força muscular e equilíbrio”, destaca Guillamón.
Confira abaixo algumas dicas para tirar proveito das práticas esportivas realizadas na piscina:
exercícios na piscina
 (Ilustração: Daniel Almeida/SAÚDE é Vital)

A piscina não serve só para prevenir quedas

Coração em dia: mexer o corpo nesse ambiente está relacionado ao controle da pressão arterial e do colesterol.
Juntas azeitadas: por ter um impacto menor, essas atividades são boas para quem sofre com dores nas articulações.
Emagrecimento: quando feitas numa intensidade adequada, elas ajudam a manter ou até baixar o peso.
Socialização: as aulas coletivas são momentos perfeitos para fazer novas amizades e criar um vínculo com o grupo todo.

terça-feira, 18 de junho de 2019

A planta que cura

Anvisa convocará consulta popular sobre a liberação do plantio e da produção de medicamentos à base de maconha. O cultivo individual continuará proibido

Crédito: Sezeryadigar
PESQUISA Uso de maconha para tratamentos de saúde se dissemina em diversos países. O Brasil, ouvida a opinião popular, seguirá ou não o mesmo caminho (Crédito: Sezeryadigar)
Em breve, crianças que sofrem de epilepsia severa talvez tenham a seu dispor um remédio nacional mais barato e legalizado feito à base de maconha para conter suas crises. Outros doentes de autismo, câncer, esclerose múltipla e dores crônicas também poderão ter medicamentos similares. Tudo depende, no entanto, da aprovação popular que será dada ou não em consulta que será convocada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Se a população disser sim, as empresas poderão fazer o plantio, sempre em lugares fechados e sob condições rigorosas de segurança. As audiências públicas serão feitas ao longo de dois meses e o diretor-presidente da Anvisa, William Dib, espera que haja uma legislação publicada e pronta até o fim do ano. Caso haja a liberação, ocorrerá o barateamento de remédios, produzidos no Brasil, em torno de 30% em comparação com os importados.
TRATAMENTO Aparecida, Fábio e a filha Clarian: canabidiol para aliviar epilepsia (Crédito:MARCO ANKOSQUI )
Há uma demanda crescente por remédios à base de cannabis por causa de sua reconhecida eficácia no tratamento de algumas doenças. Nos últimos quatro anos, foram concedidas cerca de sete mil autorizações para importação desse tipo de medicamento, especialmente do canabidiol, usado em casos de epilepsia em crianças. As associações que promovem o uso medicinal da cannabis calculam que atualmente existam outros 60 mil brasileiros que usam o produto de forma clandestina, devido aos altos preços dos importados e aos custos jurídicos para viabilizar a importação.
Para as associações pró-cannabis, a decisão da Anvisa representa um pequeno avanço, mas está longe de ser uma solução. “A decisão dessa semana é só o início do debate, mas é muito importante que o tema, sempre tratado como um tabu, seja discutido cientificamente”, afirma Patrick Ferrer, diretor jurídico da Associação Brasileira dos Usuários de Canabidiol (Abuc). O principal problema identificado na medida é que a Anvisa não libera o cultivo individual ou o associativo e privilegia os interesses da indústria farmacêutica e a plantação exclusivamente em lugares fechados – a rigor, tal precaução está correta, porque seria impossível fiscalizar o plantio indiscriminado dessa planta. Tal proposta só é defendida por radicais. “O passo dado pela Anvisa é muito pequeno diante do tamanho da necessidade. O que precisamos é de um acesso realmente democrático”, diz Maria Aparecida de Carvalho, de 51 anos, casada com Fábio e mãe de Clarian, de 16 anos, que sofre da Síndrome de Dravet, uma epilepsia cujas convulsões são persistentes e não cessam com terapias convencionais. Segundo a mãe, com o uso de óleo de canabidiol, as crises de Clarian diminuíram 80% e passaram a ser menos intensas.
Plantio doméstico
Na audiência da Anvisa, em Brasília, além da regulamentação para o cultivo com fins medicinais uma outra resolução foi aprovada que estabelece “procedimentos específicos para registro e monitoramento de medicamentos feitos à base de cannabis ou de seus derivados e análogos sintéticos”. O plantio doméstico ainda seguirá proibido no Brasil, embora existam cerca de 40 pessoas que conseguiram a liberação do cultivo próprio por meio de habeas corpus. É o caso de Maria Aparecida e também do designer Gilberto Castro, de 45 anos, que sofre de esclerose múltipla e, desde 2014, mantém um jardim de cannabis na sua casa. Aposentado e sofrendo com as sequelas da doença, Gilberto conseguiu depois de quatro ações judiciais uma autorização, em 2016, para manter o cultivo próprio. “A decisão da Anvisa ajudará algumas pessoas, mas muitas ainda dependerão do cultivo caseiro”, diz. Depois que começou a consumir a planta, Castro não teve mais nenhum surto.
O grande empecilho para o uso legal da maconha no tratamento de saúde, além das limitações legais, é o preço. Medicamentos à base de cannabis custam caro. No Brasil, o único disponível nas farmácias é o Mevatyl, registrado em outros países com o nome de Sativex, desenvolvido para o tratamento da esclerose múltipla. Ele inibe os espasmos causados pela doença. Uma embalagem de Mevatyl, registrado pela Anvisa no início de 2017, não sai por menos de R$ 2,5 mil. Para quem importa canabidiol, dependendo da quantidade que o doente necessita, o custo mensal pode superar R$ 1,5 mil. A proposta da Anvisa tem chances de ser aprovada, mas obstáculos devem aparecer. O principal adversário do uso medicinal é o próprio governo. O ministro da Cidadania, Osmar Terra, já declarou que a considera uma medida “irresponsável” da Anvisa. O governo deve trabalhar para atrasar a liberação da produção local, indicando um membro para uma vaga em aberto na diretoria da agência – o que de fato ele tem direito, assim como gestões anteriores. De todo modo, até na comunidade científica, existe um clima favorável ao uso medicinal da maconha.

segunda-feira, 17 de junho de 2019

Mais obesos, menos famintos

Número de pessoas com sobrepeso supera as que passam fome no mundo. O grande problema é a má alimentação

Crédito: Motortion
SACRIFÍCIO Biscoitos recheados, salgadinhos de pacote e refrigerantes estão entre os vilões do sobrepeso: deficiência de micronutrientes (Crédito: Motortion)
Está acontecendo uma mudança radical do mapa da fome no mundo. O problema agora não é tanto a falta de comida, mas o alimento de má qualidade. Na ultima segunda 10, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) divulgou prévias de seu relatório que apontam para elevação do número de pessoas com sobrepeso em relação à quantidade de famintos. Segundo o diretor geral da FAO, o brasileiro José Graziano da Silva, “pela primeira vez teremos mais pessoas obesas do que com fome”. As declarações foram feitas durante a abertura do Simpósio Internacional dos Alimentos, em Roma. O documento final sobre segurança alimentar, elaborado por várias agências da ONU, sairá em julho.
Hoje, mais de dois bilhões de adultos com dezoito anos ou mais estão acima do peso e mais de 670 milhões são considerados obesos. Além disso, o aumento da prevalência de obesidade entre 2000 e 2016 foi mais rápido do que o sobrepeso em todas as idades. Quanto ao número de famintos, a FAO estima em 821 milhões de pessoas.
Níveis de gordura
s vilões da obesidade, que envolve deficiências de micronutrientes, são os biscoitos recheados, salgadinhos de pacote, refrigerantes e o macarrão instantâneo, entre outros alimentos ultraprocessados. Esses alimentos são produzidos com ingredientes artificiais, contêm altos níveis de gorduras saturadas, açúcares refinados, sal e aditivos químicos e, em alguns casos, podem conter resíduos químicos de petróleo e carvão. “Agora a obesidade está em toda parte sem distinção entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos”, diz Graziano, que atribui esse fenômeno a mudanças de hábitos de consumo ligadas à urbanização e a dietas baseadas em fast-food.

sexta-feira, 14 de junho de 2019

Crianças com febre: saiba quando recorrer a remédios

Os pais andam exagerando na dose de antitérmicos oferecida à criançada quando elas estão com febre. Em quais casos é necessário lançar mão das gotinhas?

 
Sempre que os pequenos têm febre, os adultos se desesperam. Basta o termômetro indicar mais de 37 °C que começa a correria para encontrar um remédio antes mesmo de averiguar o estado de saúde da criança. A questão é: o uso de medicamento, nessas horas, pode ter consequências negativas.
Tanto é que a revista científica de pediatria do mundo, a americana Pediatrics, lançou um alerta recente sobre o uso indiscriminado de antitérmicos. No artigo, assinado por especialistas da Academia Americana de Pediatria, os médicos recomendam que não se recorra a esse tipo de remédio com o objetivo exclusivo de reduzir a temperatura corporal de meninos e meninas. “Só que, infelizmente, muitos pais têm um medo exagerado e irracional da febre”, lamenta o pediatra Jayme Murahovschi. É aí que mora o perigo.
Isso porque a automedicação é sempre arriscada. “Os antitérmicos não atuam sobre a doença que desencadeou a subida da temperatura, só diminuem a febre”, lembra a infectologista e pediatra Cristina Rodrigues da Cruz. “A preocupação, quando há febre, deve ser com o diagnóstico do que a causou, feito por um pediatra.” Além disso, o calor corporal – desde que não passe de um limite tolerável – até costuma dar uma mão para exterminar o que por ventura está por trás de toda a encrenca.

“A febre de até 38,6 °C otimiza o sistema imunológico”, confirma a pediatra Joelma Gonçalves Martin. “Ou seja, ficar um pouco mais quente do que o normal ajuda a criança a se defender, porque a produção de anticorpos protetores aumenta, recrutam-se algumas células de defesa de maneira mais rápida e inibe-se a multiplicação de diversos micro-organismos”, explica.
Se a febre, a princípio, não faz mal, quando será que os antitérmicos são mesmo necessários? “No geral, quando aumentam o conforto da criança no alívio de sintomas como tremores, mal-estar e aceleração dos batimentos cardíacos”, diz o infectologista Milton Lapchik. Isso significa que se seu filho está quente, mas continua correndo pela casa, não é preciso medicá-lo. As exceções são garotos com problemas cardíacos ou pulmonares, além daqueles que têm suscetibilidade a crises convulsivas desencadeadas por febre.
Em todos os casos, entretanto, quem deve decidir se é hora de apelar para as gotinhas é o médico – e não os próprios pais. “Nos menores de 3 anos, cujo sistema imune é um pouco mais imaturo, a preocupação precisa ser maior”, ressalta Joelma. “Assim, bebês com temperatura alta, independentemente do estado geral, crianças com febre baixa, mas com outros sintomas, e as que permanecem febris por dias seguidos necessitam de atendimento médico.” Nos recém-nascidos, qualquer febre deve ser comunicada imediatamente ao pediatra.
Mas nenhum pai ou mãe deveria se desesperar nessas horas. Talvez esse seja o recado mais importante do artigo americano. Em mais de 60% dos casos, a elevação da temperatura é apenas uma das respostas do organismo à presença de algum micro-organismo estranho – e logo, logo esse calorão todo passa.

Quando o termômetro sobe

Acima de 37,8 ºC – Febre
E em crianças pequenas o termômetro pode marcar temperaturas bem mais altas do que esse calor. É uma reação natural de um organismo que está aprendendo a se defender. Ou seja, o calorão muitas vezes não reflete nada grave. Por isso, não se preocupe tanto.
Entre 37,2 e 37,8 ºC – Estado Febril
Nem sempre uma temperatura pouco acima de 37ºC indica que a febre está a caminho. Mas quando o estado febril se manifesta, a recomendação é deixar um termômetro por perto para verificar se o corpo do pequeno não irá esquentar demais.
Até 37,2 ºC – Normal
As pessoas têm organismos diferentes e a temperatura pode variar de indivíduo para indivíduo. Mas até cerca de 37,2ºC tudo está absolutamente normal.

Receitas caseiras

Algumas delas funcionam pra valer, sem efeitos colaterais
Lenços úmidos: as nossas avós já sabiam que colocar panos molhados com água na testa dos pequenos dá uma ajuda e tanto. “As compressas devem ser mornas e podem ser utilizadas desde que proporcionem conforto à criança”, lembra a infectologista e pediatra Cristina Rodrigues da Cruz. O corpo perde calor com o contato do tecido úmido em temperatura menor que a dele.
Muito líquido: durante a febre, é comum haver desidratação. Por isso, todo tipo de suco, chá ou mesmo um copo de leite ou água são muito bem-vindos para manter o corpo funcionando até o fogo passar.
Roupas leves: fuja à tentação de cobrir seu filho com um cobertor para evitar que ele fique tremendo. Para ajudar o organismo a regular a temperatura, o ideal é o contrário: tire o excesso de roupas.
Banhos mornos: a água deve estar morna, em torno de 36 ºC – e pode parecer gelada para a criança que está pelando de febre. Por isso, nada de obrigá-la a entrar na banheira ou no chuveiro. A estratégia é eficiente, desde que não faça o pequeno berrar de desconforto. Afinal, a ideia é aliviá-lo de qualquer mal-estar, certo?

quarta-feira, 12 de junho de 2019

O segredo da ressuscitação

A reversão da morte é um dos grandes desafios da medicina, mas a prática recente mostra que a melhor forma de salvar uma vítima de parada cardíaca é com medidas simples e rápidas

Crédito: Klaus-Dietmar Gabbert
SALVAÇÃO Paramédico simula o uso de um desfibrilador com um boneco: a reversão da morte súbita (Crédito: Klaus-Dietmar Gabbert)
Desde tempos imemoriais são feitas tentativas de reverter a morte. Tentar salvar o próximo é um impulso universal e altruísta do ser humano. Na Bíblia, há uma passagem que narra os esforços do profeta Eliseu para ressuscitar o filho de sua mulher, Sunamita, usando respiração boca a boca. O médico e alquimista Paracelso foi pioneiro, no século 16, na utilização de foles de lareira para introduzir ar nos pulmões de pessoas aparentemente mortas com o objetivo de trazé-las à vida. Hoje em dia, a fórmula de reversão da morte passa por técnicas de compressão pulmonar e por um aparelho chamado desfibrilador externo automático (AED). Se no passado a morte súbita era reconhecida em casos de afogamento, asfixia ou trauma, no mundo contemporâneo sua principal causa é uma parada cardíaca fulminante. “O mais importante na ressuscitação é fazer os procedimentos com simplicidade e prontidão”, diz o cardiologista Sérgio Timerman, diretor do Laboratório de Treinamento e Simulação em Emergências Cardiovasculares do Instituto do Coração (Incor). “É imprescindível dar diagnóstico e atendimento rápidos”.
Hoje, os males que mais provocam paradas cardiorrespiratórias são doenças cardiovasculares, coronarianas, cerebrovasculares e a embolia pulmonar. Diagnosticar a causa da parada aumenta as possibilidades de ressuscitação. Depois que o coração para, as chances da pessoa morrer aumentam 10% a cada minuto que passa. A partir do terceiro minuto, a probabilidade de ficar com alguma sequela é muito grande. “Tempo é vida”, diz Timerman. “Quanto mais a gente complica para fazer a ressuscitação, pior é”. Antigamente, por exemplo, media-se o pulso e agora não se faz mais isso num primeiro atendimento de emergência. Só se buscam dois sinais simples: se a vítima está respirando e se está consciente. Medir o pulso não é função de quem não é médico e a respiração boca a boca tampouco deve ser aplicada por leigos. O importante é reconhecer a parada e iniciar as compressões até que chegue o socorro. “A gente vê pessoas que resistem a uma parada cardíaca por 30, 40 minutos, quando bem atendidas, e ainda conseguem voltar à vida. Mas isso é incomum”, afirma.
Choque elétrico
Os desfibriladores emitem um choque elétrico que reativa o coração. Embora sejam indispensáveis, eles não são eficientes em todos os casos. Há três situações que levam a uma acidente cardiovascular. A mais comum, que representa 60% dos casos, é a fibrilação ventricular, quando o coração passa a bater de maneira caótica e deixa de funcionar como uma bomba. Nesse caso, para reverter o ritmo desordenado, a única maneira é usar um desfibrilador. Outras situações são a assistolia, em que o órgão para de bater e fica sem nenhuma contração, e a atividade elétrica sem pulso, que deixa o coração com os batimentos dissociados. Tanto na assistolia como na atividade elétrica sem pulso, o desfibrilador não tem eficácia. Daí a necessidade de um diagnóstico rápido antes do uso do equipamento.
“O mais importante na ressuscitação é reconhecer a parada cardíaca e iniciar imediatamente o procedimento de compressão torácica. Nesse caso, tempo é vida” Sérgio Timerman, cardiologista (Crédito:Pedro Dias)
Segundo Timerman as principais novidades nos processos de reversão da morte estão, na verdade, na pós-ressuscitação e nos procedimentos realizados no hospital. Depois que o paciente se salva, há recursos que devem ser usados para garantir a sobrevivência. O primeiro é a oxigenação por membrana extracorpórea, feita com um aparelho que promove a oxigenação continua do sangue do paciente. Outro tratamento é a hipotermia ou resfriamento da temperatura do corpo, cujo objetivo é preservar as células nervosas.
No Brasil, Timerman estima que haja 280 mil tentativas de ressuscitação por ano e os índices de reversão são baixos. Se um cidadão tiver uma parada cardíaca no meio da rua longe do ambiente hospitalar e sem qualquer apoio técnico, suas chances de sobreviver são de 1%. Mas se o acidente acontecer num hospital ou em um lugar com gente capacitada para lidar com emergências, como o metrô de São Paulo, por exemplo, essa probabilidade pode subir para 30% ou 40%. Em São Paulo existe uma lei desde 2005 que determina a obrigatoriedade de manutenção de um aparelho desfibrilador em locais que tenham concentração ou circulação média diária de pelo menos 1500 pessoas, mas a adesão à lei deixa muito a desejar. De qualquer forma, o conhecimento sobre a ressuscitação está se disseminando e reverter uma morte que parece certa não é mais um milagre.

terça-feira, 11 de junho de 2019

Saiba tudo sobre a bronquiolite

Médico explica causas, sintomas e tratamento dessa doença que atinge as crianças nos dois primeiros anos de vida

 
A bronquiolite é uma inflamação dos bronquíolos, que são a parte final dos brônquios. Eles ficam antes dos alvéolos, onde é feita a troca de oxigênio pelo gás carbônico. Quando nos referimos a essa doença, em geral falamos do tipo mais comum, que é a bronquiolite viral aguda, que acomete crianças nos dois primeiros anos de vida – inclusive, essa é a principal causa de internação de menores de 1 ano no mundo. Vamos saber mais sobre essa condição?

O que leva à bronquiolite

Ela é causada por vírus. O principal atende pelo nome de vírus sincicial respiratório, e é responsável por 40 a 80% dos casos. Vários outros tipos, porém, podem provocar a doença.

Os sintomas

Normalmente o quadro é precedido por sintomas de vias aéreas superiores, como nariz escorrendo. E pode (ou não) ocorrer febre. Na evolução do problema, a inflamação dos bronquíolos causa sua obstrução, o que dificulta a passagem do ar. Daí surgem tosse, dificuldade respiratória e chiado no peito.
A doença pode ser desde muito leve, com secreção nasal e tosse discreta, até grave, com insuficiência respiratória e necessidade de internação. Para ter ideia, 5% das crianças com bronquiolite necessitam de internação e, dessas, 2% vão à óbito.

Os fatores de risco para ter a forma grave da bronquiolite

Uma evolução ruim do quadro é associada a questões como prematuridade, tabagismo passivo, baixa idade, ausência de aleitamento materno, doença pulmonar crônica, cardiopatia congênita e ser do sexo masculino.
Cabe lembrar, no entanto, que a maior parte das crianças internadas por bronquiolite não apresenta nenhuma dessas condições.
Recentemente, realizei uma pesquisa na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), no interior paulista, e nosso grupo de trabalho demonstrou que existem fatores genéticos que contribuem com a gravidade da bronquiolite. O estudo foi publicado na revista científica Gene.

O diagnóstico

Ele é baseado na história clínica e na avaliação física. Ou seja, não é necessário nenhum exame para confirmar a doença. A detecção do vírus é um exame útil, mas não fundamental. A radiografia de tórax e os testes de sangue não devem ser recomendados como rotina – são indicados apenas para casos de evolução grave.

O tratamento

A bronquiolite geralmente é auto-limitada e o tratamento depende da gravidade da doença. A maioria das crianças pode ser acompanhada em casa. Mas, caso a decisão do pediatra seja essa, é importante que ele tranquilize os pais e esclareça sobre os sinais de alerta que podem indicar a evolução da doença e, assim, a necessidade de uma reavaliação.
Entre os sintomas que merecem atenção estão: dificuldade respiratória, aumento da frequência respiratória e utilização da musculatura acessória para respirar – que é evidenciada pela retração entre as costelas e da fúrcula, o espaço logo acima do esterno, o osso do peito. Além de um abatimento excessivo da criança e recusa em se alimentar e hidratar.

A internação será necessária se ocorrer desconforto respiratório grave ou incapacidade para manter a hidratação adequada. Aqueles que apresentam os fatores de risco citados anteriormente, porém, podem precisar de internação em um estágio mais precoce da doença.
Quando a internação ocorre, o principal aspecto do tratamento é o suporte com oxigênio, feito geralmente através de um cateter nasal – às vezes é preciso administrá-lo de forma mais invasiva. Além disso, deve ser mantida uma hidratação adequada, preferencialmente por via oral.
Se a criança apresentar dificuldade na alimentação, opta-se pelo uso de sonda nasogástrica ou hidratação endovenosa. A aspiração cuidadosa das narinas e a higiene nasal com solução salina são atitudes benéficas. As diretrizes atuais não recomendam a fisioterapia respiratória na bronquiolite não complicada.
Por ser uma doença viral, não há nenhuma necessidade de oferecer antibióticos à criança. Também está provado que não há nenhum benefício em administrar broncodilatores inalatórios, epinefrina inalatória ou corticoides, seja via inalatória, oral ou endovenosa.
*Dr. Alfonso Eduardo Alvarez é pneumologista pediátrico, mestre e doutor em Saúde da Criança e do Adolescente e presidente do Departamento de Pneumologia da Sociedade de Pediatria de São Paulo

segunda-feira, 10 de junho de 2019

Sob o signo das doenças

Péssimas gestões do sistema de saúde e falhas nas políticas públicas levam à escassez de remédios, queda na imunização por vacinas e ao ressurgimento de moléstias que estavam erradicadas

Sob o signo das doenças
Os problemas de saúde pública no Brasil se aprofundam. Não só pelos muitos hospitais que não funcionam ou pelas dificuldades de agendar uma consulta médica ou um exame no Sistema Único de Saúde (SUS). De alguns anos para cá, doenças que eram erradicadas estão retornando, vacinas e remédios passaram a faltar em diversas partes do País e a taxa de mortalidade infantil, que não aumentava desde 1990, voltou a subir. A situação é bastante crítica e há um evidente retrocesso no quadro clínico.Junto com a crise econômica e as deficiências nas políticas públicas, mais pessoas estão sucumbindo a doenças ou sofrem com a dificuldade de tratá-las.
A queda da cobertura vacinal é um dos problemas mais graves. Levantamento do Ministério da Saúde/PNI mostra que o percentual de brasileiros imunizados só tem diminuído. Entre 2015 e 2017, o índice de vacinação para poliomielite, por exemplo, caiu de 98,3% para 79,5%. A vacina pentavalente (difteria, tétano, coqueluche, hepatite B e doenças causadas por Haemophilus influenza tipo B) desceu de 96,3% para 79,2%. Embora não tenha aparecido nenhum registro de poliomielite no País, o risco de contágio tem aumentado. Outras doenças, como o sarampo e a dengue, evitáveis com vacinas, reapareceram com força. Cerca de 10 mil casos de sarampo foram registrados no ano passado. Quanto à dengue, houve um aumento de 340% no número de registros em 2019.
Também faltam remédios. Um levantamento do Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass) mostra que, nos primeiros meses desse ano, de um total de 134 remédios distribuídos obrigatoriamente pelo Ministério da Saúde, 25 estavam com os estoques zerados em muitos estados brasileiros no começo de maio e outros 18, prestes a se esgotar. Segundo o Conass, o País está vivendo a maior crise de sua história na oferta de medicamentos pelo sistema público de saúde. Cerca de dois milhões de pacientes dependem dos remédios que estão em falta, incluindo crianças com leucemia e transplantados.
DESTINO O índice de mortalidade infantil voltou a subir após 26 anos: falta de assistência e medicamentos (Crédito:Divulgação)
Câncer infantil
As pessoas que passam por transplantes de fígado precisam tomar medicações especificas para continuarem vivas. As substâncias Everolimo e Tracolimo, que evitam a rejeição pelo organismo do órgão transplantado, estão em falta no Ceará. Segundo Wilter Ibiapina, presidente da Associação Cearense dos Pacientes Hepáticos e Transplantados (ACEPHET), existem remédios faltando há 35 dias. “Em minhas mãos tenho mais de cinqüenta receitas de pessoas que estão sem tomar essas medicações”, diz ele.
Quimioterápicos usados por pacientes em tratamento contra o câncer infantil sumiram dos estoques do governo. “Enfrentamos hoje no Brasil a falta desses produtos. Actinomicina D, essencial para tratamento do câncer de rim e sarcomas em crianças e adolescentes. Também há carência da Procarbazina, utilizada no linfoma de Hodgkin”, diz Silvia Brandilise, presidente do Centro Infantil Boldrini. “Nada justifica a falta de planejamento para a aquisição dos medicamentos indispensáveis contra o câncer da criança”.
Em 2016, pela primeira vez em 26 anos, a taxa de mortalidade infantil entre menores de um ano voltou a subir. A alta foi 13,3 para 14 mortes a cada mil nascidos vivos. Segundo Maitê Gauto, líder de Políticas Públicas da Fundação Abrinq, houve avanços relevantes nas últimas décadas, mas a situação é sensível e qualquer deslize pode comprometer gravemente os esforços realizados: “É importante dizer que embora tenhamos reduzido muito as causas de mortes, a maior parte dos óbitos de crianças, menores de um ano, acontece por deficiência em políticas publicas”. Alguma coisa precisa ser feita para salvar essas crianças. E também para fazer a saúde pública brasileira entrar nos trilhos.
“Em minhas mãos tenho mais de cinqüenta receitas de pessoas que estão sem tomar suas medicações” Wilter Ibiapina, presidente da ACEPHET (Crédito:Divulgação)

sexta-feira, 7 de junho de 2019

Os sinais ignorados do infarto

A dor no peito é só a ponta do iceberg de uma série de outros incômodos que aparecem com uma pane cardíaca. Saiba como identificá-los

Marque no relógio: no tempo que você levará para ler esta reportagem, pelo menos dois brasileiros sucumbirão ao infarto, a causa de morte número 1 em nosso país e em boa parte do mundo. Esse cenário catastrófico é motivado pelo descontrole de fatores que patrocinam o entupimento das coronárias, as artérias que irrigam o coração, como o excesso de peso, o tabagismo, a pressão alta e altas taxas de colesterol e glicemia. Porém, chama a atenção a persistente lentidão com que as pessoas em geral (e, em certa medida, até profissionais de saúde) suspeitam dos sintomas de algo crítico no peito.
Essa grave falha foi escancarada por uma pesquisa do Imperial College London, na Inglaterra, recém-publicada no jornal científico The Lancet. Os autores reuniram dados sobre todos os 135 mil óbitos por ataque cardíaco que ocorreram na Inglaterra entre 2006 e 2010. Eles descobriram que, em 16% dos casos, os indivíduos haviam visitado o hospital durante o mês anterior com dores, desmaios ou falta de ar.
Mesmo assim, esses pontos de alerta não foram suficientes para levantar a possibilidade de um evento sério no coração. “O estudo destaca a importância de ficar atento aos sinais sugestivos do problema, uma vez que uma em cada seis pessoas passaram por consulta e não tiveram um diagnóstico correto”, analisa o médico Marcus Bolívar Malachias, presidente da Sociedade Brasileira de Cardiologia.
É óbvio que as pontadas agudas no peito são a face mais conhecida e comum do infarto. Mas nem sempre essa sensação dá as caras. Aliás, um músculo cardíaco em parafuso se entrega por outras vias também. “Entre elas, podemos citar dificuldades para respirar, palidez, suor frio, náuseas, vômitos, tontura, confusão mental, perda de consciência e dores difusas nas costas, nos braços e na mandíbula”, lista o médico Agnaldo Píspico, da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo.
O estabelecimento deles está relacionado à conexão entre diferentes estruturas do sistema nervoso que transmitem o estímulo doloroso e a região atingida. Se a obstrução aconteceu na porção inferior do coração, por exemplo, é natural experimentar desconfortos como regurgitação e azia.
E olha que os sintomas menos famosos são corriqueiros em alguns grupos específicos, a começar pelas mulheres. Um levantamento do Centro Médico Regional de Lakeland, nos Estados Unidos, concluiu que 42% das infartadas não sentiram uma dorzinha sequer no tórax. “Elas também demoram em média uma hora a mais para ir ao pronto-socorro em comparação com os homens”, observa o cardiologista Otavio Gebara, do Hospital Santa Paula, na capital paulista. Para piorar, o aumento do estresse e das incumbências com trabalho, casa e família elevou as estatísticas das doenças cardiovasculares entre o público feminino nas últimas décadas.
Diabéticos e idosos são outros perfis de gente que tem o colapso cardíaco sem manifestar sintomas clássicos. “O diabete danifica os nervos e altera a sensibilidade à dor”, explica o cardiologista José Armando Mangione, do Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo. A doença ainda modifica a configuração interna dos vasos sanguíneos e possibilita o surgimento de coágulos que bloqueiam a passagem do líquido vermelho.
Nos mais velhos, o avançar das décadas deixa o coração franzino. “Muitas vezes, só vemos que um paciente de 70 ou 80 anos infartou após alguns meses, no resultado de exames de rotina”, conta o cardiologista Leopoldo Piegas, do Hospital do Coração, na capital paulista.
Quando, então, suspeitar que sinais tão simples significam um infarto sem virar hipocondríaco? A regra essencial é ficar com a pulga atrás da orelha caso os incômodos sejam intensos e surjam do nada. Quem possui histórico familiar de enfermidades cardíacas, fuma, está acima do peso, hipertenso ou com o colesterol alto também deve ficar ligado. “É necessário socorrer na primeira hora, pois esse é o momento em que ocorre a maioria das mortes”, frisa o cardiologista Francisco Lourenço Junior, do Hospital Quinta D’Or, no Rio de Janeiro. Não tem jeito: para o relógio trabalhar a nosso favor, rapidez é primordial. Só assim evitamos que o coração afunde em águas nada tranquilas.

Desconfiar sempre

Grupos em que as manifestações das emergências cardíacas não são tão clássicas
Mulheres
A dor pode não ser tão forte nelas e vem acompanhada de palpitações. Episódios com impacto emocional são o gatilho de muitos piripaques cardíacos nesse público.
Idosos
Com um coração pouco vigoroso, saem de cena as pontadas do infarto. No lugar delas, pintam sintomas como confusão mental, tontura e falta de ar.
Diabéticos
Açúcar demais lesa os nervos responsáveis pelas sensações dolorosas, o que mascara o aperto nos vasos do coração. Náuseas e suor frio acendem o sinal de alerta nessa turma.

quinta-feira, 6 de junho de 2019

Pingar água oxigenada no ouvido ajuda a combater gripe e otite?

Medida está sendo recomendada nas redes sociais. Fomos investigar se ela faz sentido

Circula na internet a informação de que pingar algumas gotinhas de água oxigenada no ouvido pode amenizar os sintomas da gripe e infecções na área. Há alguns dias, a apresentadora Bela Gil se mostrou entusiasta da prática. No texto, ela declara que a família toda também é adepta, mas pede que os seguidores procurem o médico otorrino antes de fazer o mesmo.
A água oxigenada, solução feita à base de peróxido de hidrogênio, é usada para limpar ferimentos da pele e cicatrizes cirúrgicas. Como tem função desinfetante, pode eliminar vírus e bactérias que causam infecções locais – esse uso é bem estabelecido pela medicina. A questão é que não há indícios de que ela consiga atravessar a derme para, assim, agir sistemicamente.
“Traçando um paralelo, seria o mesmo que pingar uma gota na testa e imaginar que seria o suficiente para abrandar a gripe”, comenta Lauro Alcântara, chefe do serviço de otorrinolaringologia do Hospital Pequeno Príncipe, em Curitiba. Para combater a doença, as medidas preconizadas são apostar em remédios virais (quando necessário) ou caprichar na hidratação e no repouso, combinação geralmente utilizada.

Risco de infecção nos ouvidos

Existem dois tipos de otite. Uma é a externa, caracterizada por uma inflamação no canal auditivo, que vai até o tímpano. Ela é mais comum no verão, quando a água da piscina ou do mar tende a se acumular na orelha. Nesse caso, a água oxigenada até pode ser inofensiva, pois entra em contato apenas com a pele. Mas um detalhe: também não há evidências de que combata o quadro.
A outra versão de otite é chamada de média e ocorre mais em épocas mais frias. Ela acomete a tuba auditiva, estrutura interna do ouvido, e é uma complicação do resfriado e de outras infecções que atacam as vias aéreas superiores. Como pode provocar perfuração do tímpano, usar água oxigenada para tentar resolvê-la é perigoso.
“Aplicado nas mucosas, como as do ouvido interno, o produto aumenta o risco de infecções”, aponta Alcântara. Portanto, vale comparecer ao consultório na presença de febre e dor de ouvido antes de inserir qualquer coisa no local. Até mesmo porque a otite média e a externa têm tratamentos diferentes, com gotinhas específicas e, em alguns casos, medicamentos orais.

Pode fazer gargarejo com água oxigenada?

Para casos de dor de garganta, essa é outra sugestão de Bela em seu perfil. “Até pode, pois ela realmente é eficaz contra certos germes, mas sempre diluída em água e na versão dez volumes”, orienta Alcântara. Quanto maior o número de volumes (tem de 20, 30, 40…), mais concentrada é a solução de água oxigenada. Aí, há risco real de lesões nos tecidos do corpo, já que o líquido se torna corrosivo.
Resumo da ópera: consulte o médico antes de buscar soluções caseiras para solucionar doenças. “Tratar sem diagnóstico é dar um tiro no escuro”, alerta o médico.

quarta-feira, 5 de junho de 2019

Chega ao país remédio para psoríase que pode ser reaplicado a cada 3 meses

Chamado risanquizumabe, o medicamento é injetável e pode ser manipulado em casa

Boa notícia para os portadores de psoríase: a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) acaba de aprovar um novo medicamento para os casos moderados e graves da doença. É o risanquizumabe, da farmacêutica AbbVie, que
tem como vantagens a administração trimestral após as duas primeiras doses e a possibilidade de ser aplicado em casa.
Essa doença inflamatória crônica provoca lesões na pele e acaba afetando outras partes do corpo, como coração, fígado e rins. A nova alternativa de terapia faz parte do grupo dos chamados medicamentos imunobiológicos.
“Eles bloqueiam a inflamação e o paciente fica quase sem lesões. Essa classe revolucionou o tratamento por deixá-lo mais simples. E são bastante seguros”, afirma a dermatologista Aline Okita, chefe do Ambulatório de Psoríase da
Universidade de Mogi das Cruzes, em São Paulo.
O risanquizumabe é injetável e deve ser administrado por via subcutânea. Depois da primeira aplicação, são quatro semanas até o paciente receber a segunda dose. A partir daí, vem a fase da manutenção, em que o remédio é usado a cada três meses. Segundo Aline, isso representa um avanço, já que as opções atuais precisam ser manipuladas várias vezes por semana ou mês.
Os estudos clínicos que embasaram a aprovação contaram com mais de 3 000 voluntários no total. Para ter ideia, mais de 80% das pessoas tiveram melhora nas lesões na pele. E cerca de 60% alcançaram recuperação completa ao longo de 52 semanas de intervenção.
Além de avaliar a eficácia, os testes compararam sua ação com o ustequinumabe, o adalimumabe (dois outros fármacos) e um placebo. Nos três casos, a droga nova atingiu resposta significativamente superior.
“Ela tem uma eficácia bem alta comparada a de outros medicamentos usados hoje em dia. É mais uma opção. O paciente praticamente esquece que tem a doença”, comenta a especialista, que também atende na clínica Denise Steiner, na capital paulista.
Os efeitos adversos observados na pesquisa incluem dermatofitose (um tipo de micose), dor de cabeça, coceira, fadiga, reações no local da injeção e infecções no trato respiratório superior. Esse último contratempo, vale dizer, foi o mais comum: ocorreu em 13% dos participantes.
Apesar de ser um medicamento inovador, isso não significa que os já existentes entrarão em desuso. Afinal, o problema se manifesta de forma e intensidade diferentes. Por isso, o tratamento é individualizado.
“Cada medicamento tem seu perfil de paciente. Às vezes, ele sofre com efeitos adversos ou o remédio deixa de funcionar ao longo do tempo. Daí porque a gente precisa de outras opções”, completa Aline.
De acordo com a AbbVie, o risanquizumabe estará disponível para comercialização no Brasil a partir de setembro, após a definição do preço.

Como funciona o tratamento para psoríase hoje

Para a forma mais leve da doença, Aline conta que dá para recorrer a cremes de uso tópico — isto é, aqueles aplicados diretamente na pele.
Os imunobiológicos entram em cena para cuidar dos casos mais graves. A questão é que eles ainda são caros e disponibilizados apenas na rede privada.
O SUS, por sua vez, oferece metotrexato, acitretina, ciclosporina — comprimidos sintéticos — e a fototerapia. Eles são efetivos, mas acabam gerando diversos efeitos colaterais.
“Quem tem a forma mais grave, que acomete a pele toda e o couro cabeludo, geralmente acaba apresentando depressão. Não trabalha, deixa de ter lazer… Por isso é tão importante tratar adequadamente”, analisa a expert.
A especialista conta que o Ministério da Saúde estuda a introdução de um imunobiológico na lista dos medicamentos disponíveis no SUS — o adalimumabe. “Está em parecer final. Ele provavelmente será oferecido até o fim desse ano”, calcula.

segunda-feira, 3 de junho de 2019

O primeiro remédio 3 em 1 para o diabetes

Acaba de ser aprovada nos Estados Unidos uma associação inédita de três medicações em um único comprimido para tratar o diabetes tipo 2

Não canso de falar: um dos maiores desafios no tratamento das doenças crônicas é a adesão aos medicamentos prescritos em consultório. No caso do diabetes tipo 2, uma doença causada por diversas falhas bioquímicas no organismo, em geral um único remédio não é suficiente para manter baixos os níveis de glicose no sangue por um bom tempo.
Por isso, o uso de mais de um medicamento acaba sendo a regra e não a exceção. Só que, diante de tantos comprimidos para tomar na rotina, muitos pacientes abandonam o tratamento.
Aí já viu: quanto menos adesão ao plano terapêutico, pior o controle da glicose e maior o risco de complicações no longo prazo. Para tentar resolver esse dilema, que tal se juntássemos alguns desses vários remédios em um único comprimido?
Um passo importante foi dado nesse sentido. Foi aprovada para chegar às farmácias dos Estados Unidos a primeira combinação de três medicamentos para o diabetes em um só comprimido. A solução, inédita, é composta de um trio de primeira linha de princípios ativos que atuam no controle da glicose. São eles:
  1. Metformina XR: esse fármaco reduz a resistência à insulina, ou seja, melhora a ação do hormônio nas células do organismo. Com isso, mais glicose é aproveitada pelo corpo e não sobra na circulação;
  2. Dapaglifozina: a substância faz com que o excesso de açúcar no sangue seja eliminado pela urina. Segundo os estudos, diminui a glicose, o peso e a pressão arterial;
  3. Saxagliptina: é uma medicação que modula a produção de dois hormônios de função oposta, a insulina e o glucagon, de acordo com a carga de glicose no sangue.
O trio acima trabalha em sinergia e se completa, corrigindo vários daqueles “defeitos” por trás do diabetes tipo 2. Dessa forma, o tratamento consegue promover maior redução nos níveis de glicose, por mais tempo, e oferece um baixo risco de hipoglicemia (quando as taxas de açúcar despencam). Tudo isso com muita segurança para o organismo, inclusive para o sistema cardiovascular.
Agora é aguardar pelo aval e o lançamento em terras brasileiras.