segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

Contra a ciência: como a dramática epidemia de zika foi usada por defender uma causa oportunista e ideias retrógradas

Na última semana, um grupo de médicos argentinos que combate o uso de pesticidas divulgou a ideia de que um larvicida poderia ser a causa do alto número de casos de microcefalia no Brasil. De acordo com especialistas, a teoria, sem qualquer base científica, é um exemplo de como é possível aproveitar uma emergência de saúde pública para ir contra o progresso científico

Por: Rita Loiola
Mosquito Aedes aegypti, transmissor da Dengue
Larvas do mosquito 'Aedes aegypti', transmissor do vírus zika. Na última semana, a hipótese de que um composto para combater as larvas estaria por trás dos casos de microcefalia levou o governo gaúcho a suspender o uso do produto(Nelson Almeida/AFP)
Na área de saúde pública, doenças e epidemias desafiadoras para a ciência são, historicamente, um prato cheio para a defesa de causas oportunistas e ideias retrógradas. Nos últimos dias, enquanto os pesquisadores estavam lutando para descobrir qual a relação exata entre o vírus zika e o número elevado de bebês nascidos com microcefalia no Brasil, o rumor de que um larvicida estaria por trás das malformações se espalhou pelas redes sociais. Notas e reportagens em blogs e colunas ambientalistas em inglês e espanhol diziam que médicos brasileiros e argentinos estariam atribuindo a microcefalia ao piriproxifeno (pyriproxifen, em inglês), um larvicida aprovado pela Anvisa e usado para combater o Aedes agypti em todo o mundo. Sem qualquer base científica e, mesmo desmentida, a teoria foi o suficiente para que o governo do Rio Grande do Sul suspendesse o uso do larvicida na água potável, colocando em risco cerca de 10% da população que não recebe água tratada no Estado.
"Entre os inúmeros interesses que devem existir por trás desse tipo de iniciativa, o único que certamente não está presente é o interesse pela saúde pública", diz o médico Flávio Zambrone, presidente do Instituto Brasileiro de Toxicologia (IBTox), em Campinas. "Esse tipo de especulação, sem qualquer aval da ciência, só traz problemas. A epidemia que vivemos é séria, grave e precisamos usar contra ela todas as ferramentas conhecidas e eficazes. Impedir uma das formas de combate ao mosquito é, no mínimo, temerário e só vai trazer danos e prejuízos à população."
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As reportagens que circularam em redes sociais nos últimos dias citavam um relatório publicado no início de fevereiro pela Red Universitaria de Ambiente y Salud - Médicos de los Pueblos Fumigados (Reduas, na sigla em espanhol), uma associação argentina de médicos e pesquisadores que são, em sua maioria da Universidade de Córdoba, e combatem o uso de pesticidas e o modelo moderno de agricultura, com o uso de insumos químicos e industriais. O texto menciona incorretamente uma nota técnica da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), sobre os métodos de combate ao Aedes aegypti, dizendo que "não é uma coincidência" o uso do piriproxifeno em água potável e o aumento dos casos de microcefalia no Nordeste brasileiro. Segundo o artigo, a Abrasco sugeria que fossem feitos estudos epidemiológicos que levem em consideração a "relação causal" entre as más-formações dos bebês e o uso de piriproxifeno.
Mas o estudo argentino, que apenas reúne informações de fontes diversas, está longe de ter a seriedade de pesquisas científicas que passaram pela rigorosa revisão dos pares. Seus autores são o "time Reduas", coordenado pelo pediatra Medardo Avila Vazquez. Vazquez é conhecido pela luta contra os pesticidas na Argentina e, em abril do ano passado, esteve a ponto de ser denunciado formalmente pelo decano da faculdade de agronomia da Universidade Nacional de Córdoba com a acusação de divulgar na imprensa dados de suas investigações científicas de maneira enganosa.
Usando uma emergência de saúde pública, a entidade procurou defender a bandeira dos "povos fumigados" de forma irresponsável, usando a ciência apenas como verniz. A entidade é conhecida por promover discussões contra o modelo industrial de agricultura, usando para isso seus relatórios e estudos. Uma dessas reuniões, o Congresso Nacional dos Médicos de Povos Fumigados, teve entre os apoiadores de 2015 Ongs e a rede de advogados contra o uso de pesticidas, além de um sindicato e um grupo entitulado ecossocialista. O vídeo de apresentação da Reduas se encerra com a frase "o modelo industrial está gerando morte", deixando claras as intenções do grupo - mesmo que elas não tenham qualquer base ou aval vindo de pesquisas sérias.
A força de um boato - O uso político de teorias científicas falsas ou sem comprovação é uma forma especialmente perniciosa de manipulação. Os danos são ainda maiores quando a ciência isenta ainda engatinha para decifrar o enigma de uma doença ou epidemia.
Para os cientistas, é exemplar o episódio do estudo do médico britânico Andrew Wakefileld, que sugeriu que a vacina tríplice viral (contra sarampo, caxumba e rubéola) estava na origem do autismo, uma doença cujas causas, até hoje, são um desafio para os pesquisadores. O artigo, publicado em 1998 por Wakefield e outros 12 autores na conhecida revista científica Lancet, causou imensa repercussão. Diversas equipes tentaram, sem sucesso, reproduzir o estudo e, quase dez anos depois, uma longa investigação revelou que o estudo era uma fraude: além dos dados fabricados, a pesquisa havia sido patrocinada por advogados que trabalhavam contra indústrias produtoras de vacinas. O estudo foi retratado e Wakefield teve o registro médico cassado, mas o estrago estava feito.
Apesar de jamais ter sido encontrada qualquer evidência científica da ligação entre o autismo e a vacina, milhares de pais até hoje se recusam a imunizar os filhos por temer as consequências apontadas pelos estudo fraudulento de Wakefield. Muitos pagaram por isso. Em 2014, os Estados Unidos viveram um surto de sarampo, o maior desde 2000, quando a doença foi considerada eliminada do país.
"É muito fácil fazer associações equivocadas em cima de metade das evidências. Foi o que aconteceu no caso antigo da associação entre as vacinas e o autismo e nesse episódio recente do larvicida. Algumas pessoas usaram uma doença séria de forma oportunista em defesa de seus próprios interesses, contra todos o progresso científico. Para demonstrar causa e efeito é preciso não de um, mas de vários estudos experimentais, em modelos animais, que demonstrem claramente a relação. Sem isso, tudo o mais é especulação", diz Zambrone.
Larvicida causa microcefalia? - Poucos dias depois da divulgação do texto da Reduas, que se espalhou rapidamente pela internet, o verbete da Wikipedia sobre o piriproxifeno em português, inglês e francês afirmava que médicos tinham levantando a hipótese de que o composto pudesse estar relacionado ao aumento da incidência de microcefalia no Brasil. A discussão foi o suficiente para que o Rio Grande do Sul suspendesse o uso do pesticida como medida preventiva, apesar de o Ministério da Saúde ter divulgado em nota que "não existe nenhum estudo epidemiológico que comprove a associação do uso de piriproxifeno e a microcefalia".
Em nota enviada ao site de VEJA, a Abrasco afirmou que em "momento nenhum afirmou que os pesticidas, larvicidas ou outro produto químico sejam responsáveis pelo aumento do número de casos de microcefalia no Brasil" e que a nota técnica publicada em seu site afirma apenas que considera perigoso que o controle do Aedes seja feito, principalmente, por meio de larvicidas. Não há qualquer estudo científico estabelecendo uma relação direta de causa e efeito entre o uso de larvicidas e a microcefalia.
"É sabido que um cenário de incerteza como este provoca insegurança na população e é terreno fértil para a disseminação de inverdades e de conteúdos sem qualquer (ou suficiente) embasamento científico. A Abrasco repudia tal comportamento, que desrespeita a angústia e o sofrimento das pessoas em situação mais vulnerável, e solicita prudência aos pesquisadores e à imprensa neste grave momento, pois todas as hipóteses devem ser investigadas antes de negá-las ou de confirmá-las", diz a Abrasco.
Além disso, de acordo com o infectologista Kleber Luz, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e um dos primeiros cientistas a perceber a relação entre as infecções de zika no país e o aumento dos casos de microcefalia na região Nordeste, as cidades com o maior número de casos de microcefalia em Pernambuco, como Recife, não usam o piriproxifeno como larvicida, mas o BTI, um composto biológico.
"Nesse momento, atribuir a um larvicida o número elevado dos casos de microcefalia não faz sentido. Quem está na linha de frente das pesquisas sabe que a relação entre o vírus e a má-formação de bebês é clara. Ainda não sabemos os detalhes dessa relação, que é complexa e, possivelmente, envolve vários fatores, mas ela é bastante forte", diz Luz. "Em momentos como esses, de várias dúvidas sobre uma epidemia de consequências tão dramáticas, é natural que tente se encontrar um único culpado. Isso tornaria mais fácil lidar com a situação. Mas, infelizmente, não será uma 'teoria da conspiração' que vai solucionar a epidemia que vivemos."
Estratégia de saúde pública - Apesar de ter ficado claro que não há relação entre o piriproxifeno e o número elevado de bebês nascidos com microcefalia no Brasil, o governo do Rio Grande do Sul decidiu manter a proibição do uso do produto em água potável. Ele continua sendo usado em locais públicos, como fontes, chafarizes ou reservatórios.
"Se possível, o melhor é que a água que bebemos não tenha nenhum veneno", disse ao site de VEJA o médico João Gabbardo Reis, secretário de saúde do Rio Grande do Sul. "Não há evidências científicas da relação de causa e efeito entre o piriproxifeno e a microcefalia, mas há muitas dúvidas em relação ao zika e não se sabe se o larvicida não pode ser um fator coadjuvante."
É consenso entre os profissionais de saúde pública que as decisões nessa área devem ser tomadas visando o bem-estar do maior número de pessoas, levando-se em consideração o que há de mais avançado em pesquisas médicas e científicas. Contudo, segundo os especialistas, uma das fragilidades brasileiras em lidar com a epidemia de zika é a ausência de autoridades capacitadas e confiáveis, que concentrem as informações sobre a epidemia, tomem decisões corretas e transmitam à população as últimas descobertas de maneira transparente.
"O que me preocupa nesse episódio é que, além da decisão equivocada tomada com base em uma especulação, a responsabilidade pela epidemia está sendo transmitida unicamente para a população. As medidas sanitárias básicas são um encargo do governo e é uma decisão unânime entre os cientistas que controlar o mosquito é uma forma de combate eficaz do vetor", diz o médico Zambrone. "Em saúde pública devemos equilibrar os benefícios e malefícios e, em seguida, tomar decisões que beneficiem o maior número de pessoas. Por que, então, eliminar uma forma de combate ao Aedes, recomendada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e usada em todo o mundo?"
No Brasil, estão em curso estudos sobre o zika feitas com a ajuda do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) americano e da Organização Mundial de Saúde (OMS), cuja comissão está no país. O vírus complexo ainda está sendo decifrado pela ciência e os pesquisadores esperam que, em pouco tempo, respostas concretas sobre sua ação comecem a ser elaboradas. Ainda não foi descoberto quais anticorpos o vírus forma ao entrar no organismo, um primeiro passo fundamental para o desenvolvimento de um exame que identifique a doença e, futuramente, tratamentos e uma vacina.
"Nesse momento, em que aguardamos que a ciência descubra o mecanismo básico do vírus, precisamos saber onde buscar informações confiáveis e isso deveria vir de uma liderança oficial. É preciso deixar bem claro que qualquer afirmação feita sem o aval científico, nesse momento, não passa de boato", diz o infectologista Artur Timerman. "Só as respostas vindas dos laboratórios, aliadas a uma coordenação eficaz, nos ajudarão a lidar com essa epidemia que se tornou tão dramática no país."

domingo, 28 de fevereiro de 2016

Primeiro caso de zika transmitida por relação sexual é registrado na França

Segundo autoridades de saúde do país, homem que havia viajado ao Brasil infectou parceira. Ambos passam bem

Mosquito Aedes aegypti é retratado em uma folha em San Jose, na Costa Rica. O país intensificou as medidas preventivas contra o vírus Zika após registrar seu primeiro caso de infecção - 01/02/2016
Mosquito 'Aedes aegypti' é retratado em uma folha em San Jose, na Costa Rica(Juan Carlos Ulate/Reuters)
Uma autoridade do setor de saúde da França afirmou que o país registrou o primeiro caso de transmissão do vírus zika por meio de uma relação sexual. A mulher contaminada pelo vírus não estava grávida. O diretor-geral do Instituto Francês para a Vigilância da Saúde Pública, François Bourdillon, disse à emissora de televisão BFM que "a paciente não viajou, o companheiro dela havia retornado do Brasil", onde foi infectado com o vírus. Segundo Bourdillon, os dois passam bem.
O vírus da zika é primariamente disseminado pelo mosquito Aedes aegypti e a transmissão por via sexual é considerada rara. Nos Estados Unidos, o Centro para Controle e Prevenção de Doenças (CDC, sigla e inglês) informou na última semana sobre dois casos de transmissão do zika por relação sexual. Em ambos os casos, dois homens que haviam viajado contaminaram as parceiras. Além disso, há outros quatro casos prováveis nos EUA, bem como investigações sobre 14 outros registros suspeitos.
(Com Estadão Conteúdo)

sábado, 27 de fevereiro de 2016

O alerta da sífilis

Como a ausência de políticas públicas trouxe de volta ao País a doença infecciosa que tem consequências devastadoras, mas que pode ser facilmente evitada

Cilene Pereira (cilene@istoe.com.br)
Como se não bastassem a zika, a dengue e o chikungunya, os brasileiros estão sob ameaça de outra doença de consequências igualmente assustadoras. A ineficácia das políticas públicas fez explodir os casos de sífilis no País. Nunca foi tão alto o número de gestantes e bebês acometidos pela terrível enfermidade infecciosa transmitida pela bactéria Treponema pallidume que, se ocorrida ao longo da gestação, pode provocar nos fetos malformações como a microcefalia, ou, após o nascimento, surdez, cegueira e até morte. Em 2007, o total de crianças de até um ano de idade nascidas com a doença (forma congênita) foi de 5.535. A projeção para este ano é a do nascimento de mais de 22,5 mil bebês nesta condição. Onze anos atrás, o País registrou cerca de 1,8 mil casos de gestantes infectadas. Neste ano o total ultrapassará 40 mil. E por que o Brasil coleciona mais essa mazela? Atribui-se ao aumento de notificações – o problema já existiria, mas só agora sua real dimensão foi conhecida –, à falta de uma campanha de prevenção e, o mais grave, à falha na distribuição de medicamentos.
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É mais uma das vergonhas nacionais. Países como Canadá, Estados Unidos, Nicarágua e Barbados atingiram há três anos a meta estabelecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) de controle da doença (0,5 casos a cada mil nascidos vivos). No Canadá, por exemplo, em 2013 foram notificados os nascimentos de três bebês com sífilis. Nos EUA, no mesmo ano, foram 429. Enquanto isso, naquele período, o Brasil ultrapassou a marca de 13 mil crianças infectadas.
Os altos números também escancaram a falha na assistência às grávidas contaminadas. A sífilis tem tratamento seguro e eficaz tanto ao longo da gravidez, para evitar a transmissão da bactéria da mãe para o feto, quanto depois do nascimento. Na primeira circunstância, a indicação é a penicilina benzatina, e, na segunda, a penicilina cristalina. Portanto, bastaria a realização de um pré-natal como manda a cartilha – desde o início da gravidez e a aplicação do teste diagnóstico ao longo dos nove meses – e, em casos positivos, garantir às gestantes e aos bebês o acesso aos remédios. “É uma doença que pode ser prevenida e tratada. Mas a assistência materno-infantil no País é muito ruim”, afirma o infectologista Hélio Bacha, da Sociedade Brasileira de Infectologia.
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FALHA
Hélio Bacha, da Sociedade Brasileira de Infectologia: crítica ao tratamento e à prevenção
Há muitas mães que não fazem o teste ou o fazem no final da gravidez, quando o feto já está desenvolvido, e milhares que não recebem os medicamentos. Um informe do próprio Ministério da Saúde do início deste mês retratou a situação calamitosa do abastecimento de penicilina no País. Nos dia 28 e 29 de janeiro, o Departamento de Doenças Sexualmente Transmissíveis, Aids e Hepatites Virais constatou que 60% das 27 unidades da Federação não tinham a penicilina benzatina. E a do tipo cristalina faltava em todos os Estados.
O governo federal atribuiu o desabastecimento à falta mundial de matéria-prima para a fabricação dos remédios, produzida na China e na Índia. E que, embora a responsabilidade pelas compras seja dos Estados e municípios, empenha-se em sanar o problema. Na semana passada, anunciou a compra emergencial de 2,7 milhões de frascos da penicilina benzatina, a serem entregues no mês que vem. “O desabastecimento criou uma dificuldade a mais”, afirma Alberto Beltrame, secretário de Atenção à Saúde, do Ministério da Saúde. Novamente, o que se vê aqui é o governo correr atrás para tentar remediar uma tragédia já instalada. Há anos é assim com a dengue e agora com a zika e a sífilis.
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A sífilis é uma doença que pode ser evitada com o uso da camisinha, uma vez que a principal via de transmissão é a sexual (inclusive por meio do sexo oral). Desta maneira, sua prevenção exige o uso de preservativos nas relações. Mais uma falha do governo. Além de não informar a população sobre a doença e aprimorar os programas de planejamento familiar, não promove campanhas de prevenção.
“Os dados são assustadores”
Secretário de Saúde de São Paulo, o infectologista David Uip afirma que a explosão da sífilis não ocorreu do dia para a noite
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AVISO
David Uip: ''O poder público precisa intervir''
ISTOÉ – Por que a sífilis entre gestantes e bebês aumenta tanto no Brasil?
David Uip –
Os dados são assustadores. Alerto para essa situação há algum tempo. Não é algo que aconteceu do dia para a noite.
ISTOÉ – Quais as razões disso?
Uip –
Há uma banalização em torno das doenças sexualmente transmissíveis. Estamos vendo o crescimento de muitas dessas enfermidades. As pessoas precisam usar o preservativo nas relações. E o poder público precisa intervir.
ISTOÉ – Com que tipo de ações?
Uip –
É importante que o acompanhamento na gestação seja bem-feito, mas muitas grávidas não estão chegando ao pré-natal. No Brasil, 23% dos casos foram diagnosticados no terceiro trimestre de gravidez, o que significa que até então essas mulheres não tinham nenhuma assistência.
ISTOÉ – Quais os outros problemas?
Uip –
Muitas vezes a mulher faz o teste na primeira consulta apenas. Mas ela pode se contaminar durante a gestação. Dados indicam que 52% dos parceiros não foram tratados. Ou seja, a mulher continuava em risco. Além disso, em 16% dos casos as gestantes receberam tratamento inadequado. Tudo isso é muito preocupante.
Fotos: iStock; João Castellano/ISTOÉ; Fabiano Cerchiari

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Epidemia faz ampliar rede de atendimento~Fortaleza Ce

São quatro hospitais na Capital a compor a rede de referência. Antes, o encaminhamento era apenas para o HIAS
O Hospital e Maternidade José Martiniano de Alencar (HMJMA), no bairro Farias Brito, passou a integrar, nesta quinta-feira (25), a rede referência de hospitais do Estado no atendimento às crianças e mulheres grávidas de bebês com suspeita ou diagnóstico de microcefalia. Além do Hospital da Polícia Militar, como é conhecido, o atendimento especializado pode ser realizado no Hospital Geral Dr. César Cals, Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS), Hospital Geral de Fortaleza (HGF) e Hospital São José - todos na Capital.
Segundo Diana Austregésilo, pediatra e coordenadora da neonatologia do HMJMA, a unidade tem capacidade para atender a cerca de 20 bebês já notificados com microcefalia de Fortaleza e da Região Metropolitana por dia. O atendimento precisa ser marcado por meio da Secretaria da Saúde do Estado (Sesa) quando for constatada a suspeita da má-formação na unidade de saúde onde a criança foi consultada.
Outros hospitais da rede oferecem consultas, exames de imagem, sorologia e outros testes necessários para diagnóstico e acompanhamento médico. O HIAS vem acompanhando 150 casos suspeitos notificados pela Sesa. Os atendimentos ocorrem em dias de segunda e quarta-feira, mas exames e procedimentos podem ser marcados conforme a necessidade e em dias diversos.
O Albert Sabin foi escolhido como hospital de referência do SUS para atender aos casos de microcefalia no Ceará. De acordo com a assessoria do hospital, em novembro de 2015, quando começou a mobilização para o combate à doença, chegaram a ser atendidas dez mães com bebês por dia. Antes disso, costumava receber uma média de três casos por ano.
"As crianças nascem nas maternidades e, quando têm suspeita de microcefalia, vem para cá para o descarte ou para a confirmação, porque nós temos uma equipe interdisciplinar com geneticista, neurologista e infectologista. Se a microcefalia for confirmada, elas continuam sendo acompanhadas aqui", afirma a diretora-geral do Albert Sabin, Marfisa Portela. Segundo ela, o hospital tem recebido uma demanda espontânea.
Gestante
O infectologista pediatra do César Cals, Robério Leite, informa que a unidade recebe tanto as gestantes de casos suspeitos, oferecendo ultrassom morfológico, exames do líquido amniótico e atendimento psicológico, quanto os bebês suspeitos ou diagnosticados com microcefalia. Nesses casos, são realizados exames sanguíneos, visuais e auditivos e tomografia cerebral. Se a microcefalia for confirmada, o bebê é encaminhado ao HIAS. A unidade acompanha sete gestantes e, de novembro de 2015 até hoje, 10 foram notificadas.
Para o médico, o desafio do aumento da demanda por esse tipo de atendimento é a capacitação dos profissionais da saúde, já que poucos têm experiência com a doença. A ampliação da rede de atendimento às gestantes e crianças com microcefalia, segundo a Sesa, ocorre de acordo com as necessidades impostas pela atual situação epidemiológica. A pasta informa que promoveu a capacitação dos profissionais de saúde do Norte e de 450 profissionais do Programa de Saúde da Família e dos hospitais da Capital.
Casos
De acordo com o último boletim epidemiológico sobre microcefalia divulgado pela Sesa, de outubro de 2015 até a última segunda-feira (22), foram notificados 335 casos de microcefalia em 77 municípios. Desses casos, 33 foram confirmados. Cerca de 76,4% dos casos (256 dos 335) estão em investigação.
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quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

EUA investigam 14 casos de zika por transmissão sexual

Autoridades de saúde americanas estão analisando casos de mulheres que possam ter contraído o vírus por meio de relações sexuais

Mosquito Aedes aegypti, transmissor da Dengue
De acordo com as autoridades, todos os casos envolvem homens que visitaram áreas com surtos de zika e teriam infectado suas parceiras, que não tinham viajado para essas regiões(Paulo Whitaker/Reuters)
O Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês) dos Estados Unidos está investigando 14 casos de pessoas que teriam contraído o vírus zika por meio de relações sexuais. De acordo com as autoridades, todos os casos envolvem homens que visitaram áreas com surtos de zika e teriam infectado suas parceiras. Essas mulheres não tinham viajado para essas regiões. Algumas estão grávidas.
Segundo o CDC, duas dessas mulheres receberam a confirmação de estarem contaminadas pelo vírus. Os exames, no entanto, não foram concluídos. Por isso, o CDC ainda classifica os casos como "em investigação". Em quatro casos, os testes preliminares indicaram a suspeita de infecção. Oito ainda estão em fase inicial de investigação.

A transmissão do vírus zika por relações sexuais é considerada rara. Houve dois casos relatados, incluindo um recente no Texas. Outros dois relatos também da presença do vírus no sêmen. De qualquer forma, o CDC recomenda que todos os homens que viajaram para uma área com transmissão ativa do vírus zika usem camisinha ou se abstenham de contato sexual durante a gravidez da parceira.
Ainda não há evidências de que mulheres possam transmitir o vírus para parceiros sexuais, mas é necessário mais investigação sobre o assunto.
(Com Estadão Conteúdo)

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

O segredo de Michelangelo

Estudo revela que mestre do Renascimento sofria de severa artrite na velhice, período em que produziu obras-primas

Raul Montenegro (raul.montenegro@istoe.com.br)
As autoridades da Igreja da Santa Cruz, em Florença, onde está enterrado o corpo do artista renascentista Michelangelo Buonarroti (1475-1564), nunca permitiram que os restos mortais do mestre das esculturas fossem analisados pela ciência. Pesquisadores italianos e australianos, no entanto, descobriram em fevereiro uma forma de driblar a proibição para desvendar o segredo das mãos que criaram algumas das maiores obras de arte de todos os tempos, como a estátua de Davi e os afrescos da Capela Sistina, no Vaticano. Analisando pinturas e cartas, eles revelaram que em seus últimos 15 anos de vida Michelangelo sofria fortes dores nos dedos decorrentes de uma artrite degenerativa conhecida como osteoartrite. Apesar disso, o artista criou neste período obras-primas como a Pietà de Florença e os projetos da Basílica de São Pedro, a sede do catolicismo no mundo. “O diagnóstico oferece uma explicação plausível para a perda de destreza de Michelangelo na velhice, enfatizando seu triunfo sobre a enfermidade”,escreveram os responsáveis pelo estudo em artigo publicado no periódico científico “Journal of the Royal Society of Medicine”.
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DESCOBERTA
Michelangelo (acima) e as pinturas que permitiram ver que ele tinha artrite nas mãos (abaixo)
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A pesquisa comparou retratos de Michelangelo quando novo, feitos por Rafael Sanzio (1483-1520) e por ele mesmo, com três obras que mostram -no entre 60 e 65 anos. Os acadêmicos concluíram que a mão esquerda do artista não tinha sinais de artrite na juventude, mas que a doença estava instalada, em estágio avançado, na velhice. O mal acometeu principalmente seu polegar e indicador e pode ter sido acelerado pelas constantes marteladas e entalhes. “As deformações nas mãos são lesões típicas de degenerações de ossos e cartilagens causadas por traumas frequentes ao esculpir”, disse à ISTOÉ o cirurgião plástico Davide Lazzeri, que chefiou o estudo. “Os sintomas são enrijecimento e dores.”
A equipe de Lazzeri analisou ainda correspondências de Michelangelo nas quais ele reclamava de dores nas mãos e em outras articulações. Em 1552, a artrite causava desconforto quando o mestre escrevia. Em 1563, a doença havia se tornado tão severa que ele apenas assinava suas cartas. “Se acometer articulações que fazem o movimento de pinça dos dedos, você tem dificuldades para pegar numa caneta ou cortar um bife”, afirma José Goldenberg, reumatologista da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). “Imagine para um artista.” Mesmo assim, continuou desenhando e esculpindo até o fim, aos 88 anos, às vésperas de seu 89º aniversário. “O trabalho foi a salvação e a causa das mãos doentes de Michelangelo, que continuou em ação até seis dias antes da sua morte”, diz Lazzeri.
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HABILIDADE
A Pietà de Florença, uma das maravilhas que o mestre realizou apesar da dor que sentia
Apesar de suas obras mais famosas terem sido feitas entre os 20 e os 40 anos de idade, o próprio artista costumava dizer que “ninguém pode ser considerado um mestre antes do fim de sua arte e de sua vida”. Debilitado pela osteoartrite, criou obras-primas como uma série de Pietàs, incluindo a de Florença (na foto), e os desenhos da Catedral de São Pedro, em Roma, além de várias outras esculturas, pinturas e projetos arquitetônicos. Professor de história da arte da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e curador-chefe do Museu de Arte de São Paulo (Masp) entre 1995 e 1997, Luiz Cesar Marques Filho considera que em sua fase final Michelangelo usava muito a técnica “non finito”, um gosto pelo esboço comum a vários gênios que se libertam da execução pormenorizada em favor da elaboração da ideia. “Não acredito que isso se deva à artrite e até diria que as obras da velhice são as mais interessantes”, afirma.
Hoje, a osteoartrite é uma aflição que atinge 9,6% dos homens e 18% das mulheres acima de 60 anos no mundo, com 80% sofrendo limitações de movimentos e 25% impossibilitados de fazer atividades cotidianas, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). A realização de atividade física repetitiva por mais de 10 anos aumenta o risco em 9,3 vezes. Michelangelo entrou para as estatísticas dessa e de outras doenças, como atestam diversas pesquisas (leia quadro). Sua personalidade obsessiva, reclusa e antissocial fez com que se levantasse a hipótese de que fosse portador da síndrome de Asperger, uma forma de autismo, mas historiadores ainda especulam que ele possa ter sido contaminado por chumbo, uma enfermidade comum a pintores por causa do contato constante com tintas. A intoxicação às vezes carrega sintomas psicológicos, como a depressão, e também pode explicar o comportamento do mestre. Daqui para frente, a equipe quer confirmar as conclusões diretamente no cadáver de Michelangelo. Eles pressionarão as autoridades italianas para exumar o corpo e conduzir exames nos restos mortais. “A descoberta vai aumentar o interesse sobre a evolução da produção do artista ao longo de sua carreira”, afirma Lazzeri.
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FOTO: Marie-Lan Nguyen

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Começa a última fase de teste da vacina contra a dengue do Butantã

Governo federal assinou contrato com o instituto para financiamento da terceira etapa, com aplicação do imunizante em voluntários

Estadão Conteúdo
O governo federal assinou nesta segunda-feira, 22, o contrato com o Instituto Butantã para financiamento da terceira e última fase da pesquisa clínica para a vacina da dengue. O Ministério da Saúde vai investir R$ 100 milhões nos próximos dois anos para o desenvolvimento do estudo. A vacinação de um grupo de voluntários tem início nesta segunda, no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
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Assinatura de contrato entre o Ministério da Saúde e a Fundação Butantã para teste da vacina contra a dengue
A vacina, que será desenvolvida pelo Butantã em parceria com o National Institutes of Health, nos Estados Unidos, tem potencial para proteger contra os quatro tipos de vírus da dengue com uma dose. Ela será produzida com os vírus vivos, mas geneticamente enfraquecidos, com o objetivo de não provocar a doença.
Presente na cerimônia, a presidente Dilma Rousseff afirmou que o Brasil passa hoje por um momento "auspicioso" e que dá passos significativos na direção do desenvolvimento de uma vacina contra a dengue, mas que permanece o desafio de combater a proliferação do mosquito Aedes aegypti, transmissor da dengue, da febre chikungunya e do vírus zika - este último associado ao surto de microcefalia em bebês.
"O Brasil tem fortes institutos de pesquisa, laboratórios, o Butantã sem sombra de dúvida é um deles e dá passo significativo no momento que estamos presenciando hoje", afirmou Dilma. O governo espera que a vacina possa ser pentavalente (ter ação contra os quatro sorotipos da dengue mais a zika) ou que se desenvolva uma vacina contra a zika em paralelo - há convênios com os Estados Unidos nesse sentido. Segundo o diretor do Instituto Butantã, Jorge Kalil, estão sendo analisados 29 solicitações de parceria internacionais, a maioria de origem americana.
A presidente anunciou ainda R$ 8,5 milhões para financiar o desenvolvimento de pesquisas do soro contra a zika, que será voltada para grávidas já infectadas pelo vírus com o objetivo de evitar a transmissão ao bebê. Nesta terça-feira, 23, Dilma se reunirá com a diretora-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Margareth Chan.
"Entre o momento atual, em que ainda não temos a vacina, e o momento em que tivermos, temos que tomar uma atitude efetiva para evitar novos casos de crianças com microcefalia, casos de dengue, chikungunya. Temos só um processo para isso que é o extermínio dos criadouros do mosquito, do acúmulo de água limpa ou suja", afirmou Dilma.
A presidente destacou novamente que dois terços dos criadouros do mosquito encontram-se dentro das residências e enfatizou a campanha do governo federal para que a população dedique 15 minutos por semana para fazer uma faxina em casa e eliminar possíveis focos.
O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB) também participou da cerimônia, na Faculdade de Medicina da USP. O governador cumprimentou a presidente e demais autoridades presentes. Ele chamou o dia de "histórico" e elogiou a ação de "vanguarda" do Instituto Butantã em desenvolver a vacina, lembrando que ela poderá ajudar cerca de 2,5 bilhões de pessoas que habitam países tropicais e subtropicais.
Ao todo, 17 mil voluntários de 13 cidades nas cinco regiões do Brasil vão participar dos estudos clínicos que devem durar um ano. A expectativa do Instituto Butantã é disponibilizar a vacina contra a dengue em 2018.
A pesquisa será conduzida em Manaus (AM), Porto Velho (RO), Boa Vista (RR), Aracaju (SE), Recife (PE), Fortaleza (CE), Brasília (DF), Cuiabá (MT), Campo Grande (MS), Belo Horizonte (MG), São José do Rio Preto (SP) e Porto Alegre (RS).
Os estudos começam com 1,2 mil voluntários recrutados pelo Hospital das Clínicas. Eles têm entre 2 e 59 anos e residem na capital e na região metropolitana de São Paulo. Nesta segunda, dez pessoas serão vacinadas. Segundo a Secretaria de Estado da Saúde, o cadastro de interessados em participar do estudo passa de dois mil.
Nesta etapa da pesquisa, dois terços dos voluntários serão vacinados e um terço receberá placebo - uma substância com as mesmas características da vacina, mas sem o vírus, ou seja, sem efeito. A partir dos exames coletados, a intenção é descobrir se quem foi vacinado ficou protegido e quem tomou placebo contraiu a doença.
Os participantes serão acompanhados por um período de cinco anos, em que será verificada a duração da proteção oferecida pela vacina. O acompanhamento será feito por visitas programadas para coleta de amostras, contatos telefônicos e mensagens por celular.
O HC é um dos 14 centros credenciados pelo Butantã para a realização dos testes. Além do Hospital das Clínicas, a Santa Casa de Misericórdia de São Paulo também foi credenciada pelo Butantã para a realização dos testes na fase 3. A Secretaria Estadual da Saúde informou que o cronograma de vacinação de outros 12 centros será divulgado em breve.
Podem ser voluntários da pesquisa pessoas que estejam saudáveis, que já tiveram ou não dengue e que se enquadrem nas três faixas etárias: 2 a 6 anos, 7 a 17 anos e 18 a 59 anos. Os interessados em participar devem enviar e-mail para sac@butantan.gov.br.
O governo analisa outros R$ 100 milhões do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, por meio de um contrato da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). Outros R$ 100 milhões podem ser investidos ainda pelo Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES).

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Consultório dos estupros

Médico de Florianópolis é preso por abusar sexualmente de pacientes durante consultas. Segundo denúncia, crimes acontecem há pelo menos oito anos e envolvem mais de 50 vítimas

Camila Brandalise (camila@istoe.com.br)
Desde terça-feira 16, o telefone de H. V., 34 anos, não para de tocar. No mesmo dia em que o médico nutrólogo Omar César Ferreira de Castro foi preso em Florianópolis, acusado de ter estuprado 14 mulheres, ela se mobilizou para encontrar mais vítimas e instruí-las a, como ela já havia feito, denunciar os abusos sexuais sofridos durante as consultas. Mais de 50 mulheres a procuraram para relatar todo tipo de situação: comentários constrangedores, beijos forçados, pedidos de sexo oral e estupro após dopagem. Algumas situações datam de oito anos atrás. No caso de H., Castro teve ações semelhantes às relatadas por outras pacientes. Se posicionava de pé, atrás da mulher, para apalpar o pescoço e examinar a tireóide e os gânglios. Em seguida, apalpava os seios das pacientes e aproximava cada vez mais seu corpo ao delas. Na saída do consultório, outra aproximação forçada. Após registrar boletim de ocorrência, H. foi chamada para depor e se viu em outra situação constrangedora. “A mulher que tomou meu depoimento me questionou sobre a roupa que eu estava vestindo, sobre o fato de eu ter dado sinal de que queria a aproximação e ainda me aconselhou a não seguir adiante com a denúncia. Fiquei revoltada e decidi investigar por conta própria”, diz. Alguns dias depois, voltou ao consultório com um gravador. “Ele se aproximou de novo, fez comentários como ‘sua boca é gostosa’, e tentou me beijar. Depois disso, fui à delegacia pela segunda vez.”
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PRISÃO
O nutrólogo Omar César Ferreira de Castro no momento em que foi detido, na terça-feira 16
A primeira denúncia com uma prova contundente contra Castro foi feita no início de 2015. Uma servidora pública de 30 anos disse ter tomado um copo de água oferecido pelo médico e, depois, teve uma única lembrança da consulta: ela em uma maca, tentando empurrar Castro enquanto ele segurava uma camisinha. Dias depois, voltou ao consultório e, gravando a conversa, perguntou o que havia acontecido. “Tu não lembra? A gente transou duas vezes e foi bem gostoso”, respondeu ele. Com a gravação, um inquérito foi aberto, mas ficou parado até o depoimento de H. V. e uma mudança de delegado responsável, para então ser retomado. No total, eram 14 boletins de ocorrência contra o nutrólogo, motivando o Ministério Público a denunciar Castro à Justiça, que acatou o pedido. Preso provisoriamente, ele ficará detido até o dia 16 de março, data do fim das investigações.
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VÍTIMA
Paciente estuprada por médico gravou a confissão do crime e entregou à polícia
Dois dias após a prisão, outras 18 mulheres registraram boletins de ocorrência. Com a campanha de H. V. para encontrar mais vítimas, esse número deve aumentar nos próximos dias. “Queremos que a prisão temporária, de 30 dias, se torne preventiva. Nosso medo é de ele ficar solto e fugir.” Esse temor vem, principalmente, porque há uma lembrança recente de impunidade em um caso muito similar, o do ex-médico Roger Abdelmassih, preso em 2014 e condenado a 278 anos por estuprar 39 pacientes mulheres. Antes, Abdelmassih ficou três anos foragido no Paraguai enquanto as vítimas clamavam por sua condenação. Procurado pela reportagem, o advogado de Castro, Alceu Oliveira Pinto Júnior, disse que não vai se manifestar sobre o processo a pedido da família. O Conselho Regional de Medicina de Santa Catarina (CRM-SC) abriu uma sindicância para apurar as acusações e, em 30 dias, decidirá se haverá um processo contra o nutrólogo para cassação do registro profissional.
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Fotos: Betina Humeres/Agência RBS/Folhapress

domingo, 21 de fevereiro de 2016

No mundo virtual contra a depressão


Pacientes tratados com a ajuda de duas novas tecnologias apresentam melhora significativa dos sintomas da doença

Cilene Pereira (cilene@istoe.com.br)
Duas novas tecnologias estão sendo usadas com sucesso contra a depressão. A primeira é a realidade virtual, e segundo experimento realizado na University College London, na Inglaterra, reduz de forma importante os sintomas da enfermidade. A outra é o Skype. Médicos do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo (HC/SP) verificaram que o recurso pode substituir a consulta presencial sem qualquer prejuízo, melhora a adesão do paciente e reduz os índices de desistência do tratamento.
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PRATICIDADE
Acima, o psiquiatra Wagner Gattaz, que faz consultas por Skype no HC/SP
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A terapia virtual consiste em fazer com que a pessoa se submeta a uma imersão em um ambiente virtual construído para que ela atinja objetivos determinados. No caso de fobias, por exemplo, ela é exposto ao que lhe causa pânico até que não tenha mais medo. Em relação à depressão, o trabalho tinha por meta desenvolver nos pacientes a autocompaixão e menos autocrítica. Um dos traços mais comuns em pessoas depressivas é o rigor excessivo no julgamento de seus atos. O sentimento agrava as sensações de impotência e pessimismo que fazem parte dos sintomas.
Foram usados dois avatares (personagens virtuais), um adulto e uma criança estressada, chorando. Primeiro, o paciente via-se sob a perspectiva do adulto e era estimulado a consolar a criança, expressando compaixão por ela. Depois, trocava de lugar: assumia a posição da criança e ouvia o adulto dizer a ela as mesmas palavras. “Isso permitiu a eles experimentar a autocompaixão a partir da própria perspectiva”, disse à ISTOÉ Chris Brewin, coordenador da pesquisa.
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JOGO 
Acima, tela com avatares: imersão num ambiente virtual para atingir o objetivo
No Brasil, o psicólogo Christian Kristensen, da PUC/RS, também vê o recurso como algo promissor. Ele coordena um trabalho que usa a realidade virtual para tratar estresse pós-traumático de bancários ou clientes de bancos que passaram por assaltos dentro das agências e coleciona histórias bem-sucedidas. “É um recurso interessante porque permite que o paciente seja exposto, mas em ambientes controlados”, afirma.
No HC/SP, o estudo com o Skype envolveu 107 pacientes que haviam participado de duas consultas presenciais. Mais de 80% levavam até quatro horas entre deslocamentos para chegar à instituição. Após um ano submetendo-se a sessões mensais por meio do Skype de cerca de vinte minutos cada, 3% tinham abandonado o tratamento, contra 7% do grupo que fazia sessões presenciais. “É um meio eficaz pela facilidade do manejo que proporciona”, diz o psiquiatra Wagner Gattaz. Um dos empecilhos à disseminação do método é a proibição pelo Código de Ética Médica da realização de consultas não presenciais. “Mas não há razão para isso. No mundo há mais de 200 serviços de telepsiquiatria”, diz Gattaz.
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FOTO: FEIPE GABRIEL 

sábado, 20 de fevereiro de 2016

Novo tratamento para leucemia tem resultados surpreendentes

Mais de 90% dos pacientes com leucemia terminal submetidos ao método entraram em remissão. A técnica, que consiste em modificar geneticamente as células-T, foi divulgada durante o encontro anual da Associação Americana para o Avanço da Ciência, nos Estados Unidos

Os linfócitos T são células de defesa que protegem o nosso organismo de invasores como bactérias e vírus. Quando ocorre uma leucemia, estas células se multiplicam desordenadamente e se tornam cancerosas
No estudo, os pesquisadores reprogramaram os linfócitos T, células de defesa do organismo, dos pacientes, para destruírem o câncer. A técnica mostrou-se eficaz em 94% dos pacientes(Latinstock/VEJA)
Uma nova terapia contra o câncer está sendo considerada extraordinária após mostrar sucesso em 94% dos pacientes com leucemia terminal que foram submetidos a ela. A técnica, que consiste em reprogramar as células-T para atacar o câncer, foi divulgada em dois estudos apresentados no encontro anual da Associação Americana para o Avanço da Ciência, realizado em Washington, nos Estados Unidos, entre os dias 11 e 15 de fevereiro.
Em um dos estudos, realizado por pesquisadores do Fred Hutchinson Cancer Research Centre, nos Estados Unidos, 26 pacientes com leucemia linfoblástica aguda em estado terminal, que não haviam respondido aos tratamentos tradicionais, foram submetidos à terapia. No ensaio, "células-T assassinas", que agem destruindo tecidos infectados em nosso corpo, foram retiradas dos pacientes. Em seguida, elas foram modificadas geneticamente para projetar um novo mecanismo de segmentação - com o nome técnico de "receptores quiméricos de antígenos" - que atacasse o câncer.
Um ano e meio após este procedimento, 24 pacientes estavam em remissão completa, ou seja, não apresentavam mais sinais de câncer no corpo. "Estes primeiros dados são sem precedentes. Estes pacientes não haviam respondido a nenhum tratamento e obter tal taxa de resposta em casos tão avançados da doença é extraordinário. Uma dose única desta terapia colocou mais do que 90% dos pacientes em remissão completa, situação em que não se pode detectar qualquer destas células de leucemia", disse Stanley Riddell, principal autor do estudo.

Apesar dos resultados animadores, especialistas ressaltam que o experimento ainda é apenas um pequeno passo. Isso porque os efeitos colaterais deste tipo de tratamento são gravíssimos. Os pacientes podem desenvolver síndrome de liberação de citocinas, que pode causar febre, hipotensão e neurotoxicidade. Dois pacientes do estudo morreram devido a tais complicações
Os autores ressaltam que em função do estado de saúde dos pacientes, que tinham entre dois e cinco meses de expectativa de vida antes do experimento, esses resultados podem ser aceitáveis. Mas não seriam em caso de pacientes com tumores mais leves. Além disso, por enquanto, a terapia mostrou-se efetiva apenas em tumores líquidos como os de sangue. Ainda não se sabe quais seriam os resultados em cânceres sólidos, como o de mama.
Outro estudo envolvendo a manipulação genética de células-T também foi apresentado no encontro e mostra que elas podem durar anos em nosso corpo. No experimento, Chiara Bonini, hematologista do Instituto Científico São Rafael, em Milão, na Itália, injetou uma terapia imune - que incluiu células-T - em dez pacientes que haviam passado por transplante de medula. Exames realizados 14 anos após o tratamento mostraram que as células-T injetadas ainda estavam no organismo dos pacientes. Estes resultados indicam o potencial duradouro de terapias imunológicas.
"As células-T são como um medicamento vivo com o potencial de persistir no corpo por toda a nossa vida. Por exemplo, quando você recebe uma vacina na infância vocês estará protegido contra aquela doença pelo resto da vida. Por quê? Isso acontece porque a célula-T encontra o antígeno e se ativa, ela mata o agente patogênico. Mas ela também persiste no corpo como uma célula de memória. Agora imagine traduzir esse efeito para a imunoterapia do câncer, ou seja, ter células-T de memória que se lembram do câncer e estão prontos para atacá-lo sempre que ele retornar", explica Chiara.
(Da redação)

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Pesquisadores da UFRJ mapeiam genoma do Zika

Cientistas encontraram mais evidências de que a doença está relacionada a casos de microcefalia ao fazer o sequenciamento genético do vírus

Agência Brasil
Pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) conseguiram fazer o sequenciamento do genoma do vírus Zika e encontraram mais evidências de que a doença está relacionada a casos de microcefalia – uma malformação em que o bebê nasce com crânio de tamanho menor do que o normal e desenvolve danos neurológicos, afetando a cognição.
O anúncio é do Laboratório de Virologia Molecular, que analisou o vírus encontrado no líquido amniótico de grávidas de Campina Grande, na Paraíba. Com sequenciamento do genoma, eles identificaram a ordem completa das informações genéticas do vírus, um passo fundamental para entender como o Zika age no corpo, desenvolver vacinas e exames contra a doença.
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“Com essas informações poderemos tentar entender porque o vírus está preferencialmente infectando células neuronais das crianças e não infectando células neuronais de adultos e, no caso, das grávidas”, explicou o professor Renato Santana, envolvido nas pesquisas.
Os cientistas do laboratório da UFRJ conseguiram também isolar o Zika no cérebro de fetos com microcefalia e que morreram na Paraíba, logo depois do nascimento.
Os casos confirmados de microcefalia no país subiram 10% de uma semana para cá. No período, passaram de 462 para 508, sendo a maioria da região Nordeste. O Ministério da Saúde não informou o total de casos relacionados ao Zika. Na semana passada eram 41. Outros 3.935 casos de malformação estão em análise. Por causa da microcefalia, 27 bebês morreram.
O Ministério da Saúde acredita que houve infecção pelo vírus Zika na maior parte das mães que tiveram bebês, cujo diagnóstico final foi “microcefalia e/ou alterações do Sistema Nervoso Central, sugestiva de infecção congênita”. Pesquisadores trabalham também com a possibilidade de o Zika desencadear outras malformações em fetos.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

Brasil tem 508 casos confirmados de microcefalia

Outros 837 casos suspeitos da doença foram descartados e 3.935 estão sendo investigados

Primeiros pacientes com microcefalia a receber atendimento na Policlínica Lessa de Andrade, no bairro da Madalena, na zona oeste do Recife (PE)
Os 508 casos confirmados de microcefalia ocorreram em 203 municípios, localizados em 13 estados: Alagoas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul(Líbia Florentino/Leia Já Imagens/Estadão Conteúdo)
Os casos confirmados de microcefalia no Brasil subiram para 508, segundo boletim do Ministério da Saúde divulgado nesta quarta-feira. No último levantamento, anunciado na semana passada, o número de registros confirmados de microcefalia havia sido de 462. Outros 3.935 registros suspeitos ainda estão sendo investigados pelas autoridades, e 837 foram descartados.
As notificações foram registradas desde o início das investigações, em outubro, até 13 de fevereiro. Desse total, 60,1% dos casos (3.174) foram notificados em 2015 e 39,9% (2.106) este ano. Segundo o levantamento, o país também registrou 108 mortes de bebês com microcefalia ou outra alteração no sistema nervoso. Destes, 27 foram confirmados para essas alterações neurológicas, 11 descartados e 70 continuam em investigação.

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Os 508 casos confirmados de microcefalia ocorreram em 203 municípios, localizados em 13 estados: Alagoas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Amapá e Amazonas são os únicos estados que não tem nenhuma notificação da malformação.
(Da redação)

terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Comissão do Senado aprova projeto que autoriza venda de emagrecedores

Texto segue agora para avaliação no plenário da Casa; remédios deverão ser classificados como de 'tarja preta'

Estadão Conteúdo
A Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle (CMA) do Senado aprovou nesta terça-feira, 16, um projeto de lei que autoriza a produção e venda de remédios para emagrecer que contenham as substâncias sibutramina, anfepramona, femproporex e mazindol. O texto segue para avaliação no plenário do Senado.
Segundo emenda apresentada ao projeto, os medicamentos com essas substância deverão ser classificados como de "tarja preta" e a compra só poderá ser feita mediante a apresentação de uma receita médica especial, que ficará retida com o farmacêutico.
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Compra só poderá ser feita mediante a apresentação de uma receita médica especial
A comercialização desse tipo de medicamento já estava regulamentada no Brasil por uma resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que definia normas como a retenção de receita, a assinatura de um termo de responsabilidade pelo médico e de um termo de consentimento pelo paciente.
O projeto, no entanto, foi apresentado pelo deputado Felipe Bornier (PSD-RJ) para garantir em lei a permissão de comercialização dos inibidores de apetite e evitar que a agência volte a retirar os produtos do mercado, como ocorreu em 2011, quando a Anvisa proibiu o uso das substâncias.
"A Anvisa vem fazendo sua parte do trabalho, buscando cumprir sua missão de zelar pela segurança do usuário de medicamentos, mas entendemos que é preciso garantir em lei a disponibilidade dos anorexígenos no Brasil de forma a impedir que uma norma infralegal seja editado para retirá-los do mercado", destacou o relator na CMA, Otto Alencar (PSD-BA).

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

Zika pode provocar alteração neurológica até a idade escolar, dizem médicos

Atraso intelectual ou perda auditiva poderão ser associados à infecção
Estadão Conteúdo
Mulheres que tiveram suspeita ou confirmação de zika durante a gestação devem ter seus filhos monitorados
Microcefalia e graves problemas oculares podem não ser as únicas consequências do zika vírus em crianças infectadas na barriga da mãe. Com o avanço de casos no Brasil, especialistas passaram a afirmar que, no futuro, outros prejuízos neurológicos, como atraso intelectual ou perda auditiva, poderão ser associados à infecção e detectados somente no início da vida escolar.
O diagnóstico, no entanto, só poderá ser feito com propriedade se os bebês nascidos de meados do ano passado para cá, quando teve início a epidemia no País, receberem acompanhamento médico rotineiro. Especialistas ouvidos pelo Estado afirmam que todas as crianças de mulheres que tiveram suspeita ou confirmação de zika durante a gestação devem ter seus filhos monitorados, independentemente de quadros associados de microcefalia.
 "Isso é essencial, porque algumas alterações neurológicas podem ser detectadas futuramente apenas, como dificuldades de leitura e de aprendizado. Dar assistência às mulheres infectadas não quer dizer acompanhá-las até o parto, mas até que seus filhos cheguem à escola", diz o infectologista Jean Gorinchteyn, do Instituto Emílio Ribas.
A expectativa de que outros problemas de saúde possam ser relacionados ao zika vírus no futuro é explicada pela sua "semelhança" com algumas doenças também perigosas para gestantes como a rubéola, a toxoplasmose e a citomegalovirose. Todas podem provocar desde quadros de microcefalia a perda progressiva da visão, surdez e diferentes graus de atraso intelectual.
"Você pode apostar que vamos ter milhares de crianças com perímetro encefálico normal e que vão ter manifestações de atraso relacionadas ao zika, caso se confirme que o vírus segue mesmo o padrão dessas outras infecções. A criança pode não conseguir aprender a ler, por exemplo. E o quadro inicialmente ser de dislexia, de déficit de atenção", diz o médico geneticista da Apae-SP, Theoharis Efcarpidis.
Temor
Até o surgimento do zika, rubéola e toxoplasmose eram as doenças mais temidas por grávidas, apesar de mais facilmente controladas. A primeira tem vacina e a segunda pode ser evitada com hábitos simples, como ingerir alimentos bem cozidos. Mas, se infectadas, as gestantes podem transmitir essas doenças aos bebês, com consequências para o resto da vida.
Foi o que aconteceu de forma silenciosa com a enfermeira Carina Galvão do Nascimento, de 46 anos. Ela teve uma gravidez tranquila e deu à luz sua primeira filha em março de 2002 sem qualquer problema aparente. Mas, quando Catarina começou a engatinhar, a mãe reparou que havia algo errado com a visão da filha. "Ela tinha muita dificuldade para se locomover e ficava muito perto da TV", diz.
Preocupada, a enfermeira foi atrás de respostas e descobriu que Catarina tinha uma cicatriz no fundo dos olhos, provocada por uma lesão na retina. Segundo o médico oftalmologista que deu o diagnóstico, a causa foi uma infecção que Carina contraiu durante a gravidez, a toxoplasmose. "Eu tinha um cachorro na época, mas não se sabe se foi transmitida por ele, por carne crua ou por contato com algum gato. O fato é que só descobri que tive a doença depois que minha filha já havia nascido."
Com 13 anos, mesmo com dificuldades para enxergar, Catarina frequenta a escola e, segundo a mãe, é "a primeira aluna da sala". "Ela é um dos meus orgulhos. Chegou a usar lupa para conseguir copiar os escritos da lousa, mas hoje leva uma vida normal."

domingo, 14 de fevereiro de 2016

Zika não compromete Olimpíada no Rio, diz Dilma

A presidente Dilma Rousseff afirmou neste sábado (13) que o grande número de casos de zika no país não compromete a realização dos Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro, marcados para agosto deste ano. A afirmação foi feita durante visita ao bairro de Santa Cruz, na zona oeste do Rio, para participar do mutirão de combate a focos do mosquito Aedes aegypti, vetor da dengue, chikungunya e zika.
“Nós conseguiremos, até a Olimpíada, ter um sucesso bastante considerável nesse extermínio dos mosquitos. Agora, precisamos de vocês [da população]. Essa é uma obrigação do prefeito, do governador e minha. Agora, nós também apelamos para a consciência de cada um dos cariocas, homens, mulheres, crianças, para que nos ajudem nessa função”, disse Dilma.
Segundo a presidente, o Rio de Janeiro é um dos locais prioritários para o combate ao mosquito, justamente por causa da Olimpíada. Ela destacou, no entanto, que combater o vetor da zika não é um compromisso com as delegações estrangeiras, mas sim com o próprio Brasil.
“Isso não é um compromisso nosso com alguém do exterior. É um compromisso nosso conosco mesmo. É por conta da nossa importância que nós temos que fazer isso”, afirmou.
Dilma destacou que o Brasil e os Estados Unidos estão envolvidos em esforço conjunto para desenvolver uma vacina contra a zika, mas que enquanto não ela não é desenvolvida é preciso combater os criadouros do Aedes aegypti.

O governo federal lançará uma campanha de conscientização contra o aedes voltada para as crianças nas escolas.

sábado, 13 de fevereiro de 2016

O poder da nova meditação


No momento em que cada vez mais pessoas vivem sob pressão e estresse constantes, ganha força no Brasil o Mindfulness, técnica criada nas universidades, que pode ser praticada em casa e até no trabalho e auxilia em tratamentos de saúde

Fabíola Perez e Camila Brandalise
Você já lavou a louça prestando atenção somente no movimento das mãos? Ou tomou banho experimentando a sensação do sabonete ao tocar sua pele? Caminhou sentindo os pés pisarem no solo? A grande maioria das pessoas certamente responderia não a essas questões – e provavelmente as achariam tolas. Em um mundo cada vez mais acelerado, que exige respostas instantâneas, e onde ninguém tem tempo para nada, práticas cotidianas como as citadas acima são feitas no “piloto automático”.  Em contrapartida, médicos e psicólogos confirmam que nunca houve tanta gente sofrendo de estresse,  ansiedade e depressão. Número que cresce de forma assustadora, à medida que o mundo acelera, as demandas aumentam e o dia continua com as mesmas e insuficientes 24 horas. Com isso, estar atento ao momento presente se tornou quase impossível. Em busca de aliviar o estresse opressivo ou até não entrar em colapso, cada vez mais pessoas têm lançado mão da meditação. Mas de um novo tipo, diferente daquela associada a denominações religiosas, praticada em ambientes imaculados e tranquilos. Nascido em prestigiosas  universidades dos Estados Unidos e da Europa, o Mindfulness, chamado também de consciência ou atenção plena, está causando uma revolução no jeito de se meditar. Por meio de exercícios de respiração e concentração, a técnica ajuda a combater os males da nossa época de uma forma simples e pode ser adotada em todas as ações do cotidiano. Além disso, pesquisadores confirmam seus efeitos positivos à saúde. Já famoso internacionalmente, o Mindfulness ganhou força no Brasil e começa a ser estudado e aplicado em universidades, consultórios e também no Sistema Único de Saúde (SUS).
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HARMONIA
A meditação pauta a vida da apresentadora Fernanda Lima: ''Minha prioridade
é olhar o céu, o sol, pisar na areia, ficar com meus filhos. Depois vem todo o resto''
Ao contrário das meditações que exigem posições específicas, o Mindfulness tem como objetivo estimular o cérebro a perceber os movimentos do corpo e as sensações em qualquer situação. A apresentadora Fernanda Lima, 38 anos, medita há 16, desde que começou a praticar ioga. O dia a dia corrido não a impede de meditar. Ela conta que antes de dormir, tira o travesseiro da cama, fica com o corpo reto e faz os exercícios de respiração. Essa é uma das técnicas mais utilizadas pelo Mindfulness. Trata-se do “escaneamento corporal”, quando uma pessoa fica na posição horizontal e é estimulada a sentir todas as partes do corpo por meio da mente e da respiração. Segundo ela, os brasileiros precisam desmistificar a meditação. “Tento explicar que o objetivo é entrar em contato com os pensamentos, manter a respiração e organizar pensamentos por prioridades.” Fernanda também adotou o hábito de meditar pela manhã, antes de começar suas atividades. “Comprei um banquinho e fico respirando por 10 minutos, depois disso me sinto renovada.”
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As pesquisas sobre Mindfulness começaram em 1979, na Universidade de Massachussets, nos Estados Unidos. O médico Jon Kabat-Zinn desenvolveu um programa para reduzir o estresse baseado na prática. O método também foi estudado na Universidade de Oxford, na Inglaterra. “Foi o avanço científico que permitiu o boom que estamos vendo hoje”, afirma o psicólogo clínico Marcelo Batista de Oliveira, do Centro Paulista de Mindfulness. Aos poucos, conforme os estudos avançavam, os especialistas percebiam que esse tipo de meditação, que surgiu no meio acadêmico e era desvinculado de qualquer religião, conseguia reduzir os níveis de estresse e ansiedade dos pacientes. O segredo era colocar na rotina práticas diárias para exercitar o “estar presente”. Pioneira nos estudos dos benefícios do Mindfulness no cérebro, a neurocientista norte-americana Sara Lazar detectou, em 2005, que o córtex pré-frontal – a área do cérebro responsável pela concentração, memória e tomada de decisões – era mais estimulada no grupo de pessoas que faziam meditação. Em 2011, um segundo estudo revelou que as práticas meditativas provocam um aumento de volume em regiões da mente relacionadas à regulação emocional, à empatia e à cognição. Logo, o método avançou para outros países e chegou ao Brasil em 2006. Um dos primeiros nomes a investigar os efeitos do Mindfulness aplicado à saúde foi a neurocientista Elisa Kozasa,  pesquisadora do Hospital Israelita Albert Einstein. “Hoje existem diferentes estudos para redução de estresse, ansiedade, dor crônica e prevenção de recaídas para usuários de drogas”, diz ela.
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 Com isso, a nova meditação também ganhou força como técnica integrativa aos tratamentos de saúde convencionais. Desde setembro de 2015, as práticas de Mindfulness começaram a ser oferecidas pelo programa de extensão da Universidade Federal de São Paulo, em parceria com o SUS, no Centro Brasileiro de Mindfulnes e Promoção da Saúde. O coordenador do programa, Marcelo Demarzo explica que a principal aplicação da técnica é prevenir recaídas em casos de ansiedade, dor crônica e depressão. “As práticas diminuem em até 50% a chance de voltar a sentir esses males”, diz. “A pessoa se coloca como observador de si mesmo e faz uma espécie de desintoxicação do pensamento.” Funciona assim: as Unidades Básicas de Saúde enviam pacientes para fazer exercícios da prática. Eles passam por uma análise inicial, na qual é avaliado o grau de ansiedade, o estilo de vida e o uso de medicamentos. Com isso, eles podem ou não começar o curso de oito sessões.
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A psicóloga Malu Favarato, 51 anos, conheceu o Mindfulness no ano passado. Ela trabalha como voluntária na triagem de pacientes para o curso. “Para quebrar a rotina de estresse e sair do piloto automático faço algumas práticas por 20 minutos”, diz ela. “No começo era mais difícil, hoje me concentro na respiração com mais facilidade, levo a atenção para onde tenho dores.” A irmã e artista plástica, Milene, de 46 anos, tem transtorno bipolar e crises de depressão. Com a ajuda de Malu, fez o curso em outubro. “Em 2014, fui diagnosticada com artrose cervical, tomava antidepressivo, estabilizador de ânimo e ansiolítico”, afirma. Hoje a medicação já foi reduzida pela metade. “Mudou meu estilo de vida”, diz. A pesquisadora da Unifesp, Isabel Weiss, explica que esse é o objetivo da técnica. “São exercícios de respiração para acalmar. Os pacientes conhecem suas necessidades por meio do próprio corpo.”
No Brasil, Isabel foi a primeira a estudar os efeitos do Mindfulness para a prevenção de recaídas em usuários de drogas e fumantes. Nesses casos, foram desenvolvidas práticas específicas como o exercício “surfando na fissura”, no qual o usuário é conduzido a uma situação de desconforto e aprende a lidar com a onda de emoções do momento até passar. “Tendemos a reagir negativamente sempre”, diz. Atraída pelas práticas de atenção plena, a dermatologista Carolina Marçon fez o curso da Unifesp em novembro. “Nossas reações ocorrem baseadas na memória que temos de um fato e não no fato em si”, afirma. “Essas técnicas nos ancoram no momento presente.” Para ela, a meditação ajudou a tomar decisões sem uma carga emocional tão elevada, a ter mais discernimento e clareza. Hoje, recomenda o Mindfulness em seu consultório para ampliar os efeitos do tratamento convencional. “A pele está totalmente ligada às questões emocionais e ao sistema nervoso”, afirma. Nos EUA, existem casos de pacientes com psoríase que responderam melhor ao tratamento com a meditação.
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O Mindfulness também está sendo adotada no universo corporativo. “Para garantir a qualidade de vida, prevenir o burnout (ponto máximo de estresse) e desenvolver estratégias de liderança, a meditação é muito eficiente”, diz Demarzo, da Unifesp. Embora ainda precise ser mais difundido, o método praticado nas empresas, e mais disseminado entre profissionais da saúde, ajuda a desenvolver habilidades cognitivas importantes. Com um dia corrido, que exige ir de uma academia à outra para dar aulas, a personal trainer e professora de fitness Lara Magnet Dias, 41 anos, conta que a rotina de trabalho sempre lhe gerou ansiedade. “Me cobrava muito”, diz. Ao conhecer o Mindfulness, a maneira de lidar com a rotina mudou. “O meu dia é tão agitado quanto antes, mas lido de maneira diferente, com menos cobrança”, afirma. Lara também conta que dá mais valor aos momentos em que está com a filha, Isabela, de 2 anos. 
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Para o relações públicas Mateus Furlanetto, 37 anos, conhecer o método também ajudou no trabalho, mas ele aponta outro viés. “O que mais senti foi que consegui tirar de mim o sentimento de culpa por não estar fazendo e produzindo mil coisas”, diz. “Também acredito que hoje consigo dar uma dimensão real aos problemas, sem ampliá-los.” Para a empresária Fernanda Prando Godoy, 47 anos, meditar é tão essencial que ela tira um tempo no próprio escritório para a prática. “Sou uma pessoa ansiosa, lido com prazos e com pressão. Tento meditar duas vezes por dia, por 30 minutos.” Mas a experiência, claro, teve reflexos além da área profissional. “Hoje presto mais atenção na comida, coisa que nunca tinha feito. Noto a cor, o cheiro.” O bom da técnica é que não são necessários cursos dispendiosos e demorados para aprendê-la. Há uma série de aplicativos bastante didáticos disponíveis (leia ao lado).
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Por ter nascido em universidades e longe de um contexto religioso, o Mindfulness não impõem condições aos novos adeptos da prática. Não há contra-indicação e a experiência, dizem os especialistas e praticantes, é única e individual. Os benefícios surgem quando menos se espera. “Percebi o efeito da prática num dia que tive uma discussão com um cliente por telefone. Eu desliguei e o problema foi desligado junto. Em outros tempos, ficaria ruminando aquela situação por horas”, diz a empresária Fernanda Godoy. Ainda que as práticas de meditação sejam inúmeras e existam há milhares de anos, entender os mecanismos de como elas funcionam, a partir do espectro neurocientífico, é o que tem feito a nova meditação prosperar. “A ciência do Mindfulness avançou de uma tradição misteriosa para uma prática secular, benéfica e tão simples quanto escovar os dentes pela manhã”, afirma a neurocientista Claudia Aguirre, do aplicativo Headspace.
Foto: Ale de Souza, João Castellano/Istoé; Airam Abel, Airam Abel; João Castellano/Istoé 

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

Vacina contra Zika pode ser desenvolvida em até um ano, diz ministro da Saúde

Parceria entre o instituto Evandro Chagas, no Pará, e a Universidade do Texas, nos Estados Unidos, será a responsável pelo desenvolvimento da pesquisa

Agência Brasil
 O ministro da Saúde, Marcelo Castro, disse hoje (11) que uma parceria firmada entre o Instituto Evandro Chagas, no Pará, e a Universidade do Texas, nos Estados Unidos, possibilitará que a vacina contra o vírus Zika seja desenvolvida em até 12 meses.
Após essa etapa, a vacina ainda precisa passar por testes clínicos para, em seguida, começar a ser produzida e disponibilizada à população. Essa fase deve durar mais dois anos, totalizando três anos para que todo o processo seja concluído.
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 O ministro da Saúde, Marcelo Castro
Durante entrevista coletiva, o ministro destacou que a experiência de ambas as instituições no ramo das chamadas arboviroses (doenças causadas por vírus semelhantes ao Zika, como dengue, chikungunya e febre amarela) pode ajudar a reduzir o prazo para a formulação da vacina, já que o cronograma oficial de trabalho prevê o desenvolvimento das doses em dois anos.
O investimento brasileiro na parceria com os Estados Unidos, segundo ele, é de US$ 1,9 milhão para os próximos cinco anos. “Há um grande otimismo de que poderemos desenvolver essa vacina em um tempo menor do que o que estava previsto. Aproximadamente, dentro de um ano, poderemos ter a vacina desenvolvida, podendo ser menos. Depois, vêm os testes e ensaios clínicos e a produção da vacina para poder ser comercializada e aplicada”, ressaltou Castro.
No próximo sábado (13), uma mobilização nacional de combate ao Aedes aegypti vai levar cerca de 220 mil militares da Marinha, do Exército e da Aeronáutica às ruas. Os militares irão distribuir material impresso com orientações para a população sobre como manter a casa livre dos criadouros do mosquito. O Aedes aegypti é vetor da dengue, da febre chinkungunya e do vírus Zika, que pode causar microcefalia em bebês.
A meta é visitar 3 milhões de residências. A mobilização vai abranger 356 municípios, incluindo todas as cidades consideradas endêmicas, de acordo com indicação do Ministério da Saúde, e as capitais do país.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Otimismo para proteger o cérebro


Pesquisas revelam que manter uma postura positiva diante dos desafios garante mais raciocínio, atenção e memória 

Cilene Pereira (cilene@istoe.com.br)
Manter o otimismo é um recurso útil para proteger o cérebro do desgaste sofrido ao longo da passagem dos anos. Ele beneficia o raciocínio, a atenção, a fluência verbal e a memória durante o envelhecimento, segundo pesquisa divulgada na última semana pelo Trinity College Institute of Neuroscience, da Irlanda. O trabalho integra uma linha recente de estudos que abordam o peso da resposta de cada um aos desafios impostos ao corpo e à mente com o correr do tempo. Os pesquisadores usaram como base a avaliação de 4,1 mil adultos com mais de cinquenta anos sob dois aspectos: a síndrome da fragilidade (investigados pontos como a velocidade da marcha e a força motora) e as habilidades mentais. Nesse quesito, os participantes tiveram analisados seu senso de orientação, a linguagem, a atenção, a capacidade de visão e a memória. Eles também tiveram aferido se apresentavam uma visão negativa ou otimista em relação ao envelhecimento.
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POSITIVIDADE 
Aos 52 anos, a decoradora Regiane Ivanski (acima) mantém uma lista de objetivos. 
Abaixo, a psicóloga Mônica Portella, que aplica o ''otimismo funcional''
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Os que apresentavam uma percepção positiva manifestaram o melhor desempenho. Por abordagem otimista, entende-se, entre outros fatores, ser capaz de selecionar objetivos e compensar eventuais perdas de habilidades usando meios alternativos para alcançá-los. A decoradora Regiane Ivanski, de São Paulo, usufrui dos benefícios de agir assertivamente. Aos 52 anos e cheia de planos, mantém o cérebro afiado. “Tenho uma lista de objetivos e procuro me afastar de pensamentos negativos.”
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Na prática médica, começa-se a dar mais importância ao tema. “Se for preciso, o paciente é encaminhado à terapia psicológica para ajudá-lo a enfrentar o envelhecimento”, explica o geriatra Leonardo Piovesan Mendonça, do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, de São Paulo. No Rio de Janeiro, a psicóloga Mônica Portella aplica um treinamento para desenvolver o que chama de otimismo funcional. “É possível aprender a ser otimista”, diz. Deirdre Robertson, coordenadora da pesquisa irlandesa, compartilha da opinião. “A primeira coisa a fazer é reconhecer os pensamentos negativos e mudá-los”, disse à ISTOÉ.
Fotos: João Castellano/Istoé; Stefano Martini; Reprodução; Arquivo Pessoal