segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Dois mil cubanos chegam ao Brasil para segunda etapa do Mais Médicos

Fase de avaliação dos profissionais vai durar três semanas

Agência Brasil
ABr230913MCA_4950.jpg
De hoje (30) até o final desta semana chegam ao Brasil mais 2 mil médicos cubanos para a segunda etapa do Programa Mais Médicos. Hoje, os primeiros 135 profissionais de Cuba desembarcam em Vitória. Na próxima segunda-feira (7), os 2 mil cubanos iniciam o módulo de avaliação que tem duração de três semanas com aulas sobre língua portuguesa e o sistema brasileiro de saúde pública. As informações são do Ministério da Saúde.

Além dos 2 mil cubanos, os 149 médicos com diploma do exterior que foram selecionados para a segunda fase do Mais Médicos iniciam o módulo de avaliação no dia 7. As aulas ocorrerão no Distrito Federal, em Fortaleza, Vitória e Belo Horizonte.

Na primeira fase do Programa Mais Médicos, 400 profissionais cubanos chegaram ao Brasil e passaram por curso de formação e avaliação. A previsão do Ministério da Saúde é trazer ao país, até o final do ano, 4 mil médicos cubanos. Esses profissionais vêm ao Brasil por meio de um acordo intermediado pela Organização Pan-Americana da Saúde (Opas).

Assim como os médicos com diploma do exterior que se inscreveram individualmente, os cubanos que vêm pelo acordo com a Opas não precisam passar pelo Revalida (Revalidação de Diplomas Médicos Expedidos por Instituições de Educação Superior) e, por isso, terão registro provisório por três anos para atuar na atenção básica e com validade restrita ao local para onde forem designados.

domingo, 29 de setembro de 2013

Fio cirúrgico com células-tronco acelera a cicatrização de feridas

REINALDO JOSÉ LOPES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Para reparar feridas no intestino de cobaias, pesquisadores da Unicamp estão contando com a ajuda de "costureiras" microscópicas: as células-tronco mesenquimais.
Por meio de uma técnica complexa, patenteada pela universidade, eles descobriram como "colar" as células num fio de sutura cirúrgica.
As feridas costuradas com o fio especial cicatrizaram em 15 dias, quando o normal seria levar em torno de dez semanas. Por enquanto, a abordagem foi testada em ratos.
"Isso pode ser um avanço na área de regeneração de tecidos", diz a hematologista Ângela Malheiros Luzo, coordenadora do estudo.
Editoria de Arte/Folhapress
Ângela é orientadora do biólogo Bruno Bosch Volpe, cujo trabalho de mestrado foi o desenvolvimento da técnica e que deve continuar a refiná-la em seu doutorado.
As células-tronco mesenquimais estão em diversas regiões do corpo, como cordão umbilical e camadas de gordura --nesse último caso, é fácil obtê-las durante uma lipoaspiração, por exemplo.
"Preferimos células vindas da gordura porque, além de a obtenção não ser tão invasiva, é mais fácil fazer elas proliferarem", diz Ângela.
Ainda há dúvidas sobre a versatilidade desse tipo de célula. Sabe-se que elas dão origem a tecidos como osso e cartilagem e há indícios de que poderiam se transformar em músculos ou neurônios.
Testes iniciais mostraram resultados animadores para uma série de doenças, mas é possível que elas funcionem só como "suporte de vida" de órgãos lesados, produzindo substâncias que facilitem a cicatrização, por exemplo.
No caso das feridas intestinais estudadas, as fístulas (canal que une duas regiões que deveriam estar separadas), outros cientistas já tinham tentado amenizar a lesão aplicando células-tronco, sem grandes resultados.
Parece que o pulo do gato é o uso do fio especial para costurar a ferida. Volpe e sua orientadora acharam a receita correta para "colar" células vivas no fio, com a ajuda de uma substância chamada fibrina, e manter a proliferação delas antes da costura.
"O importante do trabalho não foi só o uso da cola. A questão era fazer com que as células saíssem do fio e tivessem efeito benéfico depois da sutura", diz a hematologista.
Outra vantagem da abordagem é que as células-tronco usadas em humanos seriam obtidas a partir do organismo do próprio doente, evitando a rejeição.
Não há datas para testes em pessoas, mas um alvo óbvio são as que têm doença de Crohn, problema com severos sintomas gastrointestinais e recuperação difícil.
Mas, diz Ângela, a técnica poderia melhorar a eficácia de suturas em outros casos, como em cirurgias plásticas.

sábado, 28 de setembro de 2013

Mais médicos- Federação promete fiscalizar hospitais do CE

Ao todo, 253 pacientes aguardam leitos em unidades de saúde de Fortaleza, segundo números da Fenam

Na semana em que as atividades do Programa Mais Médicos tiveram início em todo o Brasil, representantes da Federação Nacional de Médicos (Fenam) estiveram em Fortaleza para fazer uma avaliação das condições de atendimento nas principais unidades hospitalares da Capital. O resultado apurado reafirma, as deficiências e precariedades da estrutura dos serviços de saúde oferecidos à população da cidades. Diante disso, a diretoria da entidade prometeu investigar e fiscalizar o sistema.

Ontem, o secretário de Gestão Estratégica e Participativa do Ministério da Saúde, Odorico Monteiro, visitou a unidade de Horizonte FOTO: LUCAS DE MENEZES

De acordo com a instituição, o cenário encontrado mostra o contraste entre a superlotação e o subfinanciamento. Dados de ontem revelaram que, nos hospitais mais procurados pelos fortalezenses, a insuficiência de leitos não apresentou nenhum retrocesso nos últimos meses. Segundo João Batista, médico do Programa de Saúde da Família de Fortaleza, o relatório apontou que o Hospital Geral de Fortaleza (HGF), por exemplo, apresentava, ontem, 53 pessoas em estado de saúde grave estavam aguardando vagas.

No Hospital de Messejana, 50 pacientes com indicação de internação na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) se encontravam nos jardins da unidade, também sem perspectiva de auxílio. A situação se repetia no Hospital Infantil Albert Sabin (Hias), com 70 pessoas na fila de espera, e no Instituto José Frota (IJF), com 80 pacientes em corredores.

Relacionando os fatos à inauguração dos trabalhos do Mais Médicos no Estado, Batista afirma que a discrepância entre a demanda crescente de pacientes e a retração da quantidade de vagas ofertadas nas unidades é a principal responsável pelo acúmulo, e não a ausência de profissionais. Ele destaca, ainda, o subfinanciamento da saúde no País e a má gestão dos recursos como agravantes do quadro crítico. Segundo informações do Ministério da Saúde apresentadas pelo médico, nos últimos três anos, 13 mil leitos foram extintos no Ceará.

"O poder público espera o indivíduo adoecer para depois resolver o problema, o que acarreta custos muito maiores. E a categoria eleita culpada por esse caos são os médicos, mas a culpa da fila de espera é a gestão".

Denúncias

Além do diagnóstico exposto, o presidente da Fenam, Geraldo Ferreira, afirma que a instituição tem recebido denúncias de médicos de todo o Brasil integrantes do Programa Mais Médicos a respeito de irregularidades.

Conforme ele, no Estado do Rio Grande do Norte, profissionais que se hospedaram em hoteis, pois ainda não encontraram moradia, estão sendo ameaçados de despejo devido à falta de recursos para o pagamento das diárias. Na Bahia, médicos estão trabalhando em postos de saúde sem banheiros. Em outras localidades, Conselhos Regionais estão recebendo médicos com diplomas em línguas estrangeiras como russo e árabe solicitando registros profissionais, impasse que vem causando grandes dificuldades às entidades.

Na próxima segunda-feira, dia 30 de setembro, representantes da Fenam se reunirão com líderes do governo federal para discutir o Programa Mais Médicos. Ontem, O secretário de Gestão Estratégica e Participativa do Ministério da Saúde, Luiz Odorico Monteiro, visitou a Unidade Básica de Saúde José Gomes da Silva, no bairro Zumbi, em Horizonte, Região Metropolitana de Fortaleza (RMF).

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Câncer de mama avançado: uma questão social

Pesquisa aponta que 80% das brasileiras com câncer de mama avançado se queixam de falta de informações sobre a doença em fases avançadas

Câncer de mama
Dados do Instituto Nacional do Câncer (Inca) indicam que o câncer de mama é o tumor mais comum entre mulheres e o mais letal na faixa dos 35 aos 54 anos (Thinkstock)
Quando o assunto é câncer de mama os números nacionais mostram um cenário preocupante. Segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca), este é o tumor mais comum entre mulheres e o mais letal na faixa dos 35 aos 54 anos. Por ano, são registradas 13.000 mortes relacionadas à doença. O índice de mortalidade é um dos maiores do mundo. Segundo levantamento da pesquisadora Nahila Justo, diretora da consultoria Optum Insight, a cada dez mulheres diagnosticadas no Brasil, quatro vão morrer vítimas da doença.
Na Europa, o índice é de duas mortes para cada dez pacientes. O número elevado está relacionado ao diagnóstico tardio e à dificuldade de acesso a novas terapias, específicas para quadros de câncer avançado em diferentes estágios (metastático ou localizado). Um cenário que demanda urgência na criação de políticas e campanhas voltadas para pacientes com câncer de mama avançado (CMA), cujos desafios são bastante específicos.
O diagnóstico de câncer de mama é sempre difícil, mas as pacientes em fases avançadas da doença precisam lidar com um desafio adicional: mudar o foco de luta pela cura para controle e estabilização. Além disso, muitas encaram o avanço do câncer como um fracasso pessoal e acabam se isolando. Uma pesquisa global encabeçada pela Novartis Oncologia, cujos resultados foram revelados em junho deste ano, ajuda-nos a entender um pouco mais as perspectivas dessas mulheres.
A pesquisa "Count Us, Know Us, Join Us" (Conte-nos, Conheça-nos, Junte-se a Nós, em português) reuniu associações de pacientes de 12 países e contou com o apoio do Instituto Oncoguia e de outras instituições brasileiras, para dar voz a 1.273 mulheres com CMA. Os números reforçam o que percebemos no dia a dia do instituto: afastamento social, falta de informação e questões econômicas estão no topo da lista de problemas enfrentados pelas pacientes.
No Brasil, 49% das participantes da pesquisa 'Count Us' disseram sentir que ninguém entende o que estão enfrentando, 80% se queixaram da falta de informações sobre a doença em fases avançadas e 92% tiveram que adaptar seus gastos por conta do diagnóstico. A principal angústia das brasileiras, no entanto, é o preconceito relacionado às fases avançadas do câncer. Elas precisam adaptar-se às limitações impostas pela doença, mas não querem ser vistas como doentes terminais e acabam se afastando do convívio social.
Entre as entrevistadas no estudo, 66% pararam de trabalhar em determinado ponto, 61% afirmaram sentir menos vontade de participar de certas atividades e 60% tiveram seus hobbies prejudicados. Contudo, vale destacar que com tratamentos modernos, suporte multiprofissional e apoio dos familiares e amigos é possível proporcionar mais qualidade de vida para as pacientes com CMA. O primeiro passo é mudar a mentalidade de que o diagnóstico de câncer metastático é uma sentença de morte.
(Luciana Holtz é presidente do Instituto Oncoguia, formada em psicologia pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP) e especialista em oncologia e bioética. Em 2003, criou o Portal Oncoguia, que passou a ser referência por fornecer conteúdo de qualidade sobre câncer. O projeto deu origem ao Instituto Oncoguia, fundado em 2009, uma organização sem fins lucrativos que defende os interesses dos pacientes com câncer e atua como fonte segura de informações para a população. Com Estadão Conteúdo)

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

CFM irá contestar na Justiça resolução farmacêutica

Para a entidade, apenas o médico possui permissão para diagnosticar doenças e prescrever medicamentos

Remédios
CFM se posiciona contra decisão tomada pelo CFF: segundo entidade, prescrição farmacêutica de remédios pode levar à automedicação (Jupiterimages/ Thinkstock)
Em nota divulgada nesta quarta-feira, o Conselho Federal de Medicina (CFM) anunciou que irá questionar na Justiça a resolução publicada pelo Conselho Federal de Farmácia (CFF) que permite a prescrição de alguns medicamentos por farmacêuticos. De acordo com o órgão, a decisão não possui amparo legal, na medida em que a legislação que regulamenta a profissão do farmacêutico não contempla a prescrição de remédios como uma das funções atribuídas ao profissional. Além disso, a Lei do Ato Médico esclarece que cabe apenas ao médico a prevenção, o diagnóstico e o tratamento de doenças.
Ainda segundo o CFM, o fato de farmacêuticos poderem prescrever medicamentos pode induzir as pessoas à automedicação e a tentarem resolver seus problemas de saúde no balcão da farmácia, em vez de procurarem um atendimento médico. O órgão defende a ideia de que sintomas aparentemente simples, como dores de cabeça, podem indicar problemas graves, como um acidente vascular cerebral.
Resolução — Nesta quarta-feira, Dia Internacional do Farmacêutico, foi publicada no Diário Oficial da União uma resolução do CFF que passa a permitir que profissionais da categoria receitem medicamentos que não exigem prescrição médica, como analgésicos, medicamentos tópicos e fitoterápicos.

AGU acusa conselhos de medicina de 'ação orquestrada' contra Mais Médicos

Em requerimento enviado à Procuradoria-Geral da República, o órgão alega que CRMs agem com fins 'nitidamente procrastinatórios'

Marcela Mattos, de Brasília
Médicos estrangeiros do programa "Mais Médicos", visitam a Casa de Apoio à saúde Indígena
Médicos estrangeiros do programa "Mais Médicos", visitam a Casa de Apoio à saúde Indígena (Ueslei Marcelino/Reuters)
Em mais uma investida do governo contra os conselhos regionais de medicina, a Advocacia-Geral da União (AGU) pediu, na tarde desta quarta-feira, que a Procuradoria-Geral da República (PGR) investigue se as atuais medidas adotadas pelas entidades e seus dirigentes configuram-se em condutas ilícitas. No requerimento protocolado no fim desta tarde, a AGU afirma que os conselhos realizaram uma “ação orquestrada” e com fins “nitidamente procrastinatórios” para dificultar o início do programa Mais Médicos. Ainda não há prazo para que o novo procurador-geral, Rodrigo Janot, dê uma resposta. Por isso, a AGU já tem outra ação preparada: na próxima semana, vai recorrer à Justiça contra pelo menos cinco conselhos de medicina com o objetivo de tornar obrigatório, sob o risco de multa, a expedição dos registros provisórios.
Ao longo de 22 páginas do requerimento entregue à PGR, a AGU exalta a importância do Mais Médicos para a superação do déficit de profissionais no interior do país, a quantidade de ações ajuizadas — e derrubadas — contra o programa, e a cobrança de documentações além das previstas na medida provisória. O texto diz ainda que a redação da MP é suficiente para que os conselhos concedam o registro provisório e que, para rigor legal, “nada mais seria necessário encaminhar para os CRMs”.
A AGU ainda cita nominalmente alguns dos conselhos mais problemáticos, como o do Rio Grande do Sul, Minas Gerais e São Paulo. No caso do CRM-MG, o documento alega que a entidade informou à imprensa que iria recorrer à polícia caso os médicos cubanos não tivessem os diplomas revalidados. Para a entidade, as ameaças “demonstram o claro desprezo às leis” às quais o órgão está submetido e que a conduta foi, “no mínimo, antiética”.
Atrasos — Após passar por um adiamento de uma semana, os médicos estrangeiros começaram a trabalhar nesta segunda-feira com desfalque: apenas 87 profissionais receberam o registro provisório, condição para o exercício da profissão no caso dos estrangeiros ou brasileiros formados no exterior.
De acordo com o último balanço do Ministério da Saúde, divulgado nesta quarta, dos 280 pedidos de registro feitos pelo ministério cujo prazo máximo de expedição expirava nesta terça-feira, 202 não foram entregues. Dos 682 médicos inicialmente previstos para atuar nesta primeira etapa do programa, apenas 122 já têm o registro em mãos. Enquanto o governo acusa as entidades de criar dificuldades, o Conselho Federal de Medicina aponta irregularidades na documentação apresentada e afirma que pelo menos 80% dos casos ainda estão no prazo de 15 dias para a concessão do documento.
Justiça — Ao protocolar o documento na AGU, o procurador-geral da União, Paulo Henrique Kuhn, informou que na próxima semana vai entrar com ações na Justiça contra pelo menos cinco conselhos: São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Maranhão e Amazonas. “Estamos prontos [para entrar na Justiça]. Na verdade faltavam alguns ajustes técnicos, mas estamos nos aprontando”, afirmou.
O representante da AGU explicou ainda que o requerimento protocolado nesta quarta-feira não tem o intuito de forçar os conselhos a liberar o registro provisório, o que justifica recorrer à 1ª instância. “Na Justiça é um processo mais contundente, uma ação com o objetivo de obter uma decisão judicial rápida. Vamos obrigar os conselhos, em um prazo determinado sob o risco de multa, a expedir os registros”, explicou.
CFM — Em nota, o CFM afirma que os conselhos regionais irão prestar todos os esclarecimentos solicitados pela PGR. "A análise criteriosa e as exigências para a emissão dos registros provisórios tiveram como objetivo apenas assegurar o cumprimento das normas expressas na MP 621/2013."
A entidade alega ainda que o atraso na emissão dos registros tem dois fatores: "a demora do Ministério da Saúde em proceder a entrega dos dossiês para análise, sendo que a grande maioria ainda se encontra nos prazos legais para emissão; o segundo é que muitos dos dossiês que são entregues apresentam inconsistências que ferem as próprias exigências da MP 621, como diplomas não legalizados (sem o carimbo do Consulado Brasileiro dos países onde foram emitidos) e formulários com erros básicos de preenchimento."

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Estudo indica que fobia pode ser tratada durante o sono

Segundo os autores, esta foi a primeira vez que a memória emocional foi manipulada em humanos durante o sono

Insônia e apneia do sono
Sono: a exposição a uma memória que causa medo durante o sono pode ajudar na superação do trauma (Thinkstock)
Ser exposto durante o sono a uma memória que causa muito medo (uma fobia) pode ajudar a reduzir o trauma. É o que indica um estudo realizado por pesquisadores da Universidade Northwestern, nos Estados Unidos, e publicado no periódico Nature Neuroscience. De acordo com os cientistas, essa foi a primeira vez que a memória emocional foi manipulada em humanos durante o sono. A descoberta pode contribuir para a terapia de exposição, um tratamento comum para fobias, mas que costuma ser realizado apenas com o paciente desperto — nele, há uma exposição gradual do objeto ou da situação que provoca temor, até que o trauma seja superado.
CONHEÇA A PESQUISA

Título original: Stimulus-specific enhancement of fear extinction during slow-wave sleep

Onde foi divulgada: periódico Nature Neuroscience

Quem fez: Katherina K. Hauner, James D. Howard, Christina Zelano e Jay A. Gottfried

Instituição: Universidade Northwestern, EUA

Dados de amostragem: 15 voluntários

Resultado: Os pesquisadores observaram que ao serem expostas durante o sono a uma lembrança que causa reações de medo, as pessoas apresentaram menos medo dessa mesma memória ao despertar
O estudo foi realizado em duas etapas com 15 voluntários. Em um primeiro momento, os voluntários tiveram de observar dois rostos distintos enquanto recebiam pequenos choques elétricos. Eles também foram expostos a um odor específico ao ver cada um, de forma que o rosto e o cheiro fossem associados ao medo — no caso, de receber um choque. O medo foi medido de duas maneiras: através da quantidade de suor na pele e por meio de imagens de ressonância magnética.
Na segunda etapa da pesquisa, o foco era 'apagar' ou reduzir o medo criado previamente. Assim, cada pessoa foi exposta, enquanto dormia, a um dos dois odores que tinham sido usados no “treinamento”. Isso ocorreu durante o sono de ondas lentas, fase relacionada à consolidação da memória.
“Quando esse odor estava presente durante o sono, ele estava reativando a lembrança do rosto que tinha sido observado pela pessoa ao sentir aquele cheiro, de forma similar ao processo de extinção do medo que ocorre durante a terapia de exposição”, disse Katherina Hauner, integrante da equipe de pesquisadores.
Ao acordar, os participantes foram expostos novamente aos dois rostos. Quando eles viram a face relacionada ao cheiro ao qual tinham sido expostos durante o sono, suas reações de medo foram menores do que as reações ao outro rosto. “Mostramos uma redução pequena, mas significativa do medo. Se isso puder ser estendido a um medo que já existia, talvez o tratamento de fobias possa ser melhorado durante o sono”, explica Katherina.

terça-feira, 24 de setembro de 2013

São Paulo ainda não deu nenhum registro para estrangeiros

Cremesp afirma que encontrou falhas na documentação apresentada e aguarda posicionamento do governo

Médicos estrangeiros começam treinamento para trabalhar no Brasil. o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, abriu hoje, em Brasília, o primeiro curso de avaliação dos profissionais que já chegaram ao país
Médicos estrangeiros começam o treinamento para trabalhar no Brasil. Até esta segunda-feira, apenas os conselhos regionais de medicina do Rio Grande do Sul, Bahia, Ceará e Pernambuco liberaram os profissionais para participar do programa governamental (Evaristo Sa/AFP)
O início das atividades dos 55 profissionais formados no exterior selecionados para atuar no estado de São Paulo pelo programa Mais Médicos continua travado e sem previsão para acontecer. Até esta segunda-feira, nenhum registro havia sido concedido pelo Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp), que aguarda posicionamento do Ministério da Saúde sobre inconsistências apontadas na documentação apresentada.
Na última sexta-feira, representantes da Advocacia Geral da União (AGU) e do ministério se reuniram na sede do Cremesp para buscar um entendimento com a entidade, e tentar agilizar a emissão dos documentos. O governo se comprometeu a analisar as falhas apontadas durante o fim de semana para que os possíveis problemas fossem sanados o mais rápido possível, evitando mais atrasos.
No entanto, o dossiê apresentado pelo Cremesp na sexta-feira só foi protocolado nesta segunda-feira no Ministério da Saúde, segundo a AGU, que informou que os documentos começariam a ser analisados na própria segunda e ainda não havia conclusão.
Em São Paulo, pelo prazo de quinze dias que o governo deu ao conselho para analisar os pedidos, 46 expiraram nesta segunda-feira. Seis vencem na quarta e três só no dia 3 de outubro. Enquanto o registro não é fornecido, esses médicos ficarão nas cidades alocadas aguardando autorização para trabalhar. Por enquanto, estão visitando as unidades de saúde.
Pelo país — Além de São Paulo, Rio de Janeiro, Maranhão, Paraná, Pará, Santa Catarina, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso, Amazonas, Mato Grosso do Sul e Piauí também não concederam registro alegando pendências nos documentos. Um levantamento feito pelo jornal Estado de São Paulo em 23 conselhos regionais (com exceção de Minas Gerais, Distrito Federal, Roraima e Sergipe), aponta que até esta segunda-feira foram concedidos ao menos 158 registros aos médicos estrangeiros, o que representa 23% do total.
No entanto, em nota divulgada no final desta segunda-feira, o Ministério da Saúde informou que foi notificado de um número bem menor de registros: 87. De acordo com a pasta, foram liberados até o momento 28 médicos na Bahia, 29 no Ceará, onze em Pernambuco e dezenove no Rio Grande do Sul.
O governo já começou a trabalhar para tentar corrigir falhas na entrega dos documentos. A ideia é criar a figura de um responsável por grupos de até 50 médicos, que ficará encarregado de reunir os documentos e enviá-los para os conselhos regionais.
(Com Estadão Conteúdo)

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

CRMs liberam apenas 39 médicos estrangeiros para trabalhar

Conselhos regionais de saúde e Ministérios da Saúde ainda não têm acordo sobre a necessidade de documentação

Grupo de 79 médicos selecionados pelo programa Mais Médicos, do governo Federal, participa de curso na Escola de Saúde pública do Ceará
Grupo de 79 médicos selecionados pelo programa Mais Médicos, do governo Federal, participa de curso na Escola de Saúde pública do Ceará (Jarbas Oliveira/Folhapress)
Os 681 médicos estrangeiros – entre eles 400 cubanos - que estão no país para participar do programa Mais Médicos do governo federal deveriam começar a trabalhar nessa segunda-feira. Os conselhos regionais de medicina (CRMs), no entanto, liberaram até agora apenas 6% (39) dos 633 registros provisórios já pedidos pelo Ministério da Saúde. O programa para reduzir o déficit de médicos em regiões mais carentes permite a participação de profissionais sem a validação de diplomas estrangeiros, o Revalida. A classe médica contesta isso na Justiça.
De acordo com informação do Ministério, foram  fornecidos até a última sexta-feira doze registros no Ceará e 27 na Bahia. Há ainda  a promessa de que outros 45 registros sejam entregues até o final desta segunda-feira — dezenove no Rio Grande do Sul, seis na Paraíba e vinte no Ceará.
Queda de braço - Em nota divulgada na sexta-feira, o Conselho Federal de Medicina (CFM) orienta os conselhos regionais a conceder o registro provisório dos profissionais com documentos em dia, mas sob a condição de que o Ministério da Saúde, num prazo de quinze dias contados da entrega do documento, informe o endereço de trabalho, nomes dos tutores e dos supervisores dos profissionais.
Em nota divulgada também na sexta-feira, o MS afirma que não foi feito qualquer acordo com o CFM para "alterar o rol de documentos e informações para concessões dos registros". Sobre as informações que a entidade usa como condição para realizar os registros, a pasta afirma que "as informações sobre tutoria, supervisão e municípios de treinamento em serviço dos médicos serão tornadas públicas, mas não podem ser exigidas para a concessão de registro, pois não há previsão para isso em Lei ou em sua regulamentação".

domingo, 22 de setembro de 2013

O sono da beleza

Pela primeira vez, estudos científicos identificam os prejuízos à saúde da pele causados pela falta de sono. Entre eles estão a maior quantidade de rugas e a baixa capacidade de manter bons níveis de hidratação

Cilene Pereira
Nos primeiros estudos do gênero feitos até hoje, pesquisadores americanos confirmaram a antiga suspeita de que dormir mal danifica a pele. Um dos trabalhos foi realizado pela University Hospitals Case Medical Center, nos Estados Unidos. Os cientistas constataram que poucas horas de sono ou um repouso de qualidade ruim aumentam a velocidade da formação de rugas e a quantidade de manchas e reduzem de forma significativa a capacidade de a cútis se proteger e de se recuperar da agressão de fatores como a poluição. Coordenado pela pesquisadora Elma Baron, o trabalho foi apresentado no Encontro Internacional de Dermatologia Investigativa, realizado recentemente em Edimburgo, na Escócia. “Nossa pesquisa é pioneira em demonstrar de maneira conclusiva que o sono inadequado está relacionado à má saúde da pele e ao seu envelhecimento precoce”, afirmou Elma.
chamada.jpg
REFLEXOS
Elma (à frente) avalia a coloração das olheiras formadas pelo
pouco sono em participante de uma das pesquisas
A médica e sua equipe avaliaram as condições de pele e de sono de 60 mulheres com idades entre 30 e 49 anos. Metade delas apresentava uma má qualidade de sono. Os pesquisadores encontraram diferenças importantes entre as que dormiam bem e aquelas que não desfrutam de um bom descanso. Esse segundo grupo apresentava maior quantidade de rugas, manchas e diminuição da elasticidade da pele, o que resulta em maior flacidez. Além disso, a cútis dessas mulheres manifestava menor capacidade de recuperação de agentes estressores. Sua regeneração após exposição solar sem proteção levou mais de 72 horas, indicando que a inflamação instalada não foi combatida de forma eficiente. Outra constatação: a habilidade de manter a hidratação foi 30% maior na pele das participantes que dormiam bem.
A outra investigação a respeito do impacto do sono para a aparência foi conduzida na Universidade de Michigan, nos Estados Unidos. Também de forma pioneira, os pesquisadores demonstraram os benefícios para esse fim do tratamento da apneia do sono. A doença é caracterizada por ronco e pela interrupção súbita e passageira da respiração durante o sono. Além de estar relacionada a problemas cardíacos e maior risco de cansaço, falta de concentração e de irritação nos dias seguintes, a enfermidade também pode imprimir um aspecto mais pesado ao semblante.
01.jpg
Os cientistas, especializados no tratamento de doenças do sono, decidiram comprovar a impressão que tinham quando se deparavam com pacientes tratados corretamente. “Eles sempre nos pareciam muito mais saudáveis”, disse à ISTOÉ Ronald Chervin, diretor do Centro de Distúrbios do Sono da universidade americana. Os pesquisadores avaliaram as mudanças na aparência de 20 pacientes meses após o início do tratamento, que consistiu no uso regular – e em casa – de um aparelho que mantém constante o fluxo de oxigênio durante o sono. Para analisar as transformações, eles utilizaram recursos da cirurgia plástica (como uma espécie de mapeamento digital da face para a identificação de irregularidades na pele) e também contaram com as opiniões de 22 pessoas convidadas a apreciar as fotos dos participantes antes e depois do uso do equipamento sem que soubessem quando as imagens eram anteriores ou posteriores ao tratamento.
Nos exames mais precisos, a melhora na qualidade da pele foi notável. A testa, por exemplo, estava menos inchada e a tonalidade da pele, menos avermelhada. E, em 75% das vezes, os convidados apontaram que os pacientes, após o tratamento, pareciam mais alertas, jovens e atraentes. Os pesquisadores pretendem usar os resultados para estimular os portadores da doença a aderir ao tratamento. Há uma dificuldade em fazer com que o paciente use o aparelho (uma máscara), apontado como algo desconfortável. “Queremos que eles saibam que há outros benefícios, além da melhora na qualidade do sono”, completou à ISTOÉ.
02.jpg
Os cientistas irão aprofundar as investigações para descobrir de que forma a falta de sono traz esse tipo de dano a pele. Mas eles já têm algumas hipóteses. “Dormir mal pode induzir o surgimento de estresse oxidativo na pele ou torná-la menos capaz de se defender dele”, disse à ISTOÉ Elma Baron. A cientista se refere a um fenômeno já descrito pela ciência e associado a danos no material genético das células e ao seu envelhecimento precoce. A pesquisadora recomenda que os indivíduos tenham entre sete e nove horas de sono por noite. “Mas, se isso não for possível, as pessoas podem recorrer a produtos com propriedade antioxidante e também se proteger diariamente usando filtro solar.”

sábado, 21 de setembro de 2013

Tempo mais curto de radioterapia pode ser a melhor opção para tratar câncer de mama

Pesquisa mostra que um tratamento curto, de apenas três semanas, tem o mesmo efeito contra o tumor, mas produz menos efeitos colaterais

Câncer de mama
Câncer de mama: tratamento de radioterapia mais curto pode ser mais convenientes às mulheres, diminuir as filas dos hospitais e economizar dinheiro do sistema de saúde (Thinkstock)
Uma nova pesquisa publicada nesta quinta-feira na revista The Lancet Oncology mostra que um período de tratamento mais curto de radioterapia, de apenas três semanas, possui os mesmos efeitos benéficos que o tratamento padrão de cinco semanas. "Além do mais, mostramos que as três semanas de radioterapia causam menos danos aos tecidos próximos à mama e são mais convenientes para as mulheres — causando menores listas de espera e menos visitas ao hospital", afirma John Yarnold, professor do Instituto de Pesquisas do Câncer, na Inglaterra, e autor do estudo.
CONHEÇA A PESQUISA

Título original: The UK Standardisation of Breast Radiotherapy (START) trials of radiotherapy hypofractionation for treatment of early breast cancer: 10-year follow-up results of two randomised controlled trials

Onde foi divulgada: periódico The Lancet Oncology

Quem fez: John Yarnold, entre outros pesquisadores

Instituição: Instituto de Pesquisas do Câncer, na Inglaterra; entre outras

Dados de amostragem: 4.451 mulheres de 35 centros de radioterapia em todo o Reino Unido selecionadas entre 1999 e 2002.

Resultado: Os pesquisadores descobriram que o tratamento padrão de radioterapia, que oferece uma dose de  50 Gy administrada durante cinco semanas é tão eficiente quanto um tratamento mais curto, de 40 Gy em três semanas. Além disso, o tratamento mais curto causa menos danos ao tecido saudável das mulheres que passavam por ele.
Para chegar a esse resultado, os pesquisadores recrutaram 4.451 mulheres de 35 centros de radioterapia em todo o Reino Unido, entre 1999 e 2002, e dividiram sua pesquisa em duas etapas. A primeira comparou o efeito do tratamento padrão, que aplica uma dose total de 50 grays (Gy, a medida internacional para a quantidade de radiação absorvida) fornecida em 25 pequenas doses de dois grays ao longo de cinco semanas, com outros dois tratamentos de igual duração, mas que forneciam doses mais fortes. Neles, eram aplicadas apenas treze doses, mas cada uma com 3,2 ou 3 grays.
Após dez anos dos tratamentos, as taxas de controle do tumor entre os três grupos foram bastante semelhantes, com poucas mulheres experimentando a volta do câncer, e com um dano muito semelhante ao tecido mamário saudável em volta do tumor. Os pesquisadores provaram, assim, que doses mais fortes de radioterapia poderiam ser aplicadas nas mulheres sem lhes causar grandes efeitos colaterais.
Três semanas — Na segunda etapa do estudo, os pesquisadores pretenderam analisar se essas doses maiores de radiação poderiam ser aplicadas em um período menor de tempo, encurtando o tratamento. Assim, compararam o tratamento padrão — 50 grays administrados em pequenas doses de dois grays durante 5 semanas — com um mais curto, de apenas três semanas, que fornecia 40 grays divididos em doses de 2,67 grays.
Do mesmo modo, o número de mulheres cujo câncer de mama reapareceu dentro do período de dez anos foi semelhante — e baixo — nos dois casos (5,5% depois do tratamento com 50 grays e 4,3% depois dos 40). No entanto, após o período mais curto de tratamento houve significativamente menos danos ao tecido saudável que circundava a mama, demonstrando menos efeitos colaterais. Estes resultados foram os mesmos para todos os grupos, independentemente da idade, grau do tumor, estágio ou uso de outras formas de tratamento.
Brasil — Segundo Maria Aparecida Conte Maia, diretora de radioterapia do Hospital A. C. Camargo, o tratamento de cinco semanas ainda é o padrão no Brasil e em grande parte do mundo, por conta de preocupações que existiam quanto à toxicidade que a radioterapia poderia ter se aplicada em doses maiores num período mais curto. “A grande preocupação que se tinha é que o aumento da dose poderia causar mais danos nos tecidos normais. Os pesquisadores viram, no entanto, que não aconteceu essa alteração. Eles observaram que não existiu diferença entre os grupos quanto ao controle da doença, o resultado estético e as complicações de curto e longo prazo”, afirma.
Para que uma pesquisa na área da oncologia resulte em uma mudança dos tratamentos empregados nos consultórios médicos, ela precisa ser feita com um grande número de pessoas por um período longo de tempo — critérios atingidos pelo atual estudo. Segundo Conte Maia, o resultado atual, somado a outro obtido por uma pesquisa canadense publicada há alguns anos, pode levar a uma mudança na prática clínica. “A Sociedade Americana de Radioterapia já tentou montar um consenso sobre isso, e discutiu em que tipos de pacientes o período mais curto de tratamento pode ser aplicado. Eu acredito que esses dois estudos podem trazer mudanças nos tratamentos aplicados no futuro.”

Ceará soma 891 transplantes de órgãos e tecidos em 2013

Semana Nacional de Doação de Órgãos começa segunda-feira, mas alguns hospitais já iniciaram atividades
No Ceará, somente do mês de janeiro até ontem, foram realizados 891 transplantes de órgãos e tecidos, contudo a fila de espera ainda registra 991 pessoas. "As doações e os transplantes vêm aumentando, mas é preciso avançar mais", considera a coordenadora da Central de Transplante no Estado, a nefrologista Eliana Barbosa, para quem a participação da sociedade e das equipes médicas, bem como as campanhas na mídia, têm sido determinantes para diminuir a lista de espera.

Apesar da conscientização e das campanhas em prol da causa, a fila de espera ainda registra 991 pessoas, segundo dados da Central de Transplante do Estado

O Ceará já é referência em transplantes, lembra a médica, adiantando que, embora a Semana Nacional de Doação de Órgãos esteja prevista para começar na próxima segunda-feira, em Fortaleza muitos hospitais já estão desenvolvendo a sua programação. "O Dia do Doador, 27 de setembro, será mais uma oportunidade para sensibilizar a população sobre a importância deste gesto", comentou.

Em âmbito nacional, as atividades da semana irão até o próximo domingo e serão desenvolvidas pela Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). No Ceará, a Secretaria de Saúde do Estado (Sesa) lançará a sua campanha na quarta-feira, dia 25, prometendo uma vasta programação.

A doação de córnea é a mais comum no Estado, mas também é o tecido de maior procura. A lista de espera ativa registra 497 inscritos aguardando córnea. Em segundo lugar, vem o rim (313) e em terceiro o fígado (141), seguido de médula óssea (14), coração (12), pâncreas sem rim (9), pulmão (4) e pâncreas isolado (1). "É muito importante incentivar a doação voluntária", enfatiza Eliana Barbosa, acrescentando que vários fatores vêm estimulando o aumento das doações.

Destaca a atuação das comissões intra-hospitalares e de equipes de transplantes. "O apoio do Estado e a vontade política têm sido determinantes nessas estatísticas, além da parceria com a sociedade", observou, citando a participação de associações de pacientes transplantados e de portadores de insuficiência renal e hepatite, além de campanhas dos meios de comunicação, com ênfase para a Campanha Doe de Coração, desenvolvida pelo Sistema Verdes Mares.

Doe de Coração
"A Campanha Doe de Coração busca a qualidade de vida", cita a médica. Uma iniciativa da Fundação Edson Queiroz com apoio do Sistema Verdes Mares e parceria da Universidade de Fortaleza (Unifor), em 2013 o movimento comemora 11 anos de existência, contribuindo de forma decisiva para o Ceará despontar em segundo lugar no ranking dos estados que mais fazem transplante no Brasil.

Segundo a Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), no País, atualmente, cerca de 30 mil pessoas aguardam na fila de espera por um órgão ou tecido, mas de cada dez abordadas, quatro se negam a doar os órgãos de seus familiares. A recusa da família é considerado um dos maiores entraves.

MOZARLY ALMEIDAREPÓRTER

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Neste ano Sete pessoas morrem após contrair calazar-Ce

Somente em Fortaleza, já foram registrados 110 casos da doença em humanos, conforme a Secretaria Municipal

Neste ano, 110 pessoas em Fortaleza foram infectadas pela leishmaniose, doença conhecida como calazar. Desse total, sete morreram - sendo três deles já portadores de outras doenças, o que aumenta as chances de óbito - segundo números da Coordenadoria de Combate à Doença da Secretaria Municipal de Saúde (SMS). Conforme o médico veterinário e coordenador do programa, Arturo Carvalho, neste mesmo período, 4,1 mil cachorros foram contaminados. Número 152% maior do que esse espaço de tempo em 2012, quando 1.618 contraíram a doença.

O Hospital Veterinário da Universidade Estadual do Ceará (Uece) oferece cuidados para animais como cachorros, que costumam contrair a doença FOTO: JOSÉ LEOMAR

Entre os bairros que merecem atenção redobrada por parte da SMS estão a Barra do Ceará, com seis casos neste ano, e uma média de 11 registros confirmados por ano. Depois aparece Messejana, com média de oito ocorrências anuais; Bom Jardim, com 6,3/ano; Jangurussu, com a mesma média; Jardim Iracema, com média de seis casos/ano; Antônio Bezerra, com 5,7; Mondubim (5,3/ano), Cristo Redentor e Vila Velha, cada com média anual de 4,7 casos.

"Fortaleza, desde o ano de 2005, tem apresentado um crescimento do número de casos humanos e óbitos por essa enfermidade", lamenta Arturo. No entanto, diz, esse fato não é restrito à capital cearense. "Também problema sanitário em várias cidades nordestinas, devido a fatores climáticos, ambientais e graves deficiências estruturais, como por exemplo, a falta de saneamento básico", frisa.

Exames

Calazar é prevenção, enfatiza ele, acrescentando que o trabalho é realizado o ano inteiro. Ele diz que se deve levar os cães para exames periodicamente, não só quando existe a suspeita de doenças. Devem ser usados produtos veterinários para repelir o mosquito transmissor, além de evitar acúmulo de matéria orgânica em locais úmidos.

De acordo com informações do veterinário, crianças de zero a dez anos de idade, assim como adultos com mais de 60, estão no grupo de pessoas mais vulneráveis à doença. Arturo alerta para um fator importante: o calazar, muitas vezes, é assintomático. "Nesses casos, o cachorro ou o humano é infectado sem saber e continuará transmitindo a leishmaniose", salienta. Por isso, alerta Arturo, é preciso atenção: muitas pessoas apresentam os primeiros sintomas, como indisposição, febre intermitente e dor de cabeça, mas são diagnosticadas com virose.

O infectologista Anastácio Queiroz explica que os óbitos em humanos geralmente ocorrem nos casos mais graves da doença e quando acomete pessoas acima de 60 anos ou crianças pequenas, com menos de seis meses de vida. Sobre o diagnóstico da doença, ele afirma ser necessário a observação dos sintomas, como febre por mais de duas semanas, volume do abdômen aumentado, anemia ou índice de plaquetas baixas. "São sinais de alerta para o calazar".

A leishmaniose visceral é transmitida ao homem, principalmente, por meio da picada do mosquito flebotomíneo. É uma doença crônica. A cura no homem é de 95%.

LÊDA GONÇALVESREPÓRTER

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Brasil tem 370 mil usuários regulares de crack nas capitais, aponta Fiocruz

Estudo indireto com 25 mil pessoas mediu consumo por 6 meses em 2012.
Nordeste lidera lista em números absolutos, e 14% do total são menores.

Luna D'Alama, Rafaela Céo e Isabella Formiga Do G1, em São Paulo e em Brasília
Usuários de crack se reúnem no centro de São Paulo nesta segunda-feira (14). (Foto: Yasuyoshi Chiba/AFP)Usuários de crack reunidos no centro de São Paulo em imagem de janeiro (Foto: Yasuyoshi Chiba/AFP)
  •  
O crack em números:
 
370 mil usam a droga nas capitais
80% dos usuários são homens
80% usam droga em local público
80% são não brancos
65% fazem 'bicos' para sobreviver
60% são solteiros
40% vivem nas ruas
40% estão no Nordeste
30% das usuárias já fizeram sexo para obter a droga
10% das usuárias ouvidas estavam grávidas
Usuários têm 8 vezes mais HIV
Tempo médio de uso é de 8 anos
16 é a média de pedras por dia
 
Um levantamento feito pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), ligada ao Ministério da Saúde em parceria com a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad), do Ministério da Justiça, revela que cerca de 370 mil brasileiros de todas as idades usaram regularmente crack e similares (pasta base, merla e óxi) nas capitais ao longo de pelo menos seis meses em 2012.
Por "uso regular", foi considerado um consumo de pelo menos 25 dias nos seis meses anteriores ao estudo, de acordo com definição da Organização Panamericana de Saúde (Opas).
Esse número de 370 mil pessoas corresponde a 0,8% da população das capitais do país e a 35% dos consumidores de drogas ilícitas nessas cidades. Além disso, 14% do total são crianças e adolescentes, o que equivale a mais de 50 mil usuários.
O estudo foi realizado com 25 mil pessoas de forma domiciliar e indireta, ou seja, cada indivíduo respondeu a questões sobre suas redes sociais (familiares, amigos e colegas de trabalho residentes no mesmo município) de forma geral e também especificamente sobre o uso de crack e outras drogas.
O resultado, portanto, é uma estimativa do que ocorre nas 26 capitais e no Distrito Federal – em outra pesquisa da Fiocruz, por exemplo, feita de forma direta com 7 mil entrevistados em 112 municípios (incluindo capitais e regiões metropolitanas) entre o fim de 2011 e junho de 2013, o total não passou de 48 mil usuários de crack e similares.
Consumo de crack no Brasil, por região (Foto: Arte/G1)
Segundo os autores, a metodologia indireta, chamada Network Scale-up Method (NSUM), permite que populações de difícil acesso (como presos, hospitalizados, estudantes, militares, religiosos, fugitivos e vítimas de catástrofes) também entrem nessa conta.
De acordo com o secretário da Senad, Vitore Maximiano, essas duas pesquisas são as maiores já feitas sobre crack no mundo, pelo número de entrevistados e pelo volume de dados gerados.
"Somando-se os dois estudos, são 32 mil questionários produzidos. Estamos investigando uma população oculta, que tem dificuldade de revelar seu uso, suas prevalências, porque há a questão criminal, a discriminação", destaca.
Maximiano diz que o usuário de crack, conforme os resultados, é alguém que vive uma forte exclusão social, tem baixa escolaridade e dificuldade de inserção no mercado de trabalho, com predominância de indivíduos não brancos (80%) e em situação de rua.
Nordeste lidera ranking
Entre as regiões do Brasil, o Nordeste lidera o uso regular de crack e similares, com 40% do total, seguido do Sudeste, do Centro-Oeste, do Sul e do Norte (veja o gráfico acima). Além disso, cerca de 80% dos usuários dessas substâncias fazem isso em lugares públicos e de grande circulação, como as ruas.
Estamos investigando uma população oculta, que tem dificuldade de revelar seu uso, suas prevalências, porque há a questão criminal, a discriminação"
Vitore Maximiano,
secretário da Senad
Nas capitais do Sudeste e do Centro-Oeste, o crack e similares correspondem a 52% e 47%, respectivamente, de todas as drogas ilícitas (com exceção de maconha) consumidas nessas cidades. Já no Norte, o crack tem uma participação menor no total: cerca de 20%.
Além disso, as capitais do Nordeste são as que concentram mais crianças e adolescentes usuários de crack e similares, com 28 mil pessoas. No Sul e no Norte, esse número é de cerca de 3 mil indivíduos em cada região.
Segundo Maximiano, o alto uso de crack no Nordeste está ligado ao Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) local, onde há uma população mais carente. Essa droga acaba sendo, portanto, uma alternativa barata. Já no Sul, a relação é de ordem sociológica, pois lá as pessoas tradicionalmente consomem mais drogas (sobretudo injetáveis) que a média nacional.
Nas mesmas cidades analisadas, estima-se que 1 milhão de pessoas usem drogas ilícitas em geral (cocaína, heroína, ecstasy, LSD, etc), com exceção de maconha. De acordo com os autores, ainda não é possível fazer um estudo em todo o país porque não há bancos de dados nacionais com informações suficientes sobre grupos específicos da população.
Jovem segura cachimbo para fumar crack em São Luís (MA) (Foto: Reprodução/TV Mirante)Cachimbo é a forma mais usada para fumar crack
no Brasil, diz estudo (Foto: Reprodução/TV Mirante)
Usuário difícil de encontrar
Na opinião do pesquisador da Fiocruz Francisco Inácio Bastos, um dos coordenadores dos levantamentos, em estudos tradicionais com perguntas diretas não é possível identificar os usuários de crack e similares em casa, pois eles estão nas ruas. Para ter acesso a essas pessoas, então, é preciso ir em busca de suas redes de contatos.
Além de estarem fora de casa, os indivíduos que consomem drogas como o crack são mais estigmatizados que aqueles que usam maconha ou álcool, na opinião de Bastos. Por isso, a maioria dos usuários não assume o vício.
Entre as perguntas feitas pelo método indireto, incluídas em uma lista com cerca de 100 questões, estavam: "Você conhece alguém que usa crack? Quantas pessoas?" Além disso, o levantamento reuniu perguntas sobre o programa Bolsa Família e outros assuntos que, depois, foram confirmados em cadastros oficiais das capitais.
Sobre as "cracolândias", Bastos diz que esse não é um fenômeno comum e está mais restrito a São Paulo e ao Rio de Janeiro, pois para esses locais existirem é preciso de alguns pré-requisitos, como grande densidade urbana, ausência do poder público naquele determinado lugar e uma cadeia de distribuição de drogas de grande porte.
O relatório da Fiocruz conclui que o estudo indireto pode servir de base para futuras pesquisas sobre crack com essa mesma metodologia, a fim de gerar uma série histórica confiável. A partir dele, na visão dos autores, também é possível pensar em políticas públicas e estratégias voltadas principalmente para crianças e adolescentes.
PM apreende 180 pedras de crack e dois são detidos em Uberlândia, MG (Foto: Reprodução/TV Integração)Pedras de crack apreendidas em janeiro em
Uberlândia (MG) (Foto: Reprodução/TV Integração)
Homem jovem, solteiro e de rua
O outro levantamento da Fiocruz, feito de forma direta com 7 mil pessoas de 18 anos ou mais em 112 municípios, entre 2011 e 2013, envolveu cerca de 400 perguntas e teve como base o método Time-Location Sampling (TLS), para analisar o perfil dos usuários e o cenário de consumo.
As cidades pesquisadas foram as 26 capitais, o Distrito Federal, nove regiões metropolitanas e municípios de médio e pequeno porte. Os locais de estudo foram as próprias cenas de uso de crack e serviços de saúde próximos.
A média de idade dos entrevistados era de 30 anos. Por sexo, os usuários se mostraram predominantemente homens, representando quase 80% do total. Em levantamentos anteriores sobre crack e cocaína, essa proporção era menor: cerca de 60%, contra 40% de mulheres. Esse índice encontrado agora, segundo a Fiocruz, tem relação com uma maior presença masculina no tráfico e em cenários abertos de uso de drogas.
Entre as mulheres usuárias de crack ouvidas, 10% estavam grávidas naquele momento e mais da metade já havia engravidado pelo menos uma vez desde o começo do vício.
Além disso, a maioria (60%) dos usuários de crack declarou ser solteira, 40% vivem nas ruas, 65% fazem trabalhos esporádicos ou autônomos e muitos não chegaram a concluir o ensino médio ou entrar no ensino superior. Atividades ilícitas, como tráfico de drogas e furtos/roubos, foram admitidas por apenas 6,4% e 9% dos entrevistados, respectivamente.
A principal motivação para usar crack e similares foi curiosidade/vontade, apontada por mais da metade dos entrevistados. Em seguida, vieram pressão dos amigos (26,7%) e problemas familiares ou perdas afetivas (29,2%). O baixo preço da droga também seria um fator contribuinte para a manutenção do vício ao longo do tempo, mas não determinante para o início da experimentação.
O tempo médio de uso foi de 8 anos nas capitais, contra 5 anos nos demais municípios. O número médio de pedras utilizadas por pessoa nas capitais foi de 16 ao dia, contra 11 nas outras cidades. O consumo dos homens foi mais prolongado, mas as mulheres usaram mais pedras por dia – até 21, contra 13 dos homens.
Além desses dados, quase 30% das usuárias de crack ouvidas admitiram trocar dinheiro ou drogas por sexo, contra 1,3% dos homens. Elas também foram maioria nos casos de violência sexual prévia: 44,5%, contra 7% no sexo masculino.
Mais de um terço de todos os usuários entrevistados admitiu, ainda, não ter utilizado preservativo em nenhuma das relações sexuais ocorridas naquele mês. E mais da metade (53,9%) nunca havia feito um teste de HIV, o que é algo preocupante, pois os usuários analisados apresentaram prevalência do vírus da Aids oito vezes maior que a da população geral.
A maioria (quase 75%) fumava crack em cachimbos, seguidos de latas (51,8%) e copos plásticos com tampa de alumínio (28,3%). Além disso, mais de 70% compartilhavam esses apetrechos, o que a Fiocruz chama atenção pelo risco de transmissões virais como hepatites.
Dos entrevistados que já tiveram alguma situação de overdose nos 30 dias anteriores à pesquisa, 44,7% passaram por isso pelo uso de crack e 22,4% sofreram intoxicação aguda em decorrência do abuso de álcool. E, ao todo, 41,6% relataram terem sido detidos no último ano, por motivos como posse de drogas (quase 14%), assalto/roubo (9,2%), furto/fraude/invasão de domicílio (8,5%) e tráfico ou produção de drogas (5,5%).

Resposta do governo
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, anunciou nesta quinta-feira (19), durante entrevista coletiva em Brasília, que será feito um plano de três eixos para enfrentar o crack no país: um de prevenção, um de cuidados e outro de autoridade.
"(O primeiro) exige um conjunto de medidas de orientação social, que possa esclarecer os malefícios do uso do crack", explicou. Já o eixo de cuidados inclui tratar os usuários, contratar bons profissionais e manter um número suficiente de unidades de tratamento.
"O eixo autoridade tem a ver com medidas de segurança pública e o enfrentamento rigoroso das organizações de narcotraficantes", destacou.
O ministro afirmou também que os usuários de crack devem ser considerados dependentes químicos e, portanto, passíveis de tratamento, e não tratados com sanções penais.
"A maior parte dos usuários são pessoas de extrema vulnerabilidade social. Quando você vai ouvi-las, ao contrário do que muitos pensam, 80% querem tratamento e 92% querem apoio para conseguir emprego ou ensino para se reinserir socialmente", disse Cardozo.
Ações
Em dezembro de 2011, a presidente Dilma Rousseff lançou um conjunto de ações integradas para o combate ao crack com orçamento de R$ 4 bilhões do governo federal. Na ocasião, a presidente anunciou a criação de 2.462 leitos destinados ao tratamento de usuários de drogas.
Segundo o ministério, foi investido desde então R$ 1,5 bilhão em ações de implementação e custeio de serviços que atendem aos usuários de crack, e 85 das 308 unidades de rua previstas foram construídas. De acordo com o ministro, o programa segue "estritamente" o cronograma para usar os recursos.
"Desde o início do programa isso passa por uma pactuação com estados e municípios com a definição de uma matriz de responsabilidade, para que a partir daí você consiga fazer a alocação dos recursos", disse o ministro. "Você tem o tempo de articulação do programa, que é exatamente o que foi feito para fazer acordos e negociar com estados e municípios."
Segundo o governo, desde o início do programa foram criados 1.885 novos leitos em 37 Centros de Álcool e Drogas, 60 Unidades de Acolhimento, 85 Consultórios na Rua e enfermarias especializadas em álcool e drogas.
  •  
Exemplos de perguntas usadas na pesquisa direta sobre o perfil dos usuários de crack (Foto: Rafaela Céo/G1)Exemplos de perguntas usadas na pesquisa direta sobre perfil dos usuários de crack (Foto: Rafaela Céo/G1)

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Hospital de Messejana Quatro transplantes são realizados em dois dias

Já foram feitos, somente neste ano, cinco procedimentos de pulmão na unidade de saúde
O Hospital de Messejana Dr. Carlos Alberto Studart Gomes (HM) teve um importante passo na efetivação de transplantes de órgãos, com quatro procedimentos realizados em apenas dois dias. Na última segunda-feira (16), um paciente recebeu um novo coração e outro, um pulmão, exatamente os mesmos procedimentos feitos, também, ontem. Com isso, chega a 25 o número de transplantes realizados somente neste ano na unidade de saúde.

O Hospital de Messejana é o único do Norte e Nordeste a realizar transplante cardíaco pediátrico, sendo referência em procedimentos desse tipo

Destes, 16 foram cirurgias cardíacas em adultos e quatro em crianças, além de cinco transplantes de pulmão. Segundo o chefe da cirurgia cardiovascular pediátrica do hospital, Valdester Cavalcante, ambas as cirurgias cardíacas dos últimos dois dias foram um sucesso. "Eram duas crianças portadoras de cardiopatia congênita, quando a pessoa já nasce com o problema. Os casos eram tão graves que apenas a troca do coração seria a solução", explica ele.

Segundo ressalta, o Hospital de Messejana é referência em procedimentos desse tipo, sendo o único do Norte e Nordeste a realizar transplante cardíaco pediátrico, o que gera uma grande procura pela unidade. "De forma sistemática, só é feito em Fortaleza e em São Paulo. Recebemos crianças de todos os estados do Nordeste", afirma.

Os pacientes que receberam novos pulmões, uma mulher de 60 anos que sofria de fibrose pulmonar, e um homem de 61 anos que tinha enfisema pulmonar também obtiveram êxito em seus procedimentos. A expectativa, de acordo com o cirurgião torácico e coordenador da equipe de transplantes do Hospital, Antero Gomes Neto, é que sejam mais dois casos de sucesso. Conforme ressalta, desde que o serviço teve início, em 2011, já foram realizados 13 transplantes de pulmão na unidade.

"Conseguimos montar uma equipe multidisciplinar para chegarmos ao ponto em que chegamos e podemos crescer muito mais. Nossa maior dificuldade é o número de doações ainda baixo, e por isso o trabalho da imprensa é muito importante como forma de divulgação", diz.

Doe de Coração
Visando contribuir para o aumento de doações voluntárias no Estado, a campanha Doe de Coração vem trabalhando como uma das grandes incentivadoras da causa.

A campanha é promovida pela Fundação Edson Queiroz com apoio do Sistema Verdes Mares e parceria da Universidade de Fortaleza (Unifor).

RENATO BEZERRAREPÓRTER

A cada dois dias, uma brasileira morre por aborto

Com 1 milhão de procedimentos por ano, prática é um problema de saúde pública ligado à criminalização da interrupção da gravidez

Terra
shutterstock_97914731.jpg
 
Na mesa de madeira em frente à porta de uma sala de audiências no Fórum Criminal de São Paulo, repousa uma lista com os processos a serem julgados naquela tarde. Em alguns minutos, será a vez de Marta* ser absolvida sumariamente ou ir a júri popular e pegar até 4 anos de prisão, como explica a defensora pública Juliana Belloque, que atua a seu favor. A primeira folha do processo diz que Marta "provocou aborto em si mesma" e isso basta para condená-la, já que a prática é crime previsto pelo artigo 124 do Código Penal. Mas, quem seguir lendo os autos, saberá que Marta tinha 37 anos, era mãe solteira de três filhos pequenos (com idades entre 1 e 6 anos), vinha de um histórico de abandono por parte dos pais das crianças (inclusive o da gravidez que interrompeu) e estava desempregada quando, em 2010, em um ato de desespero, comprou um remédio abortivo de uma prostituta por R$ 250, tirados de sua única fonte de sobrevivência - a pensão da filha. Descobrirá também que Marta é pobre, só completou o primeiro grau, e que morava com os filhos em um bairro afastado de São Paulo quando, três dias após introduzir o remédio na vagina (de forma incorreta, já que não tinha a quem pedir orientação), ainda não havia parado de sangrar e de sentir fortes dores, e por isso procurou o pronto-atendimento de um hospital público de seu bairro. O leitor ficará surpreso ou aliviado, dependendo de suas convicções, ao saber que a médica que a recebeu, imediatamente fez a denúncia à Policia Militar, explicando que retirou uma "massa amorfa" de seu útero, "provavelmente" uma placenta resultante de um aborto malsucedido.
"Não existe prova da gravidez, a única coisa é o depoimento desta médica dizendo que retirou uma quantidade grande de massa amorfa que ela avalia como placenta do útero dessa mulher, que chegou com um sangramento no hospital. Enquanto a mulher está hospitalizada essa médica chama a Polícia Militar e, enquanto ela está internada, a PM vai até a casa dela, sem mandato, e apreende um lençol sujo de sangue e um balde. Não tinha feto, medicamento, caixa, nada. Apenas um lençol sujo de sangue e um balde, em uma casa muito pobre. Com isso se instaura o inquérito policial. Quando ela é liberada, é levada até uma delegacia e existe uma confissão extrajudicial ao delegado. Essa mulher nunca é ouvida em juízo para confirmar ou não essa confissão", resume a defensora Juliana enquanto esperamos.
 
Marta aceitou assinar uma confissão para obter a suspensão condicional do processo - prevista para penas mínimas de até 1 ano, quando o réu é primário e não responde por outro processo criminal, e que suspende o caso por um período de 2 a 4 anos, desde que o acusado cumpra algumas condições como comparecer periodicamente em juízo para atualizar endereço, justificar ocupação lícita, prestar serviços à comunidade, entre outras - mas ela deixou de cumprir essas condições e o processo seguiu o curso. Quando pergunto à defensora se ela acredita que a mulher possa ir realmente a júri popular, ela diz que nunca viu isso acontecer, mas que não é impossível. E explica que pretende mostrar ao juiz que o processo é marcado por violações, como a falta de provas, já que não há feto, o testemunho extraoficial porque ela não chegou a ser ouvida em juízo, a denúncia feita por uma médica que quebrou o sigilo de sua relação com a paciente, as buscas sem mandato, a falta de uma perícia e de um exame de corpo de delito. "As mulheres costumam assinar a confissão porque chegam muito fragilizadas e querem se livrar daquilo o mais rápido possível. Os casos que chegam para nós são bem parecidos: mulheres pobres, sozinhas, com filhos, sem antecedentes criminais, que praticam o aborto inseguro em um momento de desespero e que são denunciadas pelos profissionais que as atendem nos hospitais públicos. Os companheiros não existem, nem aparecem seus nomes nestes processos", diz a defensora. Como Marta está desaparecida, a audiência aconteceria sem sua presença, mas foi adiada porque a médica, única testemunha de acusação, estava de férias. Marta ali é um número, um crime que será julgado em alguns meses.
 
Mas também é uma em 1 milhão de mulheres que, apesar da lei, da religião e da sua opinião pessoal, buscam o aborto clandestino no Brasil todos os anos. Com sorte, fugiria da pior estatística: a de que a prática insegura mata uma mulher a cada dois dias no País e é a quinta causa de morte materna.
 
Por ano, País tem 1 milhão de abortos clandestinos
 
"A gente não classifica um problema como sendo de saúde pública se ele não tiver ao menos dois indicadores: primeiro, não pode ser algo que aconteça de forma rara, tem de acontecer em quantidades que sirvam de alerta. E precisa causar impacto para a saúde da população. Nós temos esses dois critérios preenchidos na questão do aborto no Brasil, mas essa é uma ótica nova", explica o ginecologista e obstetra representante do Grupo de Estudos do Aborto (GEA) Jefferson Drezett, que há mais de 10 anos coordena um serviço de abortamento legal no País. "Só para contextualizar, nós temos hoje, segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), 20 milhões de abortos inseguros sendo praticados no mundo. Por aborto inseguro, a Organização entende a interrupção da gravidez praticada por um indivíduo sem prática, habilidade e conhecimentos necessários ou em ambiente sem condições de higiene. O aborto inseguro tem uma forte associação com a morte de mulheres - são quase 70 mil todos os anos. Acontece que estas 70 mil não estão democraticamente distribuídas pelo mundo; 95% dos abortos inseguros acontecem em países em desenvolvimento, a maioria com leis restritivas. Nos países onde o aborto não é crime como Holanda, Espanha e Alemanha, nós observamos uma taxa muito baixa de mortalidade e uma queda no número de interrupções, porque passa a existir uma política de planejamento reprodutivo efetiva."
 
O Uruguai, que descriminalizou o aborto em outubro de 2012, também tem experimentado quedas vertiginosas tanto no número de mortes maternas quanto no número de abortos realizados. Segundo números apresentados pelo governo, entre dezembro de 2012 e maio de 2013, não foi registrada nenhuma morte materna por consequência de aborto e o número de interrupções de gravidez passou de 33 mil por ano para 4 mil. Isso porque, junto da descriminalização, o governo implementou políticas públicas de educação sexual e reprodutiva, planejamento familiar e uso de métodos anticoncepcionais, assim como serviços de atendimento integral de saúde sexual e reprodutiva.
 
Jefferson coloca ainda que atualmente, no Brasil, acontecem cerca de 1 milhão de abortos provocados e 250 mil internações para tratamento de complicações pós abortamento por ano. "É o segundo procedimento mais comum da ginecologia em internações. Por isso eu digo: o aborto pode ser discutido sob outras óticas? Deve. Não existe consenso sobre este tema e nunca existirá porque há um feto. Mas não há como negar que temos aí um problema grave de saúde pública e que a lei proibitiva não tem impedido que as mulheres abortem, mas tem se mostrado muito eficaz para matar essa mulheres."
 
Mulher pobre tem risco multiplicado por mil no aborto inseguro
 
"O aborto não é um bem a ser alcançado. Nenhuma mulher acorda um dia e diz 'vou engravidar daquele canalha que vai me abandonar, só para ter o prazer de provocar um aborto'. As mulheres buscam no aborto soluções para situações extremas. Mas é importante dizer que existe uma diferença entre aborto clandestino e inseguro. O aborto clandestino não é necessariamente inseguro. Ele pode ser feito em clínicas clandestinas, porém com todas as condições de higiene, por médicos treinados, quando a mulher tem dinheiro para pagar. A diferença entre as chances de morrer em um aborto inseguro e apenas clandestino é de mil vezes. Então acaba se criando uma desigualdade social, uma perversidade porque uma mulher que tem um nível socioeconômico bom, as mulheres dos melhores bairros da cidade de São Paulo, têm acesso a clínicas clandestinas, que não são legalizadas, mas são seguras. Esse aborto pode custar mais de US$ 2 mil. Enquanto um aborto inseguro pode custar R$ 50", diz o ginecologista.
 
Apesar das diferenças de tratamento, a Pesquisa Nacional de Aborto (PNA), realizada em 2010 pela Anis - Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero, mostra que, aos 40 anos, uma em cada cinco mulheres já fez ao menos um aborto. E que o perfil é o da mulher comum em idade reprodutiva. "Não existe surpresa nisso. São mulheres de diversas classes sociais e religiões se arriscando porque a clandestinidade oferece risco. As diferenças mais uma vez estão no fato de que, quanto mais pobre essa mulher, mais riscos ela corre por causa dos métodos aos quais tem acesso", explica a autora da pesquisa, Débora Diniz.
 
Esta leitura se confirma também no relatório feito pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro em parceria com a organização internacional IPAS "Mulheres incriminadas por aborto no RJ: diagnóstico a partir dos atores do sistema de justiça", que pesquisou casos de criminalização de mulheres por aborto e entrevistou juízes, desembargadores, promotores e atores do judiciário em geral e concluiu que: "é muito mais comum que uma mulher seja incriminada por aborto quando ela utiliza um método abortivo 'caseiro' (remédios obtidos no mercado paralelo e outros métodos) do que quando ela recorre à clínica. Estes casos são justamente aqueles nos quais o procedimento dá errado (a mulher reage à medicação) e cai no sistema público de saúde; lá, um servidor público (em alguns casos o médico do posto, em outros um policial militar de plantão) a encaminha para a polícia. Este aspecto demonstra claramente o recorte socioeconômico dessa modalidade de criminalização: a maior parte das mulheres que utiliza os serviços públicos de saúde é pobre, muitas das quais desempregadas ou com ocupações de baixa remuneração".
 
O relatório compara ainda duas sentenças dadas a mulheres diferentes: uma mulher de classe média, professora, mãe de dois filhos que foi presa após realizar aborto em clínica clandestina e teve a fiança arbitrada em R$ 300, e outra mulher sozinha, que trabalhava como prostituta e mal sabia ler e escrever e teve a fiança arbitrada em R$ 3 mil. "Em geral, o perfil da mulher se repetia: pobre, pouco instruída, moradora de periferia. Contudo, este não é necessariamente o perfil das mulheres que fazem aborto, mas sim o perfil das mulheres que são presas por terem feito aborto. Deste aspecto percebe-se uma grande diferença. O sistema captura apenas algumas mulheres, as que necessitam se submeter à saúde pública. Aquelas que encontram outras soluções privadas, não são atingidas. Um claro retrato do recorte socioeconômico."
 
Jovem é acusada por aborto involuntário
 
Mariana* tinha 20 anos quando chegou ao pronto-atendimento de um hospital particular de seu convênio médico em São Paulo com um aborto espontâneo, e acabou sendo tratada como criminosa. "Estava com dois meses de gestação, acordei uma noite com muita cólica e sangramento e corri para o hospital. Apesar de não estar mais com o pai do bebê e da minha família ter me dado a opção de fazer o aborto em uma clínica, minha religião me fez desconsiderar essa hipótese", conta. "Assim que cheguei ao hospital, sozinha, e comuniquei à recepcionista o que estava acontecendo, senti a conversa mudar. Ela passou a me tratar com descaso e, mesmo passando por uma hemorragia, tive de esperar muito mais tempo do que os outros para ser atendida." Mariana lembra que, assim que entrou no consultório, o médico perguntou se ela havia provocado o aborto e, diante da negativa, continuou perguntando seguidas vezes. "Antes da curetagem também perguntou muitas vezes se eu não havia mesmo usado nenhuma droga naqueles dias. Ele disse que eu estava com um aborto retido e que estava com uma grave infecção no útero. Fiquei vários dias internada no andar da maternidade e, todas as vezes que saia no corredor, de cadeira de rodas, todas as mães, enfermeiras e atendentes me olhavam com ar de reprovação. Já estava triste por ter perdido o bebê, e ainda tive de passar por isso mesmo sem ter provocado nada."
 
Apesar de o Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp) e o Conselho Federal de Medicina (CFM) terem se colocado várias vezes contra a denúncia da paciente que provoca o aborto por parte dos médicos e do próprio Ministério da Saúde determinar em norma técnica que "toda mulher em processo de abortamento, inseguro ou espontâneo, terá direito a acolhimento e tratamento com dignidade no Sistema Único de Saúde (SUS)", o que se vê nos hospitais públicos e de convênios é o que relata Mariana, ou pior. "Diminuiu o número de mulheres que procuram o SUS por complicações de aborto, e não é porque o número de abortamentos diminuiu. É porque os profissionais recebem essa mulher com julgamento, xingamentos, deixam-na sangrando por horas antes de internar e, muitas vezes, fazem os procedimentos sem anestesia ,que é 'para aprender'", diz a socióloga integrante da Frente contra a criminalização das mulheres e pela legalização do aborto Dulce Xavier, que há muitos anos acompanha estes casos. "Nós não temos uma política de planejamento reprodutivo no Brasil, faltam preservativos nos postos de saúde, muitos serviços que estão nas mãos de organizações sociais religiosas se negam a fazer laqueadura e distribuir pílulas do dia seguinte - tanto que a presidente precisou sancionar uma lei para garantir o direito às vítimas de violência, o que já deveria ser feito desde a década de 1980 e, mesmo assim, houve protestos - e quando essa mulher engravida sem querer e provoca um aborto em ato de desespero, é descriminada por atendentes, enfermeiras e médicos", lamenta. Drezett complementa: "Eu trabalhei mais de 22 anos como chefe de plantão do centro obstétrico do hospital Eleonora Mendes de Barros e sempre perguntava aos residentes qual era a conduta que eles deveriam ter se uma mulher chegasse dizendo que havia feito um aborto. Eles não tinham nenhuma informação sobre isso. Os médicos não sabem o que fazer. Muitos acham que têm o dever de comunicar a polícia. Não são todos, mas isso ainda existe. E tem os que fazem procedimentos sem anestesia, que é para a mulher aprender a não abortar mais. Porque senão ela vai ficar grávida toda hora para vir fazer um aborto aqui. Esse raciocínio só não é risível porque é patético. Mas o que tem por trás de tudo isso? A falta de clareza de lidar com o aborto como questão de saúde pública."
 
Ginecologista atua em parceria com ONG
 
Cansado de presenciar cenas como estas, o ginecologista e obstetra Oswaldo Queiroz começou, há 18 anos, um trabalho de humanização no atendimento pós-aborto em parceria com a organização Ipas na Maternidade Escola Assis Chateubriand (Meac) em Fortaleza. "Nós observamos que muitas vezes a mulher é inimiga da mulher. A paciente vinha sangrando, mas quando a atendente, a auxiliar descobria que era aborto, ela mesma rejeitava essa coitada que ficava quatro, seis horas esperando por atendimento. Em 18 anos trabalhando com isso, eu nunca conheci uma mulher que quisesse abortar. Elas abortam porque estão desesperadas, porque não sabem usar os métodos, não têm orientação, muitas vezes quando o companheiro sabe que a mulher engravidou, o 'couro come', ela apanha de verdade. Não tem uma que não chore quando tudo termina. Não é uma situação agradável para elas", diz.
 
Desde então, meninas e mulheres que chegam na Maternidade Escola com abortos malsucedidos são atendidas prontamente. "Ninguém pergunta se o aborto foi provocado ou natural. Nós simplesmente prestamos o atendimento através de uma equipe multidisciplinar que tem médico, enfermeira, psicóloga e assistente social, fazemos a curetagem, conversamos, marcamos uma revisão, exames, se elas quiserem podem voltar para atendimento psicológico, e o mais importante é que essas mulheres e meninas saem daqui com o método contraceptivo ajustado, explicado, prescrito e com ele na mão", explica Oswaldo em uma sala pequena do pronto-atendimento, em uma manhã tipicamente quente e agitada de seu plantão.
 
Ele lembra que o Ipas começou esta parceria com outros hospitais do SUS, mas os serviços foram acabando por resistência dos próprios profissionais e gestores. A equipe de Oswaldo atende cerca de 100 mulheres por mês, entre abortos provocados, naturais e vítimas de violência sexual. A idade média das pacientes fica entre 16 a 24 anos. "Mulheres sem orientação, pobres, já com outros filhos, sozinhas, com companheiros que somem quando elas dizem que estão grávidas.
 
Quantas pacientes chegam com infecções, precisam ser internadas, chegam com útero perfurado, ficam estéreis, tudo isso cai na cabeça do contribuinte. Isso poderia ser evitado se o Brasil tivesse uma política de planejamento reprodutivo que funcionasse. No meu entender, em qualquer posto de saúde deveria ter anticoncepcional, DIU e camisinha disponíveis. Mas não tem. Eu mesmo só faço esse trabalho porque vou pessoalmente pedir doações nos laboratórios. Mas você vê, eu preciso me aposentar e não faço porque sei que o serviço vai acabar, ninguém quer se envolver com isso", lamenta.
 
Oswaldo me sugere ir até o andar superior da maternidade, onde algumas meninas se recuperam de curetagens feitas pela manhã e conversar diretamente com elas. Seguindo por um largo corredor verde, entro em uma enfermaria com seis camas, três de cada lado da parede, todas ocupadas, cinco delas por meninas com seus bebês. Na última está Beatriz*, 15 anos, uma das pacientes da equipe de Oswaldo. Me aproximo com cuidado, falando baixo, intimidada pelos olhares reprovadores das meninas mães (que aparentam ter no máximo 16 anos cada) sobre ela. Beatriz também responde em um fio de voz, com um leve sorriso para mostrar que está bem. Ela e o namorado, de 16 anos, moram juntos na casa de sua mãe. Ele trabalha, ela tenta levar a escola adiante, o que é bem difícil, já que tem que cuidar do filho de 1 ano. Conta que engravidou sem querer, mesmo usando a pílula. Quando pergunto se provocou o aborto, responde que sim com um aceno de cabeça, mas quando indago sobre o método utilizado, responde que caiu no banheiro e bateu as costas. Foi para o hospital sangrando. Passou pela curetagem e deveria voltar logo para casa, com orientação e método anticoncepcional.
 
A ginecologista Zenilda Vieira Bruno, que coordena um serviço de atendimento voltado especificamente a adolescentes da maternidade, explica que 25% dos abortos provocados que chegam ao hospital são de adolescentes entre 15 e 19 anos. "As meninas geralmente vão sozinhas ou com as amigas. Nós oferecemos acompanhamento por um ano, cuidando da parte de saúde, planejamento reprodutivo e psicológico. Elas dizem que engravidaram de relações esporádicas, que não sabiam que teriam relação, então não estavam tomando pílula ou não levaram camisinha. Os garotos nunca se encarregam dessa parte, isso é responsabilidade delas", disse.
 
Zenilda conta que em uma pesquisa que realizaram com as adolescentes constatou que, em cinco anos, as meninas que provocaram o aborto e tornaram a engravidar (65%) tiveram o segundo filho. A pesquisa mostra também que as meninas que abortaram eram mais velhas do que as que levavam a gravidez a termo. "Elas diziam que o filho atrapalharia os estudos, o trabalho. As mais novas, de 14, 15 anos com menos escolaridade e perspectiva achavam natural ter o bebê naquela idade e condições como sua mãe fez. Diziam que já cuidavam dos irmãos pequenos, então poderiam criar os seus bebês. A maioria das adolescentes usa os anticoncepcionais de maneira errada. Já ouvi meninas que tomavam uma cartela intercalando com a irmã, com o namorado ou só na hora de ter relações. Falta instrução, dar o método e explicar como usar. É muito fácil criminalizar, mas não dar a contrapartida", diz.
 
A Agência Pública tentou entrevistar representantes do Ministério da Saúde e da Secretaria de Políticas para Mulheres a respeito dos temas abordados nesta reportagem, mas foi informada pelas assessorias de imprensa de que não havia agenda disponível.
 
Nem quando amparado por lei
 
Segundo o artigo 128 do Código Penal, de 1940, o aborto é permitido em caso de violência sexual, assim como em caso de risco de vida para a mãe e, em decisão posterior do Supremo Tribunal Federal (STF), também nos casos de anencefalia fetal. Mas só em 1989 foi implantado o primeiro serviço para atender esses casos em São Paulo, que nos decorrentes de estupro inclui, além do apoio psicológico e da interrupção da gravidez, exames anti HIV e a contracepção de emergência. Segundo dados do Ministério da Saúde, o País possui 65 hospitais qualificados na rede pública para realizar a intervenção prevista em lei e realizou 1.626 interrupções gerais de gravidez em 2012.
 
Ainda assim, a resistência por parte de profissionais e da própria sociedade fez necessária a criação de uma lei, com tudo que já era determinado por norma, sancionada pela presidente Dilma em agosto, sob fortes protestos dos religiosos do Senado. Além disso, dos serviços que se dizem em funcionamento, nem todos realmente atendem todos os procedimentos, como explica Drezett: "Foi feita uma pesquisa em 2006, com as secretarias municipais de saúde de cerca de 800 municípios sobre os serviços de atendimento à mulher vítima de violência. Quando se pergunta quantos tinham o atendimento, quase 90% dizem que sim. Então a pesquisa pergunta quantos destes serviços oferecem a concepção de emergência, mais da metade disse que não. Aí vem a parte interessante: quando se pergunta sobre o abortamento legal, 30% de cara já diz que não faz; 6% se recusam a falar sobre o assunto. Dos que fazem, apenas 1,9% tinham feito um aborto nos últimos dois anos. Quer dizer: é bonito dizer que tem, mas prometer que eu vou cuidar de você e te abandonar no momento em que você mais precisa de mim e está totalmente vulnerável é muito cruel", lamenta.
 
Dulce Xavier lembra ainda que "quando o serviço foi instalado em São Paulo em 1989 no Jabaquara, a equipe tinha a casa apedrejada, recebia telefonemas ameaçadores, médicos eram perseguidos por serem 'aborteiros'. Houve no Ministério da Saúde um movimento para esclarecer, mas quem atende tem receio de entrar nisso", ela diz.
 
Diante desta situação, alguns hospitais referência como o Pérola Byington, em São Paulo, têm sua demanda aumentada por casos que chegam de todo o Brasil, como explica a psicóloga Daniela Pedroso: "Nós atendemos uma média de duas mulheres por semana, vítimas de violência sexual. Chegam mulheres e meninas de outras cidades e até outros Estados". Ela conta que desde a criação do serviço já foram feitos cerca de 1,3 mil procedimentos e que a idade média das vítimas é de 20 a 24 anos. "Mas também chegam adolescentes e até crianças. A menina mais nova que atendemos tinha 10 anos de idade."
 
Os casos de anencefalia, após uma dura batalha no judiciário que resultou na descriminalização por decisão do STF, hoje já são encarados com menor resistência por parte dos profissionais da saúde, mas ainda há casos de anomalias fetais graves que precisam de decisão judicial, que às vezes não saem, como explica a advogada Juliana Belloque. "O caso que foi levado para o Supremo era de um anencéfalo, então foi concedido para anencefalia. Mas é evidente que se há inviabilidade de vida extrauterina não é crime. O exemplo era de um anencéfalo, mas os médicos entendem isso restritivamente, existe um temor da classe médica de sofrer processos por essa conduta, então eles têm uma tendência a se resguardar. Quando é anencéfalo o médico faz. Qualquer outro tipo de inviabilidade a mulher precisa de um alvará judicial, e a defensoria atende toda semana essas mulheres buscando alvarás. Aqui na capital, a maioria dos juízes concede, mas ainda existem os mais conservadores ou religiosos que vão contra."
 
Estatuto do Nascituro expressa retrocesso
 
No dia 1º de agosto, a presidente Dilma Rousseff sancionou, sem vetos, a lei que obriga os hospitais a prestarem atendimento integral e multidisciplinar às vítimas de violência sexual, embora essa permissão já constasse do Código Penal desde 1940. Houve protestos por parte dos deputados da bancada religiosa, que se apressaram em apresentar vários projetos para derrubar a nova lei, focando principalmente na distribuição da pílula do dia seguinte, que, contra todas as evidências médicas e científicas, é por eles considerado "uma espécie de aborto".
 
O relatório preliminar da reforma do Código Penal, que segue lentamente, retira o aumento de permissivos para o aborto e mantém apenas o que já era garantido por lei - apesar do Conselho Federal de Medicina ter se pronunciado a favor da autonomia de decisão pela mulher até a 12ª semana de gravidez. Após a derrota na Câmara, em 2008, do PL 1.135/91, que tentou descriminalizar o aborto, a maioria dos projetos que tramitam hoje no Senado e na Câmara visa a aumentar as penas para o aborto clandestino e restringir ainda mais o abortamento legal - como o PLS 287/2012, de autoria da senadora Maria do Carmo Alves (DEM-SE), que pede que o aborto em caso de anencefalia volte a ser crime.
 
No mesmo sentido, o projeto que ganhou mais destaque é o Estatuto do Nascituro (Projeto de Lei 478/2007), que tem sido rechaçado por médicos e militantes dos direitos humanos - e provocado protestos em todo o País - por tentar estabelecer que o nascituro "é ser humano concebido, mas ainda não nascido", prevendo o pagamento de um salário mínimo aos filhos de estupro e o direito de ter o nome do "pai" na certidão de nascimento.
 
Durante a campanha para a Presidência em 2010, diante de uma ameaça de boicote por parte das igrejas evangélicas e católicas, Dilma teria se comprometido a não apresentar nenhum projeto para a descriminalização do aborto. Com as bancadas religiosas e autodenominadas "pró-vida", a repressão tende a aumentar, explica Dulce Xavier: "Nós retrocedemos muito nesta questão nos últimos anos. Se em 2008 nós discutíamos a descriminalização destas mulheres, em 2013 estamos tomando as ruas para pedir que não se aprove uma lei absurda como é o Estatuto do Nascituro, e tudo por pura pressão religiosa sobre um Estado laico".
 
Drezett vai além: "o Estatuto do Nascituro trata a mulher como um detalhe. Deveria substituir a palavra 'mulher' por 'receptáculo de esperma humano'. Se for aprovado, o Brasil será o país mais atrasado, conservador e limitado no mundo em direitos reprodutivos. A pergunta não deveria ser 'quem é contra o aborto', mas se a mulher que provoca o aborto nestas condições de total abandono social deveria ser presa. Ninguém é a favor do aborto. Eu não sou e tenho certeza que nenhuma destas mulheres é. Acontece que faltam contrapartidas e as minhas convicções morais e religiosas sobre a concepção da vida são diferentes das suas e sobre isso nunca haverá consenso. Enquanto isso, a lei pode te fazer dormir tranquilo com sua moral, mas nem a minha, nem a sua opinião e nem mesmo a própria lei têm impedido um milhão de mulheres de colocar suas vidas em risco todos os anos".

terça-feira, 17 de setembro de 2013

Ficando à vontade

Alvo do projeto

Ronaldo Caiado acaba de apresentar um projeto de lei que basta começar a tramitar para criar perturbação ao governo. A proposta determina a concessão de vistos permanentes a todos os médicos cubanos vindos por meio do Mais Médicos que solicitarem o documento.
Na prática, se o projeto for aprovado, algo pouquíssimo provável, o visto garantiria a essa turma o direito de nunca mais pisar em Cuba e permanecer trabalhando no Brasil por tempo indeterminado. Bem ao seu estilo, Caiado usou a justificativa da proposta para expôr o Palácio do Planalto.
O alvo? Uma frase de Gilberto Carvalho sobre o fato de os cubanos receberem apenas uma fração dos 10 000 reais pagos aos demais profissionais do programa – o restante vai para o caixa do Estado cubano.
A frase de Carvalho:
- Se o médico aceitou vir para cá nessas condições, é uma relação do cidadão cubano com seu governo. Esse não é um problema nosso.
Uma vez tramitando na Câmara, não faltará munição para os opositores do Mais Médicos apedrejarem Dilma Rousseff e Alexandre Padilha.
Por Lauro Jardim