sexta-feira, 31 de maio de 2013

Vacina japonesa reduz em 72% o risco de malária

Resultados, obtidos na primeira fase de testes clínicos, precisam ser confirmados em pesquisas futuras

Mosquito Anopheles, que transmite a malária aos humanos por meio do protozoário parasita Plasmodium falciparum
Mosquito Anopheles, que transmite a malária aos humanos por meio do protozoário parasita Plasmodium falciparum (IRD / N. Rahola )
Cientistas japoneses estão testando uma vacina contra a malária que, segundo eles, pode reduzir o risco da infecção em até 72%. Ao menos foi o que demonstraram os resultados da primeira fase dos testes clínicos – ou seja, feito em pessoas, e não em modelos animais – do tratamento. Para que uma nova terapia seja aprovada, ela deve passar por três fases de pesquisa clínica.

CONHEÇA A PESQUISA

Título original: Phase 1b Randomized Trial and Follow-Up Study in Uganda of the Blood-Stage Malaria Vaccine Candidate BK-SE36

Onde foi divulgada: periódico PLoS One

Quem fez: Adoke Yeka, Betty Balikagala, Nahoko Suzuki, Hiroki Shirai, Toshihiro Horii e equipe

Instituição: Universidade de Osaka, Japão

Dados de amostragem: 190 pessoas

Resultado: Os pesquisadores avaliaram a eficácia e a segurança da vacina BK-SE36 para prevenir a malária comparando pessoas imunizadas a indivíduos não vacinados. A vacina parece diminuir em até 72% o risco de infecção e mostrou ser segura.
Ainda não existe uma vacina que evite completamente a malária, e pesquisas que testaram vacinas contra a infecção demonstraram uma redução do risco pequena ou então pouco duradoura. Além disso, a resistência da doença aos remédios vem aumentando, o que piora a eficácia dos tratamentos disponíveis.
O novo estudo, feito na Universidade de Osaka, no Japão, testou a vacina BK-SE36, desenvolvida na própria universidade. A vacina foi feita a partir de uma mistura entre um gel de hidróxido de alumínio e uma proteína geneticamente modificada do parasita responsável pela transmissão da doença.
A vacina foi testada entre no Japão e também em uma região de Uganda onde a malária é endêmica. No país africano, entre 2010 e 2011, os cientistas testaram a vacina em 132 indivíduos de seis a 20 anos e, entre 130 e 365 dias após a imunização, compararam essas pessoas a outras 50 de um grupo de controle, que não haviam sido vacinadas.
De acordo com os pesquisadores, essa fase do estudo mostrou que a vacina é segura e nenhum paciente imunizado apresentou efeitos adversos graves. O efeito protetor demonstrado pelo tratamento, porém, precisa ser confirmado nas próximas etapas da pesquisa clínica.
Os resultados do teste foram publicados nesta semana no periódico PLoS One. Toshihiro Horii, coordenador do estudo, disse à agência de notícias Jiji Press que seu objetivo é que a vacina BK-SE36 seja usada “cinco anos após a realização de um estudo feito com crianças de até cinco anos de idade, que representam a maior parte das mortes por malária”.

quarta-feira, 29 de maio de 2013

Planos de saúde terão que oferecer medicamentos orais para tratamento domiciliar do câncer

Mudança faz parte da ampliação do rol de procedimentos obrigatórios a serem ofertados pelas operadoras

Agência Brasil
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A partir de janeiro de 2014, planos de saúde que atuam no país terão que ofertar 36 medicamentos orais indicados em terapias contra o câncer, usados por pacientes em tratamento domiciliar. A mudança faz parte da ampliação do rol de procedimentos obrigatórios a serem ofertados pelas operadoras.

A medida foi anunciada nesta terça-feira (28) pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e pelo Ministério da Saúde. De acordo com o diretor-presidente da ANS, André Longo, esses serviços passam a vigorar após consulta pública e aprovação da resolução normativa.

Segundo o dirigente, a consulta pública não vai alterar a decisão de oferecer os medicamentos orais, podendo servir para ampliar a lista divulgada hoje. “Nossa expectativa é de ampla participação da sociedade. No último rol, realizado de dois em dois anos, a ANS conseguiu mais de 6 mil contribuições”, informou. O anúncio teve a participação do ministro da Saúde, Alexandre Padilha.

Os remédios têm 54 indicações contra o câncer, entre esses os de próstata, mama, pulmão, rim, estômago e pele, do câncer colorretal, leucemia e linfoma. Os medicamentos servem de alternativa ou de complemento a outros tratamentos, como a quimioterapia tradicional e a radioterapia.

Pelo rol atual, os planos de saúde só são obrigados a conceder o tratamento oral contra o câncer em locais de serviço de saúde (hospitais e salas de quimioterapia).

Agora, de acordo com André Longo, cada plano deverá estabelecer sua lógica de distribuição dos remédios – distribuição direta; definição de convênios com farmácias privadas; ou criação de mecanismos de reembolso aos pacientes.

Ainda de acordo com as novas regras, a operadora não poderá limitar a quantidade de medicamentos usada pelo paciente. Ele terá direito ao volume prescrito pelo médico, enquanto durar o tratamento.

Outras mudanças do novo rol incluem o aumento do número de consultas com nutricionistas, psicólogos e fisioterapeutas. Já o exame PET (sigla em inglês para Tomografia por Emissão de Pósitrons, em tradução livre) Scan, empregado para o monitoramento do câncer, teve uso estendido de três para oito indicações.

A lista inclui um total de 80 procedimentos médicos e odontológicos entre medicamentos, exames, cirurgias e terapias, e expande as indicações de outros 30 itens já ofertados pelas operadoras.

O Rol de Procedimentos e Eventos de Saúde é obrigatório para todos os planos de saúde contratados a partir da entrada em vigor da Lei 9.656/98 e está disponível para consulta pública no site da ANS. Podem contribuir a sociedade civil, médicos e especialistas no período de 7 de junho a 7 de julho.

A atualização da lista é feita a cada dois anos, na tentativa de garantir o acesso ao diagnóstico, tratamento e acompanhamento de doenças por meio de técnicas que possibilitem o melhor resultado, seguindo critérios de segurança e eficiência.

terça-feira, 28 de maio de 2013

Nascidos por cesárea são 83% mais propensos a ter sobrepeso, diz estudo

Pesquisa acompanhou crianças nascidas na década de 1990

Terra
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Bebês nascidos por cesariana têm quase duas vezes mais risco de se tornarem crianças e adolescentes obesos, de acordo com um novo estudo. Depois de examinar os registros de mais de 10 mil crianças britânicas, os pesquisadores descobriram que crianças de 11 anos que haviam nascido por cesárea eram 83% mais propensos a ter excesso de peso em comparação às crianças que nasceram por parto normal. Os resultados do estudo, divulgado pelo jornalDaily Mail, confirmam pesquisas anteriores que também indicaram uma ligação entre cesarianas e obesidade infantil.

Os investigadores acreditam que durante o parto normal os bebês são expostos a bactérias que ajudam a regular o metabolismo posteriormente. A pesquisa sugere que a epidemia atual  de obesidade poderia ter sido impulsionada em parte pelo aumento da taxa de cesarianas. Na Inglaterra, por exemplo, um a cada quatro nascimentos são por meio desse tipo de parto, totalizando mais de 160 mil por ano.

Preocupações com a saúde podem determinar que esse seja o parto escolhido, mas muitas vezes essa opção é feita sem nenhuma razão médica. "Pode também haver consequências a longo prazo para as crianças que ainda não conhecem", disse a pesquisadora Jan Blustein, da Escola de Medicina da Universidade de Nova York.

A médica não considera o risco de obesidade um fator determinante no momento da escolha do parto, que deve ser feita com base em questões médicas. No entanto, Jan alerta que aquelas que optam pela cesariana "devem saber sobre esses riscos".

Para o estudo a equipe analisou dados de uma grade investigação sobre desenvolvimento infantil chamada Avon Longitudinal Study of Parents and Children. Este levantamento acompanhou a longo prazo cerca de 14 mil crianças nascidas na década de 1990.

Pouco mais de 9% dos bebês participantes do estudo nasceram por cesariana e tinham, em média, 56 gramas mais leves do que aqueles nascidos por parto normal. No entanto, com seis meses de vida o grupo da cesariana já estava mais pesados do que os nascidos naturalmente, mesmo levando-se em consideração outros fatores como o peso da mãe e a amamentação.

O risco de obesidade foi particularmente acentuado entre crianças nascidas de mães com excesso de peso, segundo os pesquisadores. No total, um terço das crianças estava acima do peso aos três anos, enquanto aos sete e aos 15 anos havia 17% de chance de serem crianças obesas.

A pesquisa, publicada no International Journal of Obesity, também destacou os riscos da cesariana para as mulheres, incluindo aumento da chance de lesões intestinais ou na bexiga, bem como futuras complicações na gravidez. Segundo Jan, uma razão para a ligação entre obesidade e esse tipo de parto poderia realmente estar ligada a exposição a bactérias benéficas sendo que adultos obesos tendem a ter essas bactérias boas em menos quantidade em seu trato digestivo e possuem altos níveis de bactérias ruins, fazendo com que queimem menos calorias acumulando gordura.

Outros estudos mostram ainda que mulheres obesas são mais propensas a precisar de uma cesariana e tendem a ter filhos que no futuro sofrerão como sobrepeso. Isso levanta a possibilidade de que essas crianças seriam mais pesadas de qualquer maneira. "O excesso de peso é um fator de risco para cesariana, a questão é tentar descobrir se isso é real ou apenas uma questão de escolha", ressaltou a médica.

segunda-feira, 27 de maio de 2013

UFRGS desenvolve estudo inédito com nanotecnologia e células-tronco

Pesquisadores trabalham com regeneração e produção de tecidos.
Resultados animadores são esperança contra câncer e lesões na medula.

Guacira Merlin Da RBS TV
Encontrar a fórmula para reconstruir órgãos do corpo humano. É com este objetivo que um grupo de pesquisadores gaúchos está trabalhando em uma técnica inovadora a partir do uso de células-tronco. O estudo já apresenta resultados surpreendentes e, pode, no futuro, ser uma esperança para quem sofre com doenças como câncer ou com lesões na medula.
Inédita, a pesquisa é desenvolvida no Laboratório de Hematologia e Células-Tronco da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Basicamente, o estudo une conhecimentos de nanotecnologia para desenvolver um novo material que servirá de suporte para a produção de tecidos e para o crescimento de células-tronco em tecidos lesionados.
“O que foi o Frankestein? Nada mais do que um transplante múltiplo de órgãos. O que nós fazemos hoje? Hoje é bastante frequente nós fazermos transplante múltiplo de órgãos, só que nós precisamos de um doador desses órgãos. O que nós esperamos é que no futuro, quem sabe, nós possamos então construir esses órgãos em laboratório ou pelo menos parte desses órgãos”, explica a professora Patrícia Pranke, coordenadora do laboratório.
Os pesquisadores já reconstruíram um pedaço da laringe de cobaias, usando células-tronco e aplicando conhecimentos da chamada Engenharia de Tecidos, ou seja, a construção de um tecido ou órgão vivo. A parte da laringe das cobaias que foi substituída chama-se cartilagem tireoide, que nos humanos pode ser destruída pelo câncer, por exemplo.
“A cartilagem não cresce. Então, por ser um tecido de difícil regeneração, nós estamos mostrando que essa técnica é viável, bem viável, para em um futuro próximo ser utilizada em humanos”, afirma o professor Geraldo Pereira Jotz, chefe do Departamento de Ciências Morfológicas.
O primeiro passo foi cultivar células-tronco em uma espécie de membrana bem fina, usando técnicas da nanotecnologia, uma ciência revolucionária, que cria objetos a partir de coisas muito pequenas. A unidade de medida é o nanômetro, que corresponde a um metro dividido por um bilhão.
Usando a nanotecnologia, uma máquina tece a membrana. O fio é tão fino que é imperceptível a olhos nus. Só mesmo no microscópio para enxergar o emaranhado de fibras, onde as células-tronco vão se fixar e crescer.
“É como se nós imaginássemos uma teia de aranha e as células-tronco vão entrando nessa malha de forma tridimensional. Assim nós temos certeza que em todos os níveis de tecido nós vamos ter células, não apenas na parte superior como na parte inferior”, explica Patrícia.
Para explicar melhor a vantagem dessa técnica, a pesquisador ilustra com o exemplo de uma cozinha. A cozinheira seria a cientista e as células-tronco, a massa, que se transforma no que a cozinheira deseja conforme os ingredientes usados.
“Você vai fazer um bolo de chocolate, por exemplo, ou você vai fazer uma massa de pizza, dependendo dos ingredientes que você usou. A mesma coisa conosco. Dependendo do alimento que nós vamos fornecer a essa célula, ela pode virar um neurônio, pode virar uma célula cardíaca, uma célula hepática”, enumera a pesquisadora.
Agora imagine que a massa de células-tronco tem que ir para o forno. Se ela for simplesmente despejada lá dentro, vai escorrer e se perder. Para virar um bolo de verdade, é preciso usar uma forma. Na pesquisa, esse papel é desempenhado pela membrana feita com nanotecnologia.
A diferença é que, enquanto o bolo é retirado da forma depois de pronto, na Engenharia de Tecidos a membrana é biodegradável, absorvida pelo corpo sem deixar vestígios. Foi o que aconteceu nas cobaias operadas pelo doutor Geraldo Jotz.
“Nós colocamos essa membrana dobrada na parte que ficou aberta na cartilagem, dobramos ela e suturamos esta membrana. As células mais escuras são as células antigas, as mais claras são as jovens, de cartilagem que estão crescendo. Essa é a parte que foi tirada e esta sendo totalmente reconstruída a partir de células-tronco adultas”, conta ele.
“Nós usamos essa técnica para regenerar cartilagem, pra regenerar pele, osso, nervo periférico, lesão de medula espinhal. A ideia é justamente cultivar as células-tronco aqui e nós colocarmos isso em animais de laboratório inicialmente e fazer tipo uma ponte, onde as células-tronco possam fazer a ligação das duas partes perdidas da medula espinhal”, acrescenta Patrícia.
Segundo os pesquisadores, um dos objetivos do estudo é fazer com que pacientes com esse tipo de lesão possam recuperar os movimentos. Mas antes é preciso continuar testando a técnica em animais e ter certeza de que vai trazer benefícios sem efeitos colaterais para os seres humanos. Os resultados ainda são incertos, mas enchem de esperanças a equipe de pesquisadores.

domingo, 26 de maio de 2013

Primeira geração com HIV enfrenta envelhecimento precoce

Corpo de pessoa com vírus funciona como o de alguém com 15 anos a mais

Indianos distribuindo laços vermelhos no Dia Mundial de Luta contra a AIDS
Lanço simboliza luta contra a Aids (Diptendu Dutta/AFP)
Passados 30 anos da descoberta do vírus HIV, causador da Aids, a primeira pergunta que muitos pacientes ainda fazem logo após receber o diagnóstico de que são soropositivos é: quanto tempo eu tenho de vida? O infectologista Alexandre Naime Barbosa tem a resposta na ponta da língua: "O mesmo tempo que qualquer outra pessoa da sua idade". O advento da terapia antirretroviral conseguiu controlar a principal causa de morte durante o início da epidemia: as doenças oportunistas, que surgiam depois que o vírus, em multiplicação alucinada, aniquilava as defesas do organismo. Hoje, os pacientes vivem mais. No entanto, sabe-se que eles envelhecem mais rapidamente.
As drogas antirretrovirais conseguiram diminuir a replicação do vírus a ponto de a carga viral, nas pessoas que tomam o remédio rigorosamente, ficar indetectável no sangue. Algumas partes do corpo, porém, funcionam como reservatórios do vírus. É o caso, por exemplo, dos sistemas nervoso e linfático, locais em que o vírus fica fora do alcance das drogas e continua se replicando lentamente.
Nos últimos anos, vários estudos em todo o mundo vêm mostrando que o corpo de uma pessoa que vive por muitos anos com o HIV acaba funcionando como o de alguém que tem, em média, 15 anos a mais. As comorbidades mais comuns são as doenças cardiovasculares, como infarto e AVC (acidente vascular cerebral). Em seguida, vêm os vários tipos de cânceres, como o de próstata, mama e colo de útero. Também são comuns perda de massa óssea, diabetes e distúrbios neurocognitivos, como demência precoce.
A orientação de Ricardo Diaz, infectologista da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), é para que pacientes soropositivos realizem exames periódicos para tentar lidar preventivamente com tais doenças. "Mulheres com o HIV devem fazer o exame de papanicolau e mamografia a cada seis meses, por exemplo. Recomendamos ainda que todos sempre tomem vacinas", afirma. Com esses cuidados, diz, mesmo com uma incidência maior de outros problemas de saúde, não há impacto na expectativa de vida. "A mortalidade é praticamente igual a de quem não tem HIV. Só é preciso ter mais cuidados", afirma.

sábado, 25 de maio de 2013

Você sabe o que você come?

Leite adulterado, carne sem origem, suco estragado: o crescimento de problemas de saúde relacionados à ingestão de alimentos contaminados coloca em xeque a eficiência da fiscalização e mina a credibilidade da indústria de alimentos

Laura Daudén

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Ainda surgiam notícias sobre o andamento da Operação Leite Compensado, que identificou no Rio Grande do Sul um esquema de adulteração de leite cru com ureia, quando uma nova denúncia desabou sobre o setor. Em Goiás, foi descoberta uma quadrilha que furtava cooperativas e adicionava uma mistura de água, sal e açúcar ao leite – que era vendido, na última etapa do esquema, a laticínios ilegais. No caso gaúcho, 12 pessoas foram indiciadas pelo Ministério Público, mais de 300 mil litros de leite foram apreendidos e três marcas (Italaq, Líder e Mumu) tiveram de tirar seus produtos do mercado por conterem formaldeído, uma substância cancerígena presente na ureia. Em Goiás, sete pessoas foram presas. Os crimes são distantes e diferentes em tamanho e método, mas expõem uma realidade única em todo o Brasil: as brechas do sistema de fiscalização de alimentos. “As pessoas estão desacreditadas não só com a cadeia do leite, mas também com o setor de alimentos do País. Passamos por uma crise de credibilidade”, afirma Paulo Fernando Machado, coordenador da Clínica do Leite da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (USP). “Se eu fosse um tomador de leite na França e visse uma notícia como essa, não beberia mais leite do Brasil.” Esse, e outros casos que surgiram nas últimas semanas, mostrando os perigos a que os consumidores brasileiros estão expostos quando se sentam à mesa, remetem à pergunta: afinal, os alimentos consumidos no País são seguros?
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Na família da fotógrafa mineira Adriana Gonçalves, 42 anos, a pergunta ainda deixa um gosto amargo. No início de maio, eles compraram um suco da marca Del Valle sabor goiaba e o consumiram no dia seguinte, dentro do prazo de validade. Foram salvos de uma experiência mais traumática pelo hábito de nunca tomar nada direto da embalagem. “Quando meu marido serviu a bebida para os meus filhos, saiu uma coisa branca. Se as crianças estivessem sozinhas, com certeza teriam ingerido.” Adriana coou o conteúdo da caixa e entrou imediatamente em contato com o Serviço de Atendimento ao Consumidor da Coca-Cola Brasil, dona da Leão Alimentos, que produziu o lote do suco. “Os problemas acontecem, mas a empresa tem a obrigação de informar o consumidor sobre os riscos e assumir a responsabilidade pelas falhas”, diz Adriana. Por meio de nota, a fabricante informou que o caso é “pontual e isolado” e aparenta ser fruto da “formação de bolor causada por perda de vedação da embalagem, provavelmente por impacto durante o transporte ou armazenamento”. Em sua busca de mais respostas e, sobretudo, de uma mudança de conduta por parte da marca, Adriana postou uma foto do suco contaminado no Facebook. Até o fechamento desta edição, a denúncia já havia sido compartilhada mais de 300 mil vezes.
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“A distribuição global de alimentos e a complexidade da cadeia produtiva propiciaram um aumento na ocorrência de eventos e emergências relacionados à inocuidade de alimentos”, afirmou à ISTOÉ, em nota, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). “A participação dos consumidores por meio de denúncias e reclamações também vem crescendo.” O problema apontado pela agência se verifica em diversas cadeias produtivas. No caso dos produtos de origem animal, por exemplo, há uma evidente falta de pessoal para dar conta do trabalho de fiscalização. Segundo Wilson Roberto de Sá, presidente do Sindicato dos Fiscais Federais Agropecuários (ANFFA), são apenas 3.307 profissionais para todo o País. “O sistema está fragilizado e, sem dúvida, estamos correndo riscos porque o produto que chega à mesa pode não ter passado pelos processos de fiscalização”, afirma. Outras organizações vão além e denunciam a falibilidade da estrutura de inspeção. “No caso do alimento, a pior coisa que pode acontecer é segmentar, porque ninguém carrega responsabilidade de nada”, diz Roberto Smeraldi, presidente da ONG Amigos da Terra, que vem denunciando falhas graves na cadeia produtiva da carne. “O que você tem de fazer é exatamente o contrário: rastrear e unificar o receituário em todas as fases da cadeia, de maneira que aquele boi tenha nome, sobrenome e apelido.” Smeraldi dirige sua crítica à divisão das inspeções de produtos de origem animal entre as esferas federal, estadual e municipal, o que permite que um produto recusado por estabelecimentos de uma rede seja aceito em outras por conta da diferença de critérios e, também, do rigor na fiscalização. “O Ministério da Agricultura nem sequer olha para um terço da carne que chega à mesa dos brasileiros”, diz. Segundo o relatório “Radiografia da Carne no Brasil”, publicado pela organização no início de 2013, 80% dos abatedouros que não estão sob controle do ministério apresentam irregularidades.
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O sistema tripartido foi criado em 1989 pela Lei 7889, mas há um decreto de 2006 regulamentando a aplicação da legislação e instituindo o Sistema Unificado de Atenção à Sanidade Agropecuária (Suasa). O projeto, no entanto, apenas começa a ser implantado pelo Ministério da Agricultura – a quem compete a fiscalização de todos os produtos de origem animal e vegetal vendidos in natura, além das bebidas alcoólicas e não alcoólicas. No caso dos produtos de origem animal, essa central unificada foi chamada de Sistema Brasileiro de Inspeção de Produtos de Origem Animal (Sisbi), mas apenas cinco Estados já fazem parte do programa. Outros 16 estão em processo de cadastramento.

A fragmentação também acontece na divisão de responsabilidades entre o Ministério da Agricultura e a Anvisa. Para Carlos Thadeu Oliveira, gerente técnico do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), “não parece haver simbiose entre os órgãos de vigilância. A Anvisa e as vigilâncias sanitárias locais não conversam com a Secretaria de Defesa Agropecuária (SDA) do Ministério e menos ainda com os serviços estaduais de inspeção”. Essa falta de centralidade nos processos relacionados à segurança dos alimentos produz casos como o da autorização, por parte do Mapa, de um agrotóxico vetado por técnicos da agência em 2007 – a decisão foi reiterada pelo comitê de assessoramento técnico criado para avaliar a infestação de lagartas em lavouras de algodão e soja na Bahia, em março deste ano. O benzoato de emamectina é considerado tóxico para o sistema neurológico. Segundo a Anvisa, o uso de agrotóxicos não autorizados é responsável pela maior parte das irregularidades encontradas nos alimentos de origem vegetal consumidos no Brasil. De acordo com o último relatório do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos, da agência, 30% dos produtos estão fora dos parâmetros.
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Essa situação não afeta apenas os consumidores, mas também os produtores e a indústria, que se vê cada vez mais pressionada a aprimorar seus mecanismos de autocontrole – o que exige mais investimentos e compromissos do setor privado. “A indústria é quem coloca a marca no produto e, portanto, é responsável”, diz Paulo Fernando Machado. “Agora, para detectar essa fraude de adição de ureia no leite, como aconteceu no Rio Grande do Sul, ela precisaria ter capacidade de fazer uma análise específica. O procedimento é fácil e rápido, desde que você tenha o equipamento necessário, mas ele é caro.” Nilson Muniz, diretor-executivo da Associação Brasileira da Indústria de Leite Longa Vida (ABLV), afirma que “a indústria aplica todas as análises previstas na legislação e é a maior interessada em receber a melhor matéria-prima”. Ele também ressalta que o teste para detectar o fomaldeído não fazia parte do conjunto de medidas obrigatórias, já que esse tipo de adulteração não era registrado há mais de 20 anos (a análise voltou a ser exigida em fevereiro de 2013, justamente por causa do crime).
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Segundo Ênio Marques, da SDA, fazer com que as empresas assumam a tarefa de garantir a qualidade de seu próprio produto é uma tendência dentro do Ministério da Agricultura. Ari Crispin, coordenador de Programas Especiais do Mapa, afirma que isso não significa o afastamento do poder público. “Trata-se de um aprimoramento do sistema. Nós estabelecemos os limites e avaliamos o comprometimento do empresário com essas metas”, afirma. Outra figura que precisará entrar na receita do ministério é o produtor, que muitas vezes representa a ponta fraca do sistema. Carlos Thadeu de Oliveira, do Idec, ilustra a situação. “Por ocasião de um teste que fizemos com 25 marcas de queijo minas frescal, recebemos vários produtores pequenos. O que vimos é que eles não são orientados corretamente sobre como fazer o controle, são ameaçados, tratados como cachorros pelos fiscais”, diz. Das 25 amostras coletadas, cinco estavam contaminadas com coliformes fecais – todas faziam parte do Sistema de Inspeção Federal.
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Esse emaranhado de agentes e responsabilidades já passa fatura ao setor exportador, cada vez mais cercado por barreiras sanitárias – ainda que a origem de muitas delas esteja ligada a interesses políticos e econômicos de parceiros comerciais do Brasil. Em 2011, o País recebeu 95 notificações do sistema de vigilância sanitária da União Europeia, o Rapid Alert System, o que o coloca na 12ª posição na lista de países mais notificados pelo bloco. Em 2009, foram 84 alertas e, em 2010, 110. Atualmente, nove países seguem com embargos à carne brasileira, por conta de um episódio de encefalopatia espongiforme bovina (doença conhecida como “Vaca Louca”), no Paraná.
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Do ponto de vista da saúde, não faltam motivos para cultivar a prevenção. Entre 2008 e 2012, houve um aumento de 226% nos casos de intoxicações provocadas por alimentos (leia quadro), conforme dados do Ministério da Saúde. Nutricionista e técnica da associação de consumidores Proteste, Manuela Dias diz que “os problemas ocasionados por alimentos contaminados por bactérias podem variar de uma dor de barriga leve até a morte”. Ela também ressalta que o período de incubação da doença dura de horas até dias – o que dificulta a identificação do produto contaminado. “No Brasil, o problema é completamente subnotificado. Só acontece quando é um surto e acomete muitas pessoas.” Apenas um recall de produto alimentício foi feito no Brasil em 2012. Nos Estados Unidos, no mesmo período, foram 80.
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Um dos afetados pelo problema foi o aposentado José Barbosa da Silva, 63 anos. Ele foi parar no hospital com uma infecção estomacal depois de consumir uma bebida de soja da marca AdeS em março deste ano, na mesma época em que a empresa anunciou a contaminação de um lote do produto por soda cáustica. “Ele tem o estômago sensível e, por isso, temos muito cuidado com tudo o que toma”, diz Luciano Barbosa da Silva, filho de José. “Naquela noite, ele comeu algo muito leve e isso fez com que a gente descartasse, em um primeiro momento, a possibilidade de intoxicação alimentar.” Justamente por isso, a família não guardou a caixa e o registro do lote do produto consumido pelo aposentado, o que dificultou a busca por reparação. “Nós chegamos a acionar dois advogados, mas nenhum quis levar o caso adiante, por se tratar de um embate com uma empresa muito grande.”
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Judi Nóbrega, diretora do Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal do Mapa, explica que é muito importante que a informação sobre esses casos chegue aos canais formais de denúncia – Vigilância Sanitária e Ministério da Agricultura –, com dados que permitam às autoridades identificar a empresa implicada e o lote do produto. “A partir daí, podemos fazer uma fiscalização para verificar a procedência da denúncia e as condições dos estabelecimentos. Além disso, a ouvidoria do ministério gera relatórios que possibilitam programar inspeções direcionadas.” Mesmo recorrendo aos canais disponíveis e recebendo as compensações devidas – como a troca do produto ou a devolução do dinheiro –, os consumidores se sentem cada vez mais distantes da produção do alimento e, assim, bastante vulneráveis. “Você fica traumatizado porque poderia ter acontecido o pior”, diz Luciano Silva. “A gente está falando de uma grande indústria, mas imagine as pequenas. O governo precisa nos proteger.”
Foto: Bernardo Salce / Agencia i7
Foto: Orestes Locatel
Foto: Felipe Rosa / AGP
*Fontes: Sinan, Ministério da Saúde e Organização Mundial da Saúde
*Fonte: Agência Nacional de Vigilância Sanitária, Ministério da Saúde, Ministério da Agricultura

sexta-feira, 24 de maio de 2013

CFM propõe alternativa à 'importação' de médicos

Conselho sugere mudanças que tornem mais atrativo para médicos formados no Brasil o trabalho em áreas consideradas prioritárias no país

Médicos
CFM: Conselho envia ao Ministério da Saúde proposta que seja alternativa à importação de médicos estrangeiros no país (Thinkstock)
O Conselho Federal de Medicina (CFM) apresentou nesta sexta-feira uma proposta para tentar convencer o governo a desistir do plano de recrutar médicos estrangeiros para trabalhar em áreas consideradas prioritárias no Brasil. O documento pede alterações no Programa de Valorização de Atenção Básica, o Provab, de forma a tornar mais atrativo para médicos formados no Brasil o trabalho nas regiões de maior necessidade.
A proposta, protocolada no Ministério da Saúde e no Palácio do Planalto, condiciona a abertura de vagas à instalação de infraestrutura adequada, oferta de insumos, equipamentos de diagnóstico e terapias. O CFM sugere que profissionais recrutados tenham vínculo contratual com o Ministério da Saúde, uma jornada de 40 horas semanais, direito a licença-maternidade e auxílio-doença, férias e aviso prévio de desligamento de 30 dias.
O Provab foi criado em 2011 para tentar atrair médicos para áreas consideradas de difícil provimento: periferias de grandes cidades e postos em municípios afastados. Na edição deste ano, dos 13.000 profissionais solicitados pelas prefeituras, 3.800 assinaram contrato, o equivalente a 29% das vagas abertas.
Condição — No documento, o CFM também admite a "importação" de médicos formados no exterior desde que eles sejam aprovados no Revalida, um exame para validação do diploma, e em um teste de fluência em português.

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Lei que prevê tratamento de câncer em 60 dias vale a partir desta quinta

Prazo conta após diagnóstico e inclusão de dados no prontuário médico.
Quase 280 unidades do país farão cirurgia, químio e radioterapia pelo SUS.

Luna D'Alama Do G1, em São Paulo*
Entra em vigor nesta quinta-feira (23) a lei federal que estabelece um prazo máximo de 60 dias para que pessoas com câncer iniciem o tratamento pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Nesse período, que conta a partir da confirmação do diagnóstico e da inclusão dessas informações no prontuário médico, os pacientes devem passar por cirurgia ou iniciar as sessões de químio ou radioterapia, conforme a indicação de cada caso.
A lei foi sancionada pela presidente Dilma Rousseff em novembro do ano passado e tinha 180 dias para começar a valer.
A nova regra, porém, não vale para três casos: câncer de pele não melanoma (a biópsia às vezes já é o tratamento), tumor de tireoide com menor risco e pacientes sem indicação de cirurgia, radioterapia ou quimioterapia. Em algumas dessas situações, porém, o uso de remédios deve começar logo após a detecção da doença.
A previsão do Instituto Nacional do Câncer (Inca) é de que 518 mil casos de câncer sejam diagnosticados em 2013, número que deve aumentar com o envelhecimento da população e o aumento do tabagismo no sexo feminino.
Em todo o país, 277 hospitais, centros e institutos estão habilitados a realizar procedimentos oncológicos pela rede pública. Há unidades em todos os estados, mas cinco deles – quatro no Norte e um no Nordeste – têm apenas um local de tratamento. É o caso do Acre, Amapá, Amazonas, Roraima e Piauí.
Segundo o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, será preciso ampliar os serviços principalmente nessas duas regiões e no interior do país. Os investimentos para isso têm sido feitos desde 2011, com a implantação de 80 novos centros de radioterapia, aquisição de equipamentos e parcerias junto ao Ministério da Educação (MEC) para formar profissionais na área de oncologia, o que leva de dois a três anos.
"[Isso] Vai exigir uma reorganização dos estados e municípios, dos hospitais. (...) Outro grande desafio é termos mais médicos especialistas em câncer", disse Padilha, em entrevista à Globo News.
De acordo com o secretário de Atenção à Saúde do ministério, Helvécio Magalhães, os cinco estados com apenas uma unidade de atendimento ao câncer pelo SUS apresentam um perfil populacional baixo, e o cálculo do número de locais necessários é feito com base no total de habitantes. Apesar disso, segundo Magalhães, esses "vazios assistenciais" serão identificados e corrigidos.
Rosemar e Jaciara em tratamento contra o câncer em Ribeirão (Foto: Fernanda Testa/G1)Rosemar e Jaciara fazem tratamento de câncer
em Ribeirão Preto (SP) (Foto: Fernanda Testa/G1)
Para quem mora no Norte e no Nordeste, muitas vezes a saída é viajar milhares de quilômetros em busca de atendimento especializado. Foi o caso de duas mulheres, uma de Rondônia e outra da Paraíba, que foram diagnosticadas no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, no interior de São Paulo.
Rosemar Rodrigues Barbosa, de 25 anos, e Jaciara de Lima Cosmo, de 18, fazem parte dos 6% dos atendimentos do hospital que incluem pessoas de fora da região. As duas começaram o tratamento menos de 20 dias após o diagnóstico da doença: uma tem um tumor na língua e a outra, um linfoma (câncer no sistema linfático).
Na tentativa de ajudar no tratamento de pacientes com câncer, clínicas privadas também poderão se credenciadar ao SUS. O objetivo do Ministério da Saúde é aproveitar a estrutura que já existe e expandi-la em novos turnos. Magalhães conta que 20 serviços privados de radioterapia estão se credenciando à rede pública, e outros já 50 foram consultados pelo governo.
"A data de hoje é um marco na disposição legal, mas nada acontece de um dia para o outro. Apoiamos a iniciativa da lei porque vira uma força a mais para o que já estávamos tratando de forma especial, que são as doenças crônicas. Cada vez mais, conseguimos colocar o câncer no centro da Política Nacional de Saúde", avalia.
Novo sistema
Desde o dia 16, municípios e estados brasileiros têm acesso ao Sistema de Informação do Câncer (Siscan), um programa de computador que reunirá o histórico de todos os pacientes oncológicos e do tratamento de cada um.
Reginaldo Filho e sua esposa, no Recife (Foto: Katherine Coutinho / G1)Desenhista Reginaldo da Silva Filho e a mulher,
Laudiceia, no Recife (Foto: Katherine Coutinho/G1)
A partir de agosto, as prefeituras e os governos estaduais serão obrigados a cadastrar as informações nesse sistema – que estará disponível ao público, via internet. Quem não cumprir o acordo terá repasses suspensos por parte do governo federal.
"O Siscan vai permitir um monitoramento online em tempo real, mostrar onde há mais dificuldades, a concentração dos tipos de câncer, para elaborar forças-tarefa e agilizar procedimentos. Onde houver indícios de descaso por parte de um gestor ou prestador, haverá punição administrativa", explica o secretário.
Mais de mil pessoas foram treinadas a usar o novo sistema, com cursos a distância e manuais, segundo Magalhães. Depois de agosto, será feito o primeiro balanço, que após esse período deve ser mensal.
O Siscan ainda não chegou, porém, a instituições como o Hospital do Câncer de Pernambuco, onde o desenhista Reginaldo Carlos da Silva Filho, de 23 anos, luta contra um câncer nos ossos e nos pulmões. Após os primeiros sintomas, há cinco anos, ele levou oito meses para receber atendimento e mais de cinco meses para iniciar o tratamento.
Toda semana, Reginaldo viaja quase 70 km da cidade onde mora, Lagoa de Itaenga, até o hospital em Recife. Ele tem recebido o apoio da mulher, que conheceu em São Paulo, depois de nove meses de conversas a distância, e com quem se casou em fevereiro.
Apoio familiar incentiva irmãs na busca pela cura do câncer em unidades de saúde de Campinas (Foto: Anaísa Catucci/ G1 Campinas)Irmãs Clediléia e Clereni se apoiam uma na outra
para vencer o câncer (Foto: Anaísa Catucci/G1)
Demora no diagnóstico
Um dos problemas que a nova lei não contempla é a demora que o paciente enfrenta para obter o diagnóstico correto da doença. Esse foi o caso da vendedora Clediléia Maria Magalhães, de 35 anos, que vive em de Campinas (SP) e levou oito meses para receber o resultado de uma mamografia, que acabou identificando um nódulo. Agora, ela vive uma fase de "angústia, com um peso nas costas", à espera de novos exames para saber se se trata de um tumor maligno.
"O médico do posto disse que tem possibilidade de não ser câncer e que há casos mais graves na minha frente. Mesmo com a orientação de um oncologista, que me examinou e pediu exames pré-operatórios, ele resolveu cancelar tudo, depois solicitou uma ultrassonografia e, se for possível, irá encaminhar para um mastologista", disse.
Já a irmã mais velha de Clediléia, Clereni Maria Cândido, de 47 anos, foi diagnosticada em 2007 com um tumor no ovário que se espalhou para outros órgãos. Para detectar a doença, ela resolveu pagar as próprias despesas – pelo menos, R$ 2,5 mil. Acabou passando por três hospitais, quatro cirurgias e se aposentou por invalidez.
Para o oncologista Pedro Ricardo de Oliveira Fernandes, do Hospital Municipal Dr. Mário Gatti, em Campinas, a nova regra não melhora os problemas da rede pública.
"Diante da situação que enfrentamos hoje, é uma utopia acreditar que vai ocorrer com tanta agilidade a mudança do cenário que temos nos hospitais da cidade. Os exames ambulatoriais pelo SUS demoram muito e, quando precisamos de exames sofisticados, existem pacientes que morrem na fila por conta da precariedade", diz.
Francisca Camurça Rondônia (Foto: Ivanete Damasceno/G1)Dona de casa de Rondônia se queixa da demora
para ter diagnóstico (Foto: Ivanete Damasceno/G1)
Na opinião do secretário de Atenção à Saúde do ministério, Helvécio Magalhães, os serviços do SUS devem facilitar o diagnóstico por meio de exames como ultrassom, endoscopia e colonoscopia.
"Outro ponto é apostar na detecção precoce. Quanto mais cedo o médico, na atenção básica, suspeitar de algo, maior pressão haverá para o paciente fazer os exames e iniciar o tratamento", diz.
Esse é o ponto fraco da maioria dos casos. Segundo Rodrigo Almeida de Souza, diretor do Hospital de Base Ary Pinheiro, em Rondônia, o diagnóstico precoce depende do tempo que o paciente leva para procurar o posto de saúde e ser encaminhado a um especialista.
Esse tempo prolongado pode ser determinante, como vive na pele a dona de casa Francisca Camurça, de 53 anos, que faz tratamento contra um câncer de mama em Porto Velho, após quase sete meses de espera pelo resultado.
Sobre o tratamento, Francisca não tem queixas. "Começou rápido, o que demorou foi detectar a doença", lamenta.
Conceição faz acompanhamento médico (Foto: Alan Schneider / G1)Costureira Conceição faz acompanhamento médico
em Jaú, no interior de SP (Foto: Alan Schneider/G1)
Apesar de essas situações de longa espera não parecerem exceção, há casos exemplares de atendimento de câncer no país. Os moradores do interior paulista Conceição Aparecida de Matos e José Gomes Ferreira, de 71 anos, se beneficiaram da rapidez dos serviços oferecidos em Jaú.
Ela, que trabalha como costureira, foi diagnosticada com câncer de intestino e ele, de próstata. Em um mês, Conceição passou por cirurgia e agora faz acompanhamento. José segue o mesmo caminho, e admite que a falta de informação e o preconceito para fazer exames preventivos fizeram com que ele só procurasse um médico aos 60 anos de idade.
No entanto, o atendimento não deve apenas ser rápido, mas também preciso. No caso da professora de Sobradinho (DF) Maria Aparecida Nere, de 53 anos, uma avaliação equivocada poderia ter lhe custado a vida.
Paciente Maria Nere mostra uma chapa de raio X que detectou a presença de um tumor na mama esquerda (Foto: Lucas Nanini/G1)Antes de detectar tumor de mama, professora do DF
ouviu que 'câncer não dói' (Foto: Lucas Nanini/G1)
Após fazer um autoexame das mamas em 2011, ela suspeitou que estava com câncer no seio esquerdo. Consultou-se com dois ginecologistas do SUS, e eles disseram que era apenas gordura e que não deveria se preocupar, pois "câncer não dói". Mas dois exames feitos no mesmo ano mostraram que os especialistas estavam errados.
Hoje, após fazer cirurgia e sessões de químio e radioterapia, Maria Aparecida espera pelo resultado de uma ressonância magnética – feita em clínica particular – para saber se um caroço identificado no tórax e outro na mama esquerda são novos tumores.
Ajuda influente
O aposentado gaúcho Adão Monteiro, de 66 anos, acredita que só conseguiu o tratamento contra um câncer de próstata porque teve ajuda de um vereador.
Ele esperou 11 meses para tratar a doença, diagnosticada em 2011, e precisou passar por 37 sessões de radioterapia no Complexo Hospitalar da Santa Casa, em Porto Alegre.
Adão Monteiro esperou 11 meses por tratamento de um câncer (Foto: Tanise Scherer/G1)Aposentado teve ajuda de vereador para iniciar
sessões de radioterapia (Foto: Tanise Scherer/G1)
"Foi demorado. Se não conhecer ninguém influente, a pessoa morre. Eles não dão bola. (...) É um descaso com o ser humano. Quando a pessoa estiver morrendo, daí eles atendem", desabafa a mulher de Adão, Regiane Alves Monteiro.
Outro entrave vivido por pacientes com câncer é a falta de acesso aos medicamentos necessários ao tratamento, que às vezes não são encontrados no SUS e precisam ser comprados. Adão também passou por isso, e decidiu entrar na Justiça contra a Prefeitura de Canoas, na Região Metropolitana de Porto Alegre, onde mora, para receber o remédio de que precisava.
Atendimento
Dados do ministério mostram que, antes mesmo da nova lei, 78% dos casos de câncer em estágio inicial já têm sido tratados em até 60 dias. Nos casos de câncer em estágio avançado, esse índice sobe para 79%. As informações mostram ainda que 95% das crianças e dos adolescentes começam a ser tratados dentro desse prazo.
Apesar disso, ainda há uma grande desigualdade de tratamento em cidades mais distantes dos grandes centros urbanos, disse Padilha.
Queremos reduzir as desigualdades em relação ao tratamento de câncer no país. Queremos que todos sejam tratados em 60 dias"
Alexandre Padilha,
ministro da Saúde
"Queremos reduzir as desigualdades em relação ao tratamento de câncer no país. Queremos que todos sejam tratados em 60 dias", afirmou.
Se o prazo máximo estiver próximo do fim e o tratamento ainda não tiver começado, os pacientes poderão procurar e cobrar a Secretaria Municipal de Saúde, segundo Padilha.
"Sabemos que será um grande desafio para os municípios cumprirem o prazo, mas é preciso que o cidadão busque informações nos equipamentos de saúde. [...] O ministério também terá uma comissão de acompanhamento de cumprimento dos prazos em todo o país", disse.
Segundo o secretário de Atenção à Saúde do ministério, Helvécio Magalhães, o paciente ou os familiares também podem ligar para o Disque Saúde (Ouvidoria Geral do SUS), no telefone 136.
Câncer no Brasil
O Inca prevê 518 mil novos casos de câncer em 2013. No ano passado, foram mais de 500 mil diagnósticos de tumores, e o gasto público com internações foi de R$ 806 milhões. Esse é o segundo problema de saúde que mais mata no Brasil, atrás apenas de doenças cardiovasculares.
Entre as mulheres, o câncer que mais mata é o de mama – foram 12.705 casos entre 2010 e 2011, o que representa 15,3% das mortes femininas no país. Já entre os homens, o câncer de traqueia, brônquios e pulmões somou 13.677 casos no mesmo período, alcançando 14,2% dos óbitos.
O câncer não pode esperar, mas o tempo não é o principal fator determinante, e sim a qualidade do tratamento, se ele é correto, coerente"
Nise Yamaguchi,
oncologista
Para Padilha, a população brasileira também precisa melhorar os hábitos como forma de prevenção.
"É um problema de saúde pública que será cada vez mais presente por conta do modelo de vida, da urbanização e do envelhecimento. [...] A prevenção do câncer, antes de mais nada, é não fumar, ter hábitos saudáveis, fazer exercícios", destacou.
'Decisão cautelosa e útil'
Na opinião da oncologista Nise Yamaguchi, diretora do Instituto Avanços em Medicina e médica dos hospitais Sírio-Libanês e Albert Einstein, em São Paulo, a decisão do governo é extremamente cautelosa, útil, e vem da necessidade de agilizar o sistema.
"O câncer não pode esperar, mas o tempo não é o principal fator determinante, e sim a qualidade do tratamento, se ele é correto, coerente. É preciso saber o que se está fazendo, e isso não é imediato, depende da resposta do patologista, de uma biópsia", explica.
Nise diz que, na maioria das situações, dois meses são um prazo razoável. A exceção fica por conta de alguns tipos de leucemia, que avançam mais rápido. Em relação às metástases – quando um tumor se espalha para outros órgãos ou tecidos –, não é possível saber quando elas vão ocorrer, razão pela qual não dá para afirmar se 60 dias são um período seguro ou não.
De acordo com a especialista, na maioria dos países não existe esse tipo de lei.
"Neste Brasil continental, seria impossível dar conta de um prazo menor, pois não adianta uma lei para não ser cumprida. Dentro de um ano é que poderemos avaliar essa medida", diz a médica.
*Colaboraram G1 PE, DF, RO, RS,  Ribeirão Preto e Franca, Bauru e Marília, e Campinas e Região

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Ceará é o 2º em casos de Síndrome Respiratória

A doença pode evoluir para a Gripe A. O Estado é um dos que já foram afetados neste ano pela H1N1.

O Ceará é o segundo Estado do Nordeste em número de casos da Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) - doença que pode evoluir para a gripe A- de acordo com informações do Ministério da Saúde, divulgadas ontem. Até o último dia 11 de maio, foram registrados 70 pessoas doentes e dois óbitos.

Somente nesta terça-feira, o Ceará conseguiu atingir a meta de imunizar 80% dos grupos prioritários contra a gripe FOTO: WALESKA SANTIAGO
Em primeiro lugar ficou o Estado de Pernambuco, com 241 casos da doença e duas mortes. Abaixo do Ceará ficou o Rio Grande do Norte que registrou 57 casos da doença e sete óbitos. Em seguida, veio o Piauí com 50 pessoas doentes e uma morte.

Além disso, ainda houve 30 casos e dois falecimentos na Bahia, sete pessoas doentes e três mortas em Alagoas. No Maranhão foram cinco casos e na Paraíba dois.

Em relação à Gripe A, também conhecida como H1N1, o Ministério da Saúde registrou apenas três casos em todo o Nordeste. Ceará, Bahia e o Rio Grande do Norte foram os estados afetados pela doença.

Em todo o Brasil foram notificados 4.713 casos hospitalizados de Síndrome Respiratória Aguda Grave, destes apenas 388 casos foram realmente confirmados para o vírus Influenza A (H1N1). Neste ano, foram confirmados 391 óbitos por SRAG, sendo 61 por A (H1N1). Durante o ano de 2012, foram registrados 20.539 casos da SRAG, sendo confirmados 2.614 para A (H1N1). No ano passado, houve 1.931 registros de mortes, sendo 351 pelo vírus pandêmico.

Ontem, o Ceará atingiu a meta de imunizar 80% do grupo prioritário da Campanha Nacional de Vacinação contra a Gripe. Ao todo foram imunizadas 1.101.758 pessoas em todo o Estado. Desses, 727.410 eram idosos, 20.251 indígenas, 14.858 puérperas, 70.303 gestantes, 109.243 trabalhadores da área da saúde e 159.693 crianças receberam a dose da vacina.

Meta
O balanço nacional aponta que foi superada a meta da 15ª Campanha Nacional de Vacinação contra a Gripe. Até esta terça-feira, dia 21 de maio, tinham sido vacinadas 32,4 milhões de pessoas em todo o Brasil. O número representa uma cobertura de 83,7% do público-alvo, excluídas as doses aplicadas em doentes crônicos e pessoas privadas de liberdade. A meta era vacinar 80%, de um total de 39,2 milhões.

Foram, ainda, aplicadas 5,7 milhões de doses da vacina em doentes crônicos, além de 226,1 mil em pessoas privadas de liberdade. Aqueles que formam o grupo prioritário são considerados mais vulneráveis a desenvolver a forma mais grave da doença e ter complicações, como internação e mortes.

Como parte das medidas de preparação da rede pública, o Ministério da Saúde informa que oferecerá, em parceria com a Universidade Aberta do Sistema Único de Saúde (UNA-SUS), curso de Educação a Distância (EAD) sobre o protocolo de influenza 2013. Essa iniciativa será voltada aos médicos que trabalham nas redes assistência à saúde dos municípios.

terça-feira, 21 de maio de 2013

Exame de laboratório pode prever se grávida terá depressão pós-parto

Até 18% das mulheres sofrem do distúrbio após darem à luz

Terra
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Pesquisadores da Johns Hopkins dizem ter descoberto alterações químicas em dois genes que, quando presentes na gravidez, podem prever com 85% de certeza se a mulher sofrerá de depressão pós-parto. “Ficamos muito surpresos com as descobertas do estudo. Quando vimos os primeiros resultados, nos sentimos cautelosamente otimistas. Mas, quando eles foram replicados, ficamos realmente entusiasmados”, disse ao Terra Zachary Kaminsky, chefe do estudo.

O estudo mostra que modificações epigenéticas podem ser detectadas no sangue de mulheres grávidas desde o primeiro trimestre da gravidez. Isso pode oferecer uma maneira simples de prever a depressão pós-parto e possibilitar uma intervenção antes que os sintomas se tornem graves.

Ao estudar camundongos, os pesquisadores da Johns Hopkins passaram a suspeitar que o estrogeno causava mudanças epigenéticas nas células no hipocampo, a parte do cérebro que controla o humor. A partir disso, os pesquisadores desenvolveram um modelo estatístico para localizar os genes mais prováveis de sofrerem mudanças epigenéticas causadoras de depressão pós-parto. O processo identificou dois genes que reagem mais ao estrogeno: TTC9B e HP1BP3. Pouco é conhecido sobre esses genes, além de seu envolvimento com a atividade do hipocampo.

As descobertas do estudo com camundongos foram depois confirmadas nas amostras sanguíneas das 52 participantes do estudo, todas com histórico médico de transtornos de humor. Essas mulheres foram acompanhas durante a gravidez e após o parto. Foi observado que as participantes com depressão pós-parto apresentavam mudanças epigenéticas maiores nos genes TTC9B e HP1BP3, sugerindo que essas mulheres eram mais sensíveis aos efeitos do estrogeno.

De acordo com Kaminsky, os genes TTC9B e HP1BP3 têm uma função na criação de novas células do hipocampo e na capacidade de o cérebro se reorganizar e adaptar a novos ambientes.  “O índice de acerto de 85% da previsão de depressão pós-parto desse estudo é bem alto. E, melhor ainda, é a simplicidade dessa análise, que pode ser feita com um simples exame de sangue", diz Kaminsky.

Estima-se que entre 10% e 18% das mulheres sofram de depressão depois de darem a luz. A causa específica da depressão pós-parto é desconhecida. Os sintomas incluem sentimento persistente de tristeza, desespero, exaustão e ansiedade. Os sintomas surgem dentro de quatro semanas depois do parto, podendo durar semanas, meses ou mesmo um ano.

O estudo não encontrou uma relação entre a depressão pós-parto com a idade nem com a etnia das participantes. O fator amamentação não foi considerado pelo estudo. Mas os pesquisadores já sabiam que a incidência de depressão pós-parto aumenta para 30% e 35% entre mulheres previamente diagnosticadas com transtornos de humor.

Segundo os pesquisadores, identificar cedo a depressão pós-parto pode limitar ou mesmo evitar que a condição chegue ao ponto de incapacitar as mulheres que sofrem com essa condição. “A depressão pós-parto não apenas afeta a saúde e a segurança da mãe, como também a saúde mental, física e comportamental do bebê. Essa nova ferramenta pode ajudar as grávidas com maior risco de depressão pós-parto a ter uma ideia mais clara de como administrar sua saúde", diz o chefe do estudo.

segunda-feira, 20 de maio de 2013

A ciência ainda não desistiu da celulite


Apesar dos avanços das técnicas usadas para tratar o problema, ainda não há uma abordagem que acabe definitivamente com as celulites — mas isso não quer dizer que a ciência deixou de se dedicar a encontrar novos tratamentos

Vivian Carrer Elias
Celulite
Celulite: tratamentos atuais resolvem, mas efeito não é duradouro e nem completamente eficaz (Thinkstock)
A celulite aflige as mulheres desde sempre, é óbvio. Mas a preocupação com ela é um fenômeno recente. O termo foi usado e descrito pela primeira vez somente em 1920. E o primeiro estudo sobre o assunto demorou ainda mais tempo para aparecer: só em 1978, quando dois pesquisadores alemães publicaram o artigo A chamada celulite: uma doença inventada, que descreveu as características anatômicas desse problema estético, que até então era tratado como doença. Talvez por isso ainda não se tenha encontrado uma solução definitiva para os indesejados furinhos que atormentam as mulheres. Os tratamentos atuais oferecem apenas soluções temporárias, ou completamente inócuas, como alguns cremes que prometem resultados milagrosos.
Essa situação, porém, está mudando rapidamente graças à mudança no comportamento das mulheres dos países desenvolvidos. "O mundo está descobrindo o corpo. Nos Estados Unidos, por exemplo, todos os tratamentos cosméticos estão ficando muito mais comuns agora, como já acontecia, por exemplo, no Brasil. Há sete anos, as pessoas chegavam ao meu consultório em Boston e diziam estar envergonhadas por ter me procurado. Hoje, ninguém mais me diz isso", afirma, em entrevista ao site de VEJA, Matthew Avram, diretor do Departamento de Lasers e Cosmiatria do Hospital Geral de Massachusetts, filiado à Universidade Harvard, nos Estados Unidos. Autor de vários estudos sobre o assunto, Avram esteve no Brasil neste mês para participar do 25º Congresso Brasileiro de Cirurgia Dermatológica, em Campos do Jordão.
Desde então, a celulite vem ganhando cada vez mais espaço entre os pesquisadores — reflexo direto do aumento da atenção que vem recebendo de mulheres não só de países tropicais, como o Brasil, mas de todo o mundo. Não é para menos. Em entrevista ao site de VEJA, Doris Hexsel, dermatologista da Sociedade Brasileira de Cirurgia Dermatológica e autora do livroAnticelulite, lançado em 2012, diz acreditar que todas as mulheres do mundo têm ou terão algum dia celulite. Pesquisas estimam que ela atinja cerca de 80% das mulheres. 

Além da maior atenção, há outro fator que vem contribuindo para colocar a celulite em evidência: o nosso estilo de vida. "A celulite está aumentando cada vez mais, e isso se deve aos hábitos dos dias atuais. Somos mais sedentários, comemos mal, e isso contribui para agravar o problema", diz Doris Hexsel.

10 perguntas sobre celulite

1 de 10

Por que a celulite ocorre principalmente entre as mulheres?

O tecido adiposo sob a pele das mulheres é organizado verticalmente com a ajuda de septos fibrosos que ligam, perpendicularmente, a pele ao músculo. Se esses septos se encurtam e puxam a pele para baixo, ou então se a gordura se acumula nessa região, ocorrem os furos ou as protuberâncias na pele que caracterizam a celulite. No entanto, o tecido que há sob a pele dos homens é envolvido por uma espécie de rede capaz de manter a gordura uniforme mesmo se ela se acumular nessas regiões. Para piorar, as mulheres costumam ter uma pele mais fina, o que facilita que as irregularidades se tornem aparentes. Além disso, o estrogênio torna as mulheres mais propensas a acumular gordura.
 

Saiba mais

CELULITE: DANO À AUTOESTIMA
Um estudo feito em 2011, pelo Centro Brasileiro de Estudos em Dermatologia, avaliou o impacto que a celulite tem sobre a qualidade de vida das mulheres. Para o levantamento, 62 participantes de 18 a 45 anos de idade responderam a um questionário sobre o tema. Os resultados mostraram que mais da metade (65%) dessas mulheres percebeu que tinha celulite antes mesmo dos 20 anos de idade. Além disso, sete em cada dez participantes afirmaram que as celulites prejudicavam "muito" suas vidas, principalmente quando exibiam seus corpos em público (por exemplo, ao usar biquínis, roupas claras ou justas, ou durante o sexo), quando cruzavam as pernas ou então ao praticar algum esporte. Essa pesquisa, coordenada pela dermatologista Doris Hexsel, foi publicada em 2011 no periódico Surgical & Cosmetic Dermatology.
Tratamentos paliativos — As celulites surgem principalmente na pele das mulheres, sempre após a puberdade, especialmente nas áreas onde a gordura é acumulada no corpo e, na maioria das vezes, depois da menopausa. Embora existam fatores que agravam a celulite, como o ganho de peso e retenção de líquido, ela aparece de qualquer maneira, até mesmo entre as mais magras.
Por enquanto, as técnicas disponíveis ajudam – mas não completamente. Durante as últimas décadas, foram desenvolvidos cremes, métodos de massagens e até lasers e ultrassons que ajudam a reduzir a celulite. Porém, a realidade é que ainda não há uma técnica capaz de acabar de vez com ela. "Eu não diria que não temos nenhum tratamento contra a celulite, mas sim que os tratamentos são apenas parcialmente e temporariamente eficazes", diz Avram.
Uma das grandes dificuldades para combater a celulite está no fato de ela não ser apenas causada pelo acúmulo de gordura, o qual poderia ser resolvido simplesmente perdendo peso, mas sim envolver toda uma estrutura que há por debaixo da nossa epiderme. Sob a nossa pele, há o tecido adiposo e, abaixo dele, o músculo. A pele se liga a uma membrana que envolve o músculo por meio de septos fibrosos, estruturas incapazes de se distender e que atravessam a gordura, dividindo o tecido adiposo em "blocos". Por diversos motivos, alguns desses septos se encurtam, puxando a pele para baixo e causando os "buracos" da celulite. Também é possível que a gordura se acumule em determinadas regiões do corpo e, como os septos fibrosos não conseguem se distender, ela se projeta para fora de seu lugar de origem, causando elevações na superfície da pele, que também caracterizam a celulite.
Cynosure/Cellulaze
Celulite
A ilustração mostra, em amarelo, o tecido de gordura, que fica sob a pele e acima do músculo. Os septos fibrosos são as estruturas perpendiculares à pele que separam a gordura em 'blocos'.
"Tratar a celulite é tratar a arquitetura da gordura, e não apenas removê-la. Mesmo tirando a gordura, essa estrutura fica. Podemos remover a gordura há décadas com lipoaspiração, mas não conseguimos ainda mudar a forma como ela é organizada", diz Avram. Ou seja, para que uma abordagem seja eficaz e duradoura, é preciso agir em toda estrutura que liga pele, tecido adiposo, músculo e os septos fibrosos. "O que causa a celulite está muito abaixo da pele, então métodos usados acima dela, como lasers ou cremes, dificilmente dão resultado, pois não penetram o suficiente para resolver a celulite", afirma o médico.
Em 2008, Molly Wanner, professora de dermatologia da Faculdade de Medicina da Universidade Harvard, revisou as evidências dos resultados de tratamentos contra a celulite, tanto não invasivos quanto os invasivos. "A maioria dos estudos mostra uma melhora de 25% a 50% após vários tratamentos. Alguns pacientes apresentam uma melhora ainda menor, e os efeitos podem desaparecer com o tempo, então as pessoas precisam fazer novos tratamentos", disse Wanner em entrevista ao jornal The New York Times.

8 tratamentos contra a celulite

1 de 8

Mudança do estilo de vida

Atividade física, alimentação correta e hábitos saudáveis, em geral, contribuem para que a mulher não acumule tanta gordura e, consequentemente, que sua celulite se agrave.
Invasivos — Pelo fato de a celulite envolver uma estrutura que existe sob a pele — e não somente o acúmulo de gordura — os tratamentos mais invasivos parecem surtir efeitos mais positivos do que os não invasivos, como cremes e ultrassons, por agirem diretamente na região onde estão os septos fibrosos, sem que exista pele como barreira.
 A subcisão é o principal método minimamente invasivo usado no Brasil para combater a celulite e é aplicado com esse objetivo há 15 anos. No procedimento, o médico faz um pequeno orifício na pele do paciente, por onde insere uma agulha que corta os septos fibrosos que puxam a pele para baixo e desencadeiam os "buraquinhos" da celulite. "Em geral, todas as lesões melhoram. Mas pode haver lesões que ficam exatamente no relevo da pele adjacente pois não foram totalmente preenchidas pelo procedimento, ficando melhores, mas não completamente", escreve Doris Hexscel em Anticelulite.
A promessa — No ano passado, o Food and Drug Administration (FDA), órgão americano que regula alimentos, remédios e equipamentos médicos, aprovou o Cellulaze, equipamento que faz, com laser, a mesma coisa que a subcisão – ou seja, rompe os septos fibrosos que puxam a pele para baixo. O aparelho apresenta, no entanto, algumas vantagens. A energia emitida pelo laser "frita" o tecido adiposo da região, liquefaz as gorduras e as elimina do organismo. O laser também estimula produção de colágeno, que ajuda a dar mais firmeza à pele flácida. No geral, é feita apenas uma sessão.
Com todos esses atributos, essa parece ser a máquina estética perfeita. Mas há ressalvas. Como todo procedimento que substitui o trabalho braçal do médico pelo laser, ele é mais caro: uma sessão de Cellulaze nos Estados Unidos custa, em média, 6.000 dólares (aproximadamente 12.000 reais) ou mais. Além disso, como a técnica é nova, é difícil prever seus resultados a longo prazo. "Até agora, a técnica se mostrou promissora, mas ainda não há casos suficientes para sabermos o quão eficaz é para o público em geral. Acho que ainda é cedo para falarmos sobre a eficácia e segurança do tratamento", diz Matthew Avram.
Os dermatologistas brasileiros esperam que até o final do ano o país já possa receber o Cellulaze, mas, segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a empresa ainda não entrou com processo de registro no país. 
Futuro — Apesar de essa ser uma técnica nova e promissora, cientistas já estão pensando em uma forma de cortar os septos fibrosos – com faz o Cellulaze e subcisão — apenas com a injeção de uma substância química. Sem lasers, sem bisturi — uma subscisão química. Porém, segundo Doris Hexsel, os testes com essa nova abordagem ainda serão iniciados, e os resultados somente serão publicados em cerca de três anos.

domingo, 19 de maio de 2013

As opções de Angelina

Fiel ao seu estilo polêmico, a atriz anuncia a retirada das mamas após exame genético e inspira mulheres no mundo todo

Por Natália Mestre
Uma das mulheres mais bonitas e desejadas do planeta, esposa do astro Brad Pitt, mãe de seis filhos, sendo três adotivos, ativista humanitária, destruidora de lares, bissexual assumida, com histórico de anorexia e depressão. São muitos os rótulos associados à vida e à carreira da atriz americana Angelina Jolie, 37 anos, alguns aparentemente contraditórios, que compõem uma personalidade rica e multifacetada, de uma celebridade que consegue ser, ao mesmo tempo, formadora de opinião, polêmica e vanguardista. Na terça-feira 14, a diva deu mais uma demonstração de sua veia rebelde e corajosa ao anunciar, em artigo no jornal “The New York Times”, intitulado “My medical choice” (Minha escolha médica, em tradução livre), que havia feito uma mastectomia dupla preventiva após ter se submetido a um teste genético que estimou um risco de 87% de ela ter câncer de mama e 50% de ovário. Jolie, que perdeu a mãe, Marcheline Bertrand, morta aos 56 anos vítima de um tumor no ovário, começa seu texto no “NYT” deixando claro que foi motivada pelos filhos, que perguntavam se a doença que levou a avó também poderia vitimá-la. “Sempre falei para não se preocuparem, mas, na verdade, carrego um gene ‘defeituoso’, o ‘BRCA1’, que aumenta abruptamente minha chances de desenvolver câncer de mama e ovário”, escreveu a atriz.
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Em questão de minutos, o artigo saltou para o topo da lista dos mais lidos e centenas de comentários, a grande maioria parabenizando a atriz pela decisão, invadiram as redes sociais. Angelina incorporava mais um predicado à sua já numerosa lista: o de voz combativa na luta contra o câncer e pela valorização da saúde feminina. “Acho uma atitude de coragem e inteligência que vem favorecer as mulheres que passam por esse drama”, afirmou a psiquiatra Carmita Abdo, coordenadora do programa de estudos em sexualidade da Universidade de São Paulo (USP). “O seio é uma representação simbólica da vida e, de certa forma, é algo paradoxal relacioná-lo com doença e morte. Por isso a ideia de removê-lo é tão assustadora.” Com seu gesto radical, a esposa de Brad Pitt se tornou um exemplo. Segundo especialistas em comportamento, ela passou a mensagem de que, diante de uma situação difícil, o pior a fazer é se deprimir e se entregar e a melhor saída é buscar uma solução efetiva para os problemas. De fato, a atriz classificou a sua decisão como uma das mais difíceis de sua vida. Também não poupou os detalhes das etapas médicas pelas quais passou.
Segundo a médica americana Kristi Funk, do Pink Lotus Breast Center, a clínica em Beverly Hills (Los Angeles) que cuidou da estrela, a atriz já estava em pé apenas quatro dias depois da operação, às voltas com seu novo projeto cinematográfico. “Acho que a recuperação é reflexo da expectativa. Angelina esperava se sentir bem e estar ativa”, afirmou Kristi. Brad Pitt esteve com a mulher durante todo o processo e derreteu-se em elogios à esposa. “Ela poderia ter mantido tudo em sigilo e não acredito que alguém iria perceber, diante de resultados tão bons. Mas era realmente importante para ela compartilhar essa história, pois assim as outras pessoas iriam entender que isso não precisa ser uma coisa assustadora”, disse. O astro ainda revelou sua admiração pela força de Angelina, uma vez que ela manteve os seus compromissos nos últimos meses, como a visita ao Congo e a Conferência dos Ministros das Relações Exteriores do G-8, em Nova York. “Isso foi durante o estágio 2 (quando a mastectomia foi realizada).”
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Ao expor a sua decisão pela mastectomia preventiva, Angelina também abriu caminhos para uma discussão de âmbito mundial sobre a possibilidade de prevenir o câncer de forma efetiva. Desde o seu anúncio, mulheres de todos os continentes pararam para pensar no assunto. “O caso de Angelina mexeu com todo mundo”, afirmou o mastologista Henrique Alberto Pasqualette, diretor do Centro de Diagnóstico da Mulher (Cepem) do Rio de Janeiro. Desde então, pacientes de Pasqualette e de tantos outros médicos perguntaram se precisavam se submeter à cirurgia. “Mas é preciso informar que esse procedimento não é indicado para todos”, disse. Na quinta-feira 16, inspirada pela declaração de Jolie, a atual Miss Columbia (EUA), Allyn Rose, uma bela modelo e advogada de 25 anos, veio a público declarar que também fará uma mastectomia preventiva após a escolha da próxima Miss Columbia, em junho deste ano. “No início eu era contra a cirurgia, mas o tempo corre para mim”, disse Allyn, cuja mãe, que morreu por causa da doença, foi diagnosticada com câncer aos 27 anos. “Angelina deixou claro que a saúde é mais importante que a estética e que não liga para os padrões convencionais de beleza, e isso é muito positivo para as mulheres”, afirmou Noely Moraes, professora de relações de gênero do departamento de psicologia social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
Não é de hoje que Angelina demonstra um certo descaso para os padrões. Ela nunca teve medo de assumir os seus atos e expor as suas fragilidades. Nunca escondeu, por exemplo, o relacionamento conturbado com o pai, o ator John Voight. Desde que ele saiu de casa, quando ela tinha 2 anos, os dois vivem em pé de guerra, com brigas e tumultos constantes. Segundo a biografia “Angelina Jolie – A história Jamais Contada da Superstar Que Ousou Ter Tudo”, da jornalista Rhona Mercer, a atriz foi uma criança exótica. Tinha um lagarto e uma cobra de estimação, colecionava armas e facas e estudou artes mortuárias. Nascida em Los Angeles, a futura superstar se mudou para Nova York para cursar artes cênicas no Lee Strasberg Theatre Institute e na Universidade de Nova York, onde começou a atuar em produções teatrais de pequeno porte. Na época, tinha pensamentos de suicídio recorrentes, tendo chegado a contratar um pistoleiro para matá-la, segundo declarou à revista “Rolling Stone” em 1999.
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Todo desgosto decorria da carreira, que não decolava. Para sua sorte, foi escalada para viver a viciada Gia Garangi, no filme “Gia – Fama e Destruição”. Pelo seu desempenho, foi convidada para atuar em “Garota, Interrompida”, que lhe rendeu o Oscar de melhor atriz coadjuvante e enorme projeção. Durante a cerimônia de premiação, em 2000, ela declarou que o irmão James Haven Voight era o amor da sua vida e, depois, deu-lhe um beijo na boca. Nessa época, também assumiu ter usado todos os tipos de drogas. Por inúmeras vezes foi apontada como anoréxica e depressiva. Mesmo assim, se tornou símbolo sexual ao interpretar Lara Croft, da saga “Tomb Raider”.
A vida amorosa foi tão conturbada quanto. Casou-se com os atores Jonny Lee Miller e Billy Bob Thornton – de quem usava o famoso pingente com sangue. Bissexual assumida, foi namorada da modelo Jenny Shimizu durante dez anos e existem rumores de que esse caso nunca tenha terminado. Em 2005, conheceu Brad Pitt nas filmagens de “Mr. e Mrs. Smith”. Ela já era mãe adotiva de Maddox e, com Pitt, adotou mais dois, Pax, e Zahara, e teve três filhos biológicos, Shiloh, Knox e Vivienne. Vivem o modelo da família feliz e defensora das causas humanitárias. Uma realidade bem distante daquela quando Angelina era chamada de destruidora de lares, acusada de ter sido o pivô da separação do galã da atriz Jennifer Aniston. Agora, ela é a mulher que declara: “Meus filhos sabem que eu os amo e farei tudo que estiver ao meu alcance para ficar o máximo de tempo possível com eles.” Pelo menos, essa é a versão atual da maior celebridade do mundo de hoje.