quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Tablets e celulares não são boas “babás”

Embora proporcione horas de sossego aos pais, especialistas alertam que o aparelho pode gerar isolamento social e familiar
  Bruna Komarchesqui A cena é comum: pais comem e conversam tranquilamente em um restaurante, enquanto as crianças, praticamente imóveis, brincam com tablets ou smartphones. Portáteis, cada vez mais baratos e com uma infinidade de aplicativos e jogos para baixar, os aparelhos caíram no gosto da meninada, proporcionando cada vez mais horas de sossego aos pais. Embora a comodidade seja inegável, sobretudo em locais públicos, o uso de tablets como babás eletrônicas é visto com cautela por especialistas.
“O que mais me assusta é a atitude por trás, quando o adulto entrega à criança com o sentido de ‘cala a boca’. Nós educadores devemos fazer um superalerta em relação a isso”, diz a psicopedagoga Evelise Portilho, professora do departamento de educação da PUCPR. “No restaurante, por exemplo, é prejudicial porque você deixa de conversar com a criança. E a comida é esse momento de saber do filho, se eu me isolo, não há interação”, critica.
Desvantagem
Eletrônicos não exigem concentração, diz consultora familiar
Mãe de três meninas (uma de 5 anos e gêmeas de 3 anos), a consultora familiar Renata Bermudez Konzen, 32 anos, garante que o acesso das filhas ao tablet é mínimo. “Criança tem muita energia, ficar demais em frente ao videogame ou tablet limita a aprendizagem corporal.” Baseada em recomendações médicas, ela costuma orientar os pais que o total de eletrônicos em um dia da criança – o que inclui televisão – não passe de duas horas. A média no Brasil, segundo Renata, são cinco horas e meia. “Quando faz com horário fixo, a criança não discute o tempo todo, você diz ‘pronto, agora acabou’”. Na rotina das meninas, ela conta, atividades de gasto de energia são bastante valorizadas, além de brincadeiras como desenho, pintura e montagem de quebra-cabeças. Televisão e eletrônicos são limitados a uma hora e meia diárias. “É importante ter atividades tranquilas, de mais concentração. O eletrônico não exige esse esforço, é muito iluminado, chama a atenção. Depois a criança dá problema na escola, porque não se concentra.”
Evelise ressalta que o tablet é um recurso tecnológico interessante, com bons estímulos, apenas não pode substituir o convívio, os jogos sociais e cooperativos. Entre boas opções de aplicativos estão jogos de raciocínio, que tragam desafios e façam a criança usar de recursos cognitivos diferentes. “Tudo com parcimônia. Quem vai orientar a criança é o adulto. O que percebo é que o adulto tem dificuldade de botar limite, porque dá trabalho.”
Pesquisadora em tecnologias na educação, a professora da UFPR Glaucia da Silva Brito argumenta que só daqui a alguns anos, quando essas crianças crescerem, será possível avaliar os efeitos do uso do tablet. “Na sociedade da informação e da tecnologia, não tem como não deixar a criança usar. Essa preocupação é antiga. Quando era a televisão, quem era a babá?”, recorda.
Para Glaucia, os tablets têm se mostrado um grande parceiro na educação, por estimularem vários sentidos. Ela ressalta que, independente de qual seja a tecnologia, o problema está no excesso. E é aí que entra o controle e a observação dos pais. “Não é só colocar a criança para ver vídeo no YouTube. Há vários softwares gratuitos, livrinhos infantis, com som, que possibilitam interação com os personagens. É papel dos pais buscar isso.” Apesar da possibilidade de bloquear palavras a serem buscadas na internet pelos filhos, a melhor estratégia para a pesquisadora ainda é acompanhar de perto a brincadeira.
O presidente da Sociedade Paranaense de Pediatria, Gilberto Pascolat, também pondera que o prejuízo depende da idade da criança e do uso que se faz do tablet. Embora diga que o aparelho pode trazer problemas ao desenvolvimento se usado por crianças muito pequenas, o médico não arrisca estabelecer uma idade mínima para o uso. “Depende do grau de maturidade da criança. O tablet pode trazer benefícios, desde que usado em um padrão que não seja para substituir a interação social”, resume.
Mães dizem que impõem limites
Para controlar o uso do tablet pelo filho João Pedro, 6 anos, a professora Denise Almeida de Souza, 41 anos, deixou claro que o aparelho é da família toda, no ato da compra. “Explicamos que tem limite, que não é dele, porque, se deixasse, ele ficaria o dia inteiro.” Embora não estipule um tempo diário, ela cuida para que João Pedro brinque com amigos e faça atividades fora de casa, como andar de bicicleta. “Quando acho que ultrapassou, aviso ‘agora chega’. Mas o tablet auxilia a distraí-lo num restaurante, quando quero conversar com meu marido. Não acho que prejudique, porque é um uso rápido, não são horas.”
Além dos joguinhos de futebol e de construir cidades, preferidos do pequeno, Denise estimula brincadeiras que envolvam letras e perguntas e respostas. “Baixamos o Show do Milhão e o Roda a Roda, do Sílvio Santos, porque ele está na fase de alfabetização. Por ser professora, estimulo também esse lado.”
A ideia da fotógrafa e publicitária Laiz Zotovici Martins, 33 anos, sobre o assunto mudou ao longo dos três anos e meio do primogênito Antônio. Ela conta que, quando ele era bebezinho, baixou vários aplicativos, mas depois de ler bastante, resolveu limitar a brincadeira. Para Laiz, antes dos três anos, o tablet atrasa o desenvolvimento de habilidades como a fala e a socialização com outras crianças. “Conheço um menino de três anos que não fala, mas sabe passar todas as fases num jogo. Uma vez, num buffet, tinha uma fila de crianças no tablet e ninguém pra brincar com meu filho.” Nos poucos momentos que usa o equipamento, Antônio vê desenhos selecionados pela mãe ou brinca com um aplicativo que repete a fala da criança.

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