Agência americana libera a venda do primeiro marca-passo para promover a perda de peso. Ele é colocado no abdome e tem bateria recarregável por bluetooth
Cilene Pereira (cilene@istoe.com.br)Os neurocirurgiões Alessandra Gorgulho e Antônio de Salles explicam
como funciona a novidade no tratamento da obesidade
Um aparelho que induz à sensação de
saciedade depois de ser implantado no abdome é a novidade no tratamento
da obesidade. O sistema acaba de ser liberado para comercialização pela
Food and Drug Administration (FDA), a agência americana responsável pela
aprovação de medicamentos e produtos de saúde cujas decisões costumam
servir de parâmetro para serviços semelhantes de outros países. É o
primeiro equipamento contra o excesso de peso aprovado pelo FDA desde
2007.
O sistema chama-se Maestro Rechargeable
System e consiste em um marca-passo e uma bateria recarregável via
bluetooth. Os eletrodos são colocados próximos do ponto do nervo vago
localizado na junção entre o esôfago e o estômago. Esse canal nervoso
desce do cérebro e inerva vários órgãos, entre eles o coração e o
estômago. Ele tem papel importante no processamento das informações de
saciedade enviadas do estômago para o cérebro. “No início da refeição,
algumas substâncias, como a leptina, por exemplo, são liberadas e ativam
o nervo vago a levar informação ao cérebro de que o corpo está
alimentado”, explica a neurocirurgiã Alessandra Gorgulho, chefe
clínico-científica do HCor Neuro, de São Paulo. Os sinais elétricos
emitidos pelos eletrodos modulam a atividade do nervo, dando uma
mensagem ao cérebro de que se está saciado. A bateria é implantada na
área subcutânea abaixo da clavícula.
DIFERENÇA
No Brasil, a médica Alessandra estuda
se eletrodos colocados no cérebro ajudam a emagrecer
De acordo com o estudo apresentado pelo
fabricante, a americana EnteroMedics, com 233 pacientes, aqueles
tratados pelo sistema perderam 24% de seu excesso de peso em um ano. No
entanto, esperava-se que o aparelho promovesse pelo menos 10% a mais de
perda de peso excessivo em comparação ao obtido pelos indivíduos que
integraram o grupo controle (não receberam o implante). Não foi o que
aconteceu. Mesmo assim, o FDA considerou que o equipamento mostrou-se um
recurso importante para manter o emagrecimento a longo prazo. Um ano e
meio depois, os pacientes com o aparelho apresentavam 23% de perda do
peso em excesso.
O aparelho é indicado para pessoas com
Índice de Massa Corpórea (IMC) superior a 35 – o número é calculado pelo
peso dividido pela altura ao quadrado – que apresentam pelo menos uma
doença associada à obesidade, como a diabetes ou a hipertensão, e não
responderam a tratamentos anteriores. Os efeitos colaterais mais comuns
manifestados pelos pacientes foram dor no local do implante dos
eletrodos e azia.
A estratégia agora aprovada pelo FDA é um
exemplo das opções que estão sendo geradas por um campo novo na medicina
chamado de neuromodulação. A ideia é usar a modulação por sinais
elétricos para ajudar no tratamento de doenças como a dor crônica e o
Parkinson. No Brasil, a médica Alessandra Gorgulho, do HCor Neuro, e seu
colega, o neurocirurgião Antonio Salles, da mesma instituição,
coordenam uma pesquisa sobre a eficácia do implante de eletrodos para
tratar a obesidade. Em seu caso, porém, o implante é feito em um dos
núcleos do hipotálamo, estrutura cerebral também envolvida no
processamento da sensação de saciedade.
A investigação brasileira encontra-se em
fase 1, realizada para avaliar a tolerabilidade dos pacientes ao
implante. O procedimento foi feito em seis pessoas – o último recebeu os
eletrodos no início de janeiro. Ainda existem outras etapas de estudo
em humanos antes de o método ficar disponível. Já o aparelho americano
começará a ser vendido nos Estados Unidos no próximo semestre.
Foto: Kelsen Fernandes
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