domingo, 22 de março de 2015

A ciência contra a incerteza

A busca pelas melhores evidências levou a uma explosão no número de metanálises nos últimos anos. Esses estudos que reúnem os resultados de outras pesquisas têm levado a uma medicina cada vez mais precisa

Por: Guilherme Rosa
De acordo com a Sociedade Brasileira de Análises Clínicas, cerca de 90% dos laboratórios foram prejudicados pela greve da Anvisa
Estudo científico: número de pesquisas cresce entre 8% e 9% ao ano no mundo(Thinkstock/VEJA)
O volume de estudos científicos publicados ao redor do mundo cresce de 8 a 9% ao ano. É por isso que, cada dia mais, surgem pesquisas que confundem a cabeça das pessoas. Num dia comer ovo faz mal à saúde, no outro faz bem. Hoje os suplementos vitamínicos protegem contra várias doenças, amanhã não é bem assim. Um dos responsáveis por essas divergências é a má qualidade de diversos estudos, publicados em revistas de baixa qualidade, sem metodologias confiáveis ou simplesmente enviesados. Para ajudar os pesquisadores - e, por consequência, a população em geral - a navegarem nesse oceano de informações, foram criadas as metanálises: estudos estatísticos que combinam o resultado do maior número de pesquisas independentes em busca da melhor evidência possível.
"Se você olhar no dicionário, metanálise quer dizer análise da análise. De modo simples, ela é a somatória dos resultados de estudos que tentam responder à mesma pergunta", diz Álvaro Nagib Attalah, professor da Unifesp e chefe da disciplina de medicina baseada em evidências, dedicada a promover o uso dos melhores dados científicos no atendimento médico. Ele também é diretor do Centro Cochrane do Brasil, focado em publicar revisões da literatura científica e metanálises para ajudar nas decisões médicas.
Segundo o pesquisador, o uso da metanálise vem crescendo em diversas áreas da ciência, como a agricultura, veterinária e até o direito. Mas é na medicina e nos consultórios médicos que tem se destacado. Elas servem, muitas vezes, para corroborar ou ir contra tratamentos receitados em todo o mundo. Uma metanálise publicada no ano passado, por exemplo, confirmou que o uso de estatinas realmente ajuda a salvar a vida de pacientes com o risco de desenvolver doenças cardiovasculares. Foram analisados 19 estudos, com mais de 56 000 voluntários no total, e foi possível constatar uma redução da mortalidade com o tratamento. De cada mil que receberam o medicamento, 18 conseguiram prevenir o aparecimento dessas doenças.
Ao mesmo tempo, um estudo publicado pela revista Annals of Internal Medicine em 2013 analisou 27 pesquisas sobre a eficácia dos suplementos de vitaminas que muitas vezes são receitados pelos médicos. Somados, avaliaram mais de 400 000 participantes, e chegaram à conclusão que não havia nenhuma evidência estatística significativa de sua eficácia no aumento do tempo de vida e na incidência de câncer ou doenças cardiovasculares.
Por unificar o número de amostras analisadas em vários estudos, muitas vezes as metanálises ajudam a trazer à tona informações que poderiam passar despercebidas num primeiro momento. Por exemplo, em estudos pequenos, com dezenas de casos analisados, uma diferença de 3% pode não fazer diferença. Mas quando se juntam várias pesquisas, e a soma dos voluntários pode atingir a casa dos milhares, essa diferença se torna estatisticamente significante. "Hoje em dia, as diferenças na eficácia dos tratamentos tende a ser cada vez menor. Mas essas diferenças ainda são importantes, pois ajudam a salvar vidas. Por isso, daqui para a frente, precisaremos de amostras cada vez maiores. E esse é um dos papéis das metanálises", diz Atallah.

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