A Academia Americana de Pediatria
divulga novas recomendações para o uso de tablets, celulares e
computadores por crianças e adolescentes. E não é só o tempo de
utilização que conta
ESCOLHA: Arthur usa os tablets por pouco tempo. Prefere as brincadeiras do mundo real
Cilene Pereira
A academia Americana de Pediatria divulgou na semana passada
suas novas recomendações para que crianças e adolescentes naveguem com
equilíbrio pelo mundo digital. A entidade, cujas orientações costumam
servir de parâmetro para a conduta de médicos, pais e governos na
maioria dos países, deixou patente que é preciso prestar atenção não
somente ao tempo que os jovens passam com tablets e celulares, mas ao
quê e como eles entendem o que vêem ou jogam.
Por isso, as orientações fazem distinções por faixas etárias,
respeitando o grau de compreensão da criança em cada uma. O uso de
mídias digitais deve ser evitado por bebês menores de um ano e meio. Até
essa idade eles precisam explorar o mundo real e manter interação
social com cuidadores nos quais confiam. Isso é fundamental para que
desenvolvam apropriadamente o raciocínio, a linguagem e a coordenação
motora. Além disso, os bebês têm dificuldade para transferir o que
enxergam no celular, por exemplo, para a realidade tridimensional em que
vivemos.
A partir dessa idade e até por volta dos cinco anos, a exposição aos
recursos digitais pode produzir alguns benefícios, desde que as
atividades sejam de boa qualidade. A associação americana cita como
opções programas e aplicativos infantis de tevês públicas e do velho
Vila Sésamo, agora repaginado para tablets e celulares. Na avaliação dos
especialistas, grande parte do que está disponível é ruim e não
contempla as necessidades educacionais dos pequenos. “Daí a importância
de os pais acompanharem os filhos durante o uso, que deve ser feito por
no máximo uma hora por dia”, diz a pediatra Evelyn Einseinstein, da
Sociedade Brasileira de Pediatria.
As figuras interativas dos e-books prejudicam a capacidade de a criança entender o conteúdo
A mesma recomendação vale para os e-books, geralmente recheados de
figuras interativas. Ao contrário do que se imagina, esses recursos
prejudicam a capacidade de a criança entender o conteúdo. Funcionam como
distração. Habilidades necessárias para o bom desempenho escolar, como
persistência para a conclusão de tarefas, controle do impulso,
pensamentos flexíveis e criativos e equilíbrio emocional são promovidas
principalmente em brincadeiras reais, não estruturadas e que requerem
convivência social.
Na casa da relações pública Giuliana Gregori e do advogado Bruno
Paletta, em São Paulo, Arthur, de três anos e meio, até tem acesso aos
digitais – ele ganhou o próprio Iphone quando tinha menos de um ano de
idade. Mas não troca as brincadeiras no parque pelos joguinhos online.
“Ele usa quando quer, por pouco tempo, e para acesso a brincadeiras
pontuais”, diz Giuliana. “Arthur dá mais valor para as interações no
mundo real.”
Cabe aos pais darem o exemplo. Não devem fazer da tecnologia o centro da vida
NAVEGAR COM SEGURANÇA
A utilização por jovens em idade escolar precisa ser ainda mais
monitorada. O uso excessivo está associado à obesidade e a
comportamentos de risco, como a auto-mutilação ou distúrbios
alimentares. Por essa razão, as diretrizes instruem os pais a
estimularem seus filhos à prática de exercícios físicos pelo menos uma
hora por dia e a dormirem entre oito e doze horas por noite. Uma das
formas de garantir o sono é impedir que os aparelhos sejam usados uma
hora antes de se deitar.
Nessa fase, os pais devem estimular conversas sobre os cuidados
necessários para se navegar com segurança na rede, evitando o assédio de
pedófilos ou outras armadilhas perigosas. Também é o momento de falar a
respeito de cidadania, respeito ao outro e à diversidade de opiniões.
“A família deve criar um ambiente de segurança para que o jovem recorra a
ela quando tiver dúvidas sobre o que está vendo”, diz Jenny Radesk,
pediatra e especialista em desenvolvimento comportamental da
Universidade de Michigan, nos Estados Unidos. Ela é uma das responsáveis
pelas novas orientações. ATENÇÃO:
Na casa da Luiza, a navegação é acompanhada pelos pais. Giuliana e Luiz
também procuram desligar o celular para brincar junto com a filha
No Brasil, as recomendações da Sociedade Brasileira de Pediatria são
basicamente as mesmas das agora lançadas pelos americanos. A entidade
nacional pretende atualizá-las adicionando a orientação para que
crianças entre dois e cinco anos tenham acesso ao meio digital somente
uma hora por dia.
Aos pais, cabe dar o exemplo e não fazer da tecnologia o centro da
vida. Pediatras brasileiros e americanos enfatizam que a mensagem
passada aos filhos deve ser a de que ela tem seu valor, desde que
desfrutada com parcimônia e qualidade. Luiza Reginatto Diório, de três
anos, vê o comportamento equilibrado dos pais, Giuliana Reginatto e Luiz
Antonio Diorio, em relação aos aparelhos, e segue pelo mesmo caminho.
“Se as crianças percebem que o celular é o centro das atenções na vida
dos pais, até mesmo durante as refeições, é muito provável que o
encantamento pelos aparelhos seja maior”, diz Giuliana. “Por isso,
procuramos dedicar nosso tempo a brincar junto com a Luiza, a construir
coisas com ela, como desenhos e quebra-cabeças, a cantar juntos. O mundo
real, assim, vai naturalmente se tornando mais interessante do que o
das telas.” ALGUMAS DAS PRINCIPAIS ORIENTAÇÕES
>> Evite o uso de tablets e celulares por crianças com menos de um ano e meio
>> Pais que decidirem permitir o uso a partir dessa idade devem
escolher programas de qualidade e assisti-los junto com seus filhos
para ajudá-los a entender o que estão vendo
>> Entre 2 e 5 anos, o limite de exposição deve ser de uma hora por dia
>> A partir dos 6 anos, os pais precisam estabelecer limites em
relação ao tempo e tipo de mídia usado e garantir que o acesso não
prejudique o sono, a atividade física ou outros hábitos saudáveis
>> Uma das formas de fazer isso é proibir a utilização uma hora
antes de dormir. Outra é reservar horários sem que os aparelhos estejam
por perto. Nas refeições e na cama, por exemplo
>> Conteúdos violentos devem ser evitados a qualquer custo.
Estima-se que até os 12 anos uma criança já tenha visto cerca de 8 mil
mortes e 100 mil cenas de violência em ambiente virtual ou na tevê
>> Desencoraje o manuseio enquanto o jovem faz a lição de casa
>> Converse sobre como navegar na rede com segurança e saber
respeitar o outro e as diferenças de pensamento nas redes sociais
Fotos: Airam Abel; Andre Lessa/IstoÉ
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