quinta-feira, 2 de abril de 2015

Adesão à vacina contra o HPV é baixa. Entenda o porquê

Levantamento da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo mostra que apenas 28% das garotas que compõem o público-alvo recebeu a primeira dose. Especialistas explicam os motivos que levam o número de meninas imunizadas a ser tão pequenos

Por: Giulia Vidale
Vacina
A vacina contra o HPV oferecida pelo SUS protege contra quatro subtipos do vírus HPV responsáveis por cerca de 70% dos casos de câncer de colo de útero em todo mundo e por 90% das verrugas anogenitais(Thinkstock/VEJA)
Até 31 de março, apenas 212.299 meninas com idades entre 9 e 13 anos receberam a primeira dose da vacina contra o papiloma vírus humano (HPV) no Estado de São Paulo. O número representa 28% do público-alvo, de 762 100 adolescentes, de acordo com o levantamento divulgado nesta quarta-feira pela Secretaria de Estado da Saúde.
A adesão à vacinação contra a doença, que começou no início do mês, vem caindo ao longo do tempo. Ao todo, as meninas devem tomar três doses para ter a proteção garantida - e o número de garotas que recebe a vacina costuma diminuir ao longo das doses. Na campanha de imunização do ano passado, enquanto a primeira dose atingiu 100% do público-alvo, a segunda chegou a não mais que 60% das meninas. O número de pouco mais de quinto das meninas imunizadas na primeira dose representa, portanto, um sinal de alerta para as autoridades de saúde.
De acordo com os especialistas, os baixos números podem ser explicados por um conjunto de fatores, que inclui a falta de preparação dos profissionais de saúde e das escolas que participam da campanha, a insuficiência de informação adequada sobre a eficácia e segurança da vacina para os pais e adolescentes e a associação do HPV ao início da vida sexual. Outra causa que contribuiu para a visão negativa da vacina foram os efeitos adversos sofridos por onze meninas que receberam a segunda dose da vacina no ano passado, em Bertioga, litoral do Estado. Em setembro, elas procuraram um pronto-socorro da cidade com queixas de dor no corpo e dificuldades de locomoção. Houve demora do Ministério da Saúde em se pronunciar sobre essa reação, o que pode ter colaborado para espalhar o temor em relação às doses e diminuir o número de garotas que toma a vacina.
Vacina para adolescentes - Para Isabella Ballalai, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações, implementar campanhas de saúde cujo público alvo é formado por pré-adolescentes e adolescentes exige cuidados e estratégias específicas. Em primeiro lugar, os profissionais de saúde - médicos, enfermeiros e funcionários em geral - precisam estar bem informados e preparados para interagir com as adolescentes e seus pais.
"Os adolescentes em geral têm muitos temores sobre procedimentos invasivos e dolorosos e tendem a achar que estão imunes a doenças e situações de risco. Isso faz com que seja mais difícil convencê-los da necessidade de tomar uma vacina, que é uma medida preventiva contra alguma doença que eles podem adquirir no futuro", explica Ricardo Becker Feijó, chefe da Unidade de Adolescentes do Hospital das Clínicas de Porto Alegre (HCPA-RS).
Efeitos adversos - Os pais também têm papel fundamental neste processo, pois são eles que permitirão que as filhas tomem a vacina. Para eles, mais importante que a eficácia e finalidade da vacina, é a certeza de que as doses não causarão nenhum dano à saúde das garotas. Desse modo, é importante que os profissionais de saúde estejam aptos a explicar a esses adultos, em linguagem adequada, como a vacina funciona, quais são seus benefícios e quão segura é a imunização, assim como os possíveis sintomas adversos e suas causas.
Segundo Feijó, a demora da explicação por parte das autoridades do motivo da hospitalização das garotas que receberam a vacina em Bertioga gerou uma preocupação na população sobre a segurança das doses. Embora se saiba que estas reações foram causadas pelo stress do ato da vacinação e não pela vacina em si, muitos pais ainda temem vacinar suas filhas.
Sexualidade precoce - Outra preocupação é o receio de que a vacina incentive a iniciação sexual das garotas. "Muitos pais receiam que, ao vacinar suas filhas contra o vírus, precisem explicar para elas como se contrai o HPV. Consequentemente isso levaria a uma conversa sobre relações sexuais, e estes pais temem que isso incentive suas filhas a fazer sexo", explica Feijó. No entanto, um estudo feito com mais de 200 000 mulheres americanas, concluiu que a vacina contra o HPV não leva as adolescentes a adotar comportamentos sexuais precoces ou arriscados, nem eleva as taxas de doenças sexualmente transmissíveis.
Papel da escola - Diante destes fatores, os especialistas reforçam que a chave para aumentar a adesão à vacinação é a conscientização da importância da vacina na prevenção do câncer do colo do útero e sua desmistificação. A parceria com as escolas ainda é a melhor estratégia de vacinação de adolescentes, pois a vacina vai até elas. No entanto as instituições de ensino precisam estar preparadas para receber os profissionais de saúde e para dar suporte aos adolescentes.
"Este é um público extremamente suscetível a desenvolver um transtorno psicogênico em massa (MPI, na sigla em inglês). Ou seja, se uma das meninas que tomar a vacina em determinada escola apresentar algum sintoma como dor de cabeça, náusea, dor abdominal, tontura ou desmaio, geralmente desencadeado pela ansiedade ou stress da vacinação, isso pode gerar uma reação psicológica em cadeia, e várias meninas, que tomaram ou não a vacina, também podem apresentar os mesmos sintomas", explica Feijó.
Imunização - A vacina contra o vírus do papiloma humano (HPV) está disponível gratuitamente no Sistema Único de Saúde (SUS) desde o ano passado. Em 2014, o público alvo era composto por meninas entre 11 e 13 anos. Este ano, o Ministério da Saúde modificou a faixa etária da primeira dose para 9 a 11 anos e, a partir de 2016, a primeira dose será restrita às meninas de nove anos.
O objetivo da campanha deste ano, lançada pelo Ministério da Saúde no início do mês de março, é imunizar 80% do público-alvo, o que equivale 4,94 milhões de meninas entre 9 e 11 anos. A vacina oferecida pelo SUS é a quadrivalente, que protege contra quatro subtipos do vírus HPV (6, 11, 16 e 18) responsáveis por cerca de 70% dos casos de câncer de colo de útero em todo mundo e por 90% das verrugas anogenitais.
Para garantir os 98% de eficácia da vacina, as meninas precisam tomar todas as doses previstas na vacinação: a segunda, seis meses depois da primeira, e a terceira, de reforço, cinco anos depois. No entanto, a imunização não substitui a realização do exame preventivo, conhecido como papanicolau, que deve ser realizado a partir dos 25 anos de idade, com uma periodicidade de três anos, nem o uso do preservativo nas relações sexuais.

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