Governo discute oferta, pelo SUS, do primeiro remédio contra a Paramiloidose. Pouco conhecida, a enfermidade causa perda progressiva de movimentos e pode atingir famílias inteiras

PARTIDA Povoa do Varzim, em Portugal, é o centro da região onde se originou a doença

Na doença, a proteína transtirretina (TTR), produzida principalmente no fígado, apresenta uma alteração estrutural que a torna instável, fazendo com que se deposite em diferentes tecidos. O acúmulo interfere no funcionamento dos órgãos atingidos. A mudança é causada por um erro no gene que sintetiza a proteína. Há mais de cem mutações identificadas, mas a maioria dos pacientes brasileiros apresenta a mesma mutação que predomina entre os portugueses, a V30M. No país europeu, registros históricos apontam a cidade de Povoa do Varzim como possível ponto de origem da doença. Teria sido desta região ao norte de Portugal que ela foi trazida ao Brasil durante a colonização.
Diagnóstico difícil


Os navios portugueses também trouxeram a alteração I122V, mais comum entre os afro-americanos. “Ela é prevalente em quase 4% dos afro-descendentes. E o Brasil recebeu cerca de cinco milhões de escravos”, diz a neurologista Márcia Cruz, diretora do Centro de Estudos em Paramiloidose (Ceparm), na UFRJ, único serviço de referência do País. No centro, uma equipe de médicos, geneticistas e biólogos presta atendimento do diagnóstico ao tratamento e desenvolve pesquisas. “Os diagnósticos genético e o da manifestação da doença são impactantes”, diz a bióloga Débora Foguela, coordenadora do Instituto de Bioquímica Médica Leopoldo de Méis, da UFRJ.


Exatamente por ter sintomas muito distintos, a PAF pode ser confundida com outras patologias. Por essa razão, o diagnóstico é difícil e, em geral, demora anos. “Muitos neurologistas experientes podem não identificá-la”, diz Isabel. Isso é um grande problema. Os dois únicos tratamentos disponíveis devem ser adotados nas fases iniciais: o transplante de fígado, que produz a TTR instável, ou o Tafamidis, primeira medicação que estabiliza a proteína, impedindo seu enovelamento nos tecidos. “Eles apenas atrasam a progressão da doença. Os pacientes vivem anos mais significativos com qualidade de vida”, afirma Isabel. Produzido pela Pfizer, o Tafamidis é um medicamento de alto custo. A caixa com trinta comprimidos custa cerca de R$ 21 mil. Neste mês, o Ministério da Saúde abriu consulta pública para avaliar sua incorporação pelo SUS. “Infelizmente, o tratamento ainda não é uma realidade para todos”, diz Márcia Cruz.A doença começa a se manifestar a partir de 30 anos. Em geral, os primeiros sintomas são formigamento e perda de sensibilidade nas pernas e nos pés. Depois, evolui para braços e mãos, levando à atrofia e à perda dos movimentos. Há outros prejuízos, como insuficiências renal e cardíaca e alterações gastrointestinais. “A doença não é só uma neuropatia. Há um envolvimento multi-sistêmico”, explica a médica Isabel Conceição, do Hospital Santa Maria, centro de referência da doença em Lisboa.
* A jornalista viajou a Portugal a convite da Pfizer
Nenhum comentário:
Postar um comentário