quarta-feira, 13 de junho de 2012

Quando comer se torna um problema

Quem sofre com diarreia, náuseas, vômitos, distensão abdominal e, muitas vezes, osteoporose, precisa tomar cuidado para não se autodiagnosticar e acabar tomando remédios inadequados, pois, apesar de terem sintomas parecidos, intolerância e alergia a alimentos têm causas e reações distintas.
Os sintomas gastrointestinais são clássicos nas duas enfermidades. A diferença é que as reações alérgicas também trazem problemas em outras áreas, sem relação com o sistema digestivo. Urticárias, coceira, tosse e falta de ar são alguns indícios da alergia, que pode chegar a causar choque anafilático e morte.
Testes
A investigação clínica é o primeiro passo do diagnóstico. Consiste de um questionário feito pelo médico para verificar os sintomas e se há outros efeitos colaterais, como anemia. A partir das respostas, há uma definição de quais são os possíveis diagnósticos de alergia ou intolerância, que serão confirmados por testes. Veja alguns deles:
>> Prick test na pele: para diagnosticar alergias. É geralmente feito no antebraço para alimentos específicos, e a reação acontece na pele.
>> Dosagem de IgE: a imunoglobulina E (IgE) é um anticorpo que marca as reações alérgicas. A partir da quantidade total e da específica para cada alérgeno encontrada no exame de sangue é possível descobrir o causador da alergia.
>> Teste de provocação oral: para o diagnóstico de alergias sem ligação com o IgE. O paciente fica de seis a oito semanas sem o alimento que aparenta causar a alergia e, depois, é reintroduzido na dieta, com supervisão médica. É feita a provocação na pele para reconhecer os sintomas.
>> Teste de antitransglutaminase e antiendomísio: são dois testes sorológicos feitos para detectar a presença de anticorpos relacionados com a intolerância a glúten, a doença celíaca.
>> Endoscopia com biópsia do duodeno: é essencial para diagnosticar a doença celíaca. A biópsia é feita para verificar a condição do intestino delgado. Se tanto os exames sorológicos quanto a biópsia derem negativos, não há chance de intolerância a glúten.
>> Teste de tolerância com sobrecarga oral de lactose: também chamado de curva glicêmica da lactose, é feito com o paciente em jejum. Primeiramente, faz-se uma dosagem da glicemia seguida pela ingestão de uma solução de lactose. Novas medições são feitas em intervalos de 30 minutos. Se a glicemia continuar normal, o paciente não tem capacidade de digerir a lactose e transformá-la em galactose e glicose, sendo assim intolerante ao açúcar.
>> Teste de hidrogênio expirado: esse exame não é tão acessível, mas ajuda no diagnóstico de intolerâncias ligadas a carboidratos e açúcares. O processo é parecido com a da curva glicêmica, mas é feito com a coleta de ar expirado. A primeira é feita em jejum, e as seguintes, após a ingestão de uma solução diluída com o carboidrato ou açúcar em questão. Caso a quantidade de hidrogênio expirado aumente, o paciente pode ser intolerante.
>> Teste Food Detective: realizado por meio de uma coleta de uma gota de sangue, detecta anticorpos IgG (imunoglobulina G) para 59 alimentos. Feito na Inglaterra, é um exame que pode ser testado em casa. Porém, deve-se lembrar que testes acompanhados e indicados por médico especializado são mais confiáveis.
SII-A Síndrome do Intestino Irritável (SII) possui sintomas parecidos com os da intolerância alimentar, mas não existe exame para diagnosticá-la. Segundo a gastroenterologista pediátrica do Hospital Pequeno Príncipe Jocemara Gurmini, o diagnóstico é feito pela exclusão de outras possíveis doenças. A hipótese mais aceita para a ocorrência da SII é uma alteração na capacidade do intestino de mover a comida, chamada de motilidade intestinal. Ela também está ligada a diversos acontecimentos psicológicos e não possui cura. Seu tratamento deve ser multiprofissional, com a ajuda de gastroenterologistas, nutricionistas e psicólogos.
A alergia geralmente é causada por um único tipo de alimento. Segundo o Consenso Brasileiro sobre Alergia Alimentar de 2007, os que mais comumente causam problemas alérgicos são leite de vaca, ovo, peixe, leguminosas, soja, crustáceos, trigo e amendoim. O termo alergia alimentar é utilizado para definir reações adversas a alimentos ligadas ao sistema imunológico.
Já a intolerância ocorre quando o corpo não consegue mais digerir determinado açúcar ou proteína, o que causa reações adversas. As duas mais conhecidas são a intolerância à lactose (compartilhada por cerca de 20 milhões de brasileiros) e ao glúten – chamada de doença celíaca – embora cada indivíduo possa desenvolver problemas em relação a qualquer tipo de alimento.
Preocupação
A doença celíaca é a mais preocupante, pois possui uma série de sintomas secundários, como anemia, abortos recorrentes, osteoporose e até mesmo intolerância à lactose. “Isso acontece porque as vilosidades do intestino ficam cobertas e os nutrientes não podem ser absorvidos. A primeira enzima que não consegue trabalhar é a lactase [responsável pela digestão da lactose – o açúcar do leite]”, explica a gastroenterologista pediátrica e nutróloga do Hospital Pequeno Príncipe (HPP) Jocemara Gurmini.
Além disso, as chances de uma pessoa ter a doença aumentam se um familiar tiver o mesmo problema, como explica a gastroenterologista Lorete Maria da Silva Kotze, pesquisadora da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). “Pessoas que têm os sintomas, mas especialmente com familiares com a doença, ou diabete tipo 1, doenças autoimunes, entre outras, devem ficar atentas à possibilidade da doença celíaca”, afirma, acrescentando a importância dos testes sorológicos e da endoscopia para confirmar o diagnóstico.
O tratamento possível tanto para a alergia quanto para a intolerância é a exclusão do alimento do cardápio diário. Porém, no caso da lactose, há uma esperança antes de tomar a medida radical de mudança na dieta: remédios como o Lact-aid, ainda não disponível no Brasil, possuem as enzimas da lactase e ajudam na digestão. Esse corte da ingestão de leite, por exemplo, causa preocupação de que haja falta de nutrientes, como o cálcio. “Por isso, a pessoa deve ter acompanhamento multiprofissional, com nutricionistas e médicos, para ajudar nessa dieta complicada”, diz o gastroenterologista Mauro Batista Morais, professor da Escola Paulista de Medicina da Uni­versidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Alergia ao glúten?
Alguns termos utilizados pelos pacientes são de enlouquecer gastroenterologistas. Entre eles estão as pessoas que dizem ter alergia ao glúten ou à lactose. As alergias causadas por leite e cereais são as alergias à proteína do leite de vaca e ao trigo, mediadas pela imunoglobulina E. “A intolerância acontece por conta da impossibilidade de o organismo digerir carboidratos e açúcares, que são substâncias diferentes das que causam alergia, as proteínas”, explica Jocemara Gurmini, gastroenterologista pediátrica do Hospital Pequeno Príncipe. Entretanto a doença celíaca é desencadeada pelo glúten, que é a junção de duas proteínas encontradas em quatro tipos de cereais.
No caso da alergia ao leite, ela geralmente acontece em bebês, e a medida a se tomar é retirar o leite de vaca da alimentação da mãe, explica a chefe da divisão de Nutrição do Hospital Universitário de Brasília, Ana Paula Caio Zidório. “A alergia é identificada no primeiro ano de vida em crianças que já têm histórico de pais com alergias. A grande maioria já está curada aos dois anos e poucas passam dos cinco anos com o problema.”
Para prevenir a alergia ao trigo, alguns cuidados podem ser tomados pela mãe. Os cereais devem ser evitados na dieta da mãe e do bebê antes dos quatro meses e após os sete. Nesse período é possível incluir na dieta produtos derivados de cereais, pois é nessa fase que a criança desenvolve a tolerância aos alimentos.

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