domingo, 9 de dezembro de 2012

Pacientes sem cordas vocais cantam em coral após superar câncer em SP

Doze pessoas interpretaram seis músicas ao lado de fonoaudiólogos.
Tumor de laringe atinge mais homens e fumantes, explica médico.

Luna D'Alama Do G1, em São Paulo
Dez pacientes que foram diagnosticados há alguns anos com câncer de laringe e submetidos a uma cirurgia para retirada total dessa parte da garganta, incluindo as cordas vocais, participaram nesta quarta-feira (4) de um coral no Hospital A.C. Camargo, especializado no tratamento de tumores, em São Paulo.
Sete homens e três mulheres, todos com mais de 60 anos, interpretaram seis músicas ao lado de um grupo de fonoaudiólogos, que fizeram a segunda voz, e da chefe da área, Elisabete de Angelis, que tocou violão. O evento, realizado pelo segundo ano, marca o Dia do Fonoaudiólogo, neste domingo (9).
Coral (Foto: Luna D'Alama/G1)Coral teve dez pacientes que retiraram a garganta e fonoaudiólogos que os tratam (Foto: Luna D'Alama/G1)
As canções escolhidas pelo coral “Sua voz” foram “A banda”, de Chico Buarque, “Samba da bênção”, de Vinicius de Moraes – intercalada com a leitura de uma poesia –, “Trem das onze” e “Tiro ao Álvaro”, de Adoniran Barbosa, “Whisky a Go Go”, conhecida na versão de Roupa Nova, “Peixe vivo” e “Bate o sino”.
Uma das pacientes, a aposentada Maria Clara Falcucci, de 61 anos, ainda leu uma carta que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, diagnosticado com câncer de laringe no ano passado, escreveu para parabenizar a iniciativa.
Segundo a fonoaudióloga Elisabete de Angelis, o grupo – que tem outros dois participantes, que faltaram à apresentação – ensaia uma vez por mês e canta por meio de três métodos diferentes: laringe eletrônica (que deixa a voz metalizada), prótese traqueoesofágica ou, ainda, voz esofágica, em que a pessoa treina para fazer o ar passar pelo esôfago e, então, conseguir falar. Essas duas últimas técnicas precisam da ajuda dos dedos para produzir os sons, e a prótese esofágica é a que garante uma voz mais forte, fluente e compreensível.
“Temos três objetivos, que são levar informação aos pacientes, com palestras mensais, buscar que eles deem apoio uns aos outros e cantar, que treina a voz e ao mesmo tempo tem um poder de cura”, diz Elisabete.
Antes de cantar, porém, os pacientes que tiveram câncer e retiraram a laringe passam por um processo de reabilitação, em que primeiro reaprendem a falar e a lidar com o orifício que fica aberto permanentemente no pescoço, chamado traqueostomia.
“Por causa disso, eles não podem mais mergulhar e precisam tomar cuidado na hora do banho. Além disso, os que usam prótese esofágica devem trocá-la a cada seis meses, porque acumula fungos, alimentos, etc”, explica a fonoaudióloga.
Maioria homem e fumante
Das dez pessoas que cantaram nesta quarta no Hospital A.C. Camargo, sete eram homens e apenas duas nunca haviam fumado na vida. As demais mantinham o vício há décadas, e algumas já haviam largado o cigarro quando descobriram o câncer.
Coral  (Foto: Luna D'Alama/G1)Três mulheres e sete homens cantaram no coral
(Foto: Luna D'Alama/G1)
A mineira aposentada Maria Clara Falcucci, por exemplo, fumava um maço por dia há mais de 40 anos quando foi diagnosticada, em 2007. Uma forte rouquidão, que foi piorando, foi o sinal de alerta. A partir daí, veio a necessidade de cirurgia para retirada do câncer.
“Com as sessões de fonoaudiologia, aprendi a controlar o ar, ganhar fôlego e formar frases. A doença não é nada, difícil é o tratamento. Fiz 37 aplicações de radioterapia e cinco de quimio, como prevenção”, conta Maria Clara, que até dois anos atrás só tinha cantado em karaokê. Hoje, a paciente viaja muito pelo mundo e pelo interior de Minas com as duas irmãs mais velhas.
“Sempre fui muito alegre, otimista. Estar vivo é uma graça”, diz.
História semelhante viveu o aposentado Coryntho Baldoíno, de 70 anos, que foi fumante por três décadas e venceu um câncer na laringe há sete anos, já depois de ter abandonado o vício.
Primeiro, Baldoíno passou por 38 sessões de radioterapia e três de químio. Mas a doença voltou e a cirurgia foi necessária. Hoje, além de trabalhar como advogado e cantar nas horas vagas – antes do coral, ele se definia como um “péssimo cantor” -, o paciente participa de corridas de rua. No próximo domingo, vai competir em uma prova de 10 km, no Centro de São Paulo.
“Antes do diagnóstico, também era alcoólatra, e controlei o problema com o esporte. Praticava caminhadas, depois comecei a correr, e nunca tive nenhuma recaída”, diz.
70% são casos avançados
Cerca de 70% dos pacientes com câncer de laringe que chegam ao consultório médico já estão em um estágio avançado da doença, segundo o cirurgião de cabeça e pescoço Thiago Chulam, do A.C. Camargo. Isso dificulta as possibilidades de tratamento e cura.
Dependendo do local da garganta onde o tumor está, os sintomas são diferentes. Na glote (estrutura na parte superior da laringe, que impede a entrada de alimentos e facilita a saída de ar), os sinais mais comuns são rouquidão e alterações de voz. Quando aparece na parte acima da glote, há dor de garganta e dificuldade para engolir. Já se estiver abaixo, costuma aparecer falta de ar.
“Cerca de 85% dos casos estão ligados ao consumo de cigarro e álcool. E a bebida potencializa o efeito do fumo”, explica.
De acordo com Chulam, o diagnóstico é feito por meio de exames clínicos, de imagem – como laringoscopia – e biópsia.  “Entre os pacientes que fizeram químio e rádio para preservar a laringe, cerca de 40% têm uma volta do câncer e precisam retirar a garganta”, diz o médico.
As chances de cura para os tumores iniciais chegam a 80%, e caem para 40% nos casos avançados.

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