Cientistas testam novas substâncias que agem de forma inédita para evitar ataques cardíacos e o acidente vascular cerebral
Mônica Tarantino
PROMESSA
O cardiologista Bruno Caramelli acredita no potencial dessa
nova linha de tratamento, mas espera confirmação de eficácia
nos testes em humanos
Novas estratégias para combater as doenças do coração, como uma
vacina e anticorpos monoclonais, podem mudar o panorama do tratamento em
um período estimado de quatro a dez anos. As duas iniciativas pertencem
ao campo da imunologia, uma frente de batalha que começa a ser
explorada no enfrentamento dos males cardiovasculares. “A vacina e os
anticorpos monoclonais podem ser considerados inovadores, pois, pela
primeira vez, estão atacando as causas subjacentes às doenças
cardíacas”, disse à ISTOÉ o cientista sueco Jan Nilsson, da área de
Pesquisa Cardiovascular Experimental da Universidade de Lund, e líder
dos estudos com a vacina. Ele é um pesquisador renomado na criação de
tratamentos imunológicos.

Os testes realizados até agora, exclusivamente com camundongos,
mostraram que a vacina reduziu os depósitos de placas de gordura nas
artérias em até 70%. A proposta do imunizante é modificar a maneira como
o sistema imunológico responde à formação de placas nas artérias, que
estão na origem de problemas como o infarto e o acidente vascular
cerebral (AVC). Ambos ocorrem quando as placas ateroscleróticas (de
gordura) se rompem no interior das artérias. No coração, é o infarto. No
cérebro, dá lugar ao AVC. Um dos processos envolvidos no rompimento
dessas placas é a oxidação dos depósitos de gordura nas artérias. Quando
isso acontece com as moléculas de gordura infiltradas no endotélio
(membrana que reveste as artérias), o corpo passa a identificá-las como
agente agressor e dispara anticorpos para se defender do ataque,
causando inflamação e elevando o risco de ruptura.
O imunizante é feito com partes de aminoácidos (os tijolinhos que formam
as proteínas) tirados da molécula de colesterol oxidado presente nas
placas. No estágio atual, aguarda aprovação do FDA, agência americana
que regulamenta medicamentos, para ser testado em humanos. Será
ministrado por via subcutânea, por injeção. Porém, está sendo examinada
uma segunda vacina na forma de spray nasal. “Minha expectativa é de que
esteja disponível para ser usado em cinco anos”, diz o cientista
Nilsson.

O cardiologista e pesquisador Bruno Caramelli, diretor da Unidade
Clínica de Medicina Interdisciplinar do Instituto do Coração (InCor), da
Universidade de São Paulo, acha que a vacina será um grande avanço.
“Mas não se pode dizer que vá mudar todo o tratamento porque ainda não
foi testada em seres humanos. Muitas promessas falham nessa etapa”,
ressalva o especialista. “Além disso, provavelmente será muito cara e
terá de ser tomada repetidas vezes”, afirma o cardiologista. O próprio
Nilsson reconhece que o preço poderá ser alto e prediz que, por isso, as
pessoas com risco elevado de infarto do miocárdio provavelmente serão
as primeiras candidatas às abordagens imunológicas.
Há mais perspectivas. Uma delas é uma das substâncias usadas na
composição dessa vacina que demonstrou uma inesperada capacidade de
reduzir a formação das placas de gordura e fazer a doença regredir. Por
isso, está sendo testada separadamente em 114 pacientes com doença
arterial em 20 centros nos Estados Unidos e no Canadá. Os primeiros
resultados serão divulgados este ano. “É uma abordagem interessante e há
mais estudos nessa direção”, diz o professor e pesquisador Francisco
Laurindo, diretor do Laboratório de Biologia Vascular do InCor. “A
vantagem é que ambos os tratamentos, a vacina e os anticorpos
monoclonais, têm mecanismos diferentes de ação e podem ser usados em
conjunto com as terapias atuais, que reduzem o risco de doença
cardiovascular em 40%”, afirma o sueco Nilsson. Ele acredita que a
vacina poderá também ser usada em crianças. Outros avanços estão a
caminho. “O futuro do tratamento das doenças cardiovasculares está na
aplicação dos recursos da genética para buscar novos alvos e criar
terapias dirigidas. Muita gente está trabalhando nisso”, disse à ISTOÉ o
renomado pesquisador Peter Libby, da Universidade de Harvard.

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