Deficiente visual, o brasileiro Derek Rabelo vira ídolo do surfe internacional e é tema de dois documentários
Paula Rocha
CORAGEM
Derek surfou sozinho ondas no Havaí e na Califórnia
O jovem Derek Rabelo, 20 anos, é autor de uma façanha capaz de causar
inveja tanto em surfistas amadores quanto em profissionais. Em março
deste ano, ele surfou a Pipeline, no Havaí, uma das maiores e mais
perigosas ondas do mundo. O feito, que já seria considerado motivo de
orgulho para os surfistas convencionais, teve um gosto especial para
Derek. Totalmente cego, ele encarou ondas de até 20 metros. Sua incrível
história de superação conquistou o mundo do surfe e o alçou à fama.
Depois de conhecer, em julho, o ídolo Kelly Slater – americano 11 vezes
campeão do mundo, o brasileiro agora será protagonista de dois
documentários: o filme “Além da Visão”, dirigido pelos brasileiros Bruno
Lemos e Luiz Werneck, e “Beyond Sight”, assinado pelo americano Bryan
Jennings.
A ligação de Derek com o surfe começou no berço. Seus pais, fãs do
esporte, batizaram o menino em homenagem ao havaiano Derek Ho, um dos
melhores surfistas do mundo na temporada de 1992. Com uma semana de
vida, no entanto, descobriram que ele nascera com um glaucoma congênito.
A visão do garoto foi diminuindo até ele perder completamente a visão,
por volta dos 8 anos. “Foi um baque”, diz Ernesto Carlos Rabelo Souza,
pai de Derek. “Mas sempre acreditei que meu filho seria capaz de fazer
tudo o que quisesse, tanto que, com 2 anos de idade, dei uma prancha de
bodyboard para ele.” O interesse pelo esporte praticado pelo pai e pelos
tios paternos se tornou realidade há três anos, quando Derek decidiu
aprender a surfar. “Quando ele me procurou, pensei: ‘Como vou ensinar um
cego a surfar?’ Não foi fácil, mas ele evoluiu muito rápido”, diz Fábio
Alexandre Rodrigues, o “Maru”, professor do jovem até hoje. “Ele é um
menino que não tem medo de aprender, nem de onda grande.”

A chance de surfar a Pipeline surgiu com o amigo e também surfista
Magno Oliveira, que convidou Derek a ir para o Havaí. A família do
jovem, porém, não tinha condições financeiras de bancar a viagem. “Ele
tirou o passaporte e o visto para os Estados Unidos com um dinheirinho
que havia juntado vendendo pranchas”, diz Souza. Já o montante
necessário para a passagem, hospedagem e alimentação foi conseguido com a
ajuda de amigos e familiares. “Todo mundo se uniu para que ele não
perdesse essa oportunidade.” No Havaí, o jovem brasileiro foi bem
recebido pelos surfistas locais e, após conquistar as bravas ondas,
ganhou status de herói. “Surfar lá foi difícil, mas eu não tive medo.
Minha fé é maior do que o meu medo”, afirma Derek, que consegue se guiar
no mar ouvindo e sentindo o movimento das ondas – e às vezes conta com
indicações de surfistas amigos, posicionados perto dele.
“Quando vi esse menino surfando, não acreditei”, diz Bruno Lemos,
surfista e cinegrafista brasileiro que conheceu Derek no Havaí. “O que
ele faz é incrível. Surfar já é difícil para quem enxerga, imagine para
um garoto cego.” A espantosa habilidade do garoto sobre as pranchas
motivou Lemos a dirigir o documentário “Além da Visão”, que contará
histórias de pessoas com deficiência visual. O filme agora está buscando
patrocínio para a etapa de finalização e deve ser lançado no primeiro
semestre de 2013.

As conquistas de Derek, no entanto, prometem durar muito mais. Em
setembro ele fechou um contrato de patrocínio com a marca de beachwear
Billabong e passou a integrar o time de surfistas profissionais da
empresa. Agora, pretende voltar ao Havaí para surfar na última etapa do
circuito mundial Pipe Masters 2012, o maior campeonato de surfe do
mundo. Sua maior recompensa, entretanto, ele garante que já recebeu.
“Fico feliz por ser reconhecido e considerado um exemplo para as pessoas
com ou sem deficiência.”
Fotos: Bruno Lemos
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