Entidade americana muda o foco da prevenção: em vez de batalhar para atingir metas fixas, o objetivo agora é fazer cair de 30% a 50% a concentração do mau colesterol
Cilene PereiraA Associação Americana do Coração anunciou na semana passada recomendações que mudam radicalmente a forma de controlar o colesterol. Depois de quatro anos de revisão dos artigos médicos a respeito do tema, uma comissão de vinte especialistas da entidade decidiu que em vez de tentar baixar os níveis de LDL (o mau colesterol) para menos de 100 mg/dL ou 70 mg/dL, o paciente deve ser orientado a reduzir a concentração desta fração do colesterol entre 30% e 50%, independentemente de atingir ou não os níveis até agora preconizados. “Por muitos anos, a meta era diminuir o mau colesterol para menos de 100 mg/dL. Isso foi completamente eliminado agora”, afirmou o cardiologista Steven Nissen, da Cleveland Clinic, referência da cardiologia mundial.

CUIDADO
Na opinião do cardiologista brasileiro Raul Dias dos Santos, do InCor,
ao ampliar a faixa de pessoas que estão em risco, as medidas
farão com que mais indivíduos sejam tratados
A outra grande alteração está na determinação de quem possui risco suficiente o bastante para começar a tomar uma estatina, o tipo de remédio que controla o colesterol. A partir de agora, indivíduos entre 40 e 75 anos que apresentam 7,5% de chance ou mais de sofrer um evento cardiovascular (infarto ou acidente vascular cerebral) nos próximos dez anos devem começar a ser medicados. Antes, somente as pessoas com risco acima de 20% entravam no grupo das que tomavam o medicamento.
A maneira de calcular esse risco também foi aprimorada. A fórmula, disponibilizada aos médicos no site da associação, leva em consideração a idade, o sexo, a raça, colesterol, nível de pressão arterial, se a pessoa tem diabetes e se é fumante. “Cada um desses itens tem um valor numérico a ser incluído na equação que criamos. E ela vai fornecer o risco de cada paciente”, explicou Donald Lloyd-Jones, responsável pela formulação da nova conta. “Focamos realmente na questão do risco global de cada um”, disse o médico. “Existem muitas pessoas com chances substanciais de sofrer algum problema mas que não estavam sendo monitoradas por causa dos padrões anteriores”, completou. Cardiologistas americanos calculam que essas mudanças farão com que dobre o número de pacientes que tomam estatina nos Estados Unidos.

Outros questionam o abandono das metas no combate ao LDL. Temem que médicos e pacientes se atrapalhem no controle pela falta de taxas precisas. No Brasil, o cardiologista Raul Dias dos Santos, do Instituto do Coração, de São Paulo, também tem dúvidas em relação a essa medida. “Em linha geral, gostei das recomendações porque farão com que mais gente seja tratada. Mas em relação a abandonar totalmente as metas, acho uma questão complexa”, disse.
Recentemente, a Sociedade Brasileira de Cardiologia apresentou também suas novas diretrizes para um ataque mais eficiente ao colesterol. Há semelhanças conceituais entre o documento brasileiro e o americano. Os brasileiros também reconhecem que é preciso ser mais agressivo no tratamento do problema e provocar uma redução significativa nas taxas de LDL. No entanto, diferentemente dos colegas dos Estados Unidos, não acabam com as metas.
Professor de Cardiologia Preventiva e presidente da comissão responsável pelas novas recomendações americanas, o médico Neil Stone rebateu as críticas. Em sua opinião, as orientações farão com que os médicos ofereçam de fato um atendimento individualizado. “Estamos tirando os cardiologistas da zona de conforto”, disse. “Em vez de confirmarmos que o fato de o paciente alcançar as metas significa que ele está bem, estamos fazendo com que ele se pergunte qual é a melhor terapia para aquela pessoa.”
Nenhum comentário:
Postar um comentário