sábado, 29 de março de 2014

Tireoide preservada

Novos métodos permitem remover nódulos na glândula sem a necessidade de cirurgia

Mônica Tarantino (monica@istoe.com.br)
Em média, uma em cada sete mulheres tem nódulos na glândula tireoide. Se crescerem rápido demais, incomodarem e se sua aparência despertar o receio de que sejam malignos ou de que venham a se converter em câncer, a recomendação é removê-los. Até agora, o método predominante para isso é a cirurgia, o que pode implicar remoção parcial ou total da glândula e a necessidade de fazer reposição hormonal. Muitos centros médicos nos Estados Unidos, na Europa e na Ásia, porém, começam a colocar em prática métodos menos invasivos para reduzir bastante as dimensões dos nódulos ou eliminá-los. Os cientistas estão estudando principalmente o desempenho das ondas de radiofrequência, do laser e das micro-ondas. As técnicas geram calor, o que leva à morte dos tecidos nodulares. 
Testes com pacientes estão em andamento principalmente na Coreia, nos Estados Unidos e na Itália. Um dos aspectos mais investigados é a segurança do procedimento para não atingir estruturas nobres que cercam a tireoide, como as artérias carótidas, a traqueia e o nervo laríngeo (relacionado à voz).
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RECURSOS
O médico Rahal, do Albert Einstein, confirmou a eficácia
do laser e planeja testar a aplicação de micro-ondas
O pesquisador italiano Roberto Valcavi concluiu recentemente um dos primeiros estudos que comparam o desempenho de duas dessas técnicas. Ele submeteu 54 mulheres com nódulos benignos grandes à ablação por radiofrequência, enquanto outras 54 foram tratadas com laser. “O grupo submetido à radiofrequência teve resultados melhores e mais rápidos”, disse Valcavi. Na Coreia, no Centro Asan, 692 pacientes experimentaram o método, com igual sucesso. Alguns, entre eles homens, tinham nódulos volumosos, daqueles que desfiguram o pescoço e são chamados de bócio. No período de seis meses a um ano, houve reduções de até 75% do tamanho.
No Brasil, os radiologistas intervencionistas Antônio Rahal e Rodrigo Gobbo, do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, submeteram, em caráter experimental, 33 mulheres com nódulos benignos ao tratamento com laser. “Verificamos que se trata de uma terapia precisa, com resultados tão eficazes quanto os da radiofrequência”, afirma Rahal. O procedimento é realizado por meio da introdução de um a quatro feixes de fibra óptica no interior do nódulo por onde serão conduzidas as ondas de energia do laser. Sob temperatura elevada, as células sofrem necrose e morrem. A paulista Aline Gandra, 24 anos, passou pela terapia. “Até agora o nódulo não voltou”, diz.
Logo após a conclusão do teste, os especialistas do Albert Einstein pediram a aprovação do procedimento e do aparelho à Agência Nacional de Vigilância Sanitária. “Foi em 2012, mas ainda esperamos a liberação. Enquanto isso, não podemos usar sem que seja em pesquisa”, diz Gobbo. No Brasil, as mulheres que precisam remover nódulos contam apenas com duas opções: a cirurgia ou a alcoolização (injetam-se doses de álcool puro no interior dos nódulos para murchá-los). Em geral, o método precisa ser repetido mais de uma vez. “As brasileiras precisam ter acesso a métodos menos agressivos, como a radiofrequência”, diz a endocrinologista Maria Fernanda Barca, de São Paulo.
Há mais técnicas em estudo. Uma delas é a eletroporação (usa pulsos elétricos para perfurar a membrana das células, levando-as à morte), em teste em centros americanos e europeus. Por aqui, a equipe do Einstein pretende iniciar ainda este ano um protocolo experimental utilizando as micro-ondas.
As principais vantagens dessas técnicas em face da cirurgia são a eliminação dos nódulos sem cortes e as chances de preservação da glândula. “Essa espécie de implosão do nódulo, matando as células, é um benefício porque elimina a possibilidade de que ele aumente de tamanho e provoque sintomas ou adquira aspectos sugestivos de câncer”, diz Maria Fernanda.
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O cirurgião Luiz Paulo Kowalski, chefe do departamento de cabeça e pescoço do A. C. Camargo Cancer Center, em São Paulo, pensa diferente. Ele acredita que, se houver possibilidade de o nódulo vir a ser câncer, deve ser removido cirurgicamente. “Se não há risco, pode ser acompanhado e não precisa ser extraído”, diz. O cirurgião Sérgio Arap, do Hospital Sírio-Libanês, de São Paulo, diz que é cedo para dar um veredicto. “Falta um acompanhamento a longo prazo das pacientes para conhecer os resultados depois de cinco anos, por exemplo”, afirma.
Os avanços incitam também a preocupação com sua aplicação adequada. “Esses procedimentos se destinam a pacientes com nódulos benignos. O câncer não pode ser tratado dessa forma”, disse à ISTOÉ o médico Damian Dupuy, diretor de radiologia do Rhode Island Hospital, nos Eua. Ele é um dos principais pesquisadores das novas tecnologias. Sua recomendação é a de que só depois de comprovar que o nódulo é benigno (por duas punções seguidas da análise dos tecidos) se pode optar por um método menos agressivo.

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