Elas já podem contar com serviços médicos para minorar as agruras físicas e psicológicas
Tranquilidade nos momentos difíceis - “No
ano passado, entrei para os cuidados paliativos. Passei a receber uma
atenção diferente. Em uma das minhas internações, uma amiga do hospital
morreu com a mesma doença que eu tenho. Isso aconteceu de madrugada. No
dia seguinte, quando acordei, minha médica já estava no quarto. Ela fez
questão de conversar comigo e tirar todas a dúvidas que passavam pela
minha cabeça. Ela me tranquilizou muito.”
Jaqueline Tebaldi, 14 anos, portadora de fibrose cística
(Fabiano Accorsi)
Aos 14 anos, Jaqueline Tebaldi tem os hábitos típicos das meninas
de sua idade. Adora maquiagem, sobretudo as de cor rosa- clarinho.
Vidrada no celular (rosa brilhante), vive a vaguear pelas redes sociais e
a trocar mensagens com os amigos. Seus filmes prediletos são as
comédias românticas. Sonha em entrar na faculdade e cursar medicina. Ao
contrário da imensa maioria dos que atravessam a adolescência, aquela
fase em que nós nos sentimos imortais e poderosos, Jaqueline reflete
sobre a finitude e a fragilidade da vida. Aos 2 anos, ela foi
diagnosticada com fibrose cística, um distúrbio hereditário, sem cura e,
em geral, precocemente fatal. A doença atinge sobretudo os pulmões.
“Desde pequena, sei o que eu tenho. Quando eu era internada, via outras
crianças com problema igual ao meu. É difícil ver meus amigos indo
embora”, diz ela. “Sempre me pergunto: quando será que eu vou também?”
Com o vigor característico dos jovens, Jaqueline não se entrega. Como
quer entrar na fila do transplante, segue à risca uma rotina rigorosa (e
penosa) de tratamento — sessões diárias de inalação e diversos
medicamentos. Atualmente, com a piora de sua capacidade respiratória, a
menina está presa a um cilindro de oxigênio. Por causa do trambolho
(incômodo, mas indispensável), ela se afastou da escola, onde tocava na
fanfarra, do curso de inglês e das aulas de dança. Em breve, assim que
se adaptar à nova condição, Jaqueline pretende voltar a estudar. E,
quando isso acontecer, no primeiro dia de aula ela estará acompanhada
por alguns dos profissionais de saúde da Santa Casa de São Paulo
encarregados de seu caso. Eles devem explicar aos colegas de classe da
adolescente tudo sobre a fibrose cística. “Vai ser bom porque muita
gente pensa que a minha doença é contagiosa... As pessoas me olham com
cara de dó”, diz. “Com o tubo ou sem o tubo, eu sou a mesma coisa.”
A atenção dos médicos, fisioterapeutas e psicólogos na adaptação de
Jaqueline à nova rotina pode soar incomum em um tratamento médico. Mas
não é. Esse tipo de preocupação é parte essencial de uma das áreas mais
humanitárias da medicina moderna, a dos cuidados paliativos. Do latim
pallium, nome dado ao manto que os cavaleiros utilizavam para se
proteger do mau tempo, os cuidados paliativos pretendem aplacar o
sofrimento causado pelos sintomas e pelas sequelas de uma doença grave,
que ameaça a vida. O tempo de sobrevida do paciente é relativo. “Na
pediatria, a duração da doença é mais imprevisível do que entre os
adultos”, diz a pediatra Silvia Barbosa, chefe do departamento de
cuidados paliativos do Instituto da Criança, da Universidade de São
Paulo. Surgida na Inglaterra, no fim dos anos 60, a prática só chegaria
às crianças vinte anos depois, com a inauguração, em Oxford, da fundação
Helen and Douglas House. No Brasil, ela ainda está em seus primórdios,
com, no máximo, trinta especialistas no país todo.
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