segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

Assistência Social Microcefalia: aumenta procura por benefício de prestação continuada

Em 2016, no Ceará, 122 crianças com microcefalia receberam o BCP, diz Ministério. Em 2015, foram apenas 10
por Karine Zaranza - Repórter
Apesar das dificuldades, não faltam carinho e esperança em Andreza e Gabriel
Na casa simples da família de Briana Gabriel, cinco pessoas sobrevivem do auxílio ao menino com microcefalia e do Bolsa Família fotos. ( Fotos: Helene Santos )
Na casa de piso e paredes cruas, no Planalto Cauípe, em Caucaia, Andreza Araújo, 18 anos, se fez mãe do pequeno Brian Gabriel. Aos 10 meses, o menino com nome de anjo vai vencendo as dificuldades que a microcefalia impõe desde que veio ao mundo. Ele aprendeu a abrir as mãozinhas e tem mais firmeza no pescoço. Ela, que nunca teve apoio do pai da criança, aprendeu a seguir a vida, por vezes tão crua quanto as paredes do lar. Deixou de trabalhar para se dedicar a Gabriel e confessa que, se não fosse o benefício que recebe desde o terceiro mês de vida do filho, tudo estaria mais difícil.
O primeiro bebê com diagnóstico de microcefalia relacionada ao vírus zika em Caucaia é uma das 122 crianças do Ceará que receberam, em 2016, o Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social (BPC), segundo o Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário (MDS). Conforme o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), desde junho deste ano, quando o MDS estendeu o BPC para crianças com a mal formação congênita, foram concedidos 118 benefícios do tipo aqui até outubro.
Os números do auxílio ganharam corpo em 2016. Foram 1.586 BPCs liberados para crianças com microcefalia no Brasil, o que representou mais de R$ 9 milhões. Em 2015, segundo o Governo Federal, foram concedidos no País 165 benefícios relacionados à microcefalia, num valor total de R$ 962 mil. Houve um aumento de 99% de um ano para o outro. No Ceará, foram 10 benefícios concedidos em 2015. Em 2016, até outubro foram 122. Um aumento de mais de 1000%.
O auxílio no valor de um salário mínimo, que atualmente é de R$880, é concedido a idosos com mais de 65 anos que não recebem aposentadoria e a pessoas diagnosticadas com um algum tipo de deficiência. É preciso que se comprove o problema de saúde através de perícia médica do INSS e que a família esteja enquadrada na categoria de miserabilidade, com renda per capta de 1/4 do salário mínimo.
Variável
O tempo, segundo a Previdência, é variável. Para o menino de Caucaia, o auxílio chegou em momento exato. A chefe da família Claudia Ramos Rocha, 35, mãe de Andreza, Alessandro, 13, e David, 3, e avó do pequeno Gabriel, perdeu também o emprego. "Eu trabalhava como diarista em duas casas. Tinha que levá-los para os médicos e fisioterapia. Acabava faltando. A patroa me dispensou. Só faço hoje um faxina por semana. A gente agora sobrevive com o Bolsa Família dos dois meninos", relata ela que, assim como a filha, foi abandonada pelo companheiro e carrega sozinha a família.
tabela
O benefício permite que ele se alimente e que possa se locomover do distante bairro até a Policlínica duas vezes por semana. "Teve mês que a gente pagou mais de R$120 só alugando carro para ir ao (Hospital) Albert Sabin e para o Sarah, onde ele é examinado e acompanhado", conta a mãe.
Em Pacajus, Luiz Miguel Freitas, 10 meses, também é um dos beneficiários. Único bebê com microcefalia no município a 54 quilômetros de distância da Capital, o tempo entre a solicitação do BPC e o recebimento foi rápida. Cerca de 30 dias. Fui orientada na Maternidade Escola Assis Chateaubriand logo quando ele nasceu. Entrei no INSS e, em 15 dias, já foi feita a perícia e,15 dias depois, já tinha sido autorizado. Acho que por não ter outros casos, foi assim", aposta a mãe Samara Freitas, 17, que sobrevive com o benefício. Ela mora com a irmã e o filho em uma casa simples da cidade.
Ela comemora a conquista do direito. Sabe que trabalhar ficou mais difícil. Mas sabe também que outras pessoas estão tentando o que ela e o pequeno Luiz já conquistaram. "Conheço mães que ainda estão na luta. Graças a Deus com a gente deu tudo certo", agradece.
Ação
Para quem tem o benefício negado no INSS, uma opção é ingressar na Defensoria Pública da União (DPU). O órgão no Ceará não conseguiu levantar o número de processos relacionados à causa em 2016. No entanto, segundo a defensora Carolina Botelho, houve um crescimento. "Não lembro de ter feito nenhum processo desse em 2015. Sozinha, fiz 10 em 2016", conta.
A defensora avalia que, desde novembro, as leis ficaram mais rígidas. Agora as famílias precisam estar inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal e o beneficiário ter CPF. "Precisa agendar no INSS, que pode demorar até quatro meses. Os benefícios que precisam de perícia médica demora até seis meses. A previdência hoje está mais interessada em fazer perícia de pente fino do que conceder os benefícios", critica ela, ao garantir que o sucesso dos casos é de 80%.
Lei
Conceitos precisam ser reavaliados
Para a defensora Carolina Botelho, da DPU, é preciso sensibilidade para avaliar a liberação dos benefícios no INSS. Primeiro, em relação ao critério de miserabilidade (renda per capta equivalente a 1/4 do salário mínimo) e, segundo, pelo critério de família. Para ela, são conceitos que ultrapassam as definições impostas e, que se analisados pela letra fria da lei, podem impedir que o auxílio chegue a quem, de fato, precise. Outro ponto é que, com a descoberta de casos de zika congênita tardia e sem microcefalia, é possível que demore ainda mais a aprovação do benefício. "Se a deficiência não é visível, é preciso prova médica, clínica, o que demora ainda mais o processo".

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