
O objetivo é imunizar metade da população brasileira, cerca de 96 milhões de pessoas, em três meses – antes do início da segunda onda da gripe, esperada para o inverno. “Nossa responsabilidade com a população não pode ser cumprida com hipóteses”, disse o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, a ÉPOCA. “Estamos tomando todas as providências para nos prepararmos para uma realidade que poderá ser mais ou menos branda. É uma estratégia com respaldo de todas as sociedades científicas.”
A prioridade da vacinação será para os profissionais de saúde. Depois virão índios, mulheres grávidas, crianças entre 6 meses e 2 anos. Adultos saudáveis ficarão para a última fase (leia o quadro abaixo) . A estratégia brasileira copia os modelos de vacinação de Estados Unidos e Canadá, que incluíram adultos jovens e saudáveis no público-alvo da imunização. Essa escolha, segundo o Ministério da Saúde, foi feita com base no perfil dos 39.679 casos graves da doença registrados no Brasil entre abril e dezembro do ano passado, com 1.705 mortes comprovadas. Os adultos jovens foram o grupo que registrou uma das maiores incidências de casos graves. “A letalidade não é muito alta”, diz Temporão. “Mas são números importantes.”
O Ministério da Saúde recomenda que as pessoas se vacinem nas datas estabelecidas, mas bebês poderão ser vacinados tão logo completem 6 meses. Mulheres que engravidem também. Mas as crianças acima de 2 anos não foram incluídas na lista de prioridades. Na verdade, não haverá vacina para os brasileiros que têm entre 2 e 19 anos. De acordo com Temporão, nenhum país do mundo vacinou esse público, por causa da baixa incidência de casos graves. Há evidência de que a França vacinou. Nos Estados Unidos, o Centro de Controle de Doenças recomenda que crianças, “especialmente entre 0 e 5 anos”, sejam vacinadas. “No Brasil, foi na faixa etária entre 6 meses e 2 anos que se registraram mais internações”, diz o médico Eitan Berezin, presidente do Departamento Científico de Infectologia da Sociedade Brasileira de Pediatria. É verdade, mas isso não esgota a discussão entre os especialistas. “A meu ver, a única possibilidade para esse público de crianças e adolescentes não ter sido considerado preferencial é porque não há vacina para todos”, diz o infectologista Juvêncio Furtado, que deixou a presidência da Sociedade Brasileira de Infectologia há um mês. Pelas estatísticas do próprio Ministério da Saúde – divulgadas pela última vez em dezembro –, o terceiro grupo etário em incidência da doença, que reúne crianças e adolescentes entre 10 e 19 anos, não está contemplado na vacinação. “Não deve haver vacinas para essa população”, diz a médica Nancy Bellei, do Laboratório de Virologia da Universidade Federal de São Paulo e membro do Comitê de Influenza da Sociedade Brasileira de Infectologia.
A estratégia de vacinação tem como alvo preferencial os adultos jovens e saudáveis e exclui os adolescentes
O Ministério da Saúde investiu R$ 1,3 bilhão na compra de 113 milhões de doses de três fabricantes: GlaxoSmithKline, Novartis e Butantã, cuja fábrica ainda não está pronta e por isso só envasa o material adquirido do laboratório francês Sanofi Pasteur. A nova vacina segue a mesma metodologia de fabricação da vacina contra a gripe sazonal, cujo índice de proteção varia de 60% a 80%. Estima-se que 300 milhões de doses da vacina contra o vírus A(H1N1) já tenham sido ministradas em todo o mundo. “Essa vacina é totalmente segura e protege. Vamos começar a vacinação cinco meses depois de outros países, o que nos dá ainda mais tranquilidade”, diz Temporão. A única restrição é para quem tem alergia a ovos: essas pessoas não poderão ser vacinadas.
Na Europa houve desconfiança em relação à vacina. Políticos europeus chegaram a acusar a OMS de adotar o discurso da indústria farmacêutica, exagerando no alarme da gravidade da pandemia para vender vacinas. A França, que tinha encomendado 94 milhões de doses, tentou cancelar a compra de 50 milhões, segundo o diário The Wall Street Journal. A polêmica na Europa, diz Temporão, é alimentada por “movimentos quase religiosos” que questionam a eficácia das vacinas. Segundo ele, até agora não foram relatadas reações adversas graves à vacina.
Na Europa, onde sobraram doses da vacina por causa da baixa procura, um dos motivos apontados pelos especialistas para esse comportamento é o caráter mais brando da nova gripe no inverno do Hemisfério Norte. Nos Estados Unidos, de acordo com informações do Centro para Prevenção e Controle de Doenças (Centers for Disease Control and Prevention), também houve um declínio no número de casos registrados até o mês passado. O relatório mais recente do comitê de emergência da OMS aponta um declínio importante nos casos da gripe no mundo. Mas a OMS não vê motivos para reduzir os esforços no combate à propagação do vírus A(H1N1), com vacinas e tratamentos antivirais. Há o risco de mutação do vírus e do surgimento de novos surtos quando começar o inverno do Hemisfério Sul. “O vírus influenza é imprevisível. Se a doença se mostrou mais branda do que em pandemias anteriores, isso não invalida a ação da OMS”, afirma Nancy Bellei. Segundo ela, as afirmações de políticos europeus de que a OMS teria decretado a pandemia de má-fé ignoram o real risco do vírus influenza.
Devido às divergências de opinião no mundo, o Ministério da Saúde encomendou uma pesquisa para saber o que o brasileiro pensa sobre a campanha de vacinação. Os resultados confirmam a mesma adesão que outras campanhas têm conquistado no país: 84% disseram querer tomar a vacina e 70% acreditam em sua eficácia. Mas não se pode ignorar que há pelo menos 30 milhões de brasileiros aguardando mais explicações para decidir o que fazer em relação à nova gripe. Da parte do governo, o maior problema agora é colocar em prática a maior campanha de vacinação da história do país – um desafio logístico que os especialistas consideram enorme. “Estamos tranquilos”, diz o ministro Temporão. “O Brasil tem experiência com grandes campanhas de vacinação.” O Calendário da imunização-Quando serão aplicados os 113 milhões de doses de vacinas – e em quem
DE 8 A 19 DE MARÇO
• Trabalhadores da rede de assistência à saúde e profissionais envolvidos na resposta à pandemia O grupo inclui equipes de limpeza, recepcionistas e motoristas de ambulância, médicos e enfermeiros; e também trabalhadores de laboratórios e de investigação de campo (como agentes de vigilância epidemiológica)
• População indígena
DE 22 DE MARÇO A 2 DE ABRIL
• População com doenças crônicas (exceto idosos) – Obesidade grau 3 (antiga obesidade mórbida) – Doenças respiratórias – Doenças cardíacas – Imunodeprimidos – Diabetes – Doenças hepáticas, renais e hematológicas
• Crianças maiores de 6 meses e menores de 2 anos – Crianças receberão duas meias doses. A segunda deverá ser dada 21 dias após a primeira
• Grávidas em qualquer período da gestação As mulheres que engravidarem após esse período podem se vacinar ao longo das próximas etapas da campanha
DE 5 A 23 DE ABRIL
• População de adultos saudáveis de 20 a 29 anos
DE 24 DE ABRIL A 7 DE MAIO
• Idosos (maiores de 60 anos) com doenças crônicas
DE 10 A 21 DE MAIO
• População de adultos saudáveis de 30 a 39 anos
Obs.: os idosos serão vacinados durante a campanha anual de imunização contra a gripe comum, que terá 22,3 milhões de doses. Aqueles que tiverem doenças crônicas tomarão as duas vacinas
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